sábado, 19 de julho de 2014

XVI Domingo do Tempo Comum - ano A - 20 de julho

       1 – Deus é lento para a ira e rico de misericórdia, "é um Deus clemente e compassivo, sem pressa para Se indignar e cheio de misericórdia e fidelidade" (Ex 34, 6). É isto que Jesus volta a dizer-nos de forma clara e inequívoca.
       Depois da parábola do Semeador que sai a semear e cuja semente encontra terrenos diversos, Jesus propõe-nos a parábola do trigo e do joio. «O reino dos Céus pode comparar-se a um homem que semeou boa semente no seu campo. Enquanto todos dormiam, veio o inimigo, semeou joio no meio do trigo e foi-se embora. Quando o trigo cresceu e começou a espigar, apareceu também o joio».
       Apercebendo-se do que está a acontecer logo os seus servos querem cortar o mal pela raiz. Então o senhor diz-lhes: "Não! Não suceda que, ao arrancardes o joio, arranqueis também o trigo". Quando chegar a altura da ceifa, amadurecendo o trigo e o joio, terão oportunidade de separar o trigo e o joio. Ao nascer e no crescer o trigo e o joio confundem-se facilmente. Mas com o tempo, o trigo cresce acima do joio…
       Já em casa, Jesus volta a explicar aos discípulos a parábola do trigo e do joio. «Aquele que semeia a boa semente é o Filho do homem e o campo é o mundo. A boa semente são os filhos do reino, o joio são os filhos do Maligno e o inimigo que o semeou é o Diabo. A ceifa é o fim do mundo e os ceifeiros são os Anjos. Como o joio é apanhado e queimado no fogo, assim será no fim do mundo».
       Em cada um de nós, cresce o trigo e o joio simultaneamente. Poderemos colocar os bons de um lado e os maus do outro lado. Nesse caso cortamos o joio antes da ceifeira. E de que lado nos situamos? Seremos os bons para excluir os maus? Ou seremos os maus que se querem perdidos na escuridão e no pecado?
       Amadureçamos a semente que Jesus lançou no nosso coração e na nossa vida, cuidemos da nossa terra, vamos mondando com cuidado para não destruir o que de bom vamos encontrando, criemos condições cada dia mais favoráveis para que o trigo seja mais forte e robusto e possa ir abafando o joio que há em nós.
        2 – Uma árvore ao cair faz muito mais barulho que todas as árvores da floresta a crescer.
       Uma notícia negativa gera uma maior atenção e tem direito a um tempo de antena alargado com todos os desenvolvimentos possíveis, os vários pontos de vistas, opiniões de quem viu e de quem não viu, emoções, sentimentos. Uma notícia positiva tem algumas dificuldades de afirmação, ainda que possa ser um bom sinal na medida em que o bem continua a ser expectável.
       A velha imagem que se adequa à parábola de Jesus, o risco de deitar fora a água suja e o bebé. Olhando para a vasilha só se vê a água turva, mas dentro está o bebé. É preciso cuidado e antes de deitar fora a água verificar que nada de bom e útil segue o mesmo destino.
       No recente Campeonato do Mundo de Futebol, 16 equipas, espalhadas pelos diferentes continentes conseguiram um feito meritório, entre muitas outras apuraram-se para a fase final. Luta, trabalho, sacrifício, para superar os adversários. Na fase final, algumas equipas obtiveram mais sucesso que outras. Até podem ter perdido jogos em que jogaram melhor futebol. Este tem uma dose elevada de sorte. Um primeiro golo pode derrubar por completo a confiança. Uma derrota ou a eliminação fez explodir, em relação a algumas seleções de futebol, como Portugal e Brasil, um rol infindável de críticas como se tudo tivesse corrido mal. Perante uma derrota é difícil ver o bem e avaliar de forma equilibrada, sem com isto desvalorizar a necessidade de se fazer uma avaliação sobre o correu bem e o que correu menos bem.
       O trigo e o joio, o bem e o mal, o branco e o preto, a vida e a morte, a luz e as trevas. As antíteses até podem ser atraentes, mas a vida não é assim, é multicolor e tem diversas matizes, uma definição não encaixa em todas as pessoas do mesmo modo.
       Temos pressa e queremos resultados imediatos. Bento XVI, no início do Seu pontificado, dizia de uma forma muito acessível que a nossa pressa destrói, precipita-nos. A paciência de Deus, que brota do amor, da compaixão, da Sua misericórdia infinita, constrói. Deus é paciente, espera por nós. Sempre.
       Num grupo eclesial, numa turma (escolar), num clube de futebol, num partido, numa empresa, um incidente, uma momento infeliz, pode destruir rapidamente tudo o que se construiu com carinho e dedicação. Caindo em rápidos juízos de valor, o sério risco de colocarmos tudo em causa, desanimarmos, fazermos com que os outros desanimem.
       Paga o justo pelo pecador. Algo correu mal. Aconteceu o que não era suposto acontecer. Alguém tem de pagar as favas, ou pagam todos. Um elemento saiu fora da linha, então desiste-se por completo do projeto em causa.
       3 – Deus age, por vezes silenciosamente, em nós e através de nós. Podemos ter vontade e desejo de transformar o mundo inteiro, mas nem a nossa vida transformaremos senão deixarmos que o Espírito Santo nos envolva e reaviva em nós a memória e a identidade de filhos adotivos de Deus.
       Com o tempo, tomamos consciência que o nosso esforço não obtém resultados imediatos nem tampouco os frutos que eram esperados diante do muito que fizemos. A reação pode levar-nos a desistir e a conformar-nos com as situações vigentes. Porém, tal como na parábola do trigo e do joio, contamos com a paciência e compaixão de Deus. Para que a semente dê fruto abundante e maduro é preciso cuidado, trato, mas sobretudo deixar que Deus opere na terra que somos, solo ávido da Palavra de Deus e da Sua presença amorosa.
       Jesus explicita o agir de Deus e a confiança que nos deve suscitar através de mais duas parábolas:
  • «O reino dos Céus pode comparar-se ao grão de mostarda que um homem tomou e semeou no seu campo. Sendo a menor de todas as sementes, depois de crescer, é a maior de todas as plantas da horta e torna-se árvore, de modo que as aves do céu vêm abrigar-se nos seus ramos».
  • «O reino dos Céus pode comparar-se ao fermento que uma mulher toma e mistura em três medidas de farinha, até ficar tudo levedado».
       Também por aqui se vê que Deus não age pelo exterior, pela força, pelo espetacular, mas pelo humilde e delicado, a partir do nosso interior. Deus age apenas e só através do amor com que nos cria e salva em Cristo Jesus, pela força do Espírito Santo. Por mais pequena que seja a semente, com Deus produzirá em abundância. O que fizermos só por nós pode ser muito, mas será sempre pouco. O que fizermos com Deus, ou deixarmos que Deus faça em nós e através de nós, ainda que seja pouco, será sempre muito, será sempre amor, e não correremos o risco de desanimar com a mesma facilidade de nos centrarmos apenas em nós. Sozinhos não existimos. Alguém duvida?

       4 – Na verdade, diz-nos o Apóstolo, "o Espírito Santo vem em auxílio da nossa fraqueza, porque não sabemos que pedir nas nossas orações; mas o próprio Espírito intercede por nós com gemidos inefáveis. E Aquele que vê no íntimo dos corações conhece as aspirações do Espírito, pois é em conformidade com Deus que o Espírito intercede pelos cristãos". Na oração encontramo-nos com o mesmo Deus, que dilata o nosso coração, envolvendo-nos na compaixão com o próximo.
       O Senhor Deus é o garante da nossa vida presente e futura, Ele que nos criou e em Cristo nos redimiu. Desde sempre, Deus cuida de nós, usando de misericórdia e paciência. "Vós, o Senhor da força, julgais com bondade e governais-nos com muita indulgência, porque sempre podeis usar da força quando quiserdes. Agindo deste modo, ensinastes ao vosso povo que o justo deve ser humano e aos vossos filhos destes a esperança feliz de que, após o pecado, dais lugar ao arrependimento".
       Como é belo saber que o nosso Pai – como os nossos pais terrenos – está sempre de coração disponível e de braços abertos para nos acolher em casa, mesmo quando fomos injustos, ingratos, rebeldes. Por mais que nos tenhamos afastado, o coração do Pai (e dos pais) está pronto para nós. Faz toda a diferença. Sabemos que ainda que tudo corra mal, temos um poiso, um lugar em Quem nos encontrarmos e para onde voltarmos. A nossa casa é onde estão os que nos querem bem.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano A): Sab 12, 13. 16-19; Sl 85 (86); Rom 8, 26-27; Mt 13, 24-43.

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