A terceira Carta Encíclica de Bento XVI empresta o título a este blogue. A Caridade na Verdade. Agora permanecem a fé, a esperança e a caridade, mas só esta entra na eternidade com Deus. Espaço pastoral de Tabuaço, Távora, Pinheiros e Carrazedo, de portas abertas para a Igreja e para o mundo...
sexta-feira, 31 de dezembro de 2021
quarta-feira, 29 de dezembro de 2021
quarta-feira, 22 de dezembro de 2021
quarta-feira, 15 de dezembro de 2021
Domingo IV do Advento - C - 19 de dezembro de 2021
1 – O Evangelho de São Lucas abre praticamente com visitação do Anjo Gabriel a Zacarias e a Maria, uma virgem desposada com um homem chamado José. Cada uma das visitações traz um anúncio. Zacarias e Isabel vão ser pais, apesar da idade avançada. Para eles, a idade de serem pais já tinha passado, já se tinham conformado com essa “maldição”. Apesar disso, são tementes a Deus, justos e cumpridores da Lei, procedendo irrepreensivelmente segundo os mandamentos e preceitos do Senhor. A Deus nada é impossível. Deus opera para além dos nossos limites racionais e torna viável o que é inalcançável, favorecendo-nos com a Sua benevolência. É inacreditável. Zacarias fica sem palavras. Não há palavras que possam expressar o inaudito que nos chega de Deus. Estamos longe de nos apercebermos de quanto bem Deus faz por nós ou coloca ao nosso alcance!
2 – A visitação do Anjo a Maria tem um propósito que alterará para sempre a história da humanidade. Mesmo para os que não acreditam, contestam ou se manifestam indiferentes, Aquele que está para vir ao mundo deixará marcas na pequena cidade de Nazaré, em Belém, em Jerusalém e no mundo inteiro. Nada, nunca será como antes. “Salve, cheia de graça, o Senhor está contigo… conceberás e darás à luz um filho, e chamá-lo-ás Jesus. Ele será grande e será chamado Filho de Deus Altíssimo”. Sim, como é possível! Deus a nascer de uma jovem, humilde, campónia, como será isso? Diante de tão grande assombro, Maria confia no anúncio que lhe é feito e predispõe-se a ser parte do mistério salvífico: “Eis a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra”. Deus chama, desafia, espera por nós, confiando no nosso discernimento! Maria responde e confia na fé que A liga a Deus. O seu “sim” assenta na intimidade com o Senhor. Ela alimenta-se de oração, é cheia de graça!
3 – A palavra de Deus desinstala-nos, inquieta-nos, põe-nos em movimento. Mau será quando a Palavra de Deus já não nos inquietar, quando nos deixar ficar como antes e/ou sentadinhos à espera que a vida aconteça. A palavra de Deus é viva e eficaz! Mas a sua eficácia também depende do nosso sim, da nossa vontade em Lhe respondermos. Esta resposta tem duas direções: Deus e próximo.
A Virgem Maria mostra-nos como se faz!
Depois de tão grandes novas, Ela podia fazer-se grande, orgulhar-se de ter sido a escolhida, mas continua ser serva, disposta, em tudo, a ser prestável. Não reserva tempo para refletir, para festejar, para medir as consequências, as dificuldades que possam vir pela frente. Não pensa no futuro. Sabe que pode confiar. Confia absolutamente em Deus. Maria levantou-se, diz-nos o Evangelho, e foi apressadamente para a montanha, em direção a uma cidade de Judá (Ein-Karim, seis quilómetros a oeste de Jerusalém), e entrou em casa de Zacarias e saudou Isabel.
Maria levanta-se e parte apressadamente, como mulher da caridade, vai ajudar Isabel nos últimos tempos de gravidez, e como mulher missionária, transportando a Alegria que contagia aqueles que encontra. Isabel fica cheia do Espírito Santo: “Eis que quando a voz da tua saudação chegou aos meus ouvidos, a criança soltou de júbilo no meu ventre”.
Como Maria, levantemo-nos e vamos apressadamente anunciar o Evangelho, com a voz e com a vida.
4 – O que nos faz correr é a fé revelada, vivida e comunicada em Jesus Cristo, que vem da eternidade para entranhar no mundo o amor do Pai e nos fazer participantes da vida divina. Deus sempre está perto de quantos o invocam de coração sincero. Não está apenas nos bons momentos como uma ideia vaga de Alguém que cuida de nós e nos protege, mas está em todo o tempo, também ou sobretudo nos momentos de aflição, cuidando de nós. É, com efeito, nesses momentos que a nossa oração terá que ser mais intensa, mais amadurecida, mais confiante e mais despojada.
A vinda do Messias, o Emanuel, Deus connosco, insere-se nas promessas de Deus e na certeza que Ele não abandona a obra das Suas mãos, do Seu amor. «De ti, diz o Senhor, Belém-Efratá, pequena entre as cidades de Judá, de ti sairá aquele que há de reinar sobre Israel... Deus os abandonará até à altura em que der à luz aquela que há de ser mãe. Então voltará para os filhos de Israel o resto dos seus irmãos. Ele se levantará para apascentar o seu rebanho pelo poder do Senhor, pelo nome glorioso do Senhor, seu Deus. Viver-se-á em segurança, porque ele será exaltado até aos confins da terra. Ele será a paz».
Entenda-se, Deus não Se afasta, o povo é que O coloca à margem, procurando, como Adão e Eva, e Caim, viver como se Ele não existisse ou como se fosse um adversário da nossa afirmação e da nossa felicidade. Temos que caminhar, rezar, para fazermos, novamente, a experiência da Sua presença entre nós.
5 – Não havendo muitos dados sobre Nossa Senhora, nos Evangelhos, como em todo o Novo Testamento, há os suficientes para nos dizerem que Maria é uma mulher de fé, simples, dócil, atenta aos sinais de Deus, talvez mística, a viver num ambiente pacífico, orante, numa família fiel aos preceitos da Lei de Moisés.
Só num ambiente orante é possível ser-se místico, escutar a voz de Deus, perceber a Sua presença e reconhecer a Sua vontade. Por conseguinte, neste tempo de Advento, que nos prepara para o Natal e nos faz viver, sempre, inseridos no mistério pascal, a oração há de ser o combustível que alimenta a nossa fé, clarifica a nossa esperança e fortalece o nosso cuidado pelos irmãos.
A abrir a celebração, suplicamos: "Infundi, Senhor, a vossa graça em nossas almas, para que nós, que pela anunciação do Anjo conhecemos a encarnação de Cristo, vosso Filho, pela sua paixão e morte na cruz alcancemos a glória da ressurreição". A glória da ressurreição está reservada, não apenas para a eternidade, para o momento da nossa morte, mas para o presente histórico, aqui e agora, concretizável em todo o bem que façamos em nome de Jesus Cristo.
Com o salmista, pedimos que o Senhor venha em nosso auxílio. Por outras palavras, que deixemos que o Senhor Deus aja em nossos corações, na nossa vida e no mundo, tornando-nos seus mensageiros e ativando o Seu amor em nós e na terra que habitamos. "Pastor de Israel, escutai... Despertai o vosso poder e vinde em nosso auxílio... Deus dos Exércitos, vinde de novo, olhai dos céus e vede, visitai esta vinha; protegei a cepa que a vossa mão direita plantou, o rebento que fortalecestes para Vós... Estendei a mão sobre o homem que escolhestes, sobre o filho do homem que para Vós criastes".
A nossa prece é acompanhada de um compromisso: "Nunca mais nos apartaremos de Vós, fazei-nos viver e invocaremos o vosso nome".
6 – Há oito dias, a multidão, os soldados, os publicanos perguntavam a João Batista o que deveriam fazer para mudar de vida, para efetivarem a conversão. São João Batista responde com recomendações concretas e realizáveis, como a opção pela justiça, pela verdade e pela não violência, o usar a profissão, não para explorar, mas para ajudar, vivendo honestamente.
Hoje visualizamos a postura de Nossa Senhora: levanta-se e vai apressadamente, a anunciar a Boa Nova e a assegurar-se que a sua prima Isabel tem a ajuda que precisa. Para isso, Maria deixa a comodidade da casa e da terra e parte sem calcular perigos nem dificuldades.
Na segunda leitura, Jesus é-nos apontado como modelo de filho e de "discípulo" do Pai. Jesus vem para nos redimir e para nos ensinar a viver segundo a vontade do Pai, que nos quer bem e a viver harmoniosamente, sendo auxiliares uns dos outros.
«Não quiseste sacrifícios nem oblações, mas formaste-Me um corpo. Não Te agradaram holocaustos nem imolações pelo pecado. Então Eu disse: ‘Eis-Me aqui; no livro sagrado está escrito a meu respeito: Eu venho, ó Deus, para fazer a tua vontade’».
A verdadeira transformação opera-se a partir do interior, mesmo que os sinais e situações exteriores possam despertar-nos para essa conversão interior. No mistério pascal, "fomos santificados pela oblação do corpo de Jesus Cristo, feita de uma vez para sempre". Cabe-nos colocar a render os dons e os talentos e ativar a vida nova que recebemos do Senhor.
Pe. Manuel Gonçalves
sexta-feira, 10 de dezembro de 2021
Domingo III do Advento - ano C - 12 de dezembro de 2021
1 – “Alegrai-vos sempre no Senhor. Novamente vos digo: alegrai-vos. Seja de todos conhecida a vossa bondade. O Senhor está próximo. Não vos inquieteis com coisa alguma; mas em todas as circunstâncias, apresentai os vossos pedidos diante de Deus, com orações, súplicas e ações de graças. E a paz de Deus, que está acima de toda a inteligência, guardará os vossos corações e os vossos pensamentos em Cristo Jesus”.
Belíssimo este pensamento do apóstolo São Paulo. Sobressai de imediato o desafio à alegria, que não é mero contentamento exterior, mas a paz e a confiança que brotam do coração do crente e do facto de se saber amado por Deus, salvo por Jesus Cristo. É simultaneamente um compromisso com a bondade. O apóstolo fala da segunda vinda de Jesus, mas partindo da primeira, encarnação, vida, missão, morte e ressurreição de Cristo Jesus. Estamos dentro de uma inclusão cristológica e salvífica, encontramo-nos na plenitude dos tempos.
A este propósito vale a pena recordar a reflexão do apóstolo, em diversas ocasiões, em que sublinha que a vinda de Jesus não está remetida (somente) para o fim dos tempos mas acontece agora, connosco, no tempo presente. Daí a importância da oração – que nos liga a Deus e n’Ele aos outros – e do bem que possamos fazer – expressão de uma fé autêntica –, procurando a configuração a Jesus Cristo, antecipando para a nossa vida a eternidade de Deus.
A alegria assenta na certeza que Deus atende às nossas súplicas, com prontidão em socorrer-nos em todos os momentos da nossa existência e lança-nos ao encontro daqueles que peregrinam ao nosso lado, pela história e pelo tempo fora.
2 – O terceiro domingo do Advento é precisamente conhecido como o Domingo da Alegria. Razões não faltam aos cristãos para viverem na ALEGRIA do Deus que vem e que permanece. Não estamos isentos de contratempos, de dificuldades, é algo de incontornável, faz parte da nossa fragilidade e finitude humanas. Não somos deuses, estamos a caminho e sujeitos às circunstâncias do tempo que corre, do mundo, das pessoas que nos rodeiam, da nossa identidade biológica e da nossa inserção social.
A alegria, como anteriormente ficou insinuado, vem de dentro, da nossa identidade – somos herdeiros/filhos de Deus –, da nossa pertença – irmãos em Jesus Cristo – e da salvação que Ele nos traz. Não somos prisioneiros nem do pecado nem da morte. Estamos configurados, pelo batismo, à morte e ressurreição de Jesus Cristo. Ele veio, Ele vem, Ele virá, para a todos elevar para Deus, para todos salvar, não no fim mas a partir da Cruz e para sempre.
Nesta tensão, entre a celebração festiva do Natal, que nos coloca no presépio junto a Deus que Se faz criança, e a vinda definitiva de Jesus, no dia-a-dia, e no final, quando Deus fizer regressar a Si toda a criação, saboreamos já a salvação de Deus.
A profecia de Sofonias faz um apelo semelhante ao de São Paulo: «Clama jubilosamente, filha de Sião; solta brados de alegria, Israel. Exulta, rejubila de todo o coração, filha de Jerusalém. O Senhor revogou a sentença que te condenava, afastou os teus inimigos. O Senhor, Rei de Israel, está no meio de ti e já não temerás nenhum mal. Naquele dia, dir-se-á a Jerusalém: 'Não temas, Sião, não desfaleçam as tuas mãos. O Senhor teu Deus está no meio de ti, como poderoso salvador. Por causa de ti, Ele enche-Se de júbilo, renova-te com o seu amor, exulta de alegria por tua causa, como nos dias de festa'».
O que Sofonias profetiza para o futuro, São Paulo vive-o como experiência, testemunhando a presença constante de Jesus na sua vida e na via das comunidades cristãs.
3 – Nestes ou noutros tempos, a alegria dos cristãos não significa a resignação com as situações do mal, pelo contrário, a alegria manifesta a certeza que o bem vencerá, Deus terá a última palavra. Nem a espada, nem a perseguição, nem a vida, nem a morte, prevalecerão à força do amor que nos vem de Deus. Esta certeza inunda o nosso coração de alegria, renova as nossas energias, compromete-nos com a justiça, com a paz, com a harmonia, com a construção da casa da Fé e do Evangelho, casa de todos e para todos.
Sem a fé, sem a certeza da salvação, muitos dos projetos não fariam sentido, far-nos-iam morrer na desilusão, na incerteza permanente, na resignação perante o mal. Se existe o mal e não há forma de o vencer não adianta o compromisso, o esforço, a luta. Se Ele vence o mundo, isto é, as forças do mal, então também nós podemos, com Ele, com a Sua graça, contribuir para vencer o a injustiça, o medo, o egoísmo, a intolerância e todas as manifestações malévolas.
O anúncio de João Batista traz a iminência do Messias, a alegria por O sabermos próximo, mas igualmente o envolvimento com o bem e com a verdade. As pessoas percebem que o anúncio de João leva a mudar de vida. João responde em concreto: «quem tiver duas túnicas reparta com quem não tem nenhuma; e quem tiver mantimentos faça o mesmo»; aos publicanos diz «não exijais nada além do que vos foi prescrito»; aos soldados, «não pratiqueis violência com ninguém nem denuncieis injustamente; e contentai-vos com o vosso soldo».
4 – Estamos a poucos dias do Natal, expressão da Encarnação, Deus que Se faz homem, assumindo a nossa humanidade. O Advento convoca-nos a entrar no presépio com Maria e com José, para acolhermos Jesus que está mesmo a chegar. Aí residirá a nossa alegria, a nossa esperança e que se multiplicará em caridade. A fé reveste-se de esperança, de alegria, funda-se em Deus que é Pai e nos ama com amor e coração de Mãe. Não é uma fé aérea, algo vago, efémero, mas assenta na omnipotência e misericórdia do Senhor Deus. Sendo Deus e sendo Pai responsabiliza-nos uns pelos outros, pois n’Ele somos irmãos. É essa a revelação de Jesus. A fé não nos desliga, não nos afasta, não faz de nós melhores que outros, em sentido de sobranceria, dá-nos a responsabilidade de sermos santos. É fé é para manusear, para colocar mãos à obra, a fé conduz-nos, fortalece-se e madurece na prática da caridade.
Os contemporâneos de João Batista alegram-se com o anúncio da vinda do Messias. Querem estar preparados. João anuncia-lhes a Boa Nova, mas esclarece: «Eu batizo-vos com água, mas está a chegar quem é mais forte do que eu, e eu não sou digno de desatar as correias das suas sandálias. Ele batizar-vos-á com o Espírito Santo e com o fogo. Tem na mão a pá para limpar a sua eira e recolherá o trigo no seu celeiro; a palha, porém, queimá-la-á num fogo que não se apaga».
Deixemo-nos contagiar pelas suas palavras e com Isaías rezemos: “Cantai ao Senhor, porque Ele fez maravilhas, anunciai-as em toda a terra. Entoai cânticos de alegria, habitantes de Sião, porque é grande no meio de vós o Santo de Israel”.
A oração predispõe-nos a acolher a vontade de Deus e a fazermos o que nos compete para realizar a Sua santa vontade. A alegria que transborda em nós é comunicável e partilhável. Uma pessoa triste e melancólica tende a afastar-se, a isolar-se, a dobrar-se sobre si própria. Uma pessoa alegre, confiante, convicta das suas raízes e consciente da meta para onde se dirige, contagia os outros, trasvaza nas palavras e nos gestos, torna-se generosa. Uma alegria tão grande, fundada em Deus, faz com que nem as adversidades sejam obstáculo para viver. Pelo contrário, se sabemos Deus connosco, então caminhamos seguros e saberemos que nada nos poderá separar desse amor e dessa vida.
Pe. Manuel Gonçalves