sábado, 15 de junho de 2013

XI Domingo do Tempo Comum - ano C - 16 de junho

       1 – A HUMILDADE é essencial para se viver saudavelmente, na abertura ao outro, no amadurecimento espiritual e afetivo, na aceitação das diferenças, na assimilação dos limites pessoais, no reconhecimento da fragilidade humana.
       O Papa Francisco tem sublinhado a imensidade da MISERICÓRDIA de Deus. Ele não Se cansa de perdoar, nós é que nos cansamos de pedir perdão, ou nos acanhamos diante de Deus, logo Ele que por amor nos dá Jesus, que, por sua vez, torna visível o amor de Deus na entrega até à cruz.
       A liturgia da Palavra para hoje traz-nos a boa notícia do PERDÃO que há de levar-nos à conciliação com Deus e com os outros, connosco e com a vida. O perdão é uma atitude cuja iniciativa cabe àquele que perdoa. Não é uma questão de esquecimento, uma vez que a memória fixa de forma privilegiada a ofensa, é uma decisão firme da vontade que procura compreender o outro, aceitar as limitações próprias e alheias.
       Deus criou-nos para a bondade, para a beleza, para o amor. Criou-nos livres, dando-nos a possibilidade do desencontro, ou mesmo da recusa em O reconhecer, guia-nos como PAI mas não nos substitui. Não somos marionetas de Deus, como o não somos dos nossos pais. Em relação aos pais carregamos os seus genes, características físicas, temperamentos parecidos. Mas crescemos e vamos descobrindo que somos diferentes e, por sua vez, os pais vão ter que nos deixar crescer e aceitar que não somos uma extensão dos seus corpos e/ou dos seus projetos de vida. Sofrem por não poderem evitar todas as nossas quedas, o nosso sofrimento, as nossas desilusões. Assim Deus connosco. Quer a nossa felicidade, respeita a nossa liberdade. Por maior que seja o nosso pecado, maior é o amor e a misericórdia de Deus.
       2 – O amor e o perdão são duas faces da mesma moeda. A música de fundo é sempre o AMOR que implica a ternura, o perdão, a conciliação e a partilha. Quem ama sujeita-se a padecer. Quem ama compromete-se a lidar com a fragilidade, propõe-se aceitar e a conviver com a alegria e os dias luminosos mas também com a treva, o desamor, o desencontro, o pecado, a rutura.
       Amar e ser amado é muito humano. O amor cria em nós os mecanismos que nos permitem caminhar, apreciar a vida, valorizar o que nos envolve, sentirmo-nos felizes, ou pelo menos com doses equilibradas de confiança e paz. Errar é humano, mas é sobretudo um défice de amor. Mais humano é amar e fazer o bem. O pecado é uma quebra, rompe a relação saudável com os outros e com Deus, mina a segurança afetiva e emocional, faz-nos voltar sobre nós, afasta o nosso olhar e sobretudo o nosso coração do olhar e do coração do outro. O pecado faz-nos curvar. Pesa-nos. Destrói-nos. Desequilibra-nos. Tira-nos o sono. Ou faz-nos indiferentes, insossos, tíbios, torna-nos cínicos. A vida passa ao lado, nada nos atrai positivamente.
       Com a habituação, o pecado vai ficando despercebido. O que ontem me pesava na consciência, hoje já não me diz respeito. É como as imagens de violência e de terror que passam na televisão. As primeiras imagens arrepiam-nos, as seguintes ainda mexem connosco, com a repetição tornam-se banais. Como referia o Papa Paulo VI, o maior pecado do nosso tempo é a falta de consciência do pecado. Para obtermos o perdão, precisamos de reconhecer que somos pecadores. Só Deus é santo. Nós estamos a caminho e é no caminho que Deus nos encontra. “Ó feliz culpa que nos valeu tão grande Salvador”, como bem sublinha Santo Agostinho. A consciência da nossa frágil condição humana abre-nos à misericórdia de Deus, e faz-nos compreender os erros alheios. Perdoar é divino. Quando perdoamos transparecemos Deus.
       3 – O evangelho é por demais expressivo sobre a dinâmica do amor, que promove o perdão. Jesus é convidado por um fariseu. Em outras ocasiões, o evangelista da misericórdia nos fala da refeição compartilhada com Jesus. Ele está em todos os cenários.
       Entretanto, uma mulher, que vivia na cidade, pecadora, conhecida por todos, apressa-se e derrama um vaso de alabastro sobre os pés de Jesus, em simultâneo com a abundância de lágrimas, enxugando-lhe os pés com o cabelo.
       É um gesto que transpira uma grande humildade: reconhecida por todos, esta mulher não se coíbe dos olhares discriminatórias, e de se sujeitar a ser rejeitada de novo, exposta, expulsa daquela casa, apontada. Vai confiante. Ouviu falar de Jesus. O seu coração leva-a a Jesus.
       A vozearia espalha-se virulentamente. Como é que Jesus, sendo profeta, se deixa tocar por uma pecadora? Precisamente por isso, porque sendo pecadora ela precisa de ser reconhecida como pessoa, precisa de ser tocada pelo perdão, pela luz que vem de Deus, por um olhar de compreensão e de aceitação. Porque sabe, Jesus apresenta-a como exemplo de humildade e de delicadeza, como imagem do pobre que se dispõe a acolher Deus e começa a alterar a sua vida.
       Diz Jesus a Simão, o anfitrião: «Vês esta mulher? Entrei em tua casa e não Me deste água para os pés; mas ela banhou-Me os pés com as lágrimas e enxugou-os com os cabelos. Não Me deste o ósculo; mas ela, desde que entrei, não cessou de beijar-Me os pés. Não Me derramaste óleo na cabeça; mas ela ungiu-Me os pés com perfume. Por isso te digo: São-lhe perdoados os seus muitos pecados, porque muito amou; mas aquele a quem pouco se perdoa, pouco ama». Depois disse à mulher: «Os teus pecados estão perdoados... A tua fé te salvou. Vai em paz».
       Os que ouviram interrogam-se: «Quem é este homem, que até perdoa os pecados?»
       Jesus surpreende os presentes. Pela generosidade do perdão e pelo contraponto entre a atenção da mulher pecadora que reconhece Jesus, e do patrão da casa e do banquete, que se coloca a si mesmo como dignatário e centro da festa. Outro contraponto cultural e religioso, acompanham Jesus, no anúncio da boa nova do reino de Deus, os Doze e algumas mulheres, como Maria Madalena, de quem Jesus tinha expulsado sete demónios, e Joana, mulher de Cusa, administrador de Herodes, Susana e muitas outras. Servem-no com os seus bens. As mulheres merecem todo o cuidado de Jesus.
       4 – Na primeira leitura, a figura de David, o grande Rei de Israel. Tendo o mundo a seus pés, ungido por Deus, através do profeta, não se coíbe de usar o poder para tomar a mulher de Urias, seu general e a quem provoca a morte. Deus desperta a consciência David. David esquecera a palavra de Deus e que o poder deveria ser um serviço a todo o povo.
       Deus alerta David. Reconhecer o pecado é o início da conversão. Deus perdoa-lhe tamanha desfaçatez, mas David precisa de alterar o seu proceder para que não se afaste dele a bênção de Deus. O perdão, para ser eficaz, precisa de ser acolhido e levar à mudança de vida. Assim com David, assim será com Pedro, assim será com todos. O perdão exige conversão e reparação.

       5 – A fé é a garantia do futuro, a garantia que podemos contar com Deus, e que não nos perderemos pelo caminho. Basta abrir o coração e estender a mão. Ele está, podemos encontrá-l’O, tocar-Lhe, ser salvos por Ele. Só Ele verdadeiramente nos pode salvar, nos pode perdoar. O espanto dos ouvintes de Jesus tem a ver com esta verdade. Se Ele perdoa os pecados, será que é Deus?
       A intervenção de Jesus sublinha a força da fé: a tua fé de salvou. Sem fé a nossa vida tornar-se-ia selvajaria, um sufoco, um abismo sem Céu, sem futuro, sem redenção.
       É pela fé que iniciamos o caminho. Neste Ano da Fé, convocado por Bento XVI, agora Papa emérito, somos convidados a revigorar a nossa fé, a revesti-la com a caridade, com um olhar mais puro, com ternura e compaixão, com a amizade, em gestos solidários de partilha e de comunhão. Fé em Deus que é Pai, Filho e Espírito Santo e que Se revela na Igreja, Corpo de Cristo, do qual somos membros vivos. É preciso dar CORPO à nossa fé, deixando que seja Cristo a viver em nós e através de nós Se revele em todo o mundo.
       Diz-nos o Apóstolo da Palavra: “Sabemos que o homem não é justificado pelas obras da Lei, mas pela fé em Jesus Cristo; por isso acreditámos em Cristo Jesus, para sermos justificados pela fé em Cristo... Com Cristo estou crucificado. Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim. Se ainda vivo dependente de uma natureza carnal, vivo animado pela fé no Filho de Deus, que me amou e Se entregou por mim”.
       A fé guia-nos confiantes ao amanhã, no encontro fraterno com os irmãos, caminhando para Deus. A fé faz-nos sentir filhos, abrindo o nosso coração para Deus, que nos ama, e nos perdoa as nossas distâncias: “Vou confessar ao Senhor a minha falta e logo me perdoastes a culpa do pecado”.


Textos para a Eucaristia (ano C): 2 Sm 12,7-10.13; Sl 31; Gal 2,16.19-21; Lc 7,36 – 8,3.

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