sábado, 9 de abril de 2016

3.º Domingo da Páscoa - ano C - 10 de abril de 2016

       1 – O Papa Bento XVI, na celebração vespertina do dia 12 de maio de 2010, na Basílica da Santíssima Trindade, em Fátima, com religiosos, seminaristas, diáconos e sacerdotes, evidenciava: "Permiti abrir-vos o coração para vos dizer que a principal preocupação de todo o cristão... há de ser a fidelidade, a lealdade à própria vocação, como discípulo que quer seguir o Senhor. A fidelidade no tempo é o nome do amor; de um amor coerente, verdadeiro e profundo a Cristo Sacerdote".
       O amor é a fidelidade no tempo. Não é um sentimento passageiro, ou uma emoção que nos entusiasma, mas uma opção de vida, aprofundando os laços que nos unem uns aos outros, promovendo gestos de afeto, de proximidade, de ternura, de serviço. Jesus não passa pelas pessoas. Jesus permanece. Para. Olha. Fala. Envolve. Cura. Desafia. Chama. Envia. "Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos" (Mt 28,20). Não estará num momento, ou apenas nas situações favoráveis, mas em todo o tempo, e em todas as situações da vida. Deus é amor. Quem ama permanece em Deus e Deus permanece nele (cf. 1 Jo 4, 7-19).
       Jesus volta a aparecer, a estar junto à margem, a colocar-se no meio de nós, como Aquele que congrega. Convida-nos para a Sua mesa. O entusiasmo inicial desvanece-se com alguma celeridade. É assim em muitos projetos que engendramos. E aqui todos somos muito infantis ou muito juvenis. Entusiasmamo-nos, mas logo o entusiasmo passa e tudo regressa à rotina e ao cansaço. E eis que vemos Jesus, a chamar-nos, a alimentar-nos e a enviar-nos. Ainda não percebemos que a ressurreição nos leva para outros caminhos? Por quê voltar à vida do passado? A vida está aquém do sepulcro e além da morte. O Ressuscitado reenvia-nos para o HOJE e para o amanhã. Por quê voltar atrás?
       Em Lisboa, no Terreiro do Paço, a 11 de maio, o Papa Bento XVI sublinhava que "o Ressuscitado oferece-Se vivo e operante, por nós, no hoje da Igreja e do mundo. Esta é a nossa grande alegria. No rio vivo da Tradição eclesial, Cristo não está a dois mil anos de distância, mas está realmente presente entre nós e dá-nos a Verdade, dá-nos a luz que nos faz viver e encontrar a estrada para o futuro... Para isso é preciso voltar a anunciar com vigor e alegria o acontecimento da morte e ressurreição de Cristo, coração do cristianismo, fulcro e sustentáculo da nossa fé, alavanca poderosa das nossas certezas, vento impetuoso que varre qualquer medo e indecisão, qualquer dúvida e cálculo humano. A ressurreição de Cristo assegura-nos que nenhuma força adversa poderá jamais destruir a Igreja".
    2 – Jesus apareceu aos discípulos, na tarde daquele primeiro dia, encontrou-os fechados em casa com medo dos judeus. Oito dias depois voltou a aparecer-lhes, estando também presente Tomé, que antes estava ausente. Porém, o Evangelho dá a entender que os discípulos ainda não sabem em que pé estão. O entusiasmo tomou conta deles, depois de um tempo de grande desencanto, mas parece ter sido sol de pouca dura. Que fazer? Esperar que Jesus Ressuscitado restaure em definitivo o Reino de Deus?
       O Apóstolo Pedro, para se distrair ou ocupar o tempo, decide ir pescar. Os outros seguem-lhe o exemplo. Tomé, Natanael, João, Tiago e mais dois discípulos. Já se tinham esquecido que Jesus os retirou da pesca real para os tornar pescadores de homens (cf. Mt 4, 19). E, com efeito, a noite não rendeu, não pescaram nada. Ao romper da manhã, Jesus apresenta-Se na margem. Jesus chega cedo à nossa vida. Eles não sabiam que era Ele. Muitas vezes também nós não nos apercebemos que Jesus nos visita ou que está diante de nós!
       A pergunta de Jesus deixa-os boquiabertos: «Rapazes, tendes alguma coisa de comer?». Como não lembrar o pedido feito à Samaritana: dá-Me de beber! Depois será Ele a saciar-lhe a sede (cf. Jo 4,1-42). Ou quando se faz convidado: Zaqueu, desce depressa que HOJE devo ficar em tua casa. E Zaqueu sentir-se-á em casa com Jesus (cf. Lc 19, 1-10).
       Os discípulos escutam o pedido e, como outros trabalhadores, de bom grado o atenderiam. Mas andaram toda a noite e não pescaram nada. Então Jesus diz-lhes: «Lançai a rede para a direita do barco e encontrareis». Para pescadores experimentados não era muito lógico lançar as redes pela manhã, mas fazem-no e são surpreendidos, pois as redes enchem-se de peixes. Sucedem-se momentos extraordinários. Com Jesus, a pesca é abundante. Sem Ele, é inútil qualquer trabalho. Nesta pescaria são precisas muitas mãos. Pedro vai ao encontro de Jesus, outros discípulos puxam as redes para a margem. Novamente Pedro, sobe ao barco, ainda Hoje, como Francisco, e puxa a rede para terra firme, com 153 grandes peixes. Não importa o número mas a comunhão de amor. Na margem, Jesus espera-os para os alimentar. Primeiro pediu-lhes que comer, agora tem o lume aceso e peixes a assar. Mas também agora conta com eles, e connosco: «Trazei alguns dos peixes que apanhastes agora».
       3 – «Vinde comer». É o convite de Jesus, para todos os tempos, para os que estão na praia, no mar ou em terra firme. Para ontem e para hoje. Para eles e para nós. "Jesus aproximou-Se, tomou o pão e deu-lho, fazendo o mesmo com os peixes". O que temos só é verdadeiramente nosso quando o repartimos pelos outros. À mesa de Jesus todos têm lugar, sobretudo os excluídos dos reinos deste mundo. Ele dá-nos tudo o que tem, a Sua própria vida, como alimento até à vida eterna, presente no Sacramento da Caridade, a Eucaristia, que havemos de comungar com os outros, no dia-a-dia da nossa existência.

       4 – O amor é a fidelidade no tempo. Não é um instante, ainda que se alimente de instantes e se renove constantemente. Traduz-se em obras, gestos e atitudes. "Nem todo aquele que diz 'Senhor, Senhor' entrará no reino dos Céus, mas somente aquele que fizer a vontade de Meu Pai" (Mt 7, 21). O que os lábios professam, a vida transparece. Pedro havia professado Jesus, garantindo que estaria com Ele em todas as horas. É audível a repreensão de Pedro a Jesus (cf. Mt 16, 22). Mas, como Jesus previra, Pedro, na hora de maior desgaste, nega-se e nega Jesus (cf. Jo 18, 12-27).
       Neste reencontro, Jesus questiona Pedro sobre a sua fidelidade: «Simão, filho de João, tu amas-Me mais do que estes?». Pedro vai gaguejando e respondendo como se fosse algo óbvio: «Sim, Senhor, Tu sabes que Te amo». Jesus insiste com Pedro, como por vezes insistimos com os amigos para garantirmos que eles vão estar connosco quando mais precisamos! Na última resposta, Pedro reconhece-se humildemente, quase a sussurrar: «Senhor, Tu sabes tudo, bem sabes que Te amo».
       Olhando-o nos olhos, Jesus desafia-o: «Apascenta as minhas ovelhas. Em verdade, em verdade te digo: Quando eras mais novo, tu mesmo te cingias e andavas por onde querias; mas quando fores mais velho, estenderás a mão e outro te cingirá e te levará para onde não queres». Mais uma vez não lhe promete facilidades. Jesus estará sempre com ele e connosco, desde que O amemos de todo o coração. Como a Pedro, ontem, também a nós, hoje, Jesus interpela: «Segue-Me».
       5 – Simão Pedro, impulsivo e espontâneo, aprendeu a confiar em Jesus e assumir a sua vocação; confirmado na fé, passou a confirmar os irmãos.
       A resposta dada ao sumo-sacerdote, que os proibia novamente de pregar, é clarificadora: «Deve obedecer-se antes a Deus que aos homens. O Deus dos nossos pais ressuscitou Jesus, a quem vós destes a morte, suspendendo-O no madeiro. Deus exaltou-O pelo seu poder, como Chefe e Salvador, a fim de conceder a Israel o arrependimento e o perdão dos pecados. E nós somos testemunhas destes factos, nós e o Espírito Santo que Deus tem concedido àqueles que Lhe obedecem».
       A ordem das autoridades do Templo antigo é para os açoitar, intimidando-os para não voltarem a falar no Nome de Jesus. Porém, "os Apóstolos saíram da presença do Sinédrio cheios de alegria, por terem merecido serem ultrajados por causa do nome de Jesus", com o propósito de anunciar o Evangelho em toda a parte.

       6 – «Digno é o Cordeiro que foi imolado de receber o poder e a riqueza, a sabedoria e a força, a honra, a glória e o louvor, pelos séculos dos séculos». A visão de João, no Apocalipse, permite-lhe presenciar a oração dirigida a Jesus, o Cordeiro de Deus, que foi imolado para a salvação de todos. Na adoração inicia-se a conversão. Todas as criaturas que há no céu, na terra e no mar, são, em Cristo Jesus, resgatadas para Deus.
       Confiemos a nossa vida a Deus, Pai de Misericórdia: "Ouvi, Senhor, e tende compaixão de mim. Senhor, sede Vós o meu auxílio. Vós convertestes em júbilo o meu pranto: Senhor meu Deus, eu Vos louvarei eternamente" (Salmo).
       Dobremos os joelhos em adoração, mas sobretudo o coração, para que a nossa miséria, nas palavras do Papa Francisco, seja cancelada pela misericórdia de Deus.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano C): Atos 5, 27b-32. 40b-41; Sl 29 (30); Ap 5, 11-14; Jo 21, 1-19.

Sem comentários:

Enviar um comentário