sábado, 17 de outubro de 2015

XXIX Domingo do Tempo Comum - ano B - 18.10.2015

       1 – «O Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida pela redenção de todos».
       Os domingos transparecem o CAMINHO que Jesus percorre com os discípulos e com a multidão. À volta do Mestre da Vida, há muitas aproximações mas também muitos distanciamentos. Os discípulos vão testemunhando o DIZER e o AGIR de Jesus. Entranhando-nos na missão de Jesus, também nós ficamos ora admirados, ora com dúvidas, ora estranhando as Suas opções. Para Quem é todo-poderoso e vem com o poder de Deus como pode anunciar a fragilidade, a finitude e a morte?!
       Vê-se como os discípulos precisam de tempo, muito tempo, para assimilar a mensagem. Feitos da mesma massa que nós, caminham (como nós) entre avanços e recuos, entre entusiasmos e refreamentos. No aplauso da multidão deixam-se empolgar pelo sucesso que se avizinha. Com as chamadas de atenção de Jesus, que lhes anuncia tempos difíceis, de perseguição e morte, começam a pensar que lugares poderão ocupar na sucessão ao Mestre dos Mestres.
       Quem ocupará o primeiro lugar na "ausência" de Jesus? A resposta começa a ser uma provocação, um desafio e um compromisso para quem quiser seguir Jesus. Quem de entre vós quiser ser o primeiro seja o servo de todos. Os discípulos ouvem a mensagem de Jesus mas logo se esquecem e voltam à carga. E Jesus volta a insistir que o maior será aquele que mais serve!
       2 – O evangelho de hoje é um exercício significativo que interpreta a nossa vida com os seus sonhos e anseios. Numa ou noutra fase da vida podemos rever-nos no pedido de Tiago e de João: «Mestre, nós queremos que nos faças o que Te vamos pedir: concede-nos que, na tua glória, nos sentemos um à tua direita e outro à tua esquerda».
       A reação dos demais apóstolos não nos permite colocar-nos fora desta cena, pois todos padecemos do mesmo ou, pelo menos, corremos tal risco. Os outros dez indignam-se contra Tiago e João, não pelo que desejam e pedem a Jesus, mas por se terem antecipado. Sabendo que está próximo um desfecho na vida de Jesus, e que trará em definitivo o reino de Deus, todos se chegam à frente, procurando apresentar os respetivos trunfos. Tiago e João interpretam, antecipando-se, o desejo dos outros.
       O reino de Deus no meio de nós inicia-se com a Encarnação. Deus em Jesus faz-Se um de nós e um entre nós. Vem para viver, para amar servindo, para servir amando. Ele "que era de condição divina, não Se valeu da sua igualdade com Deus, mas aniquilou-Se a Si próprio. Assumindo a condição de servo, tornou-Se semelhante aos homens. Aparecendo como homem, humilhou-Se ainda mais, obedecendo até à morte e morte de cruz" (Filip 2, 6-11).
       Os discípulos estão expectantes! Para eles, o reino de Deus será um tempo novo, mas não totalmente um reino diferente. Mudarão os protagonistas. Será um reino alternativo, não nas políticas, mas nas caras. Qualquer semelhança com as democracias atuais não é mera coincidência.
       Curiosamente, Tiago e João estão dispostos a fazer sacrifícios se isso significar serem colocados no melhor lugar. «Podeis beber o cálice que Eu vou beber e receber o batismo com que Eu vou ser batizado?». À pergunta de Jesus, a resposta pronta dos dois irmãos: «Podemos».
       Perentoriamente Jesus lhes assenta o estômago: «Bebereis o cálice que Eu vou beber e sereis batizados com o batismo com que Eu vou ser batizado. Mas sentar-se à minha direita ou à minha esquerda não Me pertence a Mim concedê-lo; é para aqueles a quem está reservado».
       3 – O anúncio da Paixão está permanentemente no agir de Jesus, consciente que a prossecução da Sua missão – na opção pelos mais frágeis, indo ao encontro de todos mas especialmente dos excluídos, dos pobres, dos doentes, dos pecadores públicos, dos publicanos, na abertura aos estrangeiros; na crítica declarada às injustiças sociais, à incoerência de vida, entre o que se exige aos outros e o que se pratica, à frieza do legalismo que coloca a lei antes e acima da pessoa – mais tarde ou mais cedo provocará o desenlace expectável: a prisão e a morte!
       Os apóstolos vão também tomando consciência dessa possibilidade. Quando Pedro repreende Jesus por Ele dizer que vai ser entregue às autoridades e depois ser morto, compreende já o receio dos discípulos, precavendo-O para que tome cuidado e eventualmente altere a trajetória.
       Jesus não fica admirado com o pedido dos seus discípulos, nem com a indignação dos outros em relação a Tiago e João. Sabe de que carne são feitos, sabe o que valemos. Jesus não chama os apóstolos por serem as pessoas mais perfeitas. Como sustenta Augusto Cury, o único que talvez fosse contratado pelo departamento de pessoal de qualquer empresa moderna seria Judas Iscariotes – pela cultura e pela formação académica e pela capacidade de gestão – e no entanto veio a traí-l'O, não acolhendo o perdão de Jesus, como os demais, que se arrependeram de terem voltado as costas a Jesus. Os discípulos são pessoas normalíssimas, com qualidades e defeitos, inconstantes, ingénuos, interesseiros, espontâneos, bondosos, simples, disponíveis, impulsivos ou gananciosos. Há para todos os gostos. E por isso tão parecidos connosco! Podemos rever-nos num ou noutro!
       Não importa (tanto) o ponto de partida, a situação em que nos encontramos, a condição que vivemos no momento atual, a distância da estrada... Importa (sobretudo e acima de tudo) a nossa predisposição para escutar a voz de Deus, o caminho que nos dispomos a percorrer, a disponibilidade para nos deixarmos converter pela graça de Deus e de caminharmos juntamente com o Mestre dos Mestres, Jesus Cristo. Podemos ser os maiores pecadores. Ainda assim, Deus chama-nos, espera por nós, quer a nossa conversão, a nossa felicidade, a nossa salvação.
       Aí está a voz sapiente de Jesus para eles e para nós, com insistência: «Sabeis que os que são considerados como chefes das nações exercem domínio sobre elas e os grandes fazem sentir sobre elas o seu poder. Não deve ser assim entre vós: quem entre vós quiser tornar-se grande, será vosso servo, e quem quiser entre vós ser o primeiro, será escravo de todos». É o que Ele faz. Assim nós se quisermos ser Seus discípulos. Cabe-nos imitá-l'O.

       4 – Isaías, um dos profetas que mais claramente anuncia e visualiza a vinda do Messias, o Emanuel (cf. Is 7), o Deus connosco, também o caracteriza como o Servo Sofredor. Depois da morte e ressurreição de Jesus, os discípulos facilmente reveem Jesus nas palavras do (segundo) Isaías: «Aprouve ao Senhor esmagar o seu servo pelo sofrimento. Mas, se oferecer a sua vida como sacrifício de expiação, terá uma descendência duradoira, viverá longos dias, e a obra do Senhor prosperará em suas mãos. Terminados os sofrimentos, verá a luz e ficará saciado na sua sabedoria. O justo, meu servo, justificará a muitos e tomará sobre si as suas iniquidades».
       A intuição de Isaías transparece na vida, na missão e na entrega de Jesus, como o Eleito de Deus, o Messias que vem salvar-nos. Ele não Se revolta nem responde à violência com maior violência, mas oferece-Se por inteiro para inteiramente salvar o ser humano. Dá a Sua vida para que tenhamos vida em abundância (cf. Jo 10,10), como o Bom Pastor dá a vida pelas Suas ovelhas, qual Sumo-Sacerdote que nos oferece a Deus oferecendo-Se: «Ele mesmo foi provado em tudo, à nossa semelhança, exceto no pecado. Vamos, portanto, cheios de confiança ao trono da graça, a fim de alcançarmos misericórdia e obtermos a graça de um auxílio oportuno».
       A Carta aos Hebreus, que escutamos como segunda leitura, convida-nos a permanecer firmes na fé, pois o Sumo-Sacerdote, Jesus Cristo, penetrou nos Céus e intercede continuamente por nós; d’Ele nos vem a graça e a salvação; é Ele que nos alcança de Deus a misericórdia.

Pe. Manuel Gonçalves



Textos para a Eucaristia (B): Is 53, 10-11; Sl 32 (33); Hebr 4, 14-16; Mc 10, 35-45.

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