domingo, 1 de novembro de 2015

Roberto della Rocca - OSCAR ROMERO - A biografia

ROBERTO MOROZZO DELLA ROCCA (2015). Oscar Romero. A biografia. Braga: Editorial A.O., 232 páginas.
       No dia 3 de fevereiro de 2015, o Papa Francisco aprovou o decreto de beatificação D. Óscar Romero (1917-1980). Alguns dias depois, a 23 de maio de 2015, na Praça do Divino Salvador do Mundo, em São Salvador, foi proclamado Beato, em celebração presidida pelo cardeal Angelo Amato, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos.
       D. Óscar Romero nasceu a 15 de agosto de 1917, na Cidade de Barrios. Aos 13 anos entrou no Seminário. Foi ordenado sacerdote a 4 de abril de 1942, em Roma, onde se encontrava a efetuar estudos na Universidade Gregoriana. A estadia em Roma moldou o amor ao Papa, a fidelidade à Igreja, a devoção a São Pedro e a São Paulo. Em plena Segunda Guerra Mundial, Romero saiu de Roma para voltar a Salvador, fixando-se em São Miguel como pároco e logo como secretário do Bispo local. Segundo o biógrafo, Romero era amado e respeitado, pois conhecia e interpretava o sentir do povo. Alguns acusavam-no de comunismo. Por inveja. Romero não fugia aos conflitos. Não gostava da controvérsia, mas acabava por ser um jornalista combativo e polémico, não deixando de criticar abertamente o comunismo que procurava "desenraizar do homem qualquer sentimento religioso". Procurava a sintonia ao Papa, nomeadamente a João XXIII, colocando-se numa atitude de diálogo prudente e sincero para construir o mundo comum a todos. Também o estado liberal é criticável, tal como a influência maçónica.
       Em 1964, Romero foi acusado de ingerência em questões políticas e ameaçado com o tribunal.
       Em 1965, Romero era o padre mais ativo, mais culto, mais prestigiado de São Miguel. Tinha boas relações com o núncio apostólico, mas as relações com o clero não eram as melhores. Foi nomeado um Bispo auxiliar, norte-americano, quatro anos mais novo que Romero.
       Em 8 de junho de 1967 é nomeado como Secretário da Conferência Episcopal de El Salvador (CEDES). A notícia espalhou-se na diocese de São Miguel que protestou junto do núncio para que Romero regressasse. A gente simples estava com Romero. Romero convidou os diocesanos de São Miguel à obediência ao Bispo titular. Como secretário da CEDES, aproximou-se de Monsenhor Chávez, Arcebispo de São Salvador, que lhe pedia trabalhos pastorais na arquidiocese. A partir de maio de 1968, tornou-se secretário da SEDAC (Secretariado Episcopal da América Latina).
       Em 1970, foi sagrado Bispo. Tinha 53 anos. Em 15 de outubro de 1974, torna-se Bispo de Santiago de Maria.
       Fiel ao magistério (sobretudo) papal, tinha palavras duras para os teólogos da libertação, que não compreendiam que a verdadeira libertação era do pecado, vinha da cruz de Jesus e não apenas da militância política. Sintonizava com o Bispo Eduardo Pironio, sublinhando que este expressava com sabedoria e equilíbrio a teologia da libertação, e que sobressaia pela humildade, cultura e humildade.
       Em 3 de fevereiro de 1977 foi escolhido para Arcebispo de São Salvador, assumindo a Arquidiocese a 22 de fevereiro.
       Não teve tempo para descansar na missão que assumia. Depois de várias tomadas de posição, conjuntamente com outros Bispos, e com o pulsar da Igreja, mostrando como a repressão não era a solução, mas a justiça social, a partilha, a atenção aos pobres, a distribuição da riqueza, em 10 de março de 1977, foi assassinado o padre Rutilio Grande, juntamente com ele, dois camponeses, um idoso e um rapaz. D. Óscar Romero, muito amigo de Rutilio, ficou muito perturbado. Foi a partir de então que se dá o que o inimigos ou oportunistas chamam de "conversão", mas que o próprio refere como "Fortaleza", dom do Espírito Santo.
       A intervenção de D. Romero será mais concreta, permanente, do púlpito, pela rádio, pela impressa da Arquidiocese, me reuniões oficiais e privadas, intervindo a libertar sacerdotes ou famílias, distanciando-se e a Igreja de qualquer ideologia ou compromisso político, A Igreja defende o bem, venha de onde vier e condena o mal, seja da esquerda seja da direita. Ao longo do seu magistério, na Arquidiocese e em todo o país, a Igreja é perseguida, sacerdotes e agentes da pastoral, presos, torturados, mortos e, os estrangeiros, expulsos.
       Em relação à Teologia da Libertação, alerta para o risco de se tornar uma vertente do marxismo, fixando-se apenas na vertente temporal. Oscar Romero perfilha a opção preferencial pelos mais pobres, mas sempre em lógica de libertação integral, na abertura ao transcendente. Não se podem mudar as estruturas sem a conversão, sem mudar os corações. Prefere a Teologia da Salvação. Cristo, pela Sua cruz, redime o homem todo. Ligação permanente ao Evangelho, ao magistério dos Papas, às conferências de Medellin e Puebla. De algum modo, Romero antecipa aquela que será a posição da Santa Sé, nomeadamente da Congregação da Doutrina da Fé, presidida pelo então Cardeal Ratzinger: a opção preferencial pelos mais pobres é cristológica. Cristo veio para libertar o Homem todo: o que fizerdes ao mais pequenino dos irmãos a Mim o fazeis. Romero não se opõe à Teologia da Libertação, mas purifica-a com a cristologia. Só há libertação autêntica com a cruz redentora de Jesus Cristo. | Em relação à Teologia da Libertação vale a pena ler o que escreveu sobre Romero aquele que é considerado o Pai da Teologia da Libertação, Gustavo Gutiérrez: ROMERO, o BISPO QUE MORREU PELO POVO. Poderia sublinhar-se que a acentuação de Romero acerca da Teologia da Libertação se enquadra nas reflexões de Gustavo Gutiérrez.
       As relações com a Santa Sé também não foram fáceis, sobretudo quando intermediadas com os núncios ou com enviados papais. Os encontros com o Papa Paulo VI e com João Paulo II transmitiram-lhe confiança, solidariedade, coragem para combater as injustiças, anunciar o Evangelho, testemunhar pelo serviço e pelo compromisso com os mais pobres.
       As ameaças foram aumentando de tom, como os atentados contra a Igreja. Ora a esquerda ora a direita. Qualquer intervenção de D. Romero tinha uma leitura "política", ainda que ele sublinhasse a equidistância do Evangelho e da fé em relação a qualquer facção. A Igreja seria uma terceira via.
       Outros dos aspetos vincados, é a inveja, o ódio, vindo de dentro, dos seus colegas de episcopado, mormente do Bispo Auxiliar, que faziam queixas ao núncio ou à Congregação dos Bispos. A sua ascensão a Arcebispo de São Salvador não agradou a muitos, mais velhos, com pretensões a tão elevada dignidade, mas também o sucesso que Romero tinha nas suas intervenções que era lidas e/ou ouvidas, comentadas e seguidas pelo clero de outras dioceses. Onde chegavam era cercado por crentes e pelos jornalistas. Foram várias as tentativas para o depôr. O autor sugere que a sua morte foi precipitada aquando da certeza que não seria substituído. A única forma de o calar foi matá-lo.
       Ainda lhe sugeriram seguranças, ou a retirada, por exemplo, para Roma. A decisão foi a fé, o testemunho. Se os cristãos de São Salvador não têm proteção também o seu Bispo não a pode ter. Se os cristãos são mortos sem razão, o Pastor tem que se manter no seu posto, testemunhando a fé, dando coragem a todos. "Seria um contratestemunho pastoral se pudesse mover-me seguro, enquanto o meu povo vive no perigo... o meu dever obriga-me a andar com o meu povo; não seria justo dar um testemunho de medo. Se a morte vier, será o momento de morrer como Deus quis".
       É assassinado por um profissional, com um só disparo, uma bala de fragmentação no peito, a 24 de março de 1980, enquanto celebrava Missa. Tinha 62 anos de idade. O funeral foi a 30 de março, Domingo de Ramos, na Plaza de Barrios e não chegou ao fim. Uma explosão colocou em perigo uma imensa multidão, cujo pânico provocou dezenas de mortes.
       Foi uma morte por ódio à fé. E essa é a razão para ser reconhecido como mártir pelo Papa Francisco. Porquê uma demora tão grande? Explica Bento XVI: "Monsenhor Romero foi certamente um grande testemunho da fé, um homem de grande virtude cristã que se empenhou pela paz e contra a ditadura e que foi morto durante a celebração da Missa. Portanto, uma morte verdadeiramente credível, de testemunho de fé. Havia o problema de uma facção política o querer assumir como bandeira, como figura emblemática, injustamente. Como fazer vir à luz verdadeiramente a sua figura, purificando-a destas tentativas de instrumentalização? Este é o problema. Não duvido que a sua pessoa merece a beatificação" (9 de maio de 2007). Bento XVI reavivou o processo que conduziu à beatificação de D. Óscar Romero.

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