sábado, 17 de janeiro de 2015

Domingo II do Tempo Comum - ano B - 18 de janeiro

       1 – Diante de nós, Jesus, o Cordeiro de Deus que carrega e que tira os pecados do mundo. O Espírito do Senhor repousa n’Ele e consagra-O para anunciar a Boa Nova aos pobres, aos cativos levar a libertação, dar vista aos cegos, a todos libertar da escravidão do pecado e da morte. Vamos no Seu encalço. Foi batizado por João e logo os Céus nos lembraram como Deus está no meio de nós. Em Jesus, Deus faz-Se peregrino connosco e para nossa salvação. Desfez-se a barreira que nos separava do Céu, por Jesus vamos ao Pai e sabemos que estamos no Pai quando nos identificamos com Jesus (cf. Jo 14, 19-24).
       João percebe que Aquele Jesus é o Messias que estava para vir e que já está no MEIO de nós. Àqueles dois discípulos, e a nós também, João mostra Jesus: É o Cordeiro de Deus. Como a dizer-nos: agora o tempo é outro, já não faz sentido serdes meus discípulos, quando todos devemos ser discípulos d'Ele, Aquele sobre Quem desceu o Espírito Santo. Os discípulos ouvem-no, deixam-no e passam a seguir Jesus. Veja-se a sequência de testemunho. João dá testemunho de Jesus. Comunica aos Seus discípulos Quem é o Messias. E os discípulos, escutam e fazem uma escolha.
       Duas atitudes nos são sugeridas: sermos testemunhas, em palavras e obras, de Jesus, e como João apontarmos sempre para Ele que está no MEIO de nós; como discípulos, sermos ouvintes da Palavra de Deus, para nos pormos a caminho, seguindo atrás de Jesus.
       2 – Jesus volta-Se e vê-nos. Vai à frente, mas não indiferente. Ele sabe que O seguimos, que O procuramos, e que podemos perder-nos. Seguindo-O de perto, decalcando as Suas pegadas, podemos escutar a Sua voz: «Que procurais?». E teremos então oportunidade de nos aproximarmos mais: «Rabi – que quer dizer ‘Mestre’ – onde moras?».
       Tratamo-l'O por Mestre, reconhecendo que podemos aprender muitas coisas com Ele. Mas Ele, por sua vez, surpreende-nos, não começa por nos instruir, nos ditar pensamentos, ou balizar os mandamentos para sermos seus discípulos: «Vinde ver». A resposta de Jesus é um convite para entrarmos em Sua casa. Ele quer ser a nossa morada. Quer-nos a morar com Ele. Só assim o conheceremos, só assim O seguiremos, só assim podemos transparecê-l'O.
       O encontro com Jesus tem hora marcada. Eram quatro horas da tarde. O pormenor temporal que o evangelho de São João nos dá é significativo. Aquele encontro não é abstrato, desligado da vida, imaginável. É real, como real são os discípulos que seguem Jesus. Um dos que foram ver onde Jesus morava e ficaram com Ele nesse dia é André, irmão de Simão Pedro.
       O encontro com Jesus muda-nos. Não basta saber alguma coisa sobre Ele. É importante. É o primeiro passo. Depois, segui-l'O pelo caminho, permanecendo junto d'Ele, na Sua casa. E se Ele se torna a nossa morada, o inevitável acontece: não podemos calar o que vimos e ouvimos.
       André vai procurar o seu irmão e diz-lhe: «Encontrámos o Messias» – que quer dizer ‘Cristo’ –; e levou-o a Jesus. Atente-se no pormenor: André não diz muitas coisas sobre Jesus, nem tenta convencer Pedro, simplesmente o leva a JesusO testemunho sobre Jesus é fundamental, pois não podemos seguir e amar o que desconhecemos. Cada um de nós ouviu falar de Jesus, e alguém nos levou a Ele. O encontro pessoal com Jesus não é dispensável. Lembremo-nos da Samaritana que vai à cidade anunciar que encontrou o Messias. Na volta, os que vieram com ela, dizem claramente: Já não é pelas tuas palavras que acreditamos; nós próprios ouvimos e sabemos que Ele é verdadeiramente o Salvador do mundo (Jo 4, 42).
       3 – Dá-se o encontro de Jesus com Pedro. E mais uma vez somos surpreendidos. Ele precede-nos. Sabe quem somos, trata-nos pelo nome. O Seu olhar vai ao fundo de nós, onde Ele nos descobre e nos desconcerta. Jesus fita os olhos em Simão e diz-lhe: «Tu és Simão, filho de João. Chamar-te-ás Cefas» – que quer dizer ‘Pedro’.
       E tudo muda de novo. És Simão mas chamar-te-ás Cefas, serás Pedro, pedra, rocha sobre a Qual edificarei a minha Igreja. Sublinhe-se desde já que a Igreja é de Cristo, não de Pedro. É Ele que a edifica, mas conta com Pedro e conta connosco. A pedra angular é Jesus. Pedro é, ainda, uma pedra a trabalhar, para se tornar Pedra firme sobre a qual Jesus edifica a Sua Igreja. Ou como refere D. António Couto, Bispo de Lamego, partindo do significado de Cefas, Pedro é sobretudo "a rocha escavada, oca, espécie de gruta que serve de lugar de refúgio e acolhimento, onde os pássaros fazem os seus ninhos, os animais guardam as suas crias e os homens se refugiam em caso de guerra: não é sólido, mas dá solidez e proteção a uma vida nova". Rocha firme mas sobretudo rocha-ventre, que gera e acolhe a vida. Assim há de ser a Igreja: proteger, potenciar novas vidas. É a tarefa de todo o cristão, de todos os que se deixam encontrar por Jesus e Se deixam ver pelo Seu olhar.

       4 – Se o evangelho nos traz a vocação (chamamento) dos primeiros apóstolos, a primeira leitura presenteia-nos com o chamamento (chamamento) de Samuel.
       Samuel dorme no templo, lugar de encontro com Deus. Ali está a arca da Aliança. Para os cristãos a Arca da Aliança é a Igreja, ou o Corpo de Jesus que é a Igreja. Também Maria pode ser reconhecida – Primeira Igreja – como a Arca da Aliança. Na Arca, encontra-se a Lei de Deus dada ao Povo por Moisés. No nosso caso, a Arca traz-nos o próprio Deus, traz-nos Jesus. Samuel (= Deus chama) está bem perto de Deus e, por conseguinte, repousa, dorme tranquilo. Estamos perto de Deus, sentimo-nos tranquilos na Sua presença? Escutamos a Sua voz? Estamos pacificados quando sabemos que Ele está por perto?
       "O Senhor veio, aproximou-Se e chamou como das outras vezes: «Samuel, Samuel!» E Samuel respondeu: «Falai, Senhor, que o vosso servo escuta». Samuel foi crescendo; o Senhor estava com ele e nenhuma das suas palavras deixou de cumprir-se".
       Deus chama-nos mas nem sempre discernimos a Sua voz. Também pode acontecer que outras vozes nos desviem da de Deus e nos confundam. A comunidade é uma ajuda preciosa. Ajuda a comunidade. Heli vai percebendo que é Deus quem chama Samuel. Este ainda não conhecia o Senhor. E como poderia conhecer o Senhor se ainda não lhe tinham falado explicitamente d'Ele?! Mais um incisivo para nós: como Samuel ponhamo-nos à escuta de Deus e da Sua Palavra; como comunidade crente, demos testemunho diante dos outros deste Deus que nos fala ao coração, que está bem próximo de nós, para que os outros possam deixar-Se encontrar por Ele, perceber a Sua voz, e escutar o Seu chamamento.

       5 – O Templo no Qual encontramos a Deus, é Jesus. Ele é o verdadeiro Templo de Deus. E com Ele também nós nos tornamos templos, lugares de encontro com os outros e com Deus. Não esqueçamos que o Templo não é para Deus. O Templo é para nos encontrarmos com Deus. Mas também com os outros. Como lugar físico, sagrado, casa de oração e de comunhão, faz-nos olhar para Deus, colocando-nos em atitude de escuta, de contemplação, de diálogo, mas sintoniza-nos com outros que rezam como nós, que procuram, que escutam, que suplicam, que agradecem. Se rezamos ao mesmo Deus, unimo-nos entre nós.
       O Apóstolo lembra-nos que o nosso encontro com Deus não é abstrato, mas corpóreo. O romantismo de uma vida meramente espiritual não toca a realidade e se não toca a realidade não a salva. Ora, somos pessoas, de carne e osso, pecadores, frágeis como os vasos de barros, mas é AQUI e AGORA, no nosso corpo, na nossa vida inteira, que Deus nos encontra. Como víamos no Evangelho, e na primeira leitura, Deus tem hora marcada connosco, chama-nos pelo nome, num lugar determinado, no caminho, ou em Sua casa. Sigamo-l'O à Sua morada, para aprendermos d'Ele, para nos alimentarmos à Sua mesa, para O comunicarmos.
       Santificamo-nos na nossa corporeidade: "O corpo não é para a imoralidade, mas para o Senhor, e o Senhor é para o corpo. Não sabeis que os vossos corpos são membros de Cristo? Aquele que se une ao Senhor constitui com Ele um só Espírito. Não sabeis que o vosso corpo é templo do Espírito Santo, que habita em vós e vos foi dado por Deus? Não pertenceis a vós mesmos, porque fostes resgatados por grande preço: glorificai a Deus no vosso corpo".
       O seguimento de Cristo, a adoração de Deus, não é abstrata, concretiza-se em nós, na nossa vida, na história e no tempo, e não há nem tempo nem história nem templo sem o corpo, o nosso corpo, a nossa vida humana.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano B): 1 Sam 3, 3b-10. 19; Sl 39 (40); 1 Cor 6, 13c-15a. 17-20; Jo 1, 35-42.

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