sábado, 29 de setembro de 2012

XXVI Domingo do Tempo Comum - ano B - 30 de setembro

       1 – Todos, por certo, em alguma ocasião, ouvimos alguém a falar com satisfação do mal alheio, do que aconteceu a este ou aquele. Por um lado, é verdade, com o mal dos outros podemos nós bem. Por outro, mais cedo ou mais tarde, o que de mal acontece aos outros também nos pode bater à porta, ou de algum modo nos afetar, como na atual e persistente crise económico-financeira. Todo o cuidado é pouco. Arremessamos pedras e não nos damos conta que o nosso telhado também é frágil e talvez de vidro simples.
       Dizer mal só por dizer, ou para distrair, pode ser muito mais do que isso, pode ser revelador de inveja, de ciúme, ou ser uma forma de esconder os nossos medos e também as nossas insuficiências. Com efeito, se desviarmos a atenção dos que nos rodeiam para terceiros, ficamos nós com as costas em repouso. Há quem refira mesmo que o que criticamos nos outros é aquilo que não gostamos em nós. Também aqui vale a máxima, nos outros nos revemos a nós (e não apenas nas costas dos outros).
       A sabedoria e a humildade ensinar-nos-ão que os outros têm muitas qualidades que não nos fazem afronta, e que a “sorte” que os invade em nada nos prejudica ou diminui. Com mais ou menos esforço, o bem que vemos espelhado nos outros, pode ser um sinal de esperança para nós, ou o desafio para ultrapassarmos o que agora nos paralisa, ou, ao menos, a certeza que nem tudo vai mal neste reino.
       2 – No evangelho hoje proposto, deparamo-nos com a facilidade com que os apóstolos, com João à cabeça, ficam empertigados e enciumados porque viram alguém, que não andava com eles, a realizar coisas grandiosas: «Mestre, nós vimos um homem a expulsar os demónios em teu nome e procurámos impedir-lho, porque ele não anda connosco».
       Bem diferente é a visão de Jesus: «Não o proibais; porque ninguém pode fazer um milagre em meu nome e depois dizer mal de Mim. Quem não é contra nós é por nós. Quem vos der a beber um copo de água, por serdes de Cristo, em verdade vos digo que não perderá a sua recompensa».
       Jesus inverte o paradigma, pelo menos na versão genuína de Marcos, se não estão contra nós, já estão a nosso favor. A nossa divisão é mais limitativa: quem declaradamente não está por nós, está contra. Também aqui Jesus desafia a abrir a mente e o coração e a escolher a tolerância e o reconhecimento do bem que há nos outros.
     Na primeira leitura encontramo-nos com uma situação em tudo semelhante. Deus fala a Moisés e faz repousar sobre setenta anciãos parte do seu Espírito. Pelo meio, dois outros anciãos, também inscritos mas que não tinham comparecido na tenda, são beneficiados com o mesmo Espírito. Logo “um jovem correu a dizê-lo a Moisés: «Eldad e Medad estão a profetizar no acampamento». Então Josué, filho de Nun, que estava ao serviço de Moisés desde a juventude, tomou a palavra e disse: «Moisés, meu senhor, proíbe-os»”.
       O jovem e Josué, que virá a suceder a Moisés na liderança do povo eleito, entendem que aqueles dois anciãos podem ofuscar a importância do líder, usurpando o seu poder, e possivelmente poderão impedir que eles próprios possam vir a ter uma relevância maior nos afetos de Moisés e do povo.
       Bem diferente é a posição de Moisés: «Estás com ciúmes por causa de mim? Quem dera que todo o povo do Senhor fosse profeta e que o Senhor infundisse o seu Espírito sobre eles!».
 
       3 – Essencial não é saber quem faz melhor, mas que todos façamos o bem, o melhor de nós, o que estiver ao nosso alcance. Não adiemos. Não fiquemos empertigados pelos dons que os outros possuem, ou pela beleza, pela alegria, pela riqueza de outros, pelo sucesso ou admiração que suscitam. Nem tudo é responsabilidade nossa. Não somos deuses. Somos seres humanos. Com limitações, e muitas qualidades. Façamos mais do que nos é pedido. O dia de amanhã constrói-se hoje, aqui e agora. E até a eternidade poderá ser antecipada e experimentada no tempo e na história atuais. Não passemos todo a responsabilidade para os outros, para amanhã, para os políticos ou para os líderes económicos. Há mais vida para lá da crise e da política e das notícias horripilantes que nos entram casa dentro.
        As palavras do apóstolo São Tiago, uma vez mais, são clarividentes e levadas a sério por muito boa gente poderão ajudar a ultrapassar a(s) crise(s). Sem paninhos quentes:
“As vossas riquezas estão apodrecidas e as vossas vestes estão comidas pela traça. O vosso ouro e a vossa prata enferrujaram-se, e a sua ferrugem vai dar testemunho contra vós e devorar a vossa carne como fogo. Acumulastes tesouros no fim dos tempos. Privastes do salário os trabalhadores que ceifaram as vossas terras. O seu salário clama; e os brados dos ceifeiros chegaram aos ouvidos do Senhor do Universo. Levastes na terra uma vida regalada e libertina, cevastes os vossos corações para o dia da matança. Condenastes e matastes o justo e ele não vos resiste”.
       O clamor que se levantava ontem é o mesmo de hoje, contra as injustiças, contra a arrogância e a prepotência, contra a corrupção e a ganância. A partilha, a solidariedade, o compromisso social, a caridade, não são meramente “verbos de encher”, são forma e o jeito de ser cristão e de imitar o Mestre dos Mestres, Cristo Jesus. 

Textos para a Eucaristia (ano B): Num 11, 25-29; Tg 5, 1-6; Mc 9, 38-43.45.47-48.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Tudo tem o seu tempo, tudo tem a sua hora!

Tudo tem o seu tempo, tudo tem a sua hora debaixo do céu:
tempo para nascer e tempo para morrer,
tempo para plantar e tempo para arrancar;
tempo para matar e tempo para curar,
tempo para demolir e tempo para construir;
tempo para chorar e tempo para rir,
tempo para gemer e tempo para dançar;
tempo para atirar pedras e tempo para as juntar,
tempo para se abraçar e tempo para se separar;
tempo para ganhar e tempo para perder,
tempo para guardar e tempo para deitar fora;
tempo para rasgar e tempo para coser,
tempo para calar e tempo para falar;
tempo para amar e tempo para odiar,
tempo para a guerra e tempo para a paz.
       Que aproveita ao homem com tanto trabalho? Tenho observado a tarefa que Deus atribuiu aos homens, para nela se ocuparem. Ele fez todas as coisas apropriadas ao seu tempo e pôs no coração do homem a sucessão dos séculos, sem que ele possa compreender o princípio e o fim da obra de Deus. (Co  3, 1-11)
       Deus fez todas as coisas com sentido, expressão da abundância do Seu amor, que transborda e cria todo o Universo. E fez tudo admiralvelmente. O facto de nem sempre compreendermos o mundo e o tempo que nos envolve, isso não significa que os acontecimentos, a sucessão dos tempos e a história não esteja no coração de Deus.
       O texto de Coeleth aponta-nos para a sabedoria de Deus e para a nossa confiança no Senhor de todas as coisas. Se Deus estivesse ausente do Universo, tudo seria vaidade, passageiro, rotina, vazio, efémero, como líamos ontem. Se Deus é o autor também do tempo, tudo tem um sentido de eternidade.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Roberto Carneiro - Educação, Cidadania, Ano da Fé, Europa

       "O antigo ministro da Educação, em entrevista à FAMÍLIA CRISTÃ, fala sobre um novo modelo educativo de serviço. A palavra servir – tão cristã – leva-nos a estender a conversa a outros focos. Escola, professores, alunos, família, cidadania, Igreja, fé, vida, doença e morte – eis alguns dos assuntos abordados numa conversa de duas horas no edifício da Biblioteca João Paulo II, da Universidade Católica de Lisboa".
 

FC – Quando falta cidadania, quando os portugueses participam muito pouco...
R.C. – Estou preocupado com isso. Há uma clivagem ética, cada um tenta resolver os problemas por si e para si. Esta clivagem ética de toda a Europa mina os seus fundamentos. Recordo-me de um episódio, passado há já alguns anos, quando um jornalista pergunta ao [ensaísta] Eduardo Lourenço qual seria a solução para a Europa. Ele respondeu simplesmente: «A fraternidade cristã.» Na fraternidade cristã somos todos irmãos em Jesus Cristo e filhos do mesmo Pai. Ninguém tem o direito de explorar e maltratar o outro. Esse sentido ético da fraternidade é eu sentir que preciso do outro para a minha felicidade, porque o outro não é senão a outra metade de mim. Sou incompleto se não me completar com o outro. Por conseguinte, uma questão central que temos de recolocar hoje, como há 2000 anos, é: Quem é o meu próximo? Como me posso sentir pobre dele? Que iniciativa devo tomar para dele me aproximar sem nada esperar em retorno?

FC – Em outubro inicia-se o Ano da Fé, que também se cruza com essa questão.
R.C. – A fé faz-nos livres para servir melhor o outro. A fé tem de ser imbuída em sentido de serviço, senão é orgulho pessoal. Ninguém se salva sozinho, salva-se sobretudo no abraço ao outro, no encontro com o outro e pensar que o outro tem sempre coisas fantásticas a dar-me: o sem-abrigo, o imigrante, eventualmente o mendigo andrajoso que nos repugna porque cheira mal... Quando nós achamos que uma pessoa não merece a nossa atenção é porque não a conhecemos. Se eu não a descubro, a culpa é minha. Está ali um filão para descobrir, é um poço onde posso matar a sede. Se eu souber beber do poço dos que estão à minha volta, disponíveis para o diálogo e para a relação, nunca mais terei sede.

FC – Que trabalho tem de ser feito pela Igreja no Ano da Fé?
R.C. – Organizar as comunidades de base. É de baixo para cima, capilarmente, que a Igreja se faz. Há uma grande crise da prática religiosa. Aproveito para dizer que ir ao domingo à Missa não faz ninguém praticante. Praticante é o que põe em prática a Palavra de Cristo. Precisamos de pastores e de uma orientação mais clara neste momento de crise: faça-se ouvir a voz da Igreja Mãe e Mestra. É preciso também rever a cultura em família. A semente tem de ser lançada quando a criança ainda é pequenina, e acarinhada para fazer com que a criança se enamore da pessoa de Cristo. A pessoa que não se enamora não descobre amor, não dá nada. O amor está na base da redenção. Temos de nos enamorar, ler todos os dias a Sagrada Escritura e nela buscar o "rosto de Cristo, meu irmão". Como se pode chegar à fé sem tempos de silêncio para ouvirmos a voz do Pai? O silêncio é, para mim, frequentemente, olhar para o crucifixo, testemunhar a grandeza contida na contingência humana, e escutar...

FC – O que escuta do Pai?
R.C. – Coisas terríveis: «És um soberbo, um orgulhoso, não estejas a dissimular as tuas deficiências, não queiras esconder a tua realidade frágil.»

FC – Que coisas boas lhe diz o Pai?
R.C. – «Estou sempre do teu lado. Nunca te abandonarei.» Sabe, cada vez mais identifico na Vanitas o grande pecado mortal. A vaidade está na raiz de todas as fraquezas humanas, da luxúria, da gula, da preguiça, da inveja, da mentira... e é o orgulho que nos afasta do Pai.

FC – Quando é que o Eng. Roberto Carneiro tem vaidade?
R.C. – Permanentemente. Quando tento parecer o que não sou. Em muitas conferências sou aplaudido. Aplausos para quê? Ajo para o reino de Deus ou para glória pessoal? Reconhecer que se é homem, pecador e frágil é fundamental para se ser salvo.

FC – Sente-se cada vez mais frágil?
R.C. – E dependente... uma dependência cada vez maior com a idade e com algumas maleitas. Às vezes para descer um degrau preciso de ajuda, preciso de um computador para escrever (já não consigo escrever à mão porque tremo), às vezes preciso de ajuda para descodificarem aquilo que digo. É a dependência. A dependência de Deus é total. Entrego-me nas mãos do Pai. Peço-Lhe sem descanso: «Dá-me sentido para isto, dá-me o sentido da vida» – e o sentido da vida e da morte é a dependência. Tornar-se dependente cada vez mais do Pai, é perceber que não se tem vontade própria, de nada nos serve a (van)glória pessoal. Tudo o que se faz bem, faz-se pelo Pai. O que sai bem, é o Pai que nos ajuda, é para glória de Deus e para o progresso do Seu reino que temos de fazer as coisas. Portanto, digo-Lhe: «Faz de mim o que quiseres.» A vida é bela se soubermos apreciá-la no esplendor da dependência do Senhor da História.

FC – Mesmo os amargos de boca...
R.C. – Os amargos de boca têm sentido – ajudam-nos a sentir a nossa fragilidade. Quando morrer espero poder dizer como São Paulo: «Combati o bom combate, cheguei ao fim da corrida e mantive a minha fé.»
 (Entrevista completa, edição de setembro da Família Cristã)

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Testemunho: Viver a FÉ em Angola

       O emigrante também pode rezar e participar nas Eucaristias no país de acolhimento.
       É possível estar com Deus no trabalho.
       Estar com Deus e rezar em Sua casa quando estamos distantes das nossas origens ou da nossa terra… Parece que é difícil arranjar um tempo para podermos estar junto de Deus, mas da mesma maneira que temos tempo para trabalhar e para nos divertirmos devemos arranjar tempo para ir à casa do Pai agradecer pela semana de trabalho e pelos benefícios da semana.
       Eu (Tony) estou por terras de África, em Angola, e vou praticamente todos os Domingos à Missa, onde quer que eu me encontre, no Golungo Alto, em N’Dalatando, ou no Dondo Caxito. Tenho de me levantar às 6h00 da manhã, mas mesmo com sacrifício vou e na Igreja sinto que estou mais perto de casa, sinto que estou mais leve e ajuda-me a passar melhor a semana. Vou sempre sozinho. Somos cerca de 30 portugueses e ninguém me acompanha. E na Igreja também é difícil ver outros portugueses. Acho que os emigrantes só são católicos quando estão de regresso à sua terra. Quando estamos emigrados esquecemos!
       As celebrações aqui são muito bonitas e também muito demoradas, uma missa normal demora cerca de 2 horas, pois os angolanos são muito participativos.
       Já participei em celebrações muito bonitas, tais como a Páscoa, os votos perpétuos de uma Irmã, a chegada de um novo Padre, o Encontro Nacional dos Jovens, no Dondo, que teve a presença das Relíquias de Dom Bosco, Pai, Mestre e Amigo dos Jovens.
       Nas Eucaristias, gosto principalmente dos cânticos e das danças, eles dançam e cantam bastante e animam muito a celebração. Depois, o ofertório solene também é muito participado. As pessoas dão aquilo que às vezes lhes faz falta mas partilham com os outros a contar sempre com a graça de Deus. Partilhar o pouco que têm com quem tem menos isso é lindo. Essas ofertas servem para alimentar o Seminário, os mais pobres, a cadeia, alguns doentes do hospital, etc.
       No encontro nacional dos jovens achei que podiam ter feito mais, achei que foram pouco participativos e acabou por ser quase uma celebração normal, embora com muita dedicação.
       É assim a vida de um emigrante que queira estar com Deus… E que Deus vá cuidando de nós.

Angola, setembro 2012, TONY SILVA, in Boletim Paroquial Santa Eufémia, n. 2

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

As mulheres têm a custódia da vida, na ausência de Deus

       "Os homens têm medo das mulheres. É um medo que vem de longe, de tão longe quanto a vida. É um medo assinalado desde o primeiro dia, e não é só medo do corpo, da face e do coração da mulher, mas também medo da vida e de Deus. Porque estas três realidades estão muito próximas: a mulher, a vida e Deus... As mulheres têm a custódia da vida, durante a ausência de Deus".

domingo, 23 de setembro de 2012

A oração encontra uma brecha de luz

       O itinerário da oração que Jesus indica em Mateus (7,7) e em Lucas (11,9-10) conclui-se numa casa: «Pedi, e ser-vos-á dado; procurai, e encontrareis; batei, e hão de abrir-vos». Pedir só exige a palavra, procurar exige um corpo e uma estrada, bater à porta exige uma casa: depois do limiar, lá dentro, está Alguém. A casa: lugar do pão, do amor e dos nascimentos. E os olhos em que procurar a certeza que conta, de que és atendido e amado. A oração é o ponto onde a solidão cede ao encontro. E a casa é o lugar do encontro, não do eu, não do tu, mas do nós.
       No fim, a oração não encontra um objecto, mas uma porta, uma abertura, uma brecha de luz. Que, à sua imagem, faz de nós uma porta atravessada, um limiar transpassado, prelúdio para uma abraço de que os da terra são parábola e nostalgia.
       No dia a dia, a fé abre o espaço do mistério, na casa abre o espaço do Céu.

ERMES RONCHI, As casas de Maria.

HOJE - às 17h00 - IGREJA PAROQUIAL DE TABUAÇO

sábado, 22 de setembro de 2012

XXV Domingo do tempo Comum - ano B - 23 de setembro

       1 – O anúncio da Cruz é uma evidência na vida de Jesus. Para os cristãos, o anúncio e a identificação com a Cruz de Jesus Cristo é um projeto de vida, a sua maneira de ser. 
       Depois da confissão de fé de Pedro – “Tu és o Messias” –, o anúncio progressivo, mas sem recuos, dos sofrimentos que o Mestre vai enfrentar. Em constante movimento, Jesus anuncia tempos novos, o reino de Deus em ebulição. São Marcos mostra que o Messias, o Ungido do Senhor, é verdadeiro Homem, com sentimentos e emoções, com necessidades (de comer, de beber, de descansar, de ser ouvido) e com sonhos (revolucionar a mente e sobretudo o coração das pessoas), atento a todos, fixando o Seu olhar nas pessoas mais frágeis, naquelas que se apresentam fatigadas, desiludidas, marginalizadas, sem esperança e sem futuro. Ele acolhe, desafia, compreende, ama, perdoa, cura, revoluciona a partir do interior.
       Chegados ao meio do evangelho de Marcos, o caminho do sucesso e da fama, que se vinha a espalhar e a consolidar, dá lugar rapidamente à desilusão (por parte dos discípulos), e ao abandono. O messianismo esperado pelo povo, e pelos discípulos, é político, imposto pela força, com um vendaval de violência e morte, e traduzir-se-ia pela substituição do poder imperial e colonizador por um poder nacional e religioso.
       É neste sentido que vemos Pedro a repreender Jesus por Ele anunciar o fracasso (humano e visível): «O Filho do homem vai ser entregue às mãos dos homens, que vão matá-l’O; mas Ele, três dias depois de morto, ressuscitará».
       A visão de Pedro, e dos demais apóstolos, corresponde à tentação de Satanás: o reino de Deus será do poder, de domínio e de violência sobre os outros. Daí a expressão contundente de Jesus: Afasta-te de mim Satanás. O caminho é outro.
 
       2 – A Cruz é símbolo da entrega total, dádiva por inteiro da Sua vida a favor de todo o povo. É necessário que UM morra por todos. É consequência lógica da Sua vida. Não é um momento. Não se trata de desprezar a VIDA, como dom, mas de recusar o egoísmo e todas as formas de vida que signifiquem destruição dos outros.
       Jesus coloca-Se do lado do pedinte, do órfão e da viúva, do estrangeiro e do perseguido, do pobre e do doente, coloca-Se do lado dos mais frágeis. Segue o caminho da Cruz como serviço. A Cruz não vale e não serve por si mesmo. O cristão acolhe a vida como dádiva, protege-a, ama-a e celebra-a; vida que se partilha e se aprofunda na relação com o próximo. Em Jesus, a Cruz é o desembocar de um caminho permanente de fidelidade a Deus e aos homens. Quem assume a defesa dos mais pobres, cedo sofrerá o desprezo e a perseguição dos mais fortes, dos que vivem pela violência. Jesus sabe isto. Não o esconde. Não faz campanha. Não diplomatiza para ter mais seguidores. Não disfarça o desfecho que se irá impor. Anuncia a paixão, a perseguição, sob o poder das autoridades, incomodando com as palavras mas muito mais com o Seu jeito de viver, de se relacionar, de servir.
       Para Jesus, dar a outra face, deixar-se machucar, é mais humano do que agredir, morrer é muito mais humano do que matar. Ao egoísmo contrapõe o serviço, o amor e o perdão. Ao poder contrapõe a humildade: «Quem quiser ser o primeiro será o último de todos e o servo de todos». E, tomando uma criança, colocou-a no meio deles, abraçou-a e disse-lhes: «Quem receber uma destas crianças em meu nome é a Mim que recebe; e quem Me receber não Me recebe a Mim, mas Àquele que Me enviou».
 
       3 – As palavras da Sabedoria são clarificadoras sobre o justo e a forma como denuncia o mal e os poderosos instalados em seus palácios e a viver à custa do povo.
“Disseram os ímpios: «Armemos ciladas ao justo, porque nos incomoda e se opõe às nossas obras; censura-nos as transgressões à lei e repreende-nos as faltas de educação. Vejamos se as suas palavras são verdadeiras, observemos como é a sua morte. Porque, se o justo é filho de Deus, Deus o protegerá e o livrará das mãos dos seus adversários».
       O justo não procura aniquilar-se, não parte em busca de problemas, ou provocando os outros para a guerra. No entanto, a sua existência é já um atentado a quem pratica declaradamente o mal. Se todos passam indiferentes às injustiças, sobretudo aqueles que pelo seu ofício ou relevância social e religiosa deveriam proteger os mais fragilizados, ou se vivem na mesma corrente de pecado, às tantas até parece que só há um caminho, ou é a forma mais certa de se viver, pois se todos vivem assim! Ora o justo é provocador pelas palavras, denunciando, e muito pela vida de retidão, de justiça e de verdade.
       Quando faltam razões ou vontade para mudar de vida, a melhor maneira, para acabar com o incómodo de quem perturba o nosso descanso e o nosso cinismo, é acabar com a reputação e vida desses que tais, expondo, levantando falsos testemunhos, perseguindo, usando da violência. Foi assim que muitos profetas foram exilados, vitimados pelo boato e pela maledicência, e mortos. É a sorte dos justos. Será o desenlace da escolha de Jesus.
 
       4 – “Como Eu vos fiz, fazei-o vós também”. Estas são as palavras de Jesus quando se coloca de joelhos diante dos apóstolos para lhes lavar os pés, consagrando o serviço como única forma de chegar perto de Deus. Ele que era Mestre e Senhor não Se valeu da Sua igualdade com Deus, mas aniquilou-Se, tornou-Se servo, humilhou-Se em obediência até à morte, até à cruz, como se reza e poetisa na Epístola aos Filipenses. Ele não vem para ser servido, mas para servir e dar a vida pela vida de muitos.
       Pode até doer, levar-nos à Cruz, mas não há outro caminho que nos leve a Deus que não seja o da caridade, do serviço, da verdade, do perdão (ainda e sempre expressão da caridade). O cristão ama a vida que Deus lhe dá em abundância. A vida em qualidade não dispensa o convívio, a festa com os outros, a "ligação" aos demais. Só há luz em nós se estivermos ligados à corrente. A corrente é o Espírito de Deus em nós, que Se torna mais luminosa e consistente se ligada aos outros. Não nos salvamos sozinhos. Não seguimos pela estrada de ninguém. A nossa estrada é aberta para que possamos seguir juntos.
       A Cruz guia-nos pela caridade, pela paz, pela justiça.
       Pelo contrário, como insiste São Tiago,
“onde há inveja e rivalidade, também há desordem e toda a espécie de más ações. Mas a sabedoria que vem do alto é pura, pacífica, compreensiva e generosa, cheia de misericórdia e de boas obras, imparcial e sem hipocrisia. O fruto da justiça semeia-se na paz para aqueles que praticam a paz... Cobiçais e nada conseguis: então assassinais. Sois invejosos e não podeis obter nada: então entrais em conflitos e guerras. Nada tendes, porque nada pedis. Pedis e não recebeis, porque pedis mal, pois o que pedis é para satisfazer as vossas paixões”.
       Voltemos a ler este pedaço da Epístola. À inveja, ao egoísmo, à injustiça, à guerra, opõe-se como purificação e cura o serviço, o amor, o diálogo, o perdão, e a oração, para que a corrente de Deus nos mantenha vigilantes e atentos e prontos para nos ajudarmos.
       A lógica do reino de Deus é a lógica que leva à CRUZ, quem quiser ser o primeiro de todos seja o servo de todos.


Textos para a Eucaristia (ano B): Sab 2, 12.17-20; Tg 3, 16 – 4, 3; Mc 9, 30-37.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Heitor e as 23 lições da felicidade...

Lições sobre a felicidade, sugeridas por Heitor, em "Heitor e a procura da felicidade":
Lição n.º 1: Uma boa maneira de estragar a felicidade é fazer comparações.
Lição n.º 2: A felicidade surge muitas vezes de surpresa.
Lição n.º 3: Muita gente só perpetiva a sua felicidade no futuro.
Lição n.º 4: Muita gente pensa que a felicidade é ser mais rico ou mais importante.
Lição n.º 5: Às vezes a felicidade é não compreender.
Lição n.º 6: A felicidade é uma boa caminhada no meio de belas montanhas desconhecidas.
Lição n.º 7: O erro é acreditar que o objetivo final é a felicidade (explicar melhor).
Lição n.º 8: A felicidade é estar com as pessoas que amamos.
Lição n.º 8 bis: A infelicidade é estar separado daqueles que amamos.
Lição n.º 9: A felicidade é não faltar nada à família.
Lição n.º 10: A felicidade é ter uma ocupação de que se gosta.
Lição n.º 11: A felicidade é ter uma casa e um jardim.
Lição n.º 12: A felicidade é mais difícil feliz num país governado por pessoas más.
Lição n.º 13: A felicidade é sentir-se útil aos outros.
Lição n.º 14: A felicidade é ser-se amado por aquilo que se é.
          Nota: as pessoas são mais simpáticas com uma criança que sorri (muito importante).
Lição n.º 15: A felicidade é sentir-se completamente vivo.
Lição n.º 16: A felicidade é festejar.
          Pergunta: Será a felicidade apenas uma reação química do cérebro?
Lição n.º 17: A felicidade é pensar na felicidade daqueles que amamos.
          Lição n.º 18: A felicidade seria poder amar várias mulheres ao mesmo tempo. (Riscado, as mulheres não estariam pelos ajustes. Para substituir a
Lição n.º 18: A felicidade é não dar demasiada importância à opinião dos outros.
Lição n.º 19: O sol e o mar são a felicidade para todas as pessoas.
Lição n.º 20: A felicidade é uma maneira de ver as coisas.
Lição n.º 21: A rivalidade é um poderoso veneno da felicidade.
Lição n.º 22: As mulheres são mais atentas que os homens à felicidade dos outros.
Lição n.º 23: A felicidade é ocuparmo-nos da felicidade dos outros?
As três lições que o monge lhe sugere:
Lição n.º 20: A felicidade é uma maneira de ver as coisas.
Lição n.º 13: A felicidade é sentir-se útil aos outros.
Lição n.º10: A felicidade é ter uma ocupação de que se gosta.
 in François LELORD, As viagens de Heitor. Heitor e a procura da felicidade. Lua de Papel (Leya), Alfragide 2011.

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

O amor é o que permanece quando nada mais resta

       "O amor é o que permanece quando nada mais resta. Todos temos uma memória no fundo de nós mesmos, quando irrompe a fundura da noite como um canto longínquo, a garantia de que para lá de tudo, para lá até da alegria e da pena, do nascimento e da morte, existe um espaço que nada suplanta, mais forte do que todas as ameaças, que não corre risco algum de destruição, um espaço intacto, o do amor que fundou o nosso ser".

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Festa e Romaria de Santa Eufémia - Pinheiros 2012

       A Festa e Romaria de Santa Eufémia envolve a paróquia de Pinheiros, mas,por certo, é uma festa e romaria para todo o Arciprestado/Concelho de Tabuaço, bem como paróquias vizinhas de Moimenta da Beira, como Castelo e Beira valente, ou de Armamar, Goujoim ou Arícera, entre muitas outras pessoas, vindas de outros lugares.
       O facto desde ano ter calhado ao fim de semana, facilitou a presença de muitas mais pessoas devotas de Santa Eufémia, que acorreram a Pinheiros para agradecer graças solicitadas, concedidas, para cumprir promessas, para fazer pedidos.
Em tempo de turbulência, a fé e a religião são um porto de abrigo. Não apenas um refúgio, mas uma âncora para enfrentar os desafios do tempo presente, para sentir terra, chão firme.
       Ficam algumas imagens da Festa de Santa Eufémia, 1.º e dia principal, a 16 de setembro, e imagens do segundo dia da festa, em honra de Santa Bárbara.
Pregador - Pe. Ricardo Barroco
 Assembleia. Pessoas de variadas paróquias...
 Momento da Comunhão...
 
 
 Segundo dia: celebração da Santa Missa, no largo da Capela de Santa Bárbara

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

D. António Couto sobre austeridade e caridade


Jillian Jensen - Who You Are | X Factor USA

       Jillian Jensen, de 19 anos, foi desde muito nova vítima de bullying na escola e procurou sempre apoio na música para se sentir melhor. Este ano decidiu participar no X Factor e protagonizou um dos momentos mais emocionantes deste programa. A jovem conseguiu deixar várias pessoas com lágrimas nos olhos, inclusive o próprio Simon, que recebeu o seguinte comentário da Demi Lovato: «You have a heart».
Fonte: AQUI

domingo, 16 de setembro de 2012

D. Manuel Clemente - Carta a Diogneto


Pregador da Festa de Santa Eufémia

       Pe. Ricardo Barroco, natural de Penude, paroquiano de Magueija, paróquias do Arciprestado de Lamego, foi ordenado sacerdote no passado 1 de julho, na Sé Catedral de Lamego, por D. António José da Rocha Couto, Bispo de Lamego.

Por curiosidade que já tínhamos aqui publicado, alguns pontos de contacto:
       A naturalidade é a mesma: PENUDE. Nascemos e fomos baptizados na paróquia de Penude.
       O Ricardo, ainda muito novo foi viver para Magueija. Entre os 2 e os 10/11 anos também vivi em Magueija e aí frequentei a Escola Primária (no Cabeço). Nessa altura, já andava no ciclo, regressei à minha povoação, Matancinha, em Penude. Ele permaneceu em Magueija.
       O Ricardo pertence a uma família - os Barrocos - a que também eu tenho ligações, parentes afastados. Quando era pequeno, diziam aos meus pais que eu saía à parte dos barrocos.
       Saliente-se também que o Ricardo tem um primo sacerdote, o Pe. Horácio Rossas, Comboniano e que se encontra atualmente na Zâmbia, em missão.
       No meu estágio pastoral, no Seminário Menor de Resende, como Diácono, na Equipa Formadora, encontrei o Ricardo Barroco, aluno do 8.º ano e depois do 9.º ano, juntamente com outros que hoje são sacerdotes, o Pe. António Giroto, aliás, são do mesmo ano e que foi o pregador da Festa no ano passado.
       Atualmente e desde há 12 anos ao serviço de paróquias no Arciprestado/Concelho de Tabuaço, e o Pe. Ricardo Barroco, integrou para estágio, a Equipa Sacerdotal do Pe. Amadeu e do Pe. Filipe, algumas paróquias deste Arciprestado: Valença do Douro, Desejosa (com a anexa da Balsa) e Pereiro.

Veja o perfil do Pe. Ricardo Barroco no facebook, bem como álbum de fotos da Ordenação Sacerdotal.

sábado, 15 de setembro de 2012

XXIV Domingo do Tempo Comum - ano B - 16 de setembro

       1 – A Epístola de São Tiago, segunda leitura, lavra a ligação íntima e fundamental entre a fé e a vida. O apóstolo exemplifica com situações concretas, reais e exequíveis.
       A religião e a fé em Cristo Jesus compromete-nos com as pessoas que vivem à nossa beira. Assim, o serviço aos mais desfavorecidos (aos órfãos e às viúvas) é inevitável na vivência autêntica da fé, assim como a “não aceção” de pessoas. Hoje, o apóstolo remete para mais uma situação clarificadora. Vale a pena ler atentamente: 
“De que serve a alguém dizer que tem fé, se não tem obras? Poderá essa fé obter-lhe a salvação? Se um irmão ou uma irmã não tiverem que vestir e lhes faltar o alimento de cada dia, e um de vós lhe disser: «Ide em paz. Aquecei-vos bem e saciai-vos», sem lhes dar o necessário para o corpo, de que lhes servem as vossas palavras? Assim também a fé sem obras está completamente morta. Mas dirá alguém: «Tu tens a fé e eu tenho as obras». Mostra-me a tua fé sem obras, que eu, pelas obras, te mostrarei a minha fé”.
       A fé autêntica, a que recebemos de Jesus Cristo, conduz-nos aos outros. Todos somos irmãos. Somos todos filhos de Deus. Quando mais estivermos vinculados a Deus, na oração, na escuta e reflexão da palavra de Deus, tanto mais estaremos ligados e comprometidos com aqueles que Deus colocou na nossa vida, para os servirmos como irmãos, para os acolhermos como presença de Deus.
       2 – Tudo começa n'Ele. A nossa vida. A nossa fé. A nossa conversão. Em Jesus Cristo, Deus vem ao nosso encontro, entra na nossa história, abre-nos as portas do Céu, reconcilia-nos com Ele, com os outros, com o mundo. Jesus clarifica o CAMINHO para Deus, precisamente com o serviço caritativo aos outros. Não vamos sós. Não estamos sós. Não nos salvamos sozinhos. Ele precede-nos. Dá o exemplo. Vive connosco no meio de nós. Atrai-nos com as palavras e com o pão, com a voz e com a Sua vida feita oração ao Pai e oferenda à humanidade.
       Não há compromisso social puro, autêntico, libertador, se antes não se der um encontro transformador com Jesus Cristo. A fé é DOM recebido, acolhido e aprofundado na partilha. A fé há de levar-nos a imitá-l'O, pelo que nos compromete nas obras, como expressão, visualização, e comprovação da nossa adesão firme a Jesus e ao Seu Evangelho de caridade.
       Tudo se inicia em Jesus. Ele desce de Deus e traz-nos Deus. Mas não Se impõe. Cabe-nos acolher a nossa vocação, o Seu chamamento. Cabe-nos escolher o caminho que nos guia ao CAMINHO. Cabe-nos, livremente, aceitar a salvação que Ele nos dá, deixarmos que a nossa vida se transforme por inteiro, interior e exteriormente, e sermos portadores desta boa notícia em nós, pelas palavras, pela profissão de fé, pela vida, pelas obras que resultam da nossa conversão a Jesus e do amor que nos habita, pelo Seu Santo Espírito.
       3 – É nesta lógica que Jesus exige de nós uma clara decisão. Não Se impõe mas propõe um caminho. Confronta-nos com a nossa escolha. Ainda que sejamos peregrinos, em conversão permanente, somos impelidos a responder por nós e com a nossa vida.
       Pergunta-nos Jesus, como o fez aos discípulos daquele tempo: «E vós, quem dizeis que Eu sou?»
       Não basta a opinião dos outros. Não vale responder com o que ouvimos dizer, ou com a opinião corrente. Jesus pergunta-lhes e pergunta-nos: «Quem dizem os homens que Eu sou?» As respostas podem ser variadas: João Baptista; Elias; um dos profetas…
       Mas chega um momento em que se tornam insuficientes as respostas dos outros, precisamos de responder por nós. Quem é Jesus para mim? Que importância tem na minha vida? De que forma influencia as minhas escolhas na minha relação com os outros, com o mundo e comigo mesmo? Toca a minha alma? Mobiliza-me para a comunhão e para a comunidade? Posso dizer com Pedro: «Tu és o Messias», o enviado de Deus? És Deus para mim? És a minha salvação, a minha vida, o meu conforto e o meu descanso? És a minha bússola, o meu norte?
       É a nós que Jesus interroga – E vós quem dizeis que Eu sou? –. Que resposta dar? Não assobiemos para o lado como se não fosse nada connosco. É connosco que Jesus está a falar.
       “Deixai fazer, deixai ir, deixar passar” (laissez faire, laissez aller, laissez passer), pode valer para a economia de mercado, na não (ou na pouca) intervenção do Estado, e que pelos vistos não está a ter grande sucesso, mas definitivamente não vale na economia da Salvação. Deus age, vem, coloca-Se à nossa disposição e pede-nos uma resposta ao Seu projeto de salvação, conta connosco.
       4 – Jesus conta connosco mas não contemos com a vida facilitada. Aliás, sublinhe-se desde logo, quem segue um caminho de honestidade e de trabalho cedo descobrirá escolhos e inimigos. Não se pode agradar a toda a gente. «Se alguém quiser seguir-Me, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-Me. Na verdade, quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á; mas quem perder a vida, por causa de Mim e do Evangelho, salvá-la-á».
       Jesus anuncia tempos conturbados: o Filho do homem terá sofrer muito, será rejeitado pelos anciãos, pelos sumos-sacerdotes e pelos escribas; será morto e ressuscitará três dias depois. O sucesso da Sua missão não se vê claramente. Com clareza vê-se que o prosseguimento da Sua missão, do Seu amor, O levará muito rapidamente à morte.
       A contestação de Pedro é expressiva. Depois da sua confissão de fé, não entende que o desfecho não seja de todo positivo e atraente. É o fim das expetativas dos discípulos. E eles que pensavam que o reino de Deus seria imposto sem baixas e sem sofrimento, sem custo e sem esforço! E afinal vai custar pelo menos a vida do Mestre.
       E para que não restem dúvidas, as palavras de Jesus a Pedro são clarificadoras: «Vai-te, Satanás, porque não compreendes as coisas de Deus, mas só as dos homens»...

       5 – Perante as palavras de Jesus, não cabem respostas evasivas. Importa responder com a nossa vida. O caminho pode apresentar dificuldades, mas Ele está do nosso lado. E se está por nós, ninguém nos poderá separar do Seu amor. No sofrimento, na doença, na fragilidade, o que precisamos, muitas vezes, não é que sofram por nós ou nos tirem todas as dores, ou anulem a nossa sensibilidade, mas que possamos contar com um olhar confiante e confidente e nos garantam que não estamos sós, que não nos abandonam, que nos compreendem e que sabem da nossa vulnerabilidade e a aceitam como caminho.
       A Palavra de Deus não promete vida fácil, mas promete a presença permanente de Deus. O Seu olhar não se desviará do nosso, como na Cruz não se desprendeu da Mãe e não se desprendeu do Pai e não se desprendeu de nós. Por isso Ele nos dá Maria por Mãe, para que no seu olhar maternal descubramos e encontremos o olhar confiante e confidente de Deus e a certeza que nem a morte destruirá a nossa vida. Como rezamos com o salmo: “Livrou da morte a minha alma, das lágrimas os meus olhos, da queda os meus pés. Andarei na presença do Senhor, sobre a terra dos vivos... O Senhor guarda os simples: estava sem forças e o Senhor salvou-me”.
       Ou como visualiza o profeta Isaías:
“O Senhor Deus abriu-me os ouvidos e eu não resisti nem recuei um passo. Apresentei as costas àqueles que me batiam e a face aos que me arrancavam a barba; não desviei o meu rosto dos que me insultavam e cuspiam. Mas o Senhor Deus veio em meu auxílio e por isso não fiquei envergonhado… O meu advogado está perto de mim. Pretende alguém instaurar-me um processo? Compareçamos juntos. Quem é o meu adversário? Que se apresente! O Senhor Deus vem em meu auxílio. Quem ousará condenar-me?”
       A certeza que Deus vem salvar-nos, anima-nos a caminhar, conforta-nos, atrai-nos, puxa-nos para a frente e para cima. Compromete-nos. Abre-nos a Céu. Ilumina o nosso esforço e o nosso olhar. Não nos deixa desistir.


Textos para a Eucaristia (ano B): Is 50,5-9a; Sl 114 (116); Tg 2,14-18; Mc 8,27-35.