terça-feira, 13 de maio de 2014

Viver em função dos outros: um desafio e um perigo

       Há uma forma positiva de viver em função dos outros, como serviço e cuidado ao próximo. E há uma forma destrutiva, desumana e idolátrica de viver em função do que o outro diz, do que pode pensar sobre mim, da palavra que me possa dirigir, ou do agradecimento que posso receber por tentar fazer tudo perfeito.
       Viver em função de alguém como nós, frágil e imperfeito, é desumano. Só Deus é Deus, e neste prisma só deveremos viver em função do louvor e da glória de Deus, para não corrermos o risco da idolatria, do engano e da desilusão. A minha vida não pode ficar dependente do que o outro "quer" pensar ou dizer acerca de mim. Todos temos necessidade de ser reconhecidos como pessoas, com qualidades e defeitos. Se fizermos depender a nossa vida do que alguém pode pensar ou dizer, cairemos num ciclo de insegurança e de ansiedade. Como diria o célebre psiquiatra, Augusto Cury, o nosso pensamento acelera de tal forma que nos pode conduzir ao desespero e à depressão.
       Na perspetiva cristã, agir a favor dos outros, querer o bem dos outros, leva-nos a usar palavras e obras como instrumento de serviço, sem que a preocupação primeira seja o elogio. Isso poderá ser consequência. Se é uma condição prévia, mergulhamos num ciclo de ansiedade, inquietação e espera pelo que pode não chegar, ou chegar de outra forma que não a esperada.
       Não colocar demasiadas expetativas nas outras pessoas.
       Não significa falta de confiança, mas sereno realismo. Os outros são humanos como nós, podem falhar, podem desiludir-nos. Nós podemos desiludir os outros que colocam demasiada confiança em nós. Não é falta de honestidade, de bondade ou de vontade, simplesmente somos humanos. A confiança é a base de tudo, da amizade, do amor, da família, das empresas, da relação dos cidadãos com a cidade. Aliás, se falta a confiança, falta tudo. Só podemos amar alguém em quem confiamos. Mas confiar na pessoa enquanto pessoa, como UM todo, que aqui e além pode errar. Olhar para o outro, o pai, a mãe, o marido, a mulher, o filho, como um ser absolutamente perfeito é o primeiro passo para a desilusão, e por vezes para a rutura. Há que aceitar o outro como ser humano, com as suas limitações, pois também estas integram o pacote.
       Jesus não age para ser agradável aos outros, mas para os ajudar, concretizando a vontade Deus.

publicado na Voz de Lamego, n.º 4263, de 6 de maio de 2014.

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