A terceira Carta Encíclica de Bento XVI empresta o título a este blogue. A Caridade na Verdade. Agora permanecem a fé, a esperança e a caridade, mas só esta entra na eternidade com Deus. Espaço pastoral de Tabuaço, Távora, Pinheiros e Carrazedo, de portas abertas para a Igreja e para o mundo...
sábado, 30 de setembro de 2017
São Jerónimo, presbítero e doutor da Igreja
Sofrónio Aurélio Jerónimo nasceu em Estridon (Dalmácia), em 340. Em 354 foi para Roma a fim de estudar.
Um dos seus ideais foi formar uma grande biblioteca. Por outro lado, desde o início em Roma, procurar visitar os túmulos dos mártires cristãos. No final da estadia em Roma, à volta dos 20 anos, recebeu o baptismo e encaminhou-se para Tréveros para fazer estudos teológicos.
Em 373 ou 374 foi em Peregrinação à Terra Santa, mas a doença reteve-o muito tempo em Antioquia. Dedicou-se a aprender/estudar grego.
Entretanto retirou-se para o deserto de Cálcida para se fazer eremita, aprendendo o hebraico.
Em 379 foi ordenado sacerdote. De Antioquia foi para Constantinopla. Em 382 foi chamado pelo papa, São Dâmaso, vindo a tornar-se seu secretário.Reviu o texto latino da Bíblia, deixando-nos a tradução conhecida como Vulgata.
Em 385, abandona Roma e de novo intenta a Peregrinação a Jerusalém, estabelecendo-se em Belém, no ano seguinte, onde esteve até à morte, em 30 de Setembro de 420, durante 34 anos.
Procurou responder a todas as polémicas. Tinha um temperamento vigoroso e duro. Foi um dos mais notáveis tradutores e comentadores bíblicos.
Oração de colecta:
Senhor nosso Deus, que destes ao presbítero São Jerónimo o dom de saborear a Sagrada Escritura e de a viver intensamente, fazei que o vosso povo se alimente cada vez mais com a vossa palavra e encontre nela a fonte da verdadeira vida. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
Comentário de São Jerónimo, presbítero, sobre o Livro do Profeta IsaíasIgnorar as Escrituras é ignorar a Cristo
Cumpro o meu dever, obedecendo aos preceitos de Cristo, que diz: Examinai as Escrituras, e: Procurai e encontrareis, para que não tenha de ouvir o que foi dito aos judeus: Estais enganados, porque não conheceis as Escrituras nem o poder de Deus. Se, de facto, como diz o apóstolo Paulo, Cristo é o poder de Deus e a sabedoria de Deus, aquele que não conhece as Escrituras não conhece o poder de Deus nem a sua sabedoria. Ignorar as Escrituras é ignorar a Cristo.
Por isso quero imitar o pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e antigas, e também a esposa que diz no Cântico dos Cânticos: Guardei para ti, meu amado, frutos novos e antigos. Assim comentarei o livro de Isaías, apresentando o não apenas como profeta, mas também como evangelista e apóstolo. Ele próprio diz, referindo-se a si e aos outros evangelistas: Como são belos, sobre os montes, os pés dos que anunciam boas novas, dos que anunciam a paz. E Deus fala lhe como a um apóstolo: A quem hei de enviar? Quem irá ter com este povo? E ele respondeu: Eis me aqui, enviai-me.
Ninguém julgue que eu desejo explicar de modo completo, em tão poucas palavras, o conteúdo deste livro da Escritura, que abrange todos os mistérios do Senhor. Efectivamente, no livro de Isaías o Senhor é preanunciado como o Emanuel que nasceu da Virgem, como autor de prodígios e milagres, como morto, sepultado e ressuscitado de entre os mortos e como Salvador de todos os povos. Que dizer da sua doutrina sobre física, ética e lógica? Este livro é como um compêndio de todas as Escrituras e contém em si tudo o que a língua humana pode exprimir e a inteligência dos mortais pode compreender. Da profundidade dos seus mistérios dá testemunho o próprio autor quando escreve: Para vós toda a visão será como as palavras de um livro selado. Se se dá a quem sabe ler, dizendo: «Lê-o por favor», ele responde: «Não posso, porque está selado». E se se dá a quem não sabe ler, dizendo: «Lê-o por favor», ele responde: «Não sei ler».
E se parece débil a alguém esta reflexão, oiça o que diz o Apóstolo: As aspirações dos profetas sejam submetidas aos profetas, de modo que tenham possibilidade de falar ou de se calar. Portanto, os Profetas compreendiam o que diziam e por isso todas as suas palavras estão cheias de sabedoria e de sentido. Aos seus ouvidos não chegavam apenas as vibrações da voz; Deus falava ao seu espírito, como diz outro profeta: O Anjo falava em mim; e também: Clama nos nossos corações: Abba, Pai; e ainda: Escutarei o que diz o Senhor.
quinta-feira, 28 de setembro de 2017
... E procurava ver Jesus
O tetrarca Herodes ouviu dizer tudo o que Jesus fazia e andava
perplexo, porque alguns diziam: «É João Baptista que ressuscitou dos
mortos». Outros diziam: «E Elias que reapareceu». E outros diziam ainda:
«É um dos antigos profetas que ressuscitou». Mas Herodes disse: «A João
mandei-o eu decapitar. Mas quem é este homem, de quem oiço dizer tais
coisas?». E procurava ver Jesus (Lc 9, 7-9).
Em muitas situações da vida é necessário que vejamos, que façamos a experiência, que nos encontremos, que vivamos, e não apenas o conhecimento que nos chega através dos outros. Ao nível da fé a comunicação e o anúncio da palavra de Deus são essenciais. Mas não suficientes. É necessário fazer a experiência de encontro com Jesus crucificado e ressuscitado, sob pena da fé se tornar acessória, vazia, sem relevância para a vida.
Em muitas situações da vida é necessário que vejamos, que façamos a experiência, que nos encontremos, que vivamos, e não apenas o conhecimento que nos chega através dos outros. Ao nível da fé a comunicação e o anúncio da palavra de Deus são essenciais. Mas não suficientes. É necessário fazer a experiência de encontro com Jesus crucificado e ressuscitado, sob pena da fé se tornar acessória, vazia, sem relevância para a vida.
Herodes tem curiosidade. Não sabemos se é um impulso interior do Espírito de Deus, ou se é mera curiosidade intelectual ou coscuvilheira. De qualquer forma, para nós uma lição ou um desafio: ver Jesus, encontrarmo-nos com Ele, fazermos a experiência d'Ele na nossa vida. E assim a fé será encorpada e dará sentido às outras dimensões da nossa vida.
sábado, 23 de setembro de 2017
São Pio de Pietrelcina, presbítero
Seguidor de
São Francisco de Assis, o padre Pio nasceu no dia 25 de Maio de 1887, em
Pietrelcina, Benevento, Itália. Foi baptizado no dia seguinte com o
nome de Francisco. Celebrou os Sacramentos da Eucaristia (1.ª Comunhão) e
do Crisma com 12 anos.
Aos 16 anos, 6 de Janeiro de 1903, entrou no noviciado da Ordem dos
Frades Menores Capuchinhos. Tomando o hábito franciscano, passou a
chamar-se Frei Pio.
Foi ordenado sacerdote no dia 10 de Agosto de 1910, em Benevento. Por
motivos de saúde, ficou na família até 1916. Em Setembro deste ano, foi
enviado para o Convento de São Giovanni Rotondo.
Procurou viver ao máximo a sua identificação com Deus, na direcção
espiritual, na confissão de penitentes, na celebração da Eucaristia,
onde ficava como enlevado para Deus.
Em 5 de Maio de 1956, foi inaugurada a "Casa Alívio do Sofrimento",
para atender os sofrimentos e a miséria das famílias carenciadas.
A sua vida era oração constante: "Nos livros procuramos Deus; na oração encontramo-l'O. A oração é a chave que abre o coração de Deus".
Tal era a sua empatia com Deus e com o semelhante que o procuravam-no
na Igreja, no confessionário, na sacristia, no convento. A todos
acolhia.
Tal como São Francisco de Assis, apareceram-lhe a chagas de Cristo, sentindo as suas dores.
No seu serviço sacerdotal esteve sujeito a numerosas investigações por
parte da Igreja. Foi vítima de acusações, de calúnias, permaneceu
calado, confiando em Deus.
Muito solicitado, mantinha-se humilde: "Quero ser apenas um pobre frade que reza".
Faleceu no dia 23 de Setembro de 1968. Tinha 81 anos de idade.
Foi beatificado no dia 2 de Maio de 1999, por João Paulo II, e
canonizado no dia 16 de Junho de 2002, também por João Paulo II.
Oração de Colecta:
Deus
todo-poderoso e eterno, que destes a São Pio, sacerdote, a graça de
participar de modo admirável na cruz do vosso Filho, e por meio do seu
ministério renovastes as maravilhas da vossa misericórdia, concedei-nos,
por sua intercessão, que, unidos constantemente á paixão de Cristo,
tenhamos a alegria de alcançar a glória da ressurreição. Por nosso
Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do
Espírito Santo.
sexta-feira, 22 de setembro de 2017
Jesus, por cidades e aldeias
Jesus ia caminhando por cidades e aldeias, a pregar e a anunciar a boa nova do reino de Deus. Acompanhavam-n’O os Doze, bem como algumas mulheres que tinham sido curadas de espíritos malignos e de enfermidades. Eram Maria, chamada Madalena, de quem tinham saído sete demónios, Joana, mulher de Cusa, administrador de Herodes, Susana e muitas outras, que serviam Jesus e os discípulos com os seus bens (Lc 8, 1-3).
No Evangelho que nos é proposto para hoje, a missão de Jesus, que passa de aldeia a aldeia, de cidade a cidade, anunciando a Boa nova do Reino de Deus. São Lucas paresenta-O em movimento, cuja missão essencial é a pregação, o ensino, que reflete a sua intimidade com Deus misericordioso.
Mas não segue sozinho. Jesus conta connosco. Conta com os Doze, conta com um grupo de mulheres. Veja-se a abertura de Jesus, tendo em conta a descriminação a que as mulheres estavam sujeitas... Elas acompanham-n'O, fazendo o que pode para Lhe facilitar a vida e a missão. Como é que nós poderemos ser "facilitadores" da Evangelização?
Mas não segue sozinho. Jesus conta connosco. Conta com os Doze, conta com um grupo de mulheres. Veja-se a abertura de Jesus, tendo em conta a descriminação a que as mulheres estavam sujeitas... Elas acompanham-n'O, fazendo o que pode para Lhe facilitar a vida e a missão. Como é que nós poderemos ser "facilitadores" da Evangelização?
quarta-feira, 20 de setembro de 2017
São Cipriano A Nova em Santa Eufémia | Pinheiros 2017
Banda de Música de São Cipriano "A Nova" na festa e romaria de Santa Eufémia de Pinheiros. No vídeo, alguns momentos na despedida, no dia 17 de setembro de 2017:
Peregrinação ao Recinto de Nª Sª da Conceição | 2017
A primeira edição desta Peregrinação realizou-se a 7 de setembro de 2014, ainda que o clima não tivesse permitido a celebração da Eucaristia no recinto, o que veio a suceder em 6 de setembro de 2015, a 4 de setembro de 2016 e, este ano, a 3 de setembro de 2017.
Durante o trajeto processional, a recitação do Rosário, com cânticos alusivos a Nossa Senhora. Para as pessoas com mais dificuldade de mobilidade, a disponibilidade de transporte camarário. O andor de Nossa Senhora da Conceição foi transportado pelos Bombeiros, da Igreja ao Quartel, onde, como no Seu dia, se prestou homenagem, através do toque da sirene, prosseguindo num carrinha de caixa aberta, preparado para o efeito. No regresso, a mesma opção, em carrinha até ao Quartel, em ombros do Quartel até à Igreja Matriz.
Pelo meio, fica o agradecimento à generosidade de todos os que estiveram envolvidos na celebração, no arranjo do andor e do recinto, na preparação do necessário à Missa em ambiente campal, som, guarda-sóis, alfaias litúrgica, animação coral durante a Procissão e na celebração da Santa Missa e, contando também, com o habitual envolvimento da Guarda Nacional Republicana no ordenamento do trânsito.
Com o regresso à Igreja Matriz, a oração do Angelus, com que terminou a celebração.
FOTOS - Paróquia de Tabuaço - Sara Santos
MÚSICA de fundo: Mendigo de Deus - Maria, a tua vida me seduz.
sábado, 16 de setembro de 2017
Domingo XXIV do Tempo Comum - ano A - 17.09.2017
1 – Aí está a pergunta de Pedro: «Se meu irmão me ofender, quantas vezes deverei perdoar-lhe? Até sete vezes?».
No evangelho do domingo passado verificámos como a comunidade procurou perceber, acolher e traduzir os ensinamentos de Jesus. Com criatividade e realismo, no contexto concreto e real, ajustando o ideal ao possível. Hoje vemos como a pergunta de Pedro aponta para algo grandioso, sabendo que perdoar nunca é fácil, menos ainda quando são os nossos amigos a ofender-nos ou quando colocam em causa a nossa honorabilidade. A comunidade percebeu que para ser fiel a Jesus tinha que dar segundas e terceiras oportunidades. A pergunta de Pedro, mesmo sem o simbolismo subjacente, vai mais longe. Perdoar até 7 vezes? Impossível. Uma vez, duas vezes! À terceira começa a ser demais, pois há que manter a dignidade! Três vezes ou mais já é perder a face e deixar abusar. 7 vezes? Só se fosse a 7 pessoas diferentes e em diferentes ocasiões! Mas o SETE, na linguagem semita, vale por plenitude, perfeição, ou seja, sempre.
Ora a resposta de Jesus é ainda mais taxativa: «Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete».
Façamos as contas que, em termos matemáticos, são fáceis de fazer: 70X7=490 vezes. Muitos "perdões"! Mas novamente a linguagem semita e o seu significado: 70X7 = SEMPRE! Pedro já apontava para um perdão sem limites, mostrando a Jesus que tinha aprendido bem a lição e que já era capaz de ver além do seu umbigo. Porém, Jesus aponta para o infinito, para que não haja ajustes ou negociações ou interpretações personalizadas à medida de quem lê ou de quem escuta. SEMPRE. É a medida do amor, é a medida de Jesus, a medida de Deus. Sem ajustes nem reservas!
2 – A fé não é um discurso (meramente) intelectual, uma elaboração racional. É vida concreta. Jesus enxerta-Se na história, assumindo a nossa carne humana e a nossa linguagem. Fala-nos sobretudo com a Sua vida. Obviamente que a fé precisa de ser inteligível, mistério que acolhemos e sobre o qual precisamos de refletir, perceber e de assimilar. Ainda que, como mistério, nos escape e ultrapasse qualquer aprisionamento racional.
A comunicação de Jesus procura "democratizar" o acesso ao reino de Deus, mas também a perceção sobre o mesmo. O reino de Deus é para todos, não para um grupo privilegiado, uma elite. Esse é também o combate de Jesus com alguns líderes religiosos, que nem entram nem deixam entrar, complicando, sendo os intérpretes exclusivos da Lei e da vontade de Deus. Jesus eleva a fasquia. Os filhos apresentam-se diante de um Pai, não de um Juiz prepotente e surdo! Os juízos do Pai são preenchidos de ternura e misericórdia, de compaixão e de caridade.
Mestre da Sensibilidade, Jesus fala da vida e de modo a que todos possamos perceber. Não se enrola num emaranhado de argumentos. Ao responder a Pedro, como em tantas outras ocasiões, Jesus conta uma estória. O reino de Deus pode comparar-se a um rei que quer ajustar contas com os seus servos. À sua presença é levado um homem que lhe deve 10 mil talentos. Uma fortuna. Não tendo com que pagar, será vendido com a mulher, os filhos e as suas posses. Perante a iminência da desgraça, este homem suplica ao rei compreensão e tempo para saldar a dívida. O rei despe a capa do poder e enche-se de compaixão! Perdoa-lhe toda a dívida.
Pelo caminho, o homem a quem foi perdoada a dívida encontra um companheiro que lhe deve uma ninharia: cem denários! A alegria e a gratidão deveriam agora ser o seu alimento e o seu vestuário. Mas prevalece a ganância e, tendo em conta o muito que lhe foi perdoado, não é capaz de fazer o mesmo com o seu companheiro, mandando-o prender. Este é também um drama do nosso tempo: muitas vezes a quem deve são-lhe também retiradas as possibilidades de pagar! A parábola termina com os companheiros a irem à presença do seu senhor, contando-lhe o sucedido, revoltados com a desmedida com que aquele servo tinha sido beneficiado e a exigência para com o companheiro sobre uma pequena dívida.
3 – Nós também cabemos dentro da parábola. Eu e tu. Enquanto Jesus fala não podemos assobiar para o lado como se não fosse nada connosco. Ele fala para os discípulos, isto é, fala para nós. Para todos. Para cada um. Sem exceção.
Na parábola, a reação do rei é elucidativa: «Servo mau, perdoei-te tudo o que me devias, porque mo pediste. Não devias, também tu, compadecer-te do teu companheiro, como eu tive compaixão de ti?» Então o senhor entregou-o aos verdugos até que a dívida seja saldada.
Depois da parábola vem a conclusão! O próprio Jesus avisa e desafia: «Assim procederá convosco meu Pai celeste, se cada um de vós não perdoar a seu irmão de todo o coração». O perdão de Deus para connosco é absoluto, sem reservas nem condições! Acolhendo-O na nossa vida, o caminho a percorrer terá de ser conforme ao Seu proceder: perdoar sempre.
4 – Perdoar faz-nos bem à saúde. Liberta-nos para viver. Quem não perdoa amargura-se mais e mais. Cisma e deixa de pensar a alegria de viver, de confiar, de apreciar o que os outros têm de bom, perde a capacidade de se esgotar positivamente a favor de alguém, a favor dos outros. A amargura é doentia. Claro que temos o direito de ficar magoados com o mal que nos fazem, mas perdemo-nos se não formos capazes de fazer o luto sobre a ofensa. Não se trata de esquecer, mas de querer, de querer viver, de querer compreender, de querer amar, apesar de tudo.
Ben Sirá alerta para o erro daquele que guarda rancor. Deus pedirá contas a quem se vinga do seu irmão. «Perdoa a ofensa do teu próximo e... as tuas ofensas serão perdoadas». Interroga-se o sábio: «Um homem guarda rancor contra outro e pede a Deus que o cure? Não tem compaixão do seu semelhante e pede perdão para os seus próprios pecados?», desafiando-nos: «lembra-te do teu fim e deixa de ter ódio; pensa na corrupção e na morte, e guarda os mandamentos».
5 – No salmo respondemos à Palavra de Deus com a própria Palavra de Deus. E hoje o salmo faz-nos ver a grandeza do perdão e da misericórdia do Senhor de tal que nos sintamos reconfortados e disponíveis para transparecer a Sua ternura. Ele perdoa os nossos pecados e cura as nossas enfermidades. Não guarda ressentimento e não nos julga segundo os nossos pecados, mas segundo a Sua misericórdia. «Como o Oriente dista do Ocidente, assim Ele afasta de nós os nossos pecados».
Se o nosso coração se abrir à misericórdia de Deus, Ele não levará em conta o nosso pecado. Com efeito, Deus quer a conversão do pecador, não a sua morte. Quer-nos como filhos. Tanto nos quer, que nos dá Jesus. Em Jesus, o Seu amor vai até ao último suspiro!
6 – Na Carta aos Romanos, que temos vindo a ler, São Paulo remete-nos para a imitação do amor de Jesus Cristo. Na verdade, Cristo morreu e ressuscitou, tornando-se Senhor dos vivos e dos mortos. A soberania de Deus é visível, no tempo e na história, na pessoa de Jesus, nas Suas palavras e gestos, na Sua vida. Oferece-se, gastando a Sua vida por nós. Deus Pai ressuscita-O sancionando a Sua postura, o Seu jeito de amar e perdoar, o Seu jeito de agir e Se dar, por inteiro, a todos.
Somos discípulos, aprendamos com Ele a dar a vida, a cuidar dos outros, sobretudo dos mais frágeis. Como cristãos não vivemos para nós, «se vivemos, vivemos para o Senhor, e se morremos, morremos para o Senhor. Portanto, quer vivamos quer morramos, pertencemos ao Senhor».
É a nossa vocação e o nosso compromisso, viver para o Senhor, sintonizados com o Seu amor, com a Sua compaixão.
Pe. Manuel Gonçalves
Textos para a Eucaristia (ano A): Sir 27, 33 – 28, 9; Sl 102 (103); Rom 14, 7-8; Mt 18, 21-35.
Pinheiros: Festa e Romaria de Santa Eufémia
Santa Eufémia, virgem e mártir, recolhe a veneração de um mar de gente, um pouco por todo o mundo, em muitas terras portuguesas, sendo-lhe dedicados santuários, igrejas, capelas.
É a padroeira da paróquia de Pinheiros, concelho de Tabuaço, Diocese de Lamego. Há muito que a sua festa se converteu numa importante romaria para as paróquias do concelho, mas igualmente para outras paróquias vizinhas, de Armamar e de Moimenta da Beira.
Saliente-se, contudo, que ao longo de todo ano se deslocam a Pinheiros pessoas de diversas proveniências, cumprindo promessas, fazendo votos, agradecendo as graças concedidas por sua intercessão, oferendo a Sagrada Eucaristia em honra de Santa Eufémia.
Morreu num tempo de grande perseguição à Igreja, em 16 de Setembro de 304. Muitos foram mortos só por serem cristãos e assumirem sem medo a sua fé.
Santa Eufémia, Santa Bárbara, Santa Marinha, Santa Inês, Santa Luzia, Santa Catarina de Alexandria, São Lourenço, São Sebastião, São Cornélio e São Cipriano, que a Igreja celebra a 16 de setembro, e tantos homens e mulheres que desde que morreram foram venerados como santos e cuja devoção se preservou e acentuou ao longo dos tempos. O fervor com que nos dirigimos a Santa Eufémia, confirma-nos na certeza de que a sua vida é um exemplo a seguir e que a sua intercessão nos faz sentir mais próximos do Senhor.
A palavra mártir aponta imediatamente para o que significa, testemunha, neste caso, testemunha da fé em Jesus Cristo. Assim sendo, cada cristão há-de chegar a ser mártir, uma vez que é testemunha da fé, da intimidade e da vivência em Jesus Cristo. Mas depois há alguns testemunhos que se tornaram mais eloquentes porque tiveram que dar a vida por causa da sua fé em Jesus Cristo.
O próprio Jesus Cristo testemunhou a Verdade, a Vida, a Fé em Deus Pai, com a Sua Mensagem mas também com a sua Morte. Depois d’Ele muitos outros, muitos outros não temeram a ofensa, a perseguição, a morte, por amor ao Mestre dos Mestres, sendo cristãos pela vida e pela morte.
Eufémia nasceu à volta do ano 288, na cidade de Calcedónia.
A família era nobre e respeitável. Procurava viver e ensinar os ideais cristãos.
Com o imperador Diocleciano, as perseguições do império aos cristãos acentuam-se. Eufémia testemunha a crueldade nas acusações, nas torturas e na morte de muitos cristãos, só por terem esse nome. Não fraqueja. Os mártires incentivam-na a também se apresentar como cristã, pronta para o sacrifício, por amor a Jesus Cristo.
Prisco, o procônsul, juiz perseguidor, dá-lhe a oportunidade, como jovem, bela e nobre, de renunciar à sua fé. Eufémia mantém-se firme, sofrendo, por isso, diversos tormentos. Não vacila.
Diz o grande Santo Ambrósio: “A santa e gloriosa Eufémia conservou a virgindade e mereceu ser cingida com a coroa do martírio. Pelas suas preces o inimigo foi vencido, o adversário Prisco eliminado, a virgem tirada do fogo da fornalha, sã e salva, as pedras duras transformadas em pó, as feras amansaram-se e submeteram-se, todos os suplícios foram superados pela oração; por fim, trespassada pela espada, deixou a prisão da carne e, jubilosa, juntou-se ao coro celeste…”
A fama da sua santidade, rapidamente se espalhou. O corpo, incorruptível, foi preservado, em Calcedónia. Em 620, com a perseguição dos persas, os cristãos mudaram o seu corpo para Constantinopla, para uma Igreja mandada construir em sua honra por Constantino, imperador romano. Com imperador Nicetor, que era contra símbolos religiosos, os cristãos temeram que os restos mortais de Santa Eufémia desaparecessem. A lenda refere que numa noite de tempestade, o sarcófago desapareceu da cidade. Talvez tenha sido levado por pescadores cristãos. Em Julho de 800, deu à costa em Rovinj, onde se encontra à veneração, na atual Croácia. O Sarcófago trazia dentro um pergaminho: “… este é o corpo de Santa Eufémia de Calcedónia, virgem e mártir de Calcedónia, filha do nobre senador, nascida para o céu em 16 de Setembro de 304, Ano do Senhor” (304 AD).
É considerada a protetora da pele.
(FONTE: apresentação da Novena e resenha biográfica, edição publicada em 2009, disponível na Paróquia de Pinheiros).
São Cornélio, Papa, e São Cipriano, Bispo
São Cornélio:
Foi papa de 251 a 253, eleito 14 meses depois do Papa São Fabião ter sido morto. As perseguições à Igreja era devastadoras.
São Cipriano disse acerca de São Cornélio: “Depois de ter sido elevado à dignidade episcopal,... por vontade de Deus, ...quanta fé, quanta virtude e quanta resolução mostrou no valor com que tomou a cadeira episcopal, no tempo em que o tirano, inim igo dos bispos de Deus, sofreria de melhor vontade um competidor ao trono, do que um bispo de Roma…”
Padeceu diversos tormentos, mas confessou sempre a fé em Jesus Cristo. Cansou os juízes e os verdugos. Condenaram-no à morte, e foi morto a 14 de Setembro de 253.
É uma das figuras maiores da Igreja dos primeiros séculos. Foi bispo de Cartago de 249 a 258. Terá nascido em 210. Antes da conversão era professor. Foi baptizado cerca do ano 245 e desde então procurou levar uma vida santa. Pelo seu valor e virtude, tornou-se chefe dos cristãos de África, reunindo à sua volta cerca de 100 bispos.
A perseguição ao cristianismo levou-o à morte. Foi condenado à espada. Chegou ao local da execução, tirou o manto, prostrou-se por terra e rezou… quando chegou o carrasco, Cipriano mandou que lhe dessem 25 moedas de ouro para o animarem. Os cristão presentes estenderam lençóis e toalhas em seu redor. Colocou ele mesmo a venda nos olhos e um sacerdote, Juliano, com um subdiácono, atou-lhe as mãos, a seu pedido, porque ele o não podia fazer. Assim foi morto à espada.
Oração de colecta:
Senhor, que destes ao vosso povo, em São Cornélio e São Cipriano,
pastores dedicados e mártires invencíveis, concedei-nos, por sua
intercessão, que, fortalecidos pela fé, trabalhemos incansavelmente pela
unidade da Igreja. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é
Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
Das Cartas de São Cipriano, bispo e mártirFé generosa e firme
Cipriano a Cornélio, irmão no episcopado.
Tivemos conhecimento, irmão caríssimo, do glorioso testemunho da vossa fé e fortaleza, e a glória da vossa pública confissão de fé deu-nos tanta alegria que nos consideramos participantes e companheiros dos vossos méritos e louvores. De facto, se formamos todos uma só Igreja, se temos um só coração e uma só alma, qual é o sacerdote que não se congratula com a glória de outro sacerdote, como se fosse própria, e qual é o irmão que não se alegra com a felicidade dos seus irmãos?
Não se pode exprimir suficientemente a alegria e o contentamento que aqui se manifestaram, quando fomos informados da vossa vitória e fortaleza, quando soubemos que vós fostes um verdadeiro chefe dos irmãos na confissão da fé e que a mesma confissão de fé do chefe foi confirmada pela confissão dos irmãos. Deste modo, sendo o primeiro a caminhar para a glória, levastes muitos companheiros a participar da mesma glória; e sendo o primeiro a confessar a fé em nome de todos, persuadistes o povo à confissão da mesma fé. Não sabemos o que mais havemos de louvar em vós, se a vossa fé generosa e inquebrantável, se a inseparável caridade dos irmãos. Assim se manifestou publicamente a coragem do bispo à frente do seu povo e se afirmou claramente a fidelidade do povo em plena solidariedade com o seu bispo. Em vós toda a Igreja de Roma deu um magnífico testemunho, unida num só coração e numa só voz.
Brilhou em todo o seu esplendor, irmão caríssimo, a fé que o Apóstolo elogiava na vossa comunidade. Já então ele previa em espírito esta gloriosa coragem e fortaleza. Já então, anunciando o futuro, celebrava a glória dos vossos méritos e, exaltando os louvores dos pais, estimulava a coragem dos filhos. Com a vossa perfeita concórdia e com a vossa fortaleza, destes a todos os cristãos um magnífico exemplo de união e constância.
Irmão caríssimo, a providência do Senhor nos adverte que está iminente a hora do nosso combate. A bondade divina nos vai prevenindo, com salutares inspirações, de que se aproxima o dia da nossa prova. Por isso, em nome da caridade que nos une, ajudemo-nos uns aos outros, perseverando assiduamente com todo o povo nos jejuns, vigílias e orações. Estas são as nossas armas celestes que nos conservam firmes, fortes e perseverantes. Estes são os dardos espirituais e os baluartes divinos que nos protegem.
Lembremo-nos uns dos outros, em perfeita concórdia e unidade de espírito; oremos sempre e em toda a parte uns pelos outros; e procuremos aliviar esta hora de tribulação e angústia com a nossa mútua caridade.
sexta-feira, 15 de setembro de 2017
quinta-feira, 14 de setembro de 2017
quarta-feira, 13 de setembro de 2017
terça-feira, 12 de setembro de 2017
sábado, 9 de setembro de 2017
Domingo XXIII do Tempo Comum - ano A - 10.09.2017
1 – Deus nunca desiste de nós. Esta é a história de Deus com os homens. A história da criação e da salvação. Deus não desiste de nós. Criou-nos por amor e por amor nos sustenta na vida. Quer-nos bem, tão bem como um Pai, como um Mãe a um/a filho/a.
A Sagrada Escritura coloca em evidência a ligação íntima de Deus com a Humanidade. As alianças renovam-se. Com Adão e Eva. Com Caim. Com Noé. Com Abraão. Com Isaac e Israel (Jacob). Com Moisés e com Josué. Com David e com Salomão. Com os Juízes e com os Profetas. Deus não desiste. Insiste sem forçar. Uma e outra vez. Quebrada uma Aliança, poderia alhear-Se para sempre! Mas como poderia abandonar a obra criada pelas Suas mãos?
Chegada a plenitude dos tempos envia-nos o Seu próprio Filho para n'Ele nos mostrar o Seu amor, a Sua ternura, a Sua complacência. Em Jesus Cristo visualiza-Se Deus, a Sua misericórdia, a Sua bondade. Sem arrogância, sem vícios de poder e prepotência. Pelo serviço, pela humildade, pela compaixão. Sempre. Em todos os momentos. Resistindo a todos os ataques e a todas as armadilhas. Levando a Boa Notícia a todos os recantos, aos pobres, às mulheres, aos estrangeiros, aos publicanos e pecadores. Sem medo de contágios! Pelo contrário, tentando a todos contagiar para o Reino de Deus, que se anuncia e se testemunha pela atração, como desafia Bento XVI, por atração materna, como acrescenta o Papa Francisco.
Jesus é acusado de comer com publicanos e pecadores, de andar em má companhia, com pessoas de índole duvidosa, com gestos que revoltam as autoridades políticas e religiosas. Faz-Se pobre para nos enriquecer com a Sua pobreza, pobreza que nos coloca no coração de Deus, dilatando o nosso coração e estendo o nosso amor para todos, a começar pelos que estão à nossa beira, dentro de portas.
2 – Perdoar? Sempre. 70X7. Em todas as ocasiões. Só o pecado contra o Espírito Santo não tem perdão, ou por outras palavras, a contumácia, o orgulho, a autossuficiência, a sobranceria, o ensimesmamento, o fechar-se conscientemente a qualquer luz, a toda a verdade, a toda a ajuda.
Quando Pedro pergunta a Jesus se se deve perdoar até 7 vezes, ele julga que está a ser muito generoso. Perdoar uma vez é razoável. Perdoar duas vezes é bondade. Perdoar três vezes é a conta que Deus fez, já começa a ser abuso. Ora a resposta de Jesus vai muito além. Sete vezes já era perdoar sempre. Perdoar 70X7? É melhor não fazer as contas! Jesus também não as faz. Por alguma razão dizemos que errar é humano e perdoar é divino. Ainda que humano seja amar e errar seja, muitas vezes, desumano. Perdoar eleva-nos, projeta-nos para outro nível de compromisso, que nos obriga a superar gostos e preferências, a tolerar nos outros o que gostávamos que tolerassem em nós, a compreender as fragilidades alheias e amar além dos defeitos e insuficiências.
As comunidades cristãs dos primeiros tempos, concretamente a comunidade de onde Mateus escreve e nos dá a sua versão do Evangelho, procura ser fiel à mensagem de Jesus: perdoar sempre. Não julgueis. Não condeneis. A quem te bater numa face oferece também a outra. Reza por aqueles que te maldizem. Abençoa os que te perseguem. A quem te pedir a capa dá também a túnica. Não matarás. Não te irrites contra o teu irmão. Se o teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa a tua oferta no altar e vai reconciliar-te com ele. A Eucaristia reconcilia-nos, senta-nos à mesa com Jesus, une-nos aos outros. Mas a Eucaristia vale enquanto nos converte, nos irmana e nos faz dar passos concretos para vivermos em harmonia, como família, apesar das dificuldades, das diferenças e das fragilidades que nos caracterizam.
3 – O texto do Evangelho exprime não apenas a Mensagem de Jesus, mas o acolhimento das Suas palavras por parte da comunidade cristã, daqueles e daquelas que decidiram segui-l'O e viver como comunidade, pondo em prática os Seus ensinamentos e imitando o Seu proceder.
A comunidade procura ver, traduzir, atualizar e concretizar tudo o que vem da parte do Senhor Jesus: «Se o teu irmão te ofender, vai ter com ele e repreende-o a sós. Se te escutar, terás ganho o teu irmão. Se não te escutar, toma contigo mais uma ou duas pessoas, para que toda a questão fique resolvida pela palavra de duas ou três testemunhas. Mas se ele não lhes der ouvidos, comunica o caso à Igreja; e se também não der ouvidos à Igreja, considera-o como um pagão ou um publicano».
O Mestre da Sensibilidade dirige-se aos Seus discípulos. Melhor, aqueles que se apresentam como Seus discípulos têm de considerar (sempre) a opção pelo perdão, pelo serviço, pela reconciliação. Uma e outra vez. E outra vez ainda! Descrição. Bom senso. Equilíbrio. Respeito pela pessoa que está à frente. Já me cansei de repetir que quem enche a boca com a própria frontalidade, entendida como dizer sempre tudo o que lhe dá na real gana, independentemente de quem esteja à frente, não passa de uma criança mimada, que diz tudo, sempre oportuna e inoportunamente, uma criança a quem tiraram o brinquedo. Mas a criança é criança, é ingénua, está a aprender, a crescer. No adulto essa atitude revela infantilidade. Quem está à nossa frente não é um saco de boxe em quem descarregamos a nossa azia, o nosso azedume com a vida. Ser frontal não é isso. Ser frontal é ser verdadeiro, mas respeitar o outro como pessoa, como rosto e presença de Deus. E a azia com que tratamos os outros, não é azia com que tratemos Jesus.
Correção fraterna. Se tens que corrigir, corrige a sós, discretamente. Se não houver avanços, pede ajuda a uma ou duas pessoas. Não, não desistas, nem à primeira nem à segunda. Recorre à Igreja, será mais uma ajuda. Falamos habitualmente em segunda oportunidade. A comunidade cristã daqueles dias percebe que terá que dar segundas e terceiras oportunidades e não desistir às primeiras dificuldades e contratempos.
4 – Com efeito, somos responsáveis uns pelos outros. Sempre. Se nos calarmos por preguiça ou por conveniência; ou se as nossas palavras afastarem, maldizendo e excluindo, contribuímos para a perda dos nossos irmãos.
Temos o poder para unir, para ligar a própria terra ao Céu. «Tudo o que ligardes na terra será ligado no Céu; e tudo o que desligardes na terra será desligado no Céu». A comunidade continua a escutar a mensagem de Jesus: «Se dois de vós se unirem na terra para pedirem qualquer coisa, ser-lhes-á concedida por meu Pai que está nos Céus. Na verdade, onde estão dois ou três reunidos em meu nome, Eu estou no meio deles». Se num primeiro momento se vislumbra a necessidade da comunidade, formada por pessoas, ter regras, para persistir e sobreviver como comunidade, logo depois sobrevém o ensinamento de Jesus: se nos unirmos para nos ajudarmos mutuamente também Deus nos ajudará, Ele está no Meio, congregando-nos. Poderíamos começar por aqui: colocar Jesus no centro, no meio, e reunirmo-nos à Sua volta.
O Profeta Ezequiel, na primeira leitura, mostra a responsabilidade para todos, especialmente para com o pecador. Não nos cabe dizer mal, mas alertar, cuidar, prevenir. Se não o fizermos, sabendo que está no mau caminho, Deus responsabiliza-nos por tal. «Sempre que Eu disser ao ímpio: ‘Ímpio, hás de morrer’, e tu não falares ao ímpio para o afastar do seu caminho, o ímpio morrerá por causa da sua iniquidade, mas Eu pedir-te-ei contas da sua morte».
5 – O Salmo e a segunda leitura afinam pelo mesmo diapasão. Com o salmo respondemos à palavra de Deus com a própria Palavra de Deus. Mas fica o desafio: se hoje ouvirmos a voz do Senhor não fechemos os nossos corações. Os ouvidos até podem já não ajudar, mas que o coração não dificulte.
A segunda leitura aviva o mandamento novo, lembrando-nos as palavras de Jesus e dizendo-nos que todos os mandamentos nos ligam aos outros e nos levam a amá-los como a nós mesmos. Vale a pena reter e sublinhar a expressividade do apóstolo: «Não devais a ninguém coisa alguma, a não ser o amor de uns para com os outros, pois, quem ama o próximo, cumpre a lei... A caridade não faz mal ao próximo. A caridade é o pleno cumprimento da lei». Tudo dito!
Pe. Manuel Gonçalves
Textos para a Eucaristia (ano A): Ez 33, 7-9; Sl 94 (95); Rom 13, 8-10; Mt 18, 15-20.
O Filho do homem é senhor do sábado
Passava Jesus através das searas num dia de sábado e os discípulos apanhavam e comiam as espigas, debulhando-as com as mãos. Alguns fariseus disseram «Porque fazeis o que não é permitido ao sábado?». Respondeu-lhes Jesus: «Não lestes o que fez David, quando ele e os seus companheiros sentiram fome? Entrou na casa de Deus, tomou e comeu os pães da proposição, que só aos sacerdotes era permitido comer, e também os deu aos companheiros». E acrescentou; «O Filho do homem é senhor do sábado» (Lc 6, 1-5).
Jesus não é, de modo nenhum, anarquista ou reacionário. No entanto, aproveita diversas ocasições para alertar que a lei ordena a convivência social e religiosa, procurando, precisamente, o bem de todos, a harmonia, a paz, a justiça, um sentido para a vida. Quando a lei impede ou dificulta a sadia relação entre as pessoas, e o crescimento das mesmas, deverá ponderar-se se a lei é necessária, ou se mais importante são as pessoas.
A lei está ao serviço da vida, ao serviço das pessoas, ao serviço da dignidade. E nunca a pessoa ao serviço da lei. A lei é um intrumento a favor das pessoas. Não pode ser a pessoa a transformar-se em intrumento a favor da lei. E bem sabemos como há leis injustas e imorais, leis que dificultam a dignidade e promovem a destruiçãoda vida ou a dimunuição da qualidade da vivência humana.
Uma lei é o argumento para lançarem mais uma cilada a Jesus: como é que em dia de sábado os discípulos apanhavam algumas espinhas, debulhavam-nas e comiam os grãos. A lei permitia o que eles vinham fazendo. E no tempo de muita carestia, e em longas jornadas, seria uma forma de enganar o estômago que todos compreendiam. Por isso também estava na lei. Agora comer os grãos dedebulhados ao sábado é que não lhes parecia lá muito bem.
A resposta da Jesus baseia-se em acontecimentos narrados na Bíblia, no bom senso, e naquilo que é verdadeiramente importante: a pessoa humana.
sexta-feira, 8 de setembro de 2017
quinta-feira, 7 de setembro de 2017
quarta-feira, 6 de setembro de 2017
Tu és o Filho de Deus
Jesus saiu da sinagoga e entrou em casa de Simão. A sogra de Simão estava com febre muito alta e pediram a Jesus que fizesse alguma coisa por ela. Jesus, aproximando-Se da sua cabeceira, falou imperiosamente à febre, e a febre deixou-a. Ela levantou-se e começou logo a servi-los. Ao pôr do sol, todos os que tinham doentes com diversas enfermidades traziam-nos a Jesus e Jesus, impondo as mãos sobre cada um deles, curava-os. De muitos deles saíam demónios, que diziam em altos gritos: «Tu és o Filho de Deus». Mas Jesus, em tom severo, impedia-os de falar, porque sabiam que Ele era o Messias. Ao romper do dia, Jesus dirigiu-Se a um lugar deserto. A multidão foi à procura d’Ele e, tendo-O encontrado, queria retê-l’O, para que não os deixasse. Mas Jesus disse-lhes: «Tenho de ir também às outras cidades anunciar a boa nova do reino de Deus, porque para isto fui enviado». E pregava pelas sinagogas da Judeia (Lc 4, 38-44).
O ministério de Jesus realiza-se a toda a brida.
Antes Jesus expulsa um espírito impuro. Hoje, a cura da sogra de Pedro, mas também de todos os doentes e enfermos que trazem até Ele. São sinais de que o poder de Deus está com Ele. Cura, perdoa e expulsa demónios. Mas, além, disso, não descura a pregação.
O Evangelho de hoje, claramente, mostra que a presença de Jesus no meio de nós é bênção e é cura das nossas enfermidades e que nas Suas palavras podemos de facto encontrar a salvação e testemunhá-la aos outros, procurando, cada um de nós, assumirmo-nos como bênção uns para os outros, procurando curar cada coração ferido que se aproximar e expulsar do meio de nós todos os demónios que nos é possível. Jesus conta connosco. Hoje, Ele cura através de nós. Expulsa as forças do mal, através de nós.
segunda-feira, 4 de setembro de 2017
Cumpriu-se hoje mesmo esta passagem da Escritura
Jesus foi a Nazaré, onde Se tinha criado. Segundo o seu costume, entrou
na sinagoga a um sábado e levantou-Se para fazer a leitura.
Entregaram-Lhe o livro do profeta Isaías e, ao abrir o livro, encontrou a
passagem em que estava escrito: «O Espírito do Senhor está sobre mim,
porque Ele me ungiu para anunciar a boa nova aos pobres. Enviou-me a
proclamar a redenção aos cativos e a vista aos cegos, a restituir a
liberdade aos oprimidos, a proclamar o ano da graça do Senhor». Depois
enrolou o livro, entregou-o ao ajudante e sentou-Se. Estavam fixos em
Jesus os olhos de toda a sinagoga. Começou então a dizer-lhes:
«Cumpriu-se hoje mesmo esta passagem da Escritura que acabais de ouvir».
Todos davam testemunho em seu favor e se admiravam das palavras cheias
de graça que saíam da sua boca. E perguntavam: «Não é este o filho de
José?». Jesus disse- lhes: «Por certo Me citareis o ditado: ‘Médico,
cura-te a ti mesmo’. Faz também aqui na tua terra o que ouvimos dizer
que fizeste em Cafarnaum». E acrescentou: «Em verdade vos digo: Nenhum
profeta é bem recebido na sua terra. Em verdade vos digo que havia em
Israel muitas viúvas no tempo do profeta Elias, quando o céu se fechou
durante três anos e seis meses e houve uma grande fome em toda a terra;
contudo, Elias não foi enviado a nenhuma delas, mas a uma viúva de
Sarepta, na região da Sidónia. Havia em Israel muitos leprosos no tempo
do profeta Eliseu; contudo, nenhum deles foi curado, mas apenas o sírio
Naamã». Ao ouvirem estas palavras, todos ficaram furiosos na sinagoga.
Levantaram-se, expulsaram Jesus da cidade e levaram-n’O até ao cimo da
colina sobre a qual a cidade estava edificada, a fim de O precipitarem
dali abaixo. Mas Jesus, passando pelo meio deles, seguiu o seu caminho (Lc 4, 16-30).
No Evangelho que hoje nos é proposto, São Lucas apresenta-nos Jesus no início da vida pública de Jesus, na deslocação à cidade que O viu crescer, onde as pessoas O conhecem pelo nome, conhecem a Sua família, sabem onde é a Sua casa, tratam-no pelo nome, pessoas que conviveram com Ele, que com Ele trabalharam, frequentaram os mesmos lugares, a praça e a sinagoga. Este é o primeiro registo. Jesus não é um extra-terrestre, que aparece do nada, sobre as nuvens, ou de forma espetacularmente milagrosa. A expectativa sobre a vinda do Messias seria próximo disso: uma origem desconhecida. No entanto, Jesus encarna, assume a nossa natureza humana, nasce, cresce, vive como nós e no meio de nós. Não é estranho, ou esquisito. Tem uma identidade muito humana.
Não se estranha que Jesus entre na Sinagoga, ao sábado, o dia sagrado, e Se levante para ler, e Se sente para refletir sobre a Palavra de Deus proclamada. Se não fosse algo habitual, a estranheza começaria de imediato. É um homem adulto, e que frequentava a Sinagoga habitualmente, primeiro acompanhado de São José e com os amigos de brincadeira.
A estranheza vem com as palavras de Jesus: Hoje mesmo se cumpriu esta passagem da Escritura. Até aí nada de espanto. Com esta afirmação contundente, inequívoca, começa a divisão, a estranheza, a interrogação. Afinal como podem alguém arvorar-se o direito de Se considerar a Si mesmo Enviado de Deus, Ungido do Senhor? E como é possível, se nós conhecemos a Sua origem, sabemos quem é o Seu Pai, os seus irmãos, os seus familiares? Sabemos que é carpinteiro, filho do carpinteiro José, como é que Ele diz agora que n'Ele Se cumprem as Escrituras?
Afinal, conhecemos a Sua origem, mas à uma origem anterior que nos é revelada pela fé, só pela fé, a origem divina, na qual também fomos enxertados. Sem fé não é possível aceitar, acolher, reconhecer, a missão e a identidade de Jesus.
A passagem revela outras coisas. Jesus já era reconhecido, também na Sua terra, como profeta, como "fazedor" de milagres, pelo menos isso, pois alguns estava na esperança que Ele realizasse ali os milagres que tinham testemunhado em outras cidades por onde Jesus tinha passado, dizendo-nos também que a vida pública de Jesus já tinha iniciado.
Outro dos aspetos importantes, é admiração das pessoas, mas sem perseverança. Deixam-se entusiasmar mas logo seguem aqueles que querem expulsar Jesus da Sinagoga e da cidade. Por outro lado ainda, uma lição importante: quando estamos certos da verdade das nossas escolhas não devemos temer as vozes que se levantam à nossa volta, mas, à semelhança de Jesus, prosseguir com firmeza e alegria o nosso caminho.
HOJE cumpriu-se o tempo. É neste HOJE de Jesus que havemos de sintonizar-nos.
domingo, 3 de setembro de 2017
VL - Quero falar contigo sobre os meus sentimentos - 2
A comunicação é como jogar à bola. Eu lanço a bola. Tu lanças a bola. Alguém tem de lançar a bola em primeiro lugar. Deus é o primeiro a lançar a bola, toma a iniciativa, vem “jogar” o nosso jogo, faz-Se, em Jesus Cristo, um de nós, em tudo igual a nós exceto no pecado.
Na comunicação contam várias condicionantes, mas o essencial são as pessoas que comunicam. A primeira condição é a aceitação: aceitar e escutar. A predisposição não apenas para falar mas para criar as condições para a outra pessoa falar. Aceitar o que tem para me dizer, sem preconceitos. A aceitação inicia-se ouvindo o que ela tem para me dizer. E então a comunicação acontece. É possível que alguma coisa mude.
Com efeito, a comunicação visa a mudança. Se nada muda, é porque não houve comunicação, pois esta leva sempre a novos comportamentos.
Falar do tempo, do futebol, falar das fases da nossa vida, é parecido com comunicação, mas a verdadeira comunicação fala de sentimentos e procura tocar o coração do outro.
Por outro lado, na comunicação pode haver a tentação de eu procurar mostrar à outra pessoa que sou melhor que ela. "Se ao menos eu fosse melhor do que aquela pessoa! Sem se perceber, muitas vezes usamos a comunicação como uma forma de competição”. Dessa forma nada muda. A mudança começa quando o outro se sente aceite como pessoa. Não se trata de concordar com tudo o que diz, trata-se de a aceitar como pessoa e dar valor ao que nos diz.
É isto que Deus faz connosco. Por amor nos chama à vida e por amor Se comunica, em palavras mas sobretudo pela Palavra que encarna, que Se assume Pessoa, em Jesus Cristo. A comunicação é “corporal”, encurtando distâncias. Jesus comunica-Se com a Sua própria vida. Na relação com as multidões, com os discípulos, com as pessoas mais frágeis, Jesus olha, escuta, pergunta, responde. A primeira preocupação de Jesus não é julgar, mas acolher, escutar, perceber o coração de quem d’Ele se aproxima ou, muitas das vezes, de quem Ele se aproxima. “Nós vivemos através da comunicação. Quando a tua comunicação muda com outra pessoa, a tua relação muda com todas as outras pessoas também. A tua relação com o teu trabalho e as relações na tua vida mudarão também”.
É isso que acontece com os discípulos: o encontro com Jesus muda-os e mudam para sempre as suas vidas, indo ao encontro de outros para comunicarem a Vida por excelência: Jesus, morto e ressuscitado.
Publicado na Voz de Lamego, n.º 4424, de 8 de agosto de 2017
sábado, 2 de setembro de 2017
VL - Quero falar contigo sobre os meus sentimentos
"I want to tell you about my feelings". Belíssimo texto de MAMORU ITOH (1992), traduzido do inglês por Helena Gil da Costa e facultado, salvo erro, em Técnicas de Comunicação, na Faculdade de Teologia no Porto. É um texto (livro já publicado) sobre comunicação e sobre sentimentos, sobre a vida e o relacionamento entre pessoas.
Comunicar é como jogar à bola. Para que haja jogo é preciso que alguém atire a bola para o outro. Uma e outra vez. Atiro a bola. Tu atiras a bola. Recolhes a bola. Eu recolho a bola. Para haver comunicação, e para haver relacionamento, alguém precisa de tomar a iniciativa e falar sobre os seus sentimentos e atirar primeiro a bola.
Na comunicação, tradicionalmente, existem o emissor, a mensagem e o recetor. Nesta parábola percebem-se as condicionantes. As circunstâncias. Eu posso atirar a bola com demasiada força ou com força insuficiente. O outro pode estar preparado para receber a bola, mas não conseguir apanhá-la, porque vai com força demasiada ou não chega. «Todos nós queremos que apanhem as nossas bolas». Eu posso atirar a bola com meio metro diâmetro e quando voltar para mim pode vir com poucos centímetros. Alguém tem de lançar primeiro a bola. Mas posso ter medo que ela não seja recolhida ou não seja devolvida. E o outro pode ter medo ou não estar preparado para atirar a bola, para falar dos seus sentimentos.
«Se a pessoa a quem atiraste a bola não a apanhou da maneira que tu querias, não culpes essa pessoa. Talvez ela não seja muito boa a jogar a bola. Talvez ela estivesse nervosa, e a sua mão tenha deslizado. Talvez a tua bola fosse demasiado pesada».
Para que haja verdadeira comunicação não posso ficar só à espera que o outro me atire a bola. Tenho que também atirar a bola, arriscar, falar sobre os meus sentimentos. Não é possível falarmos ao mesmo tempo. Um fala e outro escuta. Pode haver nervosismo, ansiedade. Mas o mal não é a ansiedade, mas não a reconhecer. Queres falar, mas o mais importante não é falar, mas a tua capacidade para fazeres com que o outro fale. Começa por confiar e por aceitar o que a outra pessoa tem para te dizer. A aceitação é o primeiro passo para que a comunicação possa acontecer.
Transpondo para a nossa fé: Deus toma a iniciativa de Se comunicar e a Sua Palavra é carne viva, é Jesus Cristo! Ele precede-nos e lança a primeira bola. A comunicação acontece e a vida surge!
Publicado na Voz de Lamego, n.º 4423, de 1 de agosto de 2017
sexta-feira, 1 de setembro de 2017
Domingo XXII do Tempo Comum - ano A - 3.09.2017
1 – A primeira e única vocação do cristão é seguir Jesus, amar Jesus, viver Jesus, transparecer e testemunhar Jesus. Em todos os momentos da vida, em toda a parte, diante de todas as pessoas, nas situações favoráveis e nos momentos adversos. Sem pausas, nem reservas, nem adiamentos. Não somos cristãos a meio tempo, quando nos dá jeito, quando é mais oportuno, ou aos Domingos.
Somos cristãos sempre, quer vivamos quer morramos, como refere o Apóstolo Paulo, no trabalho ou em férias, diante das panelas, diante de um ecrã de televisão, no meio do grupo de amigos, quando falamos sobre tudo e ou sobre coisa nenhuma, quando nos encontramos com os/as vizinhos/as, quando falamos de futebol ou da novela, quando falamos de política ou de religião, quando silenciamos para cuidar ou quando calamos para não nos incomodarem.
Seguir Jesus implica-nos por inteiro. De corpo e alma. Como se nos pudéssemos dividir! Seguir Jesus envolve-nos totalmente. Não há regiões sombrias na nossa vida que não possam e não devam ser iluminadas por Jesus Cristo e a Ele oferecidas. Como diria Santo Ambrósio, se nada mais tivermos para Lhe oferecer, ofereçamos-Lhe o nosso pecado, as nossas faltas e hesitações, os nossos egoísmos e esquecimentos, ofereçamos-Lhe as nossas distrações e descuidos em relação aos outros.
Seguir Jesus não tem horário, porque em todas as horas, minutos e segundos nos cabe acolher, seguir e anunciar Jesus. Somos discípulos missionários. Sempre a aprender de Jesus, sempre disponíveis para O testemunhar, para falar d'Ele, para O mostrar nas nossas palavras, nos nossos gestos, nas nossas escolhas e na nossa postura diante da vida e do mundo, perante os outros.
2 – Não somos originais ao seguirmos Jesus. A originalidade e o fundamento está no próprio Jesus. É Ele que nos chama, nos convoca, é Ele que nos faz discípulos e nos envia como missionários a levar a Boa Nova a todo o mundo, a ensinar e a fazer discípulos de todas as nações, a batizar e a formar comunidade. Não somos originais, pois não vivemos ensimesmados, a partir de nós e do nosso umbigo, do nosso mundo! A origem é Jesus. A origem é Deus, Fonte de todo o bem e de todo o amor, que em Jesus, Se dá por inteiro, por amor, até Se gastar totalmente, até à última gota de sangue, até ao último fôlego. Tudo por amor. Sempre por amor.
Ao longo da Sua vida, Jesus respira Deus, transparece o amor do Pai, diz as Palavras do Pai e realiza as obras do Pai. Sem complexo de inferioridade. O Pai é Maior do que Eu, chega a dizer Jesus, ainda que se perceba que Ele e o Pai são Uma só coisa. Amar como quem serve. Servir como quem ama e no amar se consome como pavio até ao fim, quando já não houver mais nada para arder! Eu venho, Senhor, para fazer a Vossa vontade. O meu alimento é fazer a vontade d'Aquele que Me enviou. Faça-Se não a minha, mas a Tua vontade, não como Eu quero e é (momentaneamente) mais fácil, mas como Tu queres, para que melhor corresponda ao amor.
Poderemos ver como Jesus mantém uma ligação íntima, profunda e permanente ao Pai. É visível nas Suas Palavras, vislumbra-se nos Seus gestos. Retira-Se para lugares desertos, sobretudo ao cair da noite, para rezar. Por vezes, a oração estende-se pela noite e até de madrugada. Esta intimidade de Jesus com o Pai fortalece-O no ânimo de prosseguir no anúncio do Reino e nos prodígios que realiza. A qualidade do tempo passado na companhia e no conforto do Pai não Lhe rouba tempo para as pessoas. Algumas vezes encontramos Jesus cansado, a retirar-Se para descansar e parar orar, mas logo surgem as multidões e Jesus esquece a fome e o cansaço e começa a ensiná-las, pois são como ovelhas sem pastor.
3 – Aproximam-se horas conturbadas, nuvens carregadas surgem no horizonte, a missão terrena de Jesus encaminha-se para o fim, o futuro desponta incerto, com grandes probabilidades falhanço. Há que retemperar forças, mas sobretudo de avaliar a firmeza do seguimento. Víamos no domingo passado a pergunta de Jesus dirigida diretamente aos discípulos: E vós quem dizeis que Eu Sou? Jesus teve a oportunidade de tomar o pulso aos que O seguiam mais de perto, procurando saber até que ponto estavam amadurecidos para O testemunhar em ambientes adversos.
O ensino e os alertas de Jesus continuam. É fácil segui-l'O quando tudo corre bem. É fácil a fé quando a vida e o mundo nos são favoráveis. É difícil a fé e o seguimento quando tudo corre mal, quando parece que o mundo está todo contra nós!
Depois da confissão de fé de Pedro, Jesus explica a obrigatoriedade de descer para Jerusalém, terra dos Profetas, onde vai sofrer muito, onde será morto, para ressuscitar ao 3.º dia. Com uma notícia tão negativa deixa de haver espaço para boas notícias. Pedro é o primeiro a reagir. É o assessor político ou o chefe de gabinete: «Deus Te livre de tal, Senhor! Isso não há de acontecer!». Pedro tem o cuidado de contestar Jesus de forma discreta, chamando-O à parte. A resposta de Jesus é contundente, sem margem para segundas leituras: «Vai-te daqui, Satanás. Tu és para mim uma ocasião de escândalo, pois não tens em vista as coisas de Deus, mas dos homens».
Para Jesus, a vontade do Pai está em primeiro lugar, ainda que isso comporte riscos, medos, sofrimentos. Pedro e os demais discípulos vivem à sombra de Jesus. Quem está perto da árvore pode beneficiar da sua sombra. Estando perto de Jesus, os discípulos podem beneficiar do Seu poder e garantir um lugar de primeira apanha no Reino que Ele está a instituir.
4 – O que Jesus diz a Pedro é para nós também. Vai-te daqui Satanás! É para nós quando sobrevém o medo, a impaciência, quando nos colocamos como centro, adiantando-nos à vontade de Deus. Hoje em dia aceita-se que Judas tenha pecado por excesso de zelo e de fé em Jesus. Judas achava que Jesus estava a ser lento e a seguir por um caminho de destruição, quando tinha poder para seguir por um caminho mais veloz, impondo-Se e impondo o Seu reino. Colocado perante o confronto violento com as autoridades, talvez Jesus se visse obrigado a agir e a invocar todo o poder de Deus. Judas enforca-se ao perceber o seu erro, antecipando o encontro com Cristo na eternidade!
Atempadamente, Jesus alertou os discípulos que o caminho era o da Cruz, do sacrifício, do trabalho árduo – Eu e o Pai trabalhamos em todo o tempo – do serviço. Sem cessar!
São palavras clarificadoras: «Se alguém quiser seguir-Me, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me. Pois quem quiser salvar a sua vida há de perdê-la; mas quem perder a sua vida por minha causa, há de encontrá-la». Numa leitura apressada poderíamos pensar que existe algum desprezo pela vida! Não está em causa a vida biológica, mas a vida entendida como dom e como tarefa. Se guardarmos os ovos durante meses, ou um vinho espumante, ou um chocolate, quando dermos conta já passou de validade e o que guardávamos com tanto carinho afinal não nos serviu de nada. A vida que não se gasta perde-se. Jesus gasta a vida por inteiro, até à última gotícula de sangue e assim nos abre em definitivo as portas da eternidade e da vida que não tem fim.
Na verdade, prossegue Jesus, «que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua vida? Que poderá dar o homem em troca da sua vida? O Filho do homem há de vir na glória de seu Pai, com os seus Anjos, e então dará a cada um segundo as suas obras». No final, seremos compensados pelo que tivermos feito uns pelos outros e não por termos ficado de braços cruzados!
5 – Na primeira leitura, o profeta Jeremias fala da sua vocação. Foi Deus que o seduziu, que o chamou. Porém, a resposta ao chamamento e vivência da sua vocação fazem-no percorrer um caminho tortuoso, sendo vilipendiado em todo o tempo, objeto de escárnio, zombaria e insulto.
Com tandos dissabores, o Profeta pondera desistir e calar-se. Mas logo sobrevém a missão: «Havia no meu coração um fogo ardente, comprimido dentro dos meus ossos. Procurava contê-lo, mas não podia». Fala mais alto o chamamento de Deus.
6 – Na segunda leitura encontramos uma belíssima síntese da Liturgia da Palavra para este domingo: «Peço-vos, irmãos, pela misericórdia de Deus, que vos ofereçais a vós mesmos como sacrifício vivo, santo, agradável a Deus, como culto espiritual. Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos, pela renovação espiritual da vossa mente, para saberdes discernir, segundo a vontade de Deus, o que é bom, o que Lhe é agradável, o que é perfeito».
Se voltarmos ao Evangelho, vemos o desafio de Jesus: gastar a própria vida, oferecer-nos como sacrifício vivo, não nos conformamos com o mundo, mas procurando em tudo seguir Jesus e como Ele procurar viver segundo a vontade de Deus.
Pe. Manuel Gonçalves
Textos para a Eucaristia (ano A): Jer 20, 7-9; Sl 62 (63); Rom 12, 1-2; Mt 16, 21-27.
VL – A árvore a cair e a floresta a arder
Depois de Pedrógão Grande, tragédia que abalou o país, outros incêndios e muitos fogos ateados pela comunicação social, pelos políticos e por muitas pessoas de boa vontade, pelo menos ao nível das intenções.
Sobre alguns assuntos todos opinam, mesmo desconhecendo o contexto, a raiz, as responsabilidades. Já muito se disse sobre incêndios. Uns desculpam-se. Outros atacam, acusam, lançam farpas. Outros remetem para o passado, a estruturação da floresta, a orgânica das autoridades, a fiabilidade das comunicações. Outros delimitam o tempo no presente. Calor intenso, erros na abordagem aos incêndios, desconhecimento do terreno, falta de coordenação, escassez de meios e de pessoas. E, claro, há quem supostamente ganhe muito dinheiro com isto! Pois, dizem, os incêndios mexem com muitos interesses, fazem gerar a economia.
É importante discutir a ordenação florestal, a estruturação dos meios e a hierarquização das responsabilidades. É preciso olhar para hoje e para amanhã. As raízes ajudam a enfrentar o vendaval. Há que avaliar e ponderar as fraquezas e as potencialidades, para que no futuro não se cometam erros semelhantes.
Porém, o que aqui me traz não são essas questões, por mais importantes que sejam. Esta semana, ainda que outros já o tenham feito, gostaria de falar sobre generosidade, voluntariado, serviço e dedicação ao próximo. Também aqui houve situações que não correram da forma mais adequada, perante a grandeza da calamidade, a rapidez, e a resposta de centenas, de milhares de pessoas, prontas para dar alimentos e roupas, prontas para ir ao local ajudar as pessoas, as famílias que foram afetadas.
É, todavia, um primeiro aspeto a sublinhar: prontidão na ajuda perante a espetacularidade das imagens que (ainda) comoveram as pessoas. Um dos perigos a que Francisco tem feito referência amiúde é o facto da repetição de imagens de violência, desgraças e miséria, sangue, crianças na valeta, criarem pessoas indiferentes. Sublinha o Papa: quando a Bolsa de Valores desce um ponto percentual, logo a comunicação social, os economistas e os políticos se agitam. Morrem centenas de crianças à fome e já faz parte da paisagem.
Na maioria dos meios de comunicação deu-se mais importância à flatulência de Salvador Sobral que aos milhares de voluntários dispostos a ajudar e aos milhões de euros recolhidos por diversas instituições. Longos minutos para a crítica, para denúncias... e quase despercebida a imensa multidão de pessoas lançadas para minorar o sofrimento das vítimas dos incêndios… Mas como sói dizer, o bem não faz barulho… uma árvore a cair faz muito mais barulho que uma floresta inteira a crescer…
Publicado na Voz de Lamego, n.º 4422, de 25 de julho de 2017