A terceira Carta Encíclica de Bento XVI empresta o título a este blogue. A Caridade na Verdade. Agora permanecem a fé, a esperança e a caridade, mas só esta entra na eternidade com Deus. Espaço pastoral de Tabuaço, Távora, Pinheiros e Carrazedo, de portas abertas para a Igreja e para o mundo...
quinta-feira, 26 de setembro de 2019
sábado, 14 de setembro de 2019
Exaltação da Santa Cruz - 14 de setembro
1 – "A linguagem da cruz é certamente loucura para os que se perdem mas, para os que se salvam, para nós, é força de Deus... Nós pregamos um Messias crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os gentios. Mas, para os que são chamados, tanto judeus como gregos, Cristo é poder e sabedoria de Deus" (1 Cor 1, 17-31).
Só os criminosos eram condenados à crucifixão. A cruz é ignominiosa remetendo imediatamente para algum crime hediondo. Ao ser apresentado como Crucificado, Jesus é tido como um malfeitor, um criminoso.
Por outro lado, como é que Jesus sendo Filho de Deus, todo-poderoso, pode deixar-Se matar? Como é que pode ser o Messias esperado e libertador, se Ele mesmo é preso, esbofeteado e morto? E sendo Deus, como pode morrer?
Alguns tentam mitigar a gravidade e o escândalo, dizendo que a morte de Jesus foi aparente; ou só morreu Jesus (humano) separado do Cristo (divino); ou foi substituído no momento da crucifixão por um dos discípulos, por exemplo, por Judas Iscariotes (cujo corpo seria desviado do túmulo e estrategicamente “enforcado” para ser encontrado), e depois Jesus teria aparecido “ressuscitado” (não se encontrando o seu corpo em parte nenhuma, uma vez que não tinha morrido). Ainda há correntes religiosas que não aceitam que Jesus Cristo tivesse sido morto e muito menos numa cruz. As representações da figura de Jesus é romantizada com belíssimas passagens, mas numa em situação de sofrimento, de fragilidade ou de morte na cruz. Ora, se Jesus não tivesse sido morto, tudo seria uma encenação, um faz-de-conta, e que colocaria em causa toda a pregação de Jesus.
Quando Jesus anuncia que vai morrer, logo os apóstolos O contestam, a começar por Pedro: Deus te livre de tal, nós não deixaremos. Já na Cruz, alguns zombam d’Aquele Messias: se és o Messias, desce da Cruz… Nas Aparições do Ressuscitado há um elemento bem visível, as marcas do Crucificado, as chagas do seu corpo, é o mesmo Jesus Cristo.
No início da missiva aos Coríntios, o Apóstolo mostra-nos o centro da pregação e a identificação do Evangelho. A Cruz ocupa um lugar incontornável na fé cristã e na vida da Igreja. Com efeito, não se poderia falar em ressurreição se antes se não falasse da morte de Jesus. E, concretamente, na morte de Cruz, lugar de oblação, de entrega, lugar do amor levado às últimas consequência, até à última gota de sangue. Oferecendo-Se, Jesus oferece-nos a Deus. Desce ao mais profundo, para nos elevar ao mais elevado.
Por mais voltas que se deem de forma a minorar os estragos da fé num Deus todo-poderoso, revelado em Jesus Cristo, a fé estaria condenada ao fracasso se não contemplasse a cruz. Os braços estendidos enlaçam-nos como irmãos. A cruz, cravada na terra, ligada a todos os que a habitam, levanta-se e levanta-nos para o alto. Dali, Jesus repara em nós, fixa o Seu olhar no nosso olhar e obriga-nos a levantar a cabeça para lá da Cruz.
2 – «Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele». A Encarnação marca um tempo novo: Deus entra na história como verdadeiro Homem, como um de nós, carne da nossa carne, sangue do nosso sangue. Tal mistério traz-nos a eternidade de Deus, para no final, nos abrir, para escancarar, as portas do Céu. Mas o Céu já está entre nós, é Jesus Cristo, que ao morrer e ressuscitar nos levará para junto do Pai. Quis-Se connosco. Veio. Quer-Se connosco, leva-nos com Ele. Sem a abertura do Céu, ficaríamos apenas pó.
Quando encontra Nicodemos, Jesus revela-lhe a importância da vinda do Filho de Deus:
«Ninguém subiu ao Céu senão Aquele que desceu do Céu: o Filho do homem. Assim como Moisés elevou a serpente no deserto, também o Filho do homem será elevado, para que todo aquele que acredita tenha n’Ele a vida eterna. Deus amou tanto o mundo que entregou o seu Filho Unigénito, para que todo o homem que acredita n’Ele não pereça, mas tenha a vida eterna».
Jesus recorda a Nicodemos como aquela serpente, levantada por Moisés no meio do nada, do deserto, antecipa a Cruz plantada entre salteadores, no meio dos homens: a salvação.
"O Senhor disse a Moisés: «Faz uma serpente de bronze e coloca-a sobre um poste. Todo aquele que for mordido e olhar para ela ficará curado». Moisés fez uma serpente de bronze e fixou-a num poste. Quando alguém, era mordido por uma serpente, olhava para a serpente de bronze e ficava curado".
Mordidos pelo pecado, pelo egoísmo, pela maledicência, pela violência, só voltando-nos para o alto encontraremos a redenção que nos obriga a sair de nós, a olhar além do nosso umbigo.
3 – Belíssimo o poema recolhido por São Paulo na Epístola aos Filipenses, e que resume todo o mistério de Jesus Cristo, a Encarnação, o abaixamento, a divindade que Se encolhe na humanidade, a eternidade que Se faz tempo e história, o Infinito que Se faz finito e frágil. Deus esconde-Se no Homem.
"Cristo Jesus, que era de condição divina, não Se valeu da sua igualdade com Deus, mas aniquilou-Se a Si próprio. Assumindo a condição de servo, tornou-Se semelhante aos homens. Aparecendo como homem, humilhou-Se ainda mais, obedecendo até à morte e morte de cruz. Por isso Deus O exaltou e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes, para que ao nome de Jesus todos se ajoelhem no céu, na terra e nos abismos, e toda a língua proclame que Jesus Cristo é o Senhor, para glória de Deus Pai".
Fácil imaginar uma Mãe (um Pai) a agachar-se para estar ao nível da criança, ora para brincar com ela, ora para a levantar em seus braços e a segurar no seu colo. Assim Deus. Debruça-Se para nos olhar olhos nos olhos, viver connosco no meio de nós, assumindo-nos no nosso pecado, na nossa fragilidade e finitude, identificando-Se com a nossa humanidade. Debruça-Se para depois nos erguer com Ele.
Como não recordar Jesus no momento da última Ceia - a primeira deste tempo novo - quando Se ajoelha, colocando-Se ainda mais baixo que os discípulos, e lhes (e nos) lava os pés, em atitude de serviço. Está connosco à mesa, partilha connosco o pão e a vida. Já as suas palavras saem embargadas. Daqui a pouco terá uma prova de fogo e de resistência. Irá até ao fim. Por todos. Por cada um de nós. São suores de sangue, quando a vida biológica está sob ameaça. São palavras de entrega confiante ao Pai: faça-Se como Tu queres. Pai, nas Tuas mãos entrego o Meu espírito.
Jesus fecha um círculo, enlaçando-o na nova vida que nos dá em abundância. Tudo n'Ele está consumado. A Cruz põe termo a toda a treva, a todas as distâncias. Jesus eleva-nos para Deus. O Seu abaixamento, torna-se exaltação. Deus dá-lhe um nome, diante do qual todos nos devemos ajoelhar para melhor O acolhermos, O louvarmos, para melhor nos deixarmos trabalhar por Ele.
A nossa salvação, a Cruz de Jesus Cristo, está cravada na terra, entre nós, no mundo, entre a terra e o Céus. Enxertada na terra, mas erguendo-se para o alto, e com os braços bem abertos, para a todos nos envolver, para a todos nos acolher no Abraço do Pai.
Pe. Manuel Gonçalves
(Reposição da reflexão completa, 14 de setembro de 2014)
quinta-feira, 12 de setembro de 2019
Augusto Cury - Tu és insubstituível
Algumas expressões do livro de AUGUSTO CURY (2018). Você é insubstituível. Lisboa: Editora Pergaminho:
"Sem sonhos, a vida não tem brilho. Sem metas, os sonhos não têm alicerces. Sem prioridades, os sonhos não se tornam reais. Sonhe, trace metas, estabeleça prioridades e corras riscos para realizar os seus sonhos. É melhor errar por tentar do que errar por se omitir. Não se esqueça de que tu, ainda que incompleto, foste o maior aventureiro da História" (espermatozóide entre 40 milhões na luta pela vida).
"Sem o perdão, o monstro do passado eclodirá no seu presente e controlará o seu futuro. Qual é a maior vingança contra um inimigo? É perdoá-lo. A palavra-chave para o perdoar não é tentar perdoá-lo, mas compreendê-lo. Se o compreender, perdoa-lo. Se o perdoas, ele morre dentro de ti e renasce de outra forma. Caso contrário, o seu inimigo dormirá contigo".
"Quando empreenderes, não tenhas medo de cometer erros. E quando os cometeres, não tenhas medo de os reconhecer. E quando os reconheceres, não tenhas medo de chorar. E quando chorares, não tenhas medo de reavaliar a tua vida. E quando reavaliares, não te esqueças de dares sempre uma nova oportunidade a ti próprio".
VIKTOR E. FRANKL - O Homem em busca de um sentido
VIKTOR E. FRANKL (2019). O Homem em busca de um sentido. 9.ª edição. Alfragide: Editora Lua de Papel. 160 páginas.
Viktor Frankl escreveu este livro em 9 dias sucessivos, em 1945, logo depois de ter sido libertado do campo de concentração nazi. Inicialmente o livro, escrito em alemão, era para ser publicado anonimamente. O propósito era ajudar pessoas com tendência para o desespero e não a tornar o autor famoso. Os amigos incentivaram-no a assumir a autoria. Por outro lado, a segunda parte do livro é dedicado à logoterapia desenvolvida pelo autor, pelo que o relacionar das duas partes se tornam essenciais: a vivência concreta que, depois, é possível visualizar-se na teoria apresentada.
Já muitos relatos foram escritos sobre os campos de extermínio nazi, com testemunhos daqueles que sobreviveram. O autor, contudo, mais que nos relatar a vida desumana nos campos, tem como objetivo ajudar as pessoas a encontrar um sentido para as suas vidas, não universal, mas o sentido concreto para cada pessoa e pelo qual valha a pena viver e lutar.
A apresentadora Fátima Lopes, no seu livro "Fátima, o meu caminho, a minha fé", que já sugerimos como leitura, revela que esta obra faz parte das que tem na mesinha de cabeceira, para ler e reler. Seguindo a recomendação procurámos o livro e, depois de o lermos, secundamos a conselho de Fátima Lopes, pois é uma leitura que nos prende da primeira à última página, quer na parte do testemunho quer na apresentação que o famoso psiquiatra elaborou.
O autor passou por quatro campos de concentração durante a 2.ª Guerra Mundial, nunca se deixando abater pelas contrariedades e pela desumanidade com que foi tratado, ele e os companheiros. Para trás, os prisioneiros deixaram tudo, mulher, filhos e bens. Entram no campo de concentração nus, despidos das roupas e da "dignidade", à qual nunca renunciará e que sustenta que nunca se perde. Uma das expressões contundentes do autor, é que a dignidade é inerente à pessoa, não tem a ver com utilidade, pois dessa forma se justificaria a eutanásia, tal como praticada pelo nazismo.
Antes da guerra, já Viktor Frankl tinha credibilidade como psiquiatra, especializado no estudo da depressão e do suicídio. Inicialmente seguiu de perto Freud, com quem manteve correspondência, e Alfred Adler, dos quais se viria a distanciar na prática clínica. Para Sigmund Freud, a vida é sobretudo a busca de prazer e para Adler a busca de poder. Par o autor, a vida é sobretudo a busca de sentido. Três fontes de sentido: o trabalho (fazer alguma coisa significativa), o amor (cuidar de outra pessoa) e a coragem em tempos difíceis. Como refere a nota introdutória, acerca do pensamento de Frankl, "não podemos controlar o que nos acontece na vida, mas podemos sempre controlar o que iremos sentir e fazer quanto àquilo que nos acontece".
Viktor desenvolveu um programa pioneiro com os estudantes de Viena, que reduziu a zero a taxa de suicídios. A sua brilhante carreira viria a ser interrompida pelo Nacional Socialismo. Teve em mãos um visto para emigrar para os EUA, mas escolheu ficar para cuidar dos pais. Em 1942, foi deportado para um gueto e, mais tarde para Auschwitz. Com ele, também o irmão e o pai, que não sobreviveram. Também a mulher, grávida, foi para os campos de concentração. Só ele sobrevivia.
Uma das expressões que utiliza, em diversas ocasiões, até para explicar a logoterapia, a busca de sentido, é Nietzsche: "Aquele que tem uma razão para viver pode suportar quase tudo". Quem tem um motivo, uma razão para viver, mais facilmente encara as dificuldades e os contratempos, por mais violentos que sejam. O autor agarrou-se ao livro que lhe foi tirado quando entrou no gueto... Toma consciência que perdeu tudo, mas ainda assim começa logo a reescrever mentalmente o livro, para depois tomar notas (usando a estenografia) em cada pedaço de papel que vai encontrando, para que quando estiver em liberdade o livro possa ser publicado. Por outro lado, pensa na Mulher. Não sabe se está morta ou viva, mas fala com ela e interpreta positivamente alguns sinais ou coincidências, como quando um pássaro vem pousar perto dele. Cria conversas com a mulher que o serenam, motivam-no, fazem esquecer a degradação, ajudam-no a continuar.
Há outros fatores que o ajudam a sobreviver, os companheiros, os guardas que encontra, a própria sorte, pois não passa de um número que pode ser necessário para entrar nalgum camião da morte. Sobrevivendo, recusará sempre a culpa coletiva do povo alemão. Também aí a logoterapia se estende. A dignidade da pessoa mantém-se em todas as situações. A pessoa não é apenas a conjugação de dados inatos, do ambiente em que cresceu e vive e das circunstâncias. É também livre e responsável. E, por isso, diz claramente que há "porcos e santos" dos dois lados da barricada, dos prisioneiros e dos guardas. Mais tarde alguém lhe perguntou porque é que continuava a escrever em alemão, a língua de Hitler. Então o autor pergunta-lhe se tem facas na cozinha. Como a senhora respondesse que sim, então Frankl rebate: Como é que ainda consegue usar facas depois de tantos assassinos as terem usado para apunhalar e matar as suas vítimas?
Já muitos relatos foram escritos sobre os campos de extermínio nazi, com testemunhos daqueles que sobreviveram. O autor, contudo, mais que nos relatar a vida desumana nos campos, tem como objetivo ajudar as pessoas a encontrar um sentido para as suas vidas, não universal, mas o sentido concreto para cada pessoa e pelo qual valha a pena viver e lutar.
A apresentadora Fátima Lopes, no seu livro "Fátima, o meu caminho, a minha fé", que já sugerimos como leitura, revela que esta obra faz parte das que tem na mesinha de cabeceira, para ler e reler. Seguindo a recomendação procurámos o livro e, depois de o lermos, secundamos a conselho de Fátima Lopes, pois é uma leitura que nos prende da primeira à última página, quer na parte do testemunho quer na apresentação que o famoso psiquiatra elaborou.
O autor passou por quatro campos de concentração durante a 2.ª Guerra Mundial, nunca se deixando abater pelas contrariedades e pela desumanidade com que foi tratado, ele e os companheiros. Para trás, os prisioneiros deixaram tudo, mulher, filhos e bens. Entram no campo de concentração nus, despidos das roupas e da "dignidade", à qual nunca renunciará e que sustenta que nunca se perde. Uma das expressões contundentes do autor, é que a dignidade é inerente à pessoa, não tem a ver com utilidade, pois dessa forma se justificaria a eutanásia, tal como praticada pelo nazismo.
Antes da guerra, já Viktor Frankl tinha credibilidade como psiquiatra, especializado no estudo da depressão e do suicídio. Inicialmente seguiu de perto Freud, com quem manteve correspondência, e Alfred Adler, dos quais se viria a distanciar na prática clínica. Para Sigmund Freud, a vida é sobretudo a busca de prazer e para Adler a busca de poder. Par o autor, a vida é sobretudo a busca de sentido. Três fontes de sentido: o trabalho (fazer alguma coisa significativa), o amor (cuidar de outra pessoa) e a coragem em tempos difíceis. Como refere a nota introdutória, acerca do pensamento de Frankl, "não podemos controlar o que nos acontece na vida, mas podemos sempre controlar o que iremos sentir e fazer quanto àquilo que nos acontece".
Viktor desenvolveu um programa pioneiro com os estudantes de Viena, que reduziu a zero a taxa de suicídios. A sua brilhante carreira viria a ser interrompida pelo Nacional Socialismo. Teve em mãos um visto para emigrar para os EUA, mas escolheu ficar para cuidar dos pais. Em 1942, foi deportado para um gueto e, mais tarde para Auschwitz. Com ele, também o irmão e o pai, que não sobreviveram. Também a mulher, grávida, foi para os campos de concentração. Só ele sobrevivia.
Uma das expressões que utiliza, em diversas ocasiões, até para explicar a logoterapia, a busca de sentido, é Nietzsche: "Aquele que tem uma razão para viver pode suportar quase tudo". Quem tem um motivo, uma razão para viver, mais facilmente encara as dificuldades e os contratempos, por mais violentos que sejam. O autor agarrou-se ao livro que lhe foi tirado quando entrou no gueto... Toma consciência que perdeu tudo, mas ainda assim começa logo a reescrever mentalmente o livro, para depois tomar notas (usando a estenografia) em cada pedaço de papel que vai encontrando, para que quando estiver em liberdade o livro possa ser publicado. Por outro lado, pensa na Mulher. Não sabe se está morta ou viva, mas fala com ela e interpreta positivamente alguns sinais ou coincidências, como quando um pássaro vem pousar perto dele. Cria conversas com a mulher que o serenam, motivam-no, fazem esquecer a degradação, ajudam-no a continuar.
Há outros fatores que o ajudam a sobreviver, os companheiros, os guardas que encontra, a própria sorte, pois não passa de um número que pode ser necessário para entrar nalgum camião da morte. Sobrevivendo, recusará sempre a culpa coletiva do povo alemão. Também aí a logoterapia se estende. A dignidade da pessoa mantém-se em todas as situações. A pessoa não é apenas a conjugação de dados inatos, do ambiente em que cresceu e vive e das circunstâncias. É também livre e responsável. E, por isso, diz claramente que há "porcos e santos" dos dois lados da barricada, dos prisioneiros e dos guardas. Mais tarde alguém lhe perguntou porque é que continuava a escrever em alemão, a língua de Hitler. Então o autor pergunta-lhe se tem facas na cozinha. Como a senhora respondesse que sim, então Frankl rebate: Como é que ainda consegue usar facas depois de tantos assassinos as terem usado para apunhalar e matar as suas vítimas?
Ao longo de todo o livro, o autor não se prende tanto com a experiência, fá-lo sobretudo para mostrar a sua teoria - logoterapia, isto é, como a vida se resolve na busca de um sentido, olhando para o futuro sem desprezar o passado (o que temos de mais certo), não se fixando numa culpa coletiva, mas respondendo com a sua vida. Ao lado da Estátua da Liberdade deveria estar a Estátua da Responsabilidade, pois a liberdade responsabiliza-nos, torna-nos responsáveis pelo que somos e pelo que fazemos.
"Não havia nem tempo nem vontade para olhar para questões éticas ou morais. Cada pessoa era controlada por um único pensamento: manter-se viva para a família que a esperava em casa e salvar os seus amigos"."Em geral, só conseguiam ficar vivos aqueles que, após anos a saltar de campo em campo, tinham perdido todos os escrúpulos na sua luta pela sobrevivência; estavam prontos a usar todos os meios, honestos ou não, até mesmo a força brutal, o roubo e a traição dos amigos, de maneira a salvarem-se. Nós, os que voltámos a casa, com a ajuda de muitas circunstâncias felizes ou milagres - seja qual for o nome que escolhemos dar-lhe - nós sabemos: os melhores de entre nós não regressaram"."A parte mais dolorosa de uma agressão é o insulto que implica""O meu espírito mantinha-se preso à imagem da minha mulher. Ouvi-a a responder-me, via o seu sorriso, o seu olhar franco e encorajador. Real ou não, esse olhar era naquele momento mais luminoso que o Sol que começava a nascer... A verdade - o amor é o supremo e mais elevado objetivo a que o Homem pode aspirar. Vislumbrei então o significado do maior segredo que a poesia, o pensamento e as crenças dos seres humanos podem comunicar: a salvação dos homens consegue-se no amor e pelo amor. Compreendi como pode um homem a quem nada resta no mundo conhecer ainda assim a felicidade, mesmo que por breves instantes, na contemplação do ser amado... o meu espírito continuava agarrado à imagem da minha mulher... o amor vai muito além da pessoa física do ser amado... Sentia a sua presença com cada vez mais intensidade, sentido que estava comigo; tinha a sensação de poder tocá-la, de poder esticar a minha mão e pegar na dela. Esse sentimento era muito forte: ela estava ali. Então, nesse preciso momento, um pássaro voou em silêncio e veio pousar mesmo à minha frente, num monte de terra que tinha escavado da vala, e ficou a olhar fixamente para mim... Escuta, Otto [companheiro, a quem comunica o seu testamento], se não voltar para a minha mulher e se a vires outra vez, diz-lhe que falei dela todos os dias, a todas as horas. Não te esqueças. Segundo, amei-a mais do que a qualquer outra pessoa. Terceiro, o pouco tempo que estive casado com ela supera tudo, até mesmo aquilo que passámos aqui".
História da Morte em Teerão
"Um persa rico e poderoso caminhava certo dia no seu jardim na companhia de um dos seus criados. O criado gritou que tinha acabado de encontrar a Morte, que o tinha ameaçado. Implorou ao amo que lhe desse o cavalo mais rápido de maneira a poder fugir para Teerão, onde poderia chegar nessa mesma noite. O amo acedeu e o criado afastou-se a galope no cavalo. Ao regressar a casa, o amor encontrou também a Morte, e questionou-a: «Por que razão assustaste e ameaçaste o meu criado?» E a Morte disse: «Não o ameacei; limitei-me a mostrar surpresa por estar ainda aqui quando tinha planeado encontrar-me com ele esta noite em Teerão».Nietzsche: "Aquilo que não me mata torna-me mais forte".
"As experiências da vida nos campos mostram que os homens têm realmente a possibilidade de escolher. Houve muitos exemplos, com frequência de natureza heróica, que demonstraram que a apatia podia ser vencida e a irritabilidade dominada. O Homem pode preservar um vestígio de liberdade e independências espirituais, até mesmo em condições terríveis de stress físico e psíquico... Homens que iam de caserna em caserna para confortar os outros, oferecendo-lhes o último pedaço de pão. Podem ter sido poucos, mas constituem prova suficiente de que tudo pode ser tirado a um homem, menos uma coisa: a última das liberdades humanas - a possibilidade de escolhermos a nossa atitude em quaisquer circunstâncias, de escolher a nossa maneira de fazermos as coisas"."É uma característica peculiar dos seres humanos só conseguirem viver a olhar para o futuro - sub specie aeternitatis. E isto é a sua salvação nos momentos mais difíceis da existência, embora por vezes tenham de forçar-se a prosseguir"."A emoção, que constitui sofrimento, deixa de ser sofrimento logo que formamos uma ideia clara e distinta a seu respeito"."O preso que perdesse a fé no futuro - o seu futuro - estava condenado. Ao perder a crença no futuro, perdia igualmente o controlo espiritual; deixava-se decair e ficava sujeito a um definhamento físico e mental"."O homem pode ser chamado a aceitar simplesmente o destino, a carregar a sua cruz... Quando um homem descobre que o seu destino é sofrer, terá que aceitar esses sofrimento como sua missão; a sua missão única e exclusiva. Terá que reconhecer o facto de que, até mesmo no sofrimento, é único e está só no universo. Ninguém pode libertá-lo do seu sofrimento ou de sofrer no seu lugar. A sua oportunidade única reside na forma como carrega o seu fardo"."Ter sido é também uma forma de ser, e talvez das mais seguras... Há alguém a olhar por cada um de nós nos momentos difíceis - um amigo, uma esposa, alguém vivo ou morto, ou um Deus - e essa pessoa não gostaria que a desiludíssemos. Esperaria ver-nos a sofrer com orgulho - e não abatidos - sabendo como morrer"."Há duas raças de homens neste mundo e só estas duas - a «raça» dos homens decentes e a «raça» dos homens indecentes. Podemos encontrar uma e outra por todo o lado; elas permeiam todos os grupos sociais. Nenhum desses grupos consiste inteiramente de pessoas decentes ou indecentes. Neste sentido, nenhum grupo é uma «raça pura» - e podíamos, portanto, encontrar ocasionalmente uma pessoa decente entre os guardas do campo"."A experiência suprema entre todas, para o homem que regressa a casa, é o sentimento maravilhoso de que, depois de tudo quanto sofreu, não há mais nada a temer - exceto o seu Deus"."O amor é a única maneira de compreender outro ser humano no fulcro mais íntimo da sua personalidade. Ninguém pode ter um conhecimento profundo e completo da essência do outro ser humano a menos que o ame. Por meio do seu amor, fica capacitado para ver os traços e as características essenciais da pessoa amada; mais ainda, vê aquilo que há em potência nela, ainda que não efetivado mas que deveria sê-lo. Para além disso, por meio do amor, a pessoa que ama permite àquela que é amada a efetivação desses potencialidades. Ao torná-la consciente daquilo que pode ser e daquilo em que deveria transformar-se, torna essas potencialidades reais... O amor é um fenómeno tão primário como o sexo. Normalmente, o sexo é um modo de expressão do amor. O sexo é justificado, é até santificado, logo que se tornar um veículo do amor, mas só na medida em que o seja. O amor não é, assim, compreendido como um mero efeito secundário do sexo; é, antes, o sexo que constitui uma forma de exprimir a experiência dessa derradeira forma de comunhão que se chama amor"."A liberdade não é a última palavra. A Liberdade é só uma parte da história e metade da verdade. A liberdade não é senão o aspeto negativo do fenómeno no seu todo, cujo aspeto positivo é a responsabilidade., De facto, a liberdade está em risco de degenerar em mera arbitrariedade, a menos que seja vivia num âmbito de responsabilização. Por este motivo recomendo que a Estátua da Liberdade na costa leste seja completada com uma Estátua da Responsabilidade na costa oeste"."O Homem é esse ser que inventou as câmaras de gás de Auschwitz; no entanto, é igualmente o ser que entrou nas câmaras de gás de cabeça erguida, com o Pai Nosso ou o Shema Yisrael nos lábios"."Sigmund Freud declarou uma vez, «deixemos alguém tentar expor à fome um certo número dos mais diversificados tipos de pessoas. À medida que aumentar a necessidade imperativa da fome, todas as diferenças individuais tenderão a esbater-se e a dar lugar à expressão uniforme do único instinto por saciar». Graças a Deus, Freud foi poupado ao conhecimento dos campos de concentração por dentro. Os seus pacientes deitam-se num divã luxuoso de estilo vitoriano e não na imundice de Auschwitz. Aí, as «diferenças individuais» não se »apagaram», pelo contrário, as pessoas tornaram-se mais diferentes; as pessoas desmascaram-se, tanto os porcos como os santos. E hoje em dia já não precisamos de hesitar em usar a palavra «santos»: basta pensar no padre Maximiliano Kolbe, forçado a passar fome e por fim assassinado com uma injeção de ácido carbólico em Auschwitz e que em 1983 foi canonizado".