sábado, 30 de novembro de 2013

Novena da Imaculada Conceição - 1.º Dia

       Com o dia 29 de novembro, cada ano, iniciamos a NOVENA de preparação para a Festa de Nossa Senhora da Conceição, Padroeira desta paróquia de Tabuaço. Este ano assinalam-se também os 25 anos do Monumento a Nossa Senhora da Conceição que se encontra sobre a Vila, na Fraga do Tostão.
       A Novena é orientada pelo Pe. Jorge Henrique, natural de Ariz, no concelho de Moimenta da Beira, ordenado sacerdote em 15 de agosto de 2008, é pároco de Faia, Penso, Vila da Ponte e Vila da Rua.
       No primeiro dia, o pregador contextualizou o final do ano litúrgico, com as Leituras apocalípticas, numa toada de fim dos tempos, em lógica de esperança e confiança em Deus. Com o final do ano litúrgico um novo tempo se inicia, o do Advento.
       Por outro lado, o significado de uma Novena, espera, preparação, antecipação do que está para acontecer. A primeira Novena, que tem Maria como protagonista, a espera entre a Ascensão de Jesus e o Pentecostes, o envio do Espírito Santo. Nove dias de oração, de assembleia que se reúne para rezar confiante na vinda do Senhor, Ao décimo dia, o Pentecostes.
       Citando um professor, o Pe. Jorge sublinhou que mais do que falar de Maria, pois conhece-se o que Ela diz, importa viver Maria, viver como Ela viveu, com alegria e confiança. Sem alegria não pode haver cristãos saudáveis.
       No final da Eucaristia, o padre pregador deixou à comunidade, para rezar individualmente ou em família, uma oração do papa Francisco, retirada da Sua primeira Encicílica Lumen Fidei:
Ajudai, ó Mãe, a nossa fé.
Abri o nosso ouvido à Palavra,
para reconhecermos a voz de Deus e a sua chamada.
Despertai em nós o desejo de seguir os seus passos,
saindo da nossa terra e acolhendo a sua promessa.
Ajudai-nos a deixar-nos tocar pelo seu amor,
para podermos tocá-Lo com a fé.
Ajudai-nos a confiar-nos plenamente a Ele,
a crer no seu amor, sobretudo nos momentos de tribulação e cruz,
quando a nossa fé é chamada a amadurecer.
Semeai, na nossa fé, a alegria do Ressuscitado.
Recordai-nos que quem crê nunca está sozinho.
Ensinai-nos a ver com os olhos de Jesus,
para que Ele seja luz no nosso caminho.
E que esta luz da fé cresça sempre em nós
até chegar aquele dia sem ocaso que é o próprio Cristo,
vosso Filho, nosso Senhor.

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

LEITURAS: Gabriel Magalhães - Espelho meu

GABRIEL MAGALHÃES. Espelho meu. A leitura diária do Evangelho pode mudar a vida. Paulinas Editora. Prior Velho 2013. 128 páginas.
       Mais um título da coleção "Poéticas do viver crente", coordenada pelo Pe. Tolentino Mendonça.
É um testemunho contado na primeira pessoa. O autor partilha a sua experiência de fé, mostrando como a leitura diária do Evangelho, ainda que um pequeno trecho, pode revolucionar a vida cristã e o compromisso com os outros. Também aqui há conversão e vida nova. O Evangelho, como a participação na Missa, pode passar quase indiferente. Faz parte da tradição. Escuta-se mas sem entrar, sem fazer mossa.
       O autor, como refere, pertence à geração daqueles que  achavam que a Igreja e o cristianismo pertenciam à menoridade, como que paralisando o desenvolvimento lúcido do pensamento e da vida. Aos 24 anos, mais ou menos, revolveu ter o Novo Testamento e lê-lo a partir da sua "perspectiva arrogante", sobretudo como forma de aumentar a cultura geral, já que não passaria disso. Mas a leitura revolucionou a sua vida e a forma de ver o Evangelho, como enriquecimento, como descoberta, como encontro. "Aquele livro era a vida, e a vida era aquele livro... Os Evangelho criam com a realidade uma relação de total fraternidade: de comunhão e de identidade... Os Evangelho são capazes desta transparência por causa da presença de Jesus. Ele é o cristal de amor, através do qual a verdade passa. O que há de mais absoluto nestes textos sagrados são as palavras de Jesus".
       Leitura partilhada do Evangelho. Momentos da vida de Jesus nos quais podemos rever-nos e encontrar-nos.
       Esta é uma reflexão muito interessante. Transparece a vivência quotidiana. Não são palavras de um erudito ou do professor universitário, mas as palavras de um crente cristão que se deixou transformar pelas palavras de Jesus e nos contagia com o seu testemunho. Claramente, a fé não obscurece a vida, pelo contrário e apesar das dificuldades que a todos afetam a fé ilumina, aponta mais para além, justifica e dá sentido à existência.

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Bento XVI - morte e ressurreição de Jesus...

       No seu discurso de despedida, Jesus anunciou aos discípulos sua morte e ressurreição iminentes, com uma frase misteriosa: «Vou partir, mas voltarei para junto de vós» (Jo 14, 28). Morrer é partir. Embora fique ainda o corpo do morto – este pessoalmente partiu para o desconhecido e não podemos segui-lo (cf. Jo 13, 36). Mas, no caso de Jesus, há uma novidade única que muda o mundo. Na nossa morte, a partida é uma realidade definitiva, não há regresso. Pelo contrário Jesus, falando da sua morte, diz: «Vou partir, mas voltarei para junto de vós». É precisamente partindo que Ele vem. A sua partida inaugura um modo totalmente novo e maior da sua presença. Com a sua morte, Jesus entra no amor do Pai. A sua morte é um acto de amor. O amor, porém, é imortal. Por isso, a sua partida transforma-se numa nova vinda, numa forma de presença mais profunda que não acaba mais. Na sua vida terrena, Jesus, como todos nós, estava ligado às condições externas da existência corpórea: a um certo lugar e a um determinado tempo. A corporeidade coloca limites à nossa existência. Não podemos estar contemporaneamente em dois lugares diferentes. O nosso tempo tende a acabar. E entre o "eu" e o "tu" existe o muro da alteridade. Certamente, no amor, podemos de algum modo entrar na existência do outro. Mas permanece a barreira intransponível de sermos diversos. Pelo contrário, Jesus, que agora fica totalmente transformado por meio do acto de amor, está livre de tais barreiras e limites. É capaz não só de passar através das portas externas fechadas, como narram os Evangelhos (cf. Jo 20, 19), mas pode também passar através da porta interna entre o "eu" e o "tu", a porta fechada entre o ontem e o hoje, entre o passado e o amanhã. No dia da sua entrada triunfal em Jerusalém, quando um grupo de Gregos veio pedir para O ver, Jesus respondeu com a parábola do grão de trigo que, para dar muito fruto, deve passar através da morte. Predissera assim o seu próprio destino: Ele não queria simplesmente falar então com este ou aquele grego durante alguns minutos. Através da sua cruz, mediante a sua partida, por meio da sua morte como o grão de trigo chegaria verdadeiramente até junto dos gregos, de tal modo que estes pudessem vê-Lo e tocá-Lo na fé. A sua partida torna-se uma vinda no modo universal da presença do Ressuscitado, no qual Ele está presente ontem, hoje e para sempre; em que abraça todos os tempos e lugares. Agora pode ultrapassar também o muro da alteridade que separa o "eu" do "tu". Assim aconteceu com Paulo, que descreve o processo da sua conversão e do seu Baptismo com estas palavras: «Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim» (Gal 2, 20). Por meio da vinda do Ressuscitado, Paulo obteve uma identidade nova. O seu "eu" fechado abriu-se. Agora vive em comunhão com Jesus Cristo, no grande "eu" dos crentes que se tornaram – segundo definição dele – «um em Cristo» (Gal 3, 28).
       Queridos amigos, deste modo resulta evidente que as palavras misteriosas de Jesus, no Cenáculo, agora – por meio do Baptismo – se tornam de novo presentes para vós. No Baptismo, o Senhor entra na vossa vida pela porta do vosso coração. Já não estamos um ao lado do outro ou um contra o outro. Ele atravessa todas estas portas. A realidade do Baptismo consiste nisto: Ele, o Ressuscitado, vem; vem até vós e une a sua vida com a vossa conservando-vos dentro do fogo vivo do seu amor. Passais a ser uma unidade: sim, um só com Ele e, deste modo, um só entre vós. Num primeiro momento, isto pode parecer bastante teórico e pouco realista. Mas quanto mais viverdes a vida de baptizados, tanto mais podereis experimentar a verdade desta palavra. As pessoas baptizadas e crentes nunca são verdadeiramente estranhas uma à outra. Podem separar-nos continentes, culturas, estruturas sociais ou mesmo distâncias históricas. Mas, quando nos encontramos, reconhecemo-nos com base no mesmo Senhor, na mesma fé, na mesma esperança e no mesmo amor, que nos formam. Então experimentamos que o fundamento das nossas vidas é o mesmo. Experimentamos que, no mais fundo do nosso íntimo, estamos ancorados à mesma identidade, a partir da qual todas as diferenças exteriores, por maiores que sejam, resultam secundárias. Os crentes nunca são totalmente estranhos um ao outro. Estamos em comunhão por causa da nossa identidade mais profunda: Cristo em nós. Deste modo, a fé é uma força de paz e reconciliação no mundo: fica superada a distância, no Senhor tornamo-nos próximos (cf. Ef 2, 13).
       Esta natureza íntima do Baptismo como dom de uma nova identidade é representada pela Igreja através de elementos sensíveis. O elemento fundamental do Baptismo é a água; ao lado desta e em segundo lugar, temos a luz, que, na liturgia da Vigília Pascal, sobressai com grande vigor. Lancemos apenas um olhar sobre estes dois elementos. No capítulo conclusivo da Carta aos Hebreus, encontra-se uma afirmação sobre Cristo, na qual não aparece directamente a água, mas, vista na sua ligação com o Antigo Testamento, deixa transparecer o mistério da água e o seu significado simbólico. Diz o texto: «O Deus da paz fez voltar dos mortos o Pastor grande das ovelhas em virtude do sangue de uma aliança eterna» (cf. 13, 20). Ecoa, nesta frase, um trecho do Livro de Isaías, onde Moisés é designado como o pastor que o Senhor fez sair da água, do mar (cf. 63, 11). Jesus aparece como o novo e definitivo Pastor que leva a cumprimento o que Moisés tinha feito: Ele conduz-nos fora das águas mortíferas do mar, fora das águas da morte. Neste contexto, convém recordar que Moisés tinha sido colocado pela mãe num cesto e deposto no Nilo. Depois, pela providência de Deus, fora tirado para fora da água, trazido da morte à vida, e assim – salvo ele próprio das águas da morte – podia conduzir os outros fazendo-os passar através do mar da morte. Por nós, Jesus desceu às águas obscuras da morte. Mas, em virtude do seu sangue – diz-nos a Carta aos Hebreus – foi feito voltar da morte: o seu amor uniu-se ao do Pai e, assim, da profundidade da morte Ele pôde subir para a vida. Agora eleva-nos a nós da morte para a vida verdadeira. Sim, isto mesmo acontece no Baptismo: Jesus levanta-nos para Ele, atrai-nos para dentro da verdadeira vida. Conduz-nos através do mar frequentemente tão obscuro da história, em cujas confusões e perigos não é raro sentirmo-nos ameaçados de afundar. No Baptismo como que nos toma pela mão, conduz-nos pelo caminho que passa através do Mar Vermelho deste tempo e introduz-nos na vida duradoura, na vida verdadeira e justa. Agarremos bem a sua mão! Suceda o que suceder e implicando mais ou menos connosco, não larguemos a sua mão! Caminharemos então pela via que conduz à vida.
       Em segundo lugar, temos o símbolo da luz e do fogo. Gregório de Tours refere o costume, que em diversos lugares se conservou durante muito tempo, de tomar o fogo novo, para a celebração da Vigília Pascal, directamente do sol por meio de um cristal: luz e fogo recebiam-se novamente, por assim dizer, do céu para depois, a partir deles, se acenderem todas as luzes e fogos do ano. Isto é um símbolo do que celebramos na Vigília Pascal. Com a radicalidade do seu amor, no qual se tocaram o coração de Deus e o coração do homem, Jesus tomou verdadeiramente a luz do céu e trouxe-a à terra – a luz da verdade e o fogo do amor que transformam o ser do homem. Ele trouxe a luz, e agora sabemos quem e como é Deus. De igual modo sabemos também como estão as coisas a respeito do homem: o que somos nós e para que fim existimos. Ser baptizados significa que o fogo desta luz desce ao nosso íntimo. Por isso, na Igreja Antiga, o Baptismo era chamado também o Sacramento da Iluminação: a luz de Deus entra em nós; assim nos tornamos nós próprios filhos da luz. Esta luz da verdade que nos aponta o caminho, não deixemos que se apague. Protejamo-la contra todas as forças que pretendem extingui-la para nos lançar novamente na escuridão de Deus e de nós mesmos. De vez em quando a escuridão pode-nos parecer cómoda. Posso esconder-me e passar a minha vida dormindo. Nós, porém, não somos chamados a viver nas trevas, mas na luz. Nas promessas baptismais, por assim dizer acendemos novamente, ano após ano, esta luz: sim, creio que o mundo e a minha vida não provêm do acaso, mas da Razão eterna e do Amor eterno, são criados por Deus omnipotente. Sim, creio que em Jesus Cristo, na sua encarnação, na sua cruz e ressurreição, se manifestou o Rosto de Deus; que, n’Ele, Deus está presente no meio de nós, nos une e conduz para a nossa meta, para o Amor eterno. Sim, creio que o Espírito Santo nos dá a Palavra da verdade e ilumina o nosso coração; creio que, na comunhão da Igreja, nos tornamos todos um só Corpo com o Senhor e, deste modo, vamos ao encontro da ressurreição e da vida eterna. O Senhor deu-nos a luz da verdade. Esta luz é ao mesmo tempo também fogo, força que nos vem de Deus: uma força que não destrói, mas quer transformar os nossos corações, para nos tornarmos verdadeiramente homens de Deus e para que a sua paz se torne operativa neste mundo.
       Na Igreja Antiga, havia o costume de o Bispo ou o sacerdote, após a homilia, exortar os crentes exclamando: "Conversi ad Dominum – agora voltai-vos para o Senhor". Isto significava, antes de mais, que eles se viravam para o Oriente – na direcção donde nasce o sol como sinal de Cristo que volta, saindo ao seu encontro na celebração da Eucaristia. Nos lugares onde isso, por qualquer razão, não era possível fazer-se, os crentes voltavam-se para a imagem de Cristo na ábside ou para a cruz, a fim de se orientarem interiormente para o Senhor. Com efeito, em última análise era deste facto interior que se tratava: da conversio, de voltar a nossa alma para Jesus Cristo e, n’Ele, para o Deus vivo, para a luz verdadeira. Com isto estava ligada também a outra exclamação, que ainda hoje é dirigida à comunidade cristã, antes do Cânone: "Sursum corda – corações ao alto", fora de todos os enredos das nossas preocupações, dos nossos desejos, das nossas angústias, do nosso alheamento – ao alto, os vossos corações, o vosso íntimo! Nas duas exclamações, somos de algum modo exortados a uma renovação do nosso Baptismo: Conversi ad Dominumsempre de novo nos devemos afastar das direcções erradas, em que tão frequentemente nos movemos com o nosso pensar e agir. Sempre de novo nos devemos voltar para Ele, que é o Caminho, a Verdade e a Vida. Sempre de novo nos devemos tornar "convertidos", com toda a vida voltada para o Senhor. E sempre de novo devemos deixar que o nosso coração seja subtraído à força da gravidade, que o puxa para baixo, e levantá-lo interiormente para o alto: para a verdade e o amor. Nesta hora, agradeçamos ao Senhor, porque Ele, com a força da sua palavra e dos sacramentos sagrados, nos orienta na justa direcção e atrai para o alto o nosso coração. E rezemos-Lhe deste modo: Sim, Senhor, fazei que nos tornemos pessoas pascais, homens e mulheres da luz, repletos do fogo do teu amor. Amen.

Bento XVI, A Alegria da Fé.
Homilia da Vigília Pascal 2008: Agência Ecclesia e Vaticano.

Bento XVI - a fé na vida eterna

       Chegou o momento, porém, de nos colocarmos explicitamente a questão: para nós, hoje a fé cristã é também uma esperança que transforma e sustenta a nossa vida? Para nós aquela é «performativa» – uma mensagem que plasma de modo novo a mesma vida – ou é simplesmente «informação» que, entretanto, pusemos de lado porque nos parece superada por informações mais recentes? Na busca de uma resposta, desejo partir da forma clássica do diálogo, usado no rito do Baptismo, para exprimir o acolhimento do recém-nascido na comunidade dos crentes e o seu renascimento em Cristo. O sacerdote perguntava, antes de mais nada, qual era o nome que os pais tinham escolhido para a criança, e prosseguia: «O que é que pedis à Igreja?». Resposta: «A fé». «E o que é que vos dá a fé?». «A vida eterna». Como vemos por este diálogo, os pais pediam para a criança o acesso à fé, a comunhão com os crentes, porque viam na fé a chave para a «vida eterna». Com efeito hoje, como sempre, é disto que se trata no Baptismo, quando nos tornamos cristãos: é não somente um acto de socialização no âmbito da comunidade, nem simplesmente de acolhimento na Igreja. Os pais esperam algo mais para o baptizando: esperam que a fé – de que faz parte a corporeidade da Igreja e dos seus sacramentos – lhe dê a vida, a vida eterna. Fé é substância da esperança. Aqui, porém, surge a pergunta: Queremos nós realmente isto: viver eternamente? Hoje, muitas pessoas rejeitam a fé, talvez simplesmente porque a vida eterna não lhes parece uma coisa desejável. Não querem de modo algum a vida eterna, mas a presente; antes, a fé na vida eterna parece, para tal fim, um obstáculo. Continuar a viver eternamente – sem fim – parece mais uma condenação do que um dom. Certamente a morte queria-se adiá-la o mais possível. Mas, viver sempre, sem um termo, acabaria por ser fastidioso e, em última análise, insuportável. É isto precisamente que diz, por exemplo, o Padre da Igreja Ambrósio na sua elegia pelo irmão defunto Sátiro: «Sem dúvida, a morte não fazia parte da natureza, mas tornou-se natural; porque Deus não instituiu a morte ao princípio, mas deu-a como remédio. Condenada pelo pecado a um trabalho contínuo e a lamentações insuportáveis, a vida dos homens começou a ser miserável. Deus teve de pôr fim a estes males, para que a morte restituísse o que a vida tinha perdido. Com efeito, a imortalidade seria mais penosa que benéfica, se não fosse promovida pela graça». [6] Antes, Ambrósio tinha dito: «Não devemos chorar a morte, que é a causa de salvação universal» [7].

       Independentemente do que Santo Ambrósio quisesse dizer precisamente com estas palavras, é certo que a eliminação da morte ou mesmo o seu adiamento quase ilimitado, deixaria a terra e a humanidade numa condição impossível e nem mesmo prestaria um benefício ao indivíduo. Obviamente há uma contradição na nossa atitude, que evoca um conflito interior da nossa mesma existência. Por um lado, não queremos morrer; sobretudo quem nos ama não quer que morramos. Mas, por outro, também não desejamos continuar a existir ilimitadamente, nem a terra foi criada com esta perspectiva. Então, o que é que queremos na realidade? Este paradoxo da nossa própria conduta suscita uma questão mais profunda: o que é, na verdade, a «vida»? E o que significa realmente «eternidade»? Há momentos em que de repente temos a sua percepção: sim, isto seria precisamente a «vida» verdadeira, assim deveria ser. Em comparação, aquilo que no dia-a-dia chamamos «vida», na verdade não o é. Agostinho, na sua extensa carta sobre a oração, dirigida a Proba – uma viúva romana rica e mãe de três cônsules –, escreve: no fundo, queremos uma só coisa, «a vida bem-aventurada», a vida que é simplesmente vida, pura «felicidade». No fim de contas, nada mais pedimos na oração. Só para ela caminhamos; só disto se trata. Porém, depois Agostinho diz também: se considerarmos melhor, no fundo não sabemos realmente o que desejamos, o que propriamente queremos. Não conhecemos de modo algum esta realidade; mesmo naqueles momentos em que pensamos tocá-la, não a alcançamos realmente. «Não sabemos o que convém pedir» – confessa ele citando São Paulo (Rm 8,26). Sabemos apenas que não é isto. Porém, no facto de não saber sabemos que esta realidade deve existir. «Há em nós, por assim dizer, uma douta ignorância» (docta ignorantia) – escreve ele. Não sabemos realmente o que queremos; não conhecemos esta «vida verdadeira»; e, no entanto, sabemos que deve existir algo que não conhecemos e para isso nos sentimos impelidos.[8]

       Penso que Agostinho descreve aqui, de modo muito preciso e sempre válido, a situação essencial do homem, uma situação donde provêm todas as suas contradições e as suas esperanças. De certo modo, desejamos a própria vida, a vida verdadeira, que depois não seja tocada sequer pela morte; mas, ao mesmo tempo, não conhecemos aquilo para que nos sentimos impelidos. Não podemos deixar de tender para isto e, no entanto, sabemos que tudo quanto podemos experimentar ou realizar não é aquilo por que anelamos. Esta « coisa » desconhecida é a verdadeira « esperança » que nos impele e o facto de nos ser desconhecida é, ao mesmo tempo, a causa de todas as ansiedades como também de todos os ímpetos positivos ou destruidores para o mundo autêntico e o homem verdadeiro. A palavra «vida eterna» procura dar um nome a esta desconhecida realidade conhecida. Necessariamente é uma expressão insuficiente, que cria confusão. Com efeito, «eterno» suscita em nós a ideia do interminável, e isto nos amedronta; «vida», faz-nos pensar na existência por nós conhecida, que amamos e não queremos perder, mas que, frequentemente, nos reserva mais canseiras que satisfações, de tal maneira que se por um lado a desejamos, por outro não a queremos. A única possibilidade que temos é procurar sair, com o pensamento, da temporalidade de que somos prisioneiros e, de alguma forma, conjecturar que a eternidade não seja uma sucessão contínua de dias do calendário, mas algo parecido com o instante repleto de satisfação, onde a totalidade nos abraça e nós abraçamos a totalidade. Seria o instante de mergulhar no oceano do amor infinito, no qual o tempo – o antes e o depois – já não existe. Podemos somente procurar pensar que este instante é a vida em sentido pleno, um incessante mergulhar na vastidão do ser, ao mesmo tempo que ficamos simplesmente inundados pela alegria. Assim o exprime Jesus, no Evangelho de João: «Eu hei-de ver-vos de novo; e o vosso coração alegrar-se-á e ninguém vos poderá tirar a vossa alegria» (16,22). Devemos olhar neste sentido, se quisermos entender o que visa a esperança cristã, o que esperamos da fé, do nosso estar com Cristo.


Bento XVI, A Alegria da Fé.
Carta Encíclica Spe Salvi, nn 10-12

Papa Francisco - Ressurreição da Carne

Na Audiência Geral do dia 27 de novembro de 2013:


quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Bento XVI - fonte da alegria cristã: amor de Deus

       «A fonte da alegria cristã é esta certeza de sermos amados por Deus, amados pessoalmente pelo nosso Criador., por Aquele que tem nas Suas mãos o universo inteiro e que ama cada um de nós e toda a grande família humana com um amor apaixonado e fiel, um amor maior do que as nossas infidelidades e pecados, um amor que perdoa. Este amor é "de tal maneira grande que chega a virar Deus contra Si mesmo", como se vê de maneira definitiva no mistério da Cruz: "Deus ama tanto o homem que, tendo-Se feito Ele próprio homem, segue-o até à morte e, deste modo, reconcilia justiça e amor" (Deus Caritas est, n.º 10)»

Papa Francisco - Espírito Santo, o protagonista do perdão

Caros irmãos e irmãs, bom dia!
       Na quarta-feira passada falei sobre a remissão dos pecados, referida de modo especial ao Baptismo. Hoje aprofundamos o tema da remissão dos pecados, mas em referência ao chamado «poder das chaves», que é um símbolo bíblico da missão que Jesus confiou aos Apóstolos.
       Antes de tudo, devemos recordar que o protagonista do perdão dos pecados é o Espírito Santo. Na sua primeira aparição aos Apóstolos, no Cenáculo, Jesus ressuscitado fez o gesto de soprar sobre eles, dizendo: «Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados; àqueles a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos» (Jo 20, 22-23). Transfigurado no seu corpo, Jesus já é o homem novo, que oferece os dons pascais, fruto da sua morte e ressurreição. Quais são estes dons? A paz, a alegria, o perdão dos pecados e a missão, mas sobretudo o Espírito Santo, que é fonte de tudo isto. O sopro de Jesus, acompanhado pelas palavras com as quais comunica o Espírito, indica a transmissão da vida, a vida nova regenerada pelo perdão.
       Mas antes de fazer o gesto se soprar e conceder o Espírito, Jesus mostra as suas chagas, nas mãos e no lado: essas feridas representam o preço da nossa salvação. O Espírito Santo concede-nos o perdão de Deus, «passando através» das chagas de Jesus. As feridas que Ele quis conservar; também neste momento, no Céu, Ele mostra ao Pai as chagas com as quais nos resgatou. Em virtude destas feridas, os nossos pecados são perdoados: assim Jesus ofereceu a sua vida pela nossa paz, pela nossa alegria, pelo dom da graça na nossa alma, pelo perdão dos nossos pecados. É muito bom contemplar Jesus assim!
        Consideremos o segundo elemento: Jesus concede aos Apóstolos o poder de perdoar os pecados. É um pouco difícil compreender como um homem pode perdoar os pecados, mas Jesus confere este poder. A Igreja é depositária do poder das chaves, de abrir ou fechar ao perdão. Na sua misericórdia soberana, Deus perdoa cada homem, mas Ele mesmo quis que quantos pertencem a Cristo e à Igreja recebam o perdão mediante os ministros da Comunidade. Através do ministério apostólico, a misericórdia de Deus alcança-me, as minhas culpas são-me perdoadas e é-me conferida a alegria. Deste modo, Jesus chama a viver a reconciliação também na dimensão eclesial, comunitária. E isto é muito bom! A Igreja, que é santa e ao mesmo tempo carente de penitência, acompanha o nosso caminho de conversão durante a vida inteira. A Igreja não é senhora do poder das chaves, mas é serva do ministério da misericórdia e rejubila todas as vezes que pode oferecer este dom divino.
       Talvez muitas pessoas não compreendam a dimensão eclesial do perdão, porque predominam sempre o individualismo e o subjectivismo, e até nós cristãos sentimos isto. Sem dúvida, Deus perdoa cada pecador arrependido, pessoalmente, mas o cristão está unido a Cristo, e Cristo à Igreja. Para nós cristãos há um dom a mais, há sempre um compromisso a mais: passar humildemente através do ministério eclesial. Devemos valorizá-lo; é uma dádiva, uma atenção, uma salvaguarda e também a certeza de que Deus me perdoou. Vou ter com o irmão sacerdote e digo: «Padre, cometi isto...». E ele responde: «Mas eu perdoo-te; Deus perdoa-te!». Naquele momento, estou convicto de que Deus me perdoou! E isto é bom, é ter a segurança que Deus nos perdoa sempre, nunca se cansa de perdoar. E não devemos cansar-nos de ir pedir perdão. Podemos ter vergonha de confessar os nossos pecados, mas as nossas mães e avós já diziam que é melhor corar uma vez do que empalidecer mil vezes. Coramos uma vez, mas os pecados são-nos perdoados e vamos em frente.
       Enfim, um último ponto: o sacerdote, instrumento para o perdão dos pecados. O perdão de Deus, que nos é concedido na Igreja, é-nos transmitido mediante o ministério do nosso irmão, o sacerdote; também ele, um homem que como nós precisa de misericórdia, se torna verdadeiramente instrumento de misericórdia, comunicando-nos o amor ilimitado de Deus Pai. Inclusive os presbíteros e os Bispos devem confessar-se: todos nós somos pecadores. Também o Papa se confessa a cada quinze dias, porque inclusive o Papa é pecador. O confessor ouve os pecados que lhe confesso, aconselha-me e perdoa-me, porque todos nós precisamos deste perdão. Às vezes ouvimos certas pessoas afirmar que se confessam directamente com Deus... Sim, como eu dizia antes, Deus ouve sempre, mas no sacramento da Reconciliação envia um irmão a trazer-nos o perdão, a segurança do perdão em nome da Igreja.
       O serviço que o sacerdote presta como ministro, por parte de Deus, para perdoar os pecados é muito delicado e exige que o seu coração esteja em paz, que o presbítero tenha o coração em paz; que não maltrate os fiéis, mas que seja manso, benévolo e misericordioso; que saiba semear esperança nos corações e sobretudo que esteja consciente de que o irmão ou a irmã que se aproxima do sacramento da Reconciliação procura o perdão, e fá-lo como as numerosas pessoas que se aproximavam de Jesus para serem curadas. O sacerdote que não tiver esta disposição de espírito é melhor que, enquanto não se corrigir, não administre este Sacramento. Os fiéis penitentes têm o direito, todos os fiéis têm o direito de encontrar nos sacerdotes servidores do perdão de Deus.
       Caros irmãos, como membros da Igreja estamos conscientes da beleza desta dádiva que o próprio Deus nos concede? Sentimos a alegria deste esmero, desta atenção materna que a Igreja tem por nós? Sabemos valorizá-la com simplicidade e assiduidade? Não esqueçamos que Deus nunca se cansa de nos perdoar; mediante o ministério do sacerdote, Ele aperta-nos num novo abraço que nos regenera e nos permite erguer-se de novo e retomar o caminho. Porque esta é a nossa vida: devemos erguer-nos sempre de novo e retomar o caminho!
 

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Papa Francisco - Evangelii Gaudium | oração conclusiva

Oração conclusiva da Exortação Apostólica Evangelii Gaudium:
Virgem e Mãe Maria,
Vós que, movida pelo Espírito,
acolhestes o Verbo da vida
na profundidade da vossa fé humilde,
totalmente entregue ao Eterno,
ajudai-nos a dizer o nosso «sim»
perante a urgência, mais imperiosa do que nunca,
de fazer ressoar a Boa Nova de Jesus.

Vós, cheia da presença de Cristo,
levastes a alegria a João o Baptista,
fazendo-o exultar no seio de sua mãe.
Vós, estremecendo de alegria,
cantastes as maravilhas do Senhor.
Vós, que permanecestes firme diante da Cruz
com uma fé inabalável,
e recebestes a jubilosa consolação da ressurreição,
reunistes os discípulos à espera do Espírito
para que nascesse a Igreja evangelizadora.

Alcançai-nos agora um novo ardor de ressuscitados
para levar a todos o Evangelho da vida
que vence a morte.
Dai-nos a santa ousadia de buscar novos caminhos
para que chegue a todos
o dom da beleza que não se apaga.

Vós, Virgem da escuta e da contemplação,
Mãe do amor, esposa das núpcias eternas
intercedei pela Igreja, da qual sois o ícone puríssimo,
para que ela nunca se feche nem se detenha
na sua paixão por instaurar o Reino.

Estrela da nova evangelização,
ajudai-nos a refulgir com o testemunho da comunhão,
do serviço, da fé ardente e generosa,
da justiça e do amor aos pobres,
para que a alegria do Evangelho
chegue até aos confins da terra
e nenhuma periferia fique privada da sua luz.

Mãe do Evangelho vivente,
manancial de alegria para os pequeninos,
rogai por nós.
Amen. Aleluia!

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Catequese | Acolhimento | Avalanches da Fé | Magusto


D. António Couto - Dia da Igreja Diocesana de Lamego

Homilia pronunciada na Igreja Catedral de Lamego, a 24 de Novembro de 2013

IR REQUER MUDANÇA DE LUGAR E DE MODO: IR É NÃO FICAR AQUI E NÃO FICAR ASSIM

1. Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo. Encerramento do Ano da Fé. Dia da nossa Igreja Diocesana. Ordenação Diaconal do José Fonseca Soares.

2. Antes de mais, o título de Rei, com que hoje celebramos o único Senhor da nossa vida. Pode parecer um título ultrapassado e com forte conotação ideológica, que poria Jesus ao nível dos senhores ricos e poderosos deste mundo. Para não resvalarmos para equívocos e terrenos movediços, convém anotar desde já a descrição que o próprio Jesus faz dos Reis: «Os Reis das nações, diz Jesus, dominam sobre elas» (Lucas 22,25). E a sua advertência: «Não seja assim entre vós» (Lucas 22,26). E, todavia, Jesus diz-se Rei, confirmando, neste domínio, as suspeitas de Pilatos (Marcos 15,2; João 18,37).

3. Para sabermos o que é que Jesus tem em vista quando se afirma como Rei, é preciso saber como é que a Escritura traça o perfil do Rei. É como quem pinta um quadro, ou melhor, dois: um díptico. No primeiro quadro, o Rei é alguém muito próximo de Deus, completamente nas mãos de Deus, sempre atento à sua Palavra, de modo que deve ter, para seu uso pessoal, uma cópia da Lei de Deus, feita pela sua própria mão, para não poder dizer que não entende a letra, e deve lê-la todos os dias, nada fazendo por sua conta, mas sempre e só de acordo com a Palavra de Deus (Deuteronómio 17,18-19). No segundo quadro, que completa o primeiro, formando um díptico, o Rei é alguém muito próximo do seu povo, sempre atento ao seu povo, em ordem a levar-lhe a prosperidade, a saúde, a paz, a felicidade, a salvação. Aí está, então, o retrato completo de Jesus Rei: sempre pertinho de Deus, sempre pertinho de nós.

4. O Ano da Fé não se encerra. E não se encerra, porque não se pode encerrar. Exatamente porque a fé não é uma questão de conteúdos que se podem ensinar e aprender num ano, num curso semestral ou anual. Se perguntardes a um bebé porque é que ele se sente seguro no colo da sua mãe, ele não saberá responder. Mas mesmo que soubesse, acharia ridícula a pergunta. Do mesmo modo que perguntar a uma mãe quais são as razões que a levam a segurar no seu colo, com força e carinho, o seu bebé, será considerada uma pergunta sem sentido. Do mesmo modo que deixaríamos Abraão boquiaberto, se lhe fôssemos perguntar quais são os conteúdos da sua fé. Sim, não se acredita em conteúdos. Acredita-se em alguém. É uma relação pessoal, consciente e consistente que vamos tecendo juntos com Deus e uns com os outros por caminhos de confiança e de amor. Abriu-se o Ano da Fé, como Jesus abriu um dia, na sinagoga de Nazaré, o Ano da Graça do Senhor (Lucas 4,19). Entenda-se, então, que este Ano da Graça ou da Fé não é um Ano de 365 dias. É a vida toda, no duplo sentido em que é toda a duração da vida, e em que é mesmo necessário apostar tudo, com toda a intensidade.

5. O aniversário da Dedicação da nossa Igreja Catedral ocorreu no passado dia 20, e nós celebramos hoje o Dia da nossa Igreja Diocesana toda Dedicada ao seu Senhor. Vou contar-vos uma história edificante. O selêucida Antíoco IV Epifânio tinha profanado o Templo de Jerusalém, introduzindo lá cultos pagãos. Este acontecimento remonta ao ano 167 a. C. Contra esta helenização e paganização do judaísmo lutaram os Macabeus, e, no ano 164 a. C., Judas Macabeu procedeu à Purificação do Templo e à sua Dedicação ao Deus Vivo. É este importante acontecimento que deve ser celebrado todos os anos, durante oito dias, com a Festa da Dedicação, a partir do dia 25 do mês de Kisleu, que, no ano em curso de 2013, corresponde ao nosso dia 28 de Novembro.

6. A Festa da Dedicação celebra-se durante oito dias, e tem como símbolo o candelabro de oito braços. Relata o Talmude que, quando os judeus fiéis entraram no Templo profanado pelos pagãos, encontraram uma única âmbula de azeite puro de oliveira para reacender o candelabro de sete braços, que é um dos símbolos de Israel, e que deve arder permanentemente diante do Deus Vivo. Todavia, uma âmbula de azeite duraria apenas um dia, e eram precisos oito dias para preparar novo azeite puro. Pois bem, o azeite daquela única âmbula durou milagrosamente oito dias! Daí que, na Festa da Dedicação, se acenda um candelabro de oito braços. Mas acende-se apenas uma luz por dia, depois do pôr-do-sol, aumentando progressivamente até estarem acesas as oito luzes. Além disso, e ao contrário das luzes do candelabro do Templo e do Sábado, que alumiam o interior do Santuário e da casa de família respetivamente, as Luzes do candelabro da Dedicação, refere o ritual, devem ser vistas cá fora: devem alumiar o ambiente social, político, comercial e cultural. E também ao contrário das luzes do candelabro do Templo e do Sábado, não se acendem todas de uma vez, mas progressivamente uma por dia, porque, quando as condições são adversas, não basta acender uma luz e mantê-la; é preciso aumentar constantemente a luz. Mais luz. Mais luz. Mais luz.

7. Como este simbolismo é importante para os dias de hoje e para a Igreja! «IDE e fazei discípulos», é o lema da nossa Igreja de Lamego para este Ano Pastoral. IR requer mudança de lugar e de modo. IR é não ficar aqui, e não ficar assim! Há tanta gente à espera de que nós lhes levemos Cristo. Obrigado, jovens, por terdes estado na primeira linha com a vossa Alegria contagiante. Como eu desejaria poder ter-vos acompanhado nas vossas avalanches. Peço a todos, sacerdotes, consagrados, fiéis leigos, mais Luz, mais Luz, mais Luz. Mais Dedicação, mais Dedicação, mais Dedicação.

8. Felizmente temos hoje, neste Dia Festivo para a Igreja de Lamego, uma Ordenação Diaconal. De forma visível, o José Fonseca Soares afirma que quer Dedicar a sua vida ao serviço da Caridade e do Evangelho. Que Deus o abençoe e o proteja sempre.

+ António, vosso bispo e irmão, in Diocese de Lamego: AQUI.

Papa Francisco - homilia no encerramento do Ano da Fé

       A solenidade de Cristo Rei do universo, que hoje celebramos como coroamento do ano litúrgico, marca também o encerramento do Ano da Fé, proclamado pelo Papa Bento XVI, para quem neste momento se dirige o nosso pensamento cheio de carinho e de gratidão por este dom que nos deu. Com esta iniciativa providencial, ele ofereceu-nos a oportunidade de redescobrirmos a beleza daquele caminho de fé que teve início no dia do nosso Baptismo e nos tornou filhos de Deus e irmãos na Igreja; um caminho que tem como meta final o encontro pleno com Deus e durante o qual o Espírito Santo nos purifica, eleva, santifica para nos fazer entrar na felicidade por que anseia o nosso coração.
       Desejo também dirigir uma cordial e fraterna saudação aos Patriarcas e aos Arcebispos Maiores das Igrejas Orientais Católicas, aqui presentes. O abraço da paz, que trocarei com eles, quer significar antes de tudo o reconhecimento do Bispo de Roma por estas Comunidades que confessaram o nome de Cristo com uma fidelidade exemplar, paga muitas vezes por caro preço.
       Com este gesto pretendo igualmente, através deles, alcançar todos os cristãos que vivem na Terra Santa, na Síria e em todo o Oriente, a fim de obter para todos o dom da paz e da concórdia.
       As Leituras bíblicas que foram proclamadas têm como fio condutor a centralidade de Cristo: Cristo está no centro, Cristo é o centro. Cristo, centro da criação, do povo e da história.
 
       1. O Apóstolo Paulo, na segunda Leitura tirada da Carta aos Colossenses, dá-nos uma visão muito profunda da centralidade de Jesus. Apresenta-O como o Primogénito de toda a criação: n’Ele, por Ele e para Ele foram criadas todas as coisas. Ele é o centro de todas as coisas, é o princípio: Jesus Cristo, o Senhor. Deus deu-Lhe a plenitude, a totalidade, para que n’Ele fossem reconciliadas todas as coisas (cf. 1, 12-20). Senhor da criação, Senhor da reconciliação.
       Esta imagem faz-nos compreender que Jesus é o centro da criação; e, portanto, a atitude que se requer do crente – se o quer ser de verdade – é reconhecer e aceitar na vida esta centralidade de Jesus Cristo, nos pensamentos, nas palavras e nas obras. E, assim, os nossos pensamentos serão pensamentos cristãos, pensamentos de Cristo. As nossas obras serão obras cristãs, obras de Cristo, as nossas palavras serão palavras cristãs, palavras de Cristo. Diversamente, quando se perde este centro, substituindo-o por outra coisa qualquer, disso só derivam danos para o meio ambiente que nos rodeia e para o próprio homem.
 
       2. Além de ser centro da criação e centro da reconciliação, Cristo é centro do povo de Deus. E hoje mesmo Ele está aqui, no centro da nossa assembleia. Está aqui agora na Palavra e estará aqui no altar, vivo, presente, no meio de nós, seu povo. Assim no-lo mostra a primeira Leitura, que narra o dia em que as tribos de Israel vieram procurar David e ungiram-no rei sobre Israel diante do Senhor (cf. 2 Sam 5, 1-3). Na busca da figura ideal do rei, aqueles homens procuravam o próprio Deus: um Deus que Se tornasse vizinho, que aceitasse caminhar com o homem, que Se fizesse seu irmão.
       Cristo, descendente do rei David, é precisamente o «irmão» ao redor do qual se constitui o povo, que cuida do seu povo, de todos nós, a preço da sua vida. N’Ele, nós somos um só; um só povo unido a Ele, partilhamos um só caminho, um único destino. Somente n’Ele, n’Ele por centro, temos a identidade como povo.
 
       3. E, por último, Cristo é o centro da história da humanidade e também o centro da história de cada homem. A Ele podemos referir as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias de que está tecida a nossa vida. Quando Jesus está no centro, até os momentos mais sombrios da nossa existência se iluminam: Ele dá-nos esperança, como fez com o bom ladrão no Evangelho de hoje.
       Enquanto todos os outros se dirigem a Jesus com desprezo – «Se és o Cristo, o Rei Messias, salva-Te a Ti mesmo, descendo do patíbulo!» –, aquele homem, que errou na vida, no fim agarra-se arrependido a Jesus crucificado suplicando: «Lembra-Te de mim, quando entrares no teu Reino» (Lc 23, 42). E Jesus promete-lhe: «Hoje mesmo estarás comigo no Paraíso» (23, 43): o seu Reino. Jesus pronuncia apenas a palavra do perdão, não a da condenação; e quando o homem encontra a coragem de pedir este perdão, o Senhor nunca deixa sem resposta um tal pedido. Hoje todos nós podemos pensar na nossa história, no nosso caminho. Cada um de nós tem a sua história; cada um de nós tem também os seus erros, os seus pecados, os seus momentos felizes e os seus momentos sombrios. Neste dia, far-nos-á bem pensar na nossa história, olhar para Jesus e, do fundo do coração, repetir-lhe muitas vezes – mas com o coração, em silêncio – cada um de nós: «Lembra-Te de mim, Senhor, agora que estás no teu Reino! Jesus, lembra-Te de mim, porque eu tenho vontade de me tornar bom, mas não tenho força, não posso: sou pecador, sou pecadora. Mas lembra-Te de mim, Jesus! Tu podes lembrar-Te de mim, porque Tu estás no centro, Tu estás precisamente no teu Reino!». Que bom! Façamo-lo hoje todos, cada um no seu coração, muitas vezes: «Lembra-Te de mim, Senhor, Tu que estás no centro, Tu que estás no teu Reino!»
       A promessa de Jesus ao bom ladrão dá-nos uma grande esperança: diz-nos que a graça de Deus é sempre mais abundante de quanto pedira a oração. O Senhor dá sempre mais – Ele é tão generoso! –, dá sempre mais do que se Lhe pede: pedes-Lhe que Se lembre de ti, e Ele leva-te para o seu Reino! Jesus é precisamente o centro dos nossos desejos de alegria e de salvação. Caminhemos todos juntos por esta estrada!
 
Praça de São Pedro, 24 de novembro de 2013: AQUI.

domingo, 24 de novembro de 2013

Catequese | Festa do Acolhimento | Magusto | 2013

       No dia 9 de novembro, na proximidade do São Martinho, na nossa paróquia, antecipando este dia comemorativo, realizámos o Magusto, mais orientado para a catequese, mas aberto a toda a comunidade cristã. Antes do Magusto a primeira festa de catequese, a Festa do Acolhimento aos meninos do primeiro ano de catequese.
       É uma festa muito simples, dentro da Eucaristia vespertina, com crianças, sublinhando precisamente o ACOLHIMENTO que lhes queremos dar, como comunidade, começando por saber quem são. Par eles certamente, foi uma oportunidade de festejar a sua entrada na catequese e uma participação mais ativa na celebração da Eucaristia.
Algumas fotos desta jornada catequética:
Para mais fotos poderá visitar a página da
Paróquia de Tabuaço no Facebook,
ou no GOOGLE +

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Novas bem-aventuranças para a Família

       Temos de ousar interpretar o caminho da família, e da nossa família, em chave de bem-aventurança. Os anos passam, e com eles os acontecimentos, as estações diferenciadas, as múltiplas etapas que compõem a vida. Vamos sendo os mesmos e, simultaneamente, tornámo-nos outros. Gerimos um património afetivo feito de alegrias e esperanças, mas também de algumas feridas e embaraços. Pode até dar-se o caso de sentirmos que o edifício de uma inteira vida ameaça agora sucumbir. É preciso, por isso, que as bem-aventuranças venham em nosso socorro. A bem-aventurança experimenta-se quando permitimos que a força da graça reconfigure a fragilidade da vida. Ela tem a mesma natureza do amor, isto é, é dialógica, dual, tensional. É fruto da relação. É obra de uma aprendizagem espiritual permanente.

Bem-aventuradas as famílias que entendem a sua missão como uma arte de hospitalidade

       O amor é uma forma incondicional de hospitalidade. Na família experimentámos humildemente que não somos donos de nada nem de ninguém: somos testemunhas, elos de uma corrente, companheiros. Acolhemo-nos na gratuidade e só aí. Bem-aventurada a família que não tem a reivindicação de posse que, muitas vezes, é a do amor exageradamente narcísico. Os seus laços são os de uma intimidade que se pode experimentar, mas não dominar; que se pode escutar profundamente, mas sem deter. A ansiedade de dominar é um equívoco. A companhia é outra coisa: é aceitar que somos uns para os outros passagem, epifania, revelação que, na prática do amor, se aprofunda e fortalece. Aceitar, aceitar - que exercício tão difícil, mas absolutamente decisivo para a edificação da família. Aceitar a noite e o nada, o silêncio e a demora, aceitar a graça e fraqueza, a diferenciação e o desapego. E de tudo fazer caminho, na esperança, sem nunca desistir de ninguém.
       Tomemos uma imagem que nos é oferecida por um autor contemporâneo, Luciano De Crescenzo: «Somos anjos de uma asa só. Temos de permanecer abraçados para poder voar». Nesta sugestiva imagem há dois princípios que sobressaem: o princípio da incompletude, cada um de nós possui uma asa apenas; e o princípio da comunhão, que garante que abraçados podemos voar. O que é a experiência de uma família? É a maturada e criativa conjugação destes dois princípios. Com cada homem e cada mulher vem ao mundo algo de novo que nunca antes existiu, algo de inaugural, mas é na construção da reciprocidade que de forma consistente o podemos descobrir. O “eu” tem imperiosa necessidade de ser olhado amorosamente por um outro, de ser acolhido para aventurar-se no risco de ser. Para haver um “eu” tem de existir um “tu”. A vida não se resolve isoladamente. Sozinhos, ficamos inclusive aquém de nós próprios, pois cada um de nós constrói-se no encontro e na relação. Precisamos desse reconhecimento mútuo: um reconhecimento não fundado no confronto ou na competição, mas na gratuidade e no afeto.
       Do princípio da incompletude transitamos assim, muito naturalmente, para o princípio da comunhão: «abraçados podemos voar». A comunhão supõe certamente decisão, esforço e caminho. Porém, não é propriamente de uma conquista que se trata, mas do espanto inesgotável e comum, da abertura, da dádiva, da radical hospitalidade que um oferece ao outro. Isso que surge de forma tão clara nos versos seguintes de Rainer Maria Rilke: «Se me tapares os olhos: ainda poderei ver-te./ Se me tapares os ouvidos: ainda poderei ouvir-te./ E mesmo sem pés poderei ir para ti./ E mesmo sem boca poderei invocar-te». O fundamental concretiza-se numa gratuidade infatigável, numa geografia sem condições nem reservas. O amor não se explica: implica-se. Acontece sem porquês. É uma voluntária hipoteca, um sigilo de sangue, um entrelaça-mento vital. Apenas apreende o amor aquele que sabe, por experiência, o que significa amar. Os que se amam tornam-se cúmplices. E cúmplices não apenas uns dos outros. Tornam-se cúmplices de Deus.

Manfredi (Dino) Quartana, 2010

Bem-aventuradas as famílias que diariamente combatem o analfabetismo dos afetos
       No célebre filme “Cenas da vida conjugal”, de Ingmar Bergman, há uma personagem que diz a dada altura: «Vou revelar-te uma coisa talvez trivial. Em matéria de sentimentos somos analfabetos. E o mais triste é que isso não é verdade apenas para ti ou para mim, mas para quase todos. Aprendemos o que há a aprender sobre o corpo humano, sobre a agricultura no fim do mundo, sobre o pi grego ou como diabo se chama... Mas ninguém se dá conta de que deveríamos aprender primeiro alguma coisa sobre nós próprios e a nossa alma...». Bem-aventurada a família que se propõe combater diariamente este analfabetismo. Os membros de uma família têm de tornar-se naturalmente (e ainda mais, sobrenaturalmente) grandes artesãos do afeto, num amor que nos aceita por inteiro, que abraça o que somos e o que não somos; o que nós fomos e o que nos tornámos. Num amor que ama as nossas possibilidades infinitas e indefinidas; os nossos desabrochares esperançosos e as nossas quedas frustrantes; as nossas liberdades insensatas e a nossa timidez hesitante. Num amor que é, por si, uma arte da confiança que continuamente relança as histórias.
Arturo Martini, 1920

Bem-aventuradas as famílias que compreendem a importância do inútil

       Porque é o inútil tão importante? Vivemos num mundo em que tudoprecisa de ser caucionado por uma qualquer utilidade e isso desvia-nos de um viver gratuito, disponível e autêntico. Só a inutilidade nos dá acesso à polifonia da vida, na sua variedade, nos seus contrastes, na sua realidade densa, na sua surpresa e na sua inteireza. “Foi o tempo que perdeste com a tua rosa, que tornou a tua rosa tão importante para ti”- explicava Saint-Exupéry. Quer dizer: temos de aceitar “perder” para que a relação valha. E perder é mesmo perder: não só tempo, mas também representações prévias, aspirações, projetos, utilidade, vida. O objetivo é poder alcançar aquela plena liberdade da definição que Montaigne propõe: «Se me intimam a dizer porque o amava, sinto que só o posso exprimir respon-dendo: “Porque era ele. Porque era eu”». As relações familiares não podem reduzir-se à gestão do útil, à gestão do que se vê de fora, dominadas por um pragmatismo epidérmico. É preciso perceber como a inutilidade abre clareiras favoráveis à revelação, à palavra, ao verdadeiro conhecimento, ao encontro.
 
Felice Carena, 1929

Bem-aventuradas as famílias que cultivam uma arte da lentidão
       Talvez precisemos voltar a essa arte tão humana que é a lentidão. Os nossos estilos de vida parecem irremediavelmente contaminados por uma pressão que não dominamos; não há tempo a perder; queremos alcançar as metas o mais rapidamente que formos capazes; os processos desgastam-nos, as perguntas atrasam-nos, os sentimentos são um puro desperdício: dizem-nos que temos de valorizar resultados, apenas resultados. À conta disso, os ritmos de atividade tornam-se impiedosamente inaturais. Cada projeto que nos propõem é sempre mais absorvente e tem a ambição de sobrepor-se a tudo. Os horários avançam impondo um recuo da esfera privada. E mesmo estando aí é necessário permanecer contactável e disponível a qualquer momento. Passamos a viver num “open space”, sem paredes nem margens, sem dias diferentes dos outros, sem rituais reconfiguradores, num contínuo obsidiante, controlado ao minuto. Damos por nós ofegantes, fazendo por fazer, atropelados por agendas e jornadas sucessivas em que nos fazem sentir que já amanhecemos atrasados. Deveríamos, contudo, refletir sobre o que perdemos, sobre o que vai ficando para trás, submerso ou em surdina, sobre o que deixamos de saber quando permitimos que a aceleração nos condicione deste modo. Passamos pelas coisas sem as habitar, falamos com os outros sem os ouvir, juntamos informação que nunca chegamos a aprofundar. Tudo transita num galope ruidoso, veemente e efémero. Na verdade, a velocidade com que vivemos impede-nos de viver.
       Uma alternativa será resgatar a nossa relação com o tempo. Por tentativas, por pequenos passos. Ora isso não acontece sem um abrandamento interno. Precisamente porque a pressão de decidir é enorme, necessitamos de uma lentidão que nos proteja das precipitações mecânicas, dos gestos cegamente compulsivos, das palavras repetidas e banais. Precisamente porque nos temos de desdobrar e multiplicar, necessitamos de reaprender o aqui e o agora da presença, de reaprender o inteiro, o intacto, o concentrado, o atento e o uno. Lembro-me de uma história engraçada que ouvi contar à pintora Lourdes Castro. Quando em certos dias o telefone tocava repetidamente, e os prazos apertavam e tudo, de repente, pedia uma velocidade maior do que aquela que é sensato dar, ela e o Manuel Zimbro, seu marido, começavam a andar teatralmente em câmara lenta pelo espaço da casa. E divergindo dessa forma com a aceleração, riam-se, ganhavam tempo e distanciamento crítico, buscavam outros modos, voltavam a sentir-se próximos, refaziam-se.
 
Mario Schifano, 1978-79

Bem-aventuradas as famílias que não deitam fora a caixa dos brinquedos

       Acontece, por vezes, que, à medida que os filhos crescem, desaparece das famílias a caixa dos brinquedos. As casas tornam-se (um pouco) mais ordenadas, aderem a uma rotina perfeita que durante anos não tiveram, numa respeitabilidade estável, segura de si. Principia-se então uma estação de tréguas, sem as surpresas que desesperavam: a chuva de peças órfãs dos seus jogos, os bonecos a ressurgirem onde absolutamente não deviam, o inofensivo módulo encontrado pelo canalizador como única explicação para a monumental avaria. Primeiro respira-se de alívio, portanto. Mas depois, estranhamente, nem tanto. Pois há uma hora em que se percebe a falta que nos faz a caixa dos brinquedos.

       É nessa caixa que se encontram os símbolos, as brincadeiras, os risos distendidos, as férias em família, os aniversários, os jogos intermináveis à volta da mesa com velhos e novos contagiados pelo mesmo entusiasmo, a contemplação carinhosa sem nenhuma finalidade. É nessa caixa que estão as histórias disparatadas e sábias que contamos pela vida fora, aí se conservam os odores, os registos, as palavras de uma canção que cantámos muitas vezes e depois esquecemos, a primeira bicicleta, os livros que nos ofereceram quando ainda não sabíamos ler, os cromos, o silêncio da intimidade, a viagem à aldeia, as conversas à janela voltados para a noite. Nessa caixa está a arte de fazer tempo, de perdê-lo para que se torne mais nosso, permitindo a imaginação, o sentido lúdico, a alegria. A caixa dos brinquedos não serve para nada, e por isso dá-
-nos razões para viver.

       Não nos damos conta do empobrecimento que representa, mas muitos dos conflitos dolorosos que transportamos mais tarde, vida fora, têm aí a sua origem. Lembro-me de uma história que uma querida amiga me contou. O seu pai era juiz em Itália. Um homem severo e absorto, sem tempo a desperdiçar, sem grande vontade de levantar os olhos do seu importante mundo, ainda menos para escutar as minu-dências por que passavam os miúdos. Ela cresceu, formou--se e, durante os primeiros anos, chegou a trabalhar como secretária do pai. Essa proximidade em nada alterou o quadro que conhecia: continuavam dois estranhos, com uma relação puramente formal, e um mundo submerso de coisas por dizer. Ela conta que um dia fizeram uma viagem de trabalho a uma das ilhas gregas. Foram de barco, e podemos imaginar os longos tempos de travessia. De madrugada, porém, sobressaltada, ela percebe que o pai está no seu camarote, a acordá-la. Fixa-o sem perceber bem o que se está a passar. E ele diz-lhe: «Vem ver o sol que está a nascer. É enorme, enorme. Vem depressa. Vais gostar. Vem». Muitos anos depois, o pai já tinha morrido, esta história tinha-se passado há décadas, a minha amiga confiava--me: «Se ele tivesse feito pelo menos mais uma coisa destas, pelo menos mais uma, eu ter-lhe-ia perdoado tudo».
Pablo Picasso, 1947

Bem-aventuradas as famílias que arriscam fazer um bom uso das crises

       Atravessar etapas de crise não é necessariamente mau: permite-nos um olhar a que ainda não havíamos chegado, permite-nos escutar não apenas a vida aparente, mas a insatisfação, a sede de verdade e de sentido, e passar a assumir uma condição mais ativa e assumida. Mudar não significa tornar-se outro, mas fazer uma experiência mais autêntica de si. No fundo, só mudamos quando nos encontramos. Não nos escutarmos, até ao fim, isso sim é desperdiçar uma preciosa ocasião para aceder àquela profundidade que pode devolver sentido à existência. Talvez precisemos descobrir que, no decurso do nosso caminho, os grandes ciclos de interrogação, a intensificação da procura, os tempos de impasse, as experiências de crise podem representar verdadeiras oportunidades. Quanto mais conscientes dos nossos entraves, limites e contradições, mas também das nossas forças e capacidades, tanto mais podemos investir criativamente no sentido da nossa identidade. Isso implica uma mudança de ponto de vista sobre nós próprios e o mundo, e advém daí naturalmente uma instabilidade face a modelos que se tinham por adquiridos. Os partos indolores são uma mistificação. Quem tem de nascer, prepare-se para esbracejar.

       Mas há um momento em que aprendemos que vale mais prestar atenção àquilo que em nós está a germinar, num lento e invisível (e inaudível) processo de gestação, do que àquilo que perdemos.

       Em 1999, uma tempestade varreu drasticamente a Europa. No rastro de desolação, estima-se que terão ficado tombadas cerca de trezentos milhões de árvores. Em França, nas semanas que se seguiram, os gabinetes governamentais elaboraram aprofundados programas de reflorestação, procurando ao mesmo tempo tirar partido do acidente, pois a floresta seria por eles reconstruída com uma racionalidade mais adequada. Mas quando passaram ao terreno, os engenheiros florestais aperceberam-se de que a floresta tinha começado a regeneração mais rapidamente do que supunham. E inclusive, contrariando os planos técnicos, a floresta havia encontrado configurações novas, muito mais vantajosas do que aquelas oficiadas pela abstrata geometria dos gabinetes.
Georges Rouault, 1948
Bem-aventuradas as famílias que dizem de si mesmas: “somos um laboratório para a alegria”

       Tolstoi começa o seu romance “Anna Karenina” dizendo que «Todas as famílias felizes se parecem, mas cada família infeliz é infeliz à sua maneira». A felicidade, porém, é tão singular como o sofrimento. Se o modo de chorar é pessoalíssimo, também o é o modo de rir. Diz-nos Jesus no Evangelho de S. João: «Eu quero que a alegria esteja em vós e a vossa alegria seja completa» (Jo 15,11). E: «Ninguém vos poderá roubar a vossa alegria» (Jo 16,22). Há, portanto, uma alegria que nada nem ninguém nos pode tirar, e que constitui o horizonte da nossa vida. É fundamental que a família coloque os olhos no horizonte e sinta que é para a alegria que está a ser chamada. É para a roda dos eleitos. E, por isso, desloca infatigavelmente o seu coração do peso da sombra para a leveza da luz. Na verdade, somos atravessados, somos conduzidos, somos levados pela mão de uma promessa, e essa promessa é a alegria. A alegria é sempre um dom. A alegria nasce quando eu aceito construir a minha vida numa cultura de hospitalidade. Se insonorizo o meu espaço vital, a alegria não me visita.

       Em vez de crescermos na severidade, na intransigência, na indiferença, no sarcasmo, na maledicência, no lamento, caminhemos esperançosamente no sentido contrário. Cresçamos na simplicidade, na gratidão, no despojamento e na confiança. A alegria tem a ver com uma essencialidade que só na pobreza espiritual se pode acolher. Bem-aventuradas as famílias que dizem de si mesmas: «somos um laboratório para a alegria»; «somos uma escola do sorriso»; «somos um ateliê para a esperança»; «somos uma fábrica para o abraço e para a dança».
Armando Spadini, 1918
Bem-aventuradas as famílias que vivem no aberto do mundo e de Deus
       O tempo de Deus é um tempo aberto. E o aberto o que é? É aceitar que o que vemos neste momento é apenas uma etapa e uma estação. Amar é também ouvir aquilo que é novo a cada momento, acompanhar o fluxo do mistério do tempo. Não tenhamos dúvidas: estamos e continuaremos a estar rodeados de perguntas. Nós próprios somos uma pergunta. Aquilo que o teólogo S. Justino expressava assim, há tantos séculos: «Magna quaestio factus sum me». «Tornei-me para mim mesmo uma grande pergunta!» A família é hoje também uma pergunta. Precisaremos talvez trocar o nosso conhecimento muito assertivo, dispondo-nos a aprender, ouvindo, tentando estabelecer o pacto, a aliança, mas nunca a partir de teorias fechadas. Temos de viver o aberto, a transformação e a abertura permanente. Só a reversibilidade nos dá a experiência profunda da salvação. Bem-aventuradas as famílias que sabem que o tempo é uma arte, uma recriação pascal.

       Ser é habitar, em criativa continuação, o seu próprio inacabado e o do mundo. O inacabado liga-se, é verdade, com o vocabulário da vulnerabilidade, mas também (e eu diria, sobretudo) com a experiência de reversibilidade e de reciprocidade. A vida de cada um de nós não se basta a si mesma: precisaremos sempre do olhar do outro. A vida só por intermitências se resolve individualmente, pois o seu sentido só se alcança na partilha e no dom.

Este texto integra o número 20 do "Observatório da Cultura" (novembro 2013).

José Tolentino Mendonça
Pontifícia Universidade Católica-Minas, Belo Horizonte, Brasil, 20.7.2013

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Papa Francisco - quem de vós sabe a data o batismo?

 Prezados irmãos e irmãs, bom dia!
       No Credo, através do qual cada domingo fazemos a nossa profissão de fé, nós afirmamos: «Professo um só baptismo, para o perdão dos pecados». Trata-se da única referência explícita a um Sacramento no contexto do Credo. Com efeito, o Baptismo constitui a «porta» da fé e da vida cristã. Jesus Ressuscitado deixou aos Apóstolos esta exortação: «Ide pelo mundo inteiro e pregai o Evangelho a toda a criatura. Quem crer e for baptizado será salvo» (Mc 16, 15-16). A missão da Igreja é evangelizar e perdoar os pecados através do sacramento baptismal. No entanto, voltemos às palavras do Credo. Esta expressão pode ser dividida em três pontos: «professo»; «um só baptismo»; e «para o perdão dos pecados».
       «Professo». O que quer dizer isto? É um termo solene, que indica a grande importância do objecto, ou seja, do Baptismo. Com efeito, pronunciando estas palavras, nós afirmamos a nossa verdadeira identidade de filhos de Deus. Num certo sentido, o Baptismo é o bilhete de identidade do cristão, a sua certidão de nascimento e o acto de nascimento na Igreja. Todos vós conheceis o dia em que nascestes e festejais o vosso aniversário, não é verdade? Todos nós festejamos o aniversário. Dirijo-vos uma pergunta, que já formulei outras vezes, mas volto a apresentá-la: quem de vós se recorda da data do seu próprio Baptismo? Levantem a mão: são poucos (e não o pergunto aos Bispos, para que não se envergonhem...). Mas façamos uma coisa: hoje, quando voltardes para casa, perguntai em que dia fostes baptizados, procurai, porque este é o vosso segundo aniversário. O primeiro é do nascimento para a vida e o segundo é do nascimento na Igreja. Fareis isto? É um dever que deveis fazer em casa: procuremos descobrir o dia em que nascemos na Igreja e demos graças ao Senhor porque no dia do Baptismo nos abriu a porta da sua Igreja. Ao mesmo tempo, ao Baptismo está ligada a nossa fé na remissão dos pecados. Com efeito, o Sacramento da Penitência ou Confissão é como um «segundo baptismo», que se refere sempre ao primeiro, para o consolidar e renovar. Neste sentido, o dia do nosso Baptismo é o ponto de partida de um caminho extremamente bonito, um caminho rumo a Deus que dura a vida inteira, um caminho de conversão que é continuamente fortalecido pelo Sacramento da Penitência. Pensai nisto: quando vamos confessar-nos das nossas debilidades, dos nossos pecados, vamos pedir o perdão de Jesus, mas vamos também renovar o Baptismo com este perdão. E isto é bom, é como festejar o dia do Baptismo em cada Confissão. Portanto, a Confissão não é uma sessão numa sala de torturas, mas é uma festa. A Confissão é para os baptizados, para manter limpa a veste branca da nossa dignidade cristã!

       Segundo elemento: «um só baptismo». Esta expressão evoca as palavras de são Paulo: «Um só Senhor, uma só fé, um só baptismo» (Ef 4, 5). Literalmente, a palavra «baptismo» significa «imersão» e, com efeito, este Sacramento constitui uma verdadeira imersão espiritual na morte de Cristo, da qual renascemos com Ele como criaturas novas (cf. Rm 6, 4). Trata-se de um lavacro de regeneração e iluminação. Regeneração, porque realiza aquele nascimento da água e do Espírito, sem a qual ninguém pode entrar no reino dos céus (cf. Jo 3, 5). Iluminação porque, através do Baptismo, a pessoa humana se torna repleta da graça de Cristo, «a verdadeira luz que a todo o homem ilumina» (Jo 1, 9), dissipando as trevas do pecado. Por isso na cerimónia do Baptismo, aos pais dá-se um círio aceso, para significar esta iluminação; o Baptismo ilumina-nos a partir de dentro com a luz de Jesus. Em virtude deste dom, o baptizado é chamado a tornar-se ele mesmo «luz» — a luz da fé que ele recebeu — para os irmãos, especialmente para quantos estão nas trevas e não vislumbram espirais de claridade no horizonte da própria vida.

       Podemos interrogar-nos: para mim, o Baptismo constitui um acontecimento do passado, isolado numa data, aquela que hoje vós procurareis, ou uma realidade viva, que diz respeito ao meu presente, a cada momento? Tu sentes-te forte, com o vigor que Cristo te oferece com a sua morte e ressurreição? Ou sentes-te abatido, esgotado? O Baptismo dá-te força e luz. Sentes-te iluminado, com aquela luz que vem de Cristo? És homem e mulher de luz? Ou és uma pessoa obscura, sem a luz de Jesus? É preciso assimilar a graça do Baptismo, que constitui uma dádiva, e tornar-se luz para todos!

       Finalmente, uma breve referência ao terceiro elemento: «para o perdão dos pecados». No sacramento do Baptismo são perdoados os pecados, o pecado original e todos os nossos pecados pessoais, assim como todas as penas do pecado. Mediante o Baptismo abre-se a porta a uma novidade de vida concreta, que não é oprimida pelo peso de um passado negativo, mas já pressente a beleza e a bondade do Reino dos céus. Trata-se de uma intervenção poderosa da misericórdia de Deus na nossa vida, para nos salvar. Esta intervenção salvífica não priva a nossa natureza humana da sua debilidade — todos nós somos frágeis, todos somos pecadores — e também não nos priva da responsabilidade de pedir perdão cada vez que erramos! Não me posso baptizar várias vezes, mas posso confessar-me e deste modo renovar a graça do Baptismo. É como se eu fizesse um segundo Baptismo. O Senhor Jesus é deveras bondoso e nunca se cansa de nos perdoar. Inclusive quando a porta que o Baptismo nos abriu para entrar na Igreja se fecha um pouco, por causa das nossas fraquezas e dos nossos pecados, a Confissão volta a abri-la precisamente porque é como um segundo Baptismo que nos perdoa tudo e nos ilumina para irmos em frente com a luz do Senhor. Vamos em frente assim, cheios de alegria, porque a vida deve ser vivida com o júbilo de Jesus Cristo; e esta é uma graça do Senhor!
 

D. António Couto - meu irmão de novembro: o Amigo n.º 3

       1. Trago hoje uma antiga história rabínica, edificante, que se ajusta bem a este tempo de Novembro. Um homem tinha três amigos. Mas tinha-os catalogados por ordem de importância: o amigo n.º 1, o amigo n.º 2 e o amigo n.º 3. O amigo n.º 1 era naturalmente o melhor amigo do nosso homem; digamos que eram amigos íntimos, e, por isso, inseparáveis: andavam sempre juntos. O amigo n.º 2 era aquele amigo que o nosso homem encontrava de vez em quando, apenas de vez em quando, altura em que confraternizavam e punham a conversa em dia. O amigo n.º 3 era aquele género de amigo que o nosso homem encontrava muito raramente, por mero acaso, e de quem já nem sequer se lembrava do nome.

        2. Um dia, o nosso homem foi apanhado de surpresa. Chegou-lhe pelo correio uma carta que provinha do palácio do Rei. O nosso homem abriu a carta, leu, releu, e ficou muito preocupado. Tratava-se de uma intimação que obrigava o nosso homem a comparecer no palácio do Rei. Ora, acontece que o nosso homem, o homem desta história, nem sabia o que era um Rei, e muito menos um palácio. Tão pouco sabia o caminho para o palácio. Mas preocupava-o sobretudo o modo como se devia comportar na presença do Rei. Não era o mundo dele.

        3. Ficou aflito. Já nem conseguia comer nem dormir. Apoderou-se dele uma grande tremedeira. Quando isto nos acontece, lembramo-nos naturalmente de recorrer aos amigos. Foi assim que o nosso homem foi desabafar com o seu melhor amigo, o amigo n.º 1. Expôs-lhe o assunto que o preocupava. Tinha sido intimado a comparecer no palácio do Rei, e tinha muito medo, pois nada percebia de palácios e de reis. Foi assim que pediu ao seu amigo n.º 1 o favor de o acompanhar naquela viagem difícil. Nem era nada demais, dado que andavam sempre juntos, eram amigos inseparáveis. O amigo n.º 1 respondeu assim ao nosso homem: é verdade que somos muito amigos; de facto, andamos sempre juntos. Pede-me o que quiseres, que eu estou sempre disposto a ajudar-te; porém, nessa viagem, não te posso acompanhar.

        4. É assim que o nosso homem, desiludido, tem de ir à procura do seu amigo n.º 2. Pô-lo a par do seu problema, e implorou-lhe, da mesma maneira, que o acompanhasse naquela viagem difícil. O amigo n.º 2 ouviu atentamente a exposição do nosso homem, e respondeu assim: sim, disponho-me a acompanhar-te, mas com uma condição: vou contigo, mas só até à porta do palácio; daí para a frente, terás de ir sozinho, pois não te posso acompanhar. O nosso homem, porém, insistiu: mas o meu problema é dentro do palácio, porque eu não entendo nada de reis e de palácios. Compreendo, retorquiu o amigo n.º 2, mas, nesse caso, não te posso mesmo ajudar. Terás de ir sozinho.

        5. Foi então que o nosso homem se pôs a caminho para ver se encontrava o seu amigo n.º 3, aquele amigo de quem já nem se lembrava do nome nem de quando tinha sido a última vez que se tinham encontrado. Com alguma sorte, lá o encontrou. Expôs-lhe o problema, e suplicou-lhe que o acompanhasse naquela viagem difícil. O amigo n.º 3 ouviu atentamente, e nem sequer deixou o nosso homem terminar. Respondeu logo: mas é claro que te acompanho. Até te digo mais: ficaria mesmo muito triste, se soubesse que estavas a braços com esse problema, e não me tivesses dito nada!

        6. A história rabínica termina aqui. Mas, para entendermos o seu alcance, terei de a descodificar. O nosso homem, o homem desta história, sou eu, és tu, pode ser qualquer um de nós. O Rei é Deus. A viagem é a morte. O amigo n.º 1, aquele que anda sempre connosco, é a nossa própria vida, os nossos projetos, os nossos trabalhos, os nossos sonhos, as nossas ambições. De facto, andamos sempre juntos, somos inseparáveis. Todavia, naquela viagem, os nossos projetos e trabalhos não nos podem acompanhar. O amigo n.º 2, aquele que encontramos de vez em quando para confraternizar e pôr a conversa em dia, são os nossos próprios amigos. Aqueles que se mostram dispostos a ir connosco, mas só até à porta… do cemitério! O amigo n.º 3, aquele que muito raramente encontramos, de quem até acabamos por esquecer o nome, mas que até ficaria triste e sentido se não lhe disséssemos nada, e que é o único que nos pode acompanhar, é o Bem que fazemos, o Amor que pomos naquilo que fazemos.

        7. Bem vistas as coisas, está bom de ver que temos de inverter a ordem dos nossos amigos, e passar para 1.º lugar aquele que temos no catálogo em 3.º lugar. Decisivo, decisivo, decisivo é o Amor. Temos de nos encontrar muito mais vezes com este amigo. Na verdade, diz bem S. Paulo, tudo passa; só o Amor permanece (1 Coríntios 13,8). Fica atento, meu irmão de Novembro.

António Couto, in Mesa de Palavras: AQUI.