sábado, 24 de outubro de 2015

XXX Domingo do Tempo Comum - ano B - 25.10.2015

       1 – O CAMINHO de Jesus não é estático. Constrói-se em movimento. São Marcos mostra como Jesus avança, progredindo na Mensagem, aprofundando as temáticas, exigindo cada vez mais e de forma mais clarividente. Poderíamos dizer que vai ganhando CONFIANÇA, que Lhe vem de Deus, mas que testa no encontro com as multidões e com os discípulos. As diferentes experiências e encontros dão-lhe uma vitalidade desconcertante.
       O Evangelho de Marcos possibilita a reflexão à volta do segredo messiânico. Jesus realiza prodígios, revela pouco a pouco a Sua identidade, mas pede "segredo" – não digais nada a ninguém. É, segundo os estudiosos, uma criação literária do evangelista para nos envolver na revelação (progressiva) de Jesus como Filho de Deus, o que só acontecerá plenamente na Ressurreição, cuja luz eliminará as dúvidas e as trevas, mas que se desvela em diferentes momentos. Jesus deixa-Se ver, deixa-Se tocar, deixa-Se acolher. Podemos segui-l’O.
       O encontro com Bartimeu é por demais sugestivo. Jesus segue o Seu CAMINHO a caminhar. À beira do caminho está um cego a pedir esmola. Um mal nunca vem só. Não basta ser cego ainda é pobre pedinte. À beira continuam muitos cegos, refugiados, doentes, idosos, pobres. Estão à beira, quase fora, alheados, excluídos. Não estão no caminho, porque se afastaram ou foram impedidos de entrar nele. O texto mostra as diferentes possibilidades.
       A voz do cego faz-se ouvir: «Jesus, Filho de David, tem piedade de mim». Certamente que já tinha ouvido falar de Jesus. O "segredo" da missianidade de Jesus estava a espalhar-se. Pedir segredo a algumas pessoas é a melhor maneira de espalhar o que supostamente seria um segredo bem guardado.
       Veja-se a dualidade da multidão. Por um lado, espalhou o "segredo" sobre Jesus. Por outro, afasta aquele homem, silencia-o. Não todos, mas muitos tentam que aquele homem se cale, como se pudesse incomodar Jesus. “Não nos incomodes com os teus problemas!”
       2 – Adentremo-nos no CAMINHO de Jesus. Onde é que nos situamos? Somos o cego, pobre, pedinte, que reconhece a sua limitação e insuficiência e que suplica a Jesus pela cura? Somos a multidão que divulga os feitos do Messias? Ou, a multidão que afasta os outros de chegarem perto de Jesus? Damos testemunho ou tornamos opaca a presença de Deus na nossa vida?
       Jesus mostra a delicadeza que devemos usar uns com os outros. A multidão, por mais ruído que possa fazer, não abafa a voz de Bartimeu. Jesus está atento a quem se abeira ou a quem está fora ou na margem do caminho. Se é necessário uma paragem ou um desvio, Jesus não hesita. É agora que Ele é necessário. Há quem precise d'Ele neste momento. Tudo o mais se torna relativo.
       Manda chamar Bartimeu. Mais uma parábola para o nosso compromisso cristão. Também a nós Jesus nos diz: «Chamai-o». Ide e anunciai. Espalhai o Evangelho. Fazei discípulos de todas as nações. Ide à procura da ovelha perdida.
       A multidão responde ao desafio de Jesus e anima-o: «Coragem! Levanta-te, que Ele está a chamar-te». Por vezes é necessário um pequeno impulso e depois tudo se facilita. É preciso que alguém inverta a tendência negativa, a demissão ou a corrente destrutiva. Jesus dá um passo, a multidão dá o seguinte.
       E logo, "o cego atirou fora a capa, deu um salto e foi ter com Jesus". A cura já começara no momento em que este cego ouviu falar de Jesus. Quando soube que Jesus estava por perto fez tudo para se encontrar com Ele, o que lhe era possível, contando com a ajuda dos outros. Jesus, que já o atraíra a Si, pergunta-lhe: «Que queres que Eu te faça?».
       Para sermos curados precisamos, primeiramente, de ter consciência que estamos doentes e depois querermos ser curados. E o pedido é óbvio: «Mestre, que eu veja».
       3 – «Vai: a tua fé te salvou». O cego – como bem lê o nosso Bispo, D. António Couto – pede para ver e Jesus envia-o: vai. Estaríamos à espera que Jesus lhe dissesse: vê. Mas para ver precisa de andar, de caminhar, de se colocar em movimento, de sair do seu canto e partir ao encontro de Jesus. Como se costuma dizer, também nós somos cegos quando não queremos ver, quando não caminhamos em direção aos outros, quando nos fechamos, ensoberbecendo-nos.
        A Diocese de Lamego, sob pastoreio de D. António Couto, tem insisto ao longo dos últimos anos, como no presente ano pastoral, na dinâmica missionária da Igreja. Foi o pedido primeiro do Papa Francisco, enxertado no ministério episcopal em Buenos Aires: uma Igreja em saída, que não se enrole sobre si mesma. Quando a Igreja é autorreferencial, atrofia, pois a Sua referência é Jesus, o Bom Pastor que sai à procura da ovelha perdida. Palavras do Cardeal Bergoglio, um pouco antes de ser eleito Papa, prefiro uma Igreja acidentada por sair do que doente, a cheirar a mofo, por se centrar em si mesma.
       Esta passagem ilustra a atitude dos discípulos de Jesus. Antes, víamos os apóstolos a quererem um lugar ao lado de Jesus, sentados. Agora um cego, que está sentado, como sublinha D. António Couto, sentado e a pedir esmola, e que se LEVANTA para encontrar Jesus. A posição do discípulo é seguir Jesus, levantar-se, libertar-se de si e do que lhe pesa. Bartimeu deita fora a capa e corre ao encontro de Jesus. O encontro com Jesus transforma-o. Recuperada a vista, segue Jesus pelo caminho. Seguindo Jesus somos curados da nossa cegueira.

       4 – A salvação mobiliza-nos para a transformação do mundo, a começar pelo nosso mundo, a nossa vida. O mundo inteiro dentro de nós. Aí começa a verdadeira mudança. Aquele homem cego levanta-se, salta, lança fora o que lhe pesa e com alegria fica frente a Jesus. Uma vez curado não volta à vida anterior, não volta a sentar-se nem a recuperar a capa, segue Jesus pelo caminho.
        A mesma interpelação nos chega de Jeremias: «Soltai brados de alegria por causa de Jacob... Fazei ouvir os vossos louvores e proclamai: ‘O Senhor salvou o seu povo’… Vou trazê-los das terras do Norte e reuni-los dos confins do mundo. Entre eles vêm o cego e o coxo, a mulher que vai ser mãe e a que já deu à luz. É uma grande multidão que regressa. Eles partiram com lágrimas nos olhos e Eu vou trazê-los no meio de consolações. Levá-los-ei às águas correntes, por caminho plano em que não tropecem. Porque Eu sou um Pai para Israel».
       Página extraordinária do profeta que nos envolve na salvação de Deus. Se a experimentamos, então não podemos calar o que vimos, ouvimos e vivemos. Cabe-nos anunciar ao mundo inteiro. O desencanto, o desânimo e a desesperança afastam-nos e dissolvem-nos. A salvação faz-nos regressar com alegria para bebermos da água viva que Deus nos dá em abundância.

       5 – Eu sou o Caminho, a Verdade e Vida. O próprio Jesus Se apresenta como o CAMINHO que nos leva a Deus. Só por Ele chegamos ao Pai (cf. Jo 14, 6-7, e também 1, 18). No Evangelho vemos como Jesus Se faz caminho para quem quer ver e quem quer caminhar, para quem quer transformar positivamente a sua vida.
       Ele é o Sumo-sacerdote que ousou entregar a Sua vida por inteiro a favor da humanidade.
       A Epístola aos Hebreus lembra-nos que o Sumo-sacerdote é escolhido de entre iguais, está revestido da mesma fraqueza pelo que pode interceder pelos outros. Oferece sacrifícios pelos próprios pecados e do povo. Assim Jesus. Igual a nós, revestido da nossa fragilidade, ainda que sem pecado, para oferecer já não sacrifícios, mas ser o SACRIFÍCIO a favor de todos. Ele é o Escolhido do Pai: «Tu és meu Filho, Eu hoje Te gerei... Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec».
       Jesus é constituído Sumo-sacerdote para, em definitivo e em plenitude, nos colocar à direita do Pai, de onde nos vêm todas as bênçãos. Porquanto, vamos caminhando com Ele, abrindo o Seu caminho para que outros O possam encontrar, acolher e segui-l’O.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (B): Jer 31, 7-9; Sl 125 (126); Hebr 5, 1-6; Mc 10, 46-52.

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