sábado, 16 de março de 2013

Domingo V da Quaresma - ano C - 17 de março

       1 – No evangelho de São Lucas, no domingo passado, Jesus, através da conhecida parábola do Filho pródigo, mostrou-nos como Deus é um Pai que respira amor, perdoa e faz festa pelo regresso do filho. Hoje, no Evangelho de São João, Jesus testemunha, com palavras e gestos, a opção clara e inequívoca pelo amor, que se traduz no perdão, na proximidade com os outros, no acolhimento das pessoas mais frágeis, tantas vezes excluídas pela sua condição social, religiosa, pela sua origem, ou pela situação em que se encontram, doentes, pecadores, publicanos, mulheres de má vida, e no caso presente uma mulher apanhada em flagrante adultério.
       Os dois evangelhos entrelaçam-se. Jesus não vem para separar, julgar, excluir, vem para salvar, incluir, desafiar-nos a sermos MAIS, a darmos o melhor de nós mesmos, a descobrirmos nos outros a presença de Deus.
       A Lei de Moisés tinha previsto que uma mulher apanhada em flagrante adultério fosse morta por apedrejamento. Ouvimos Jesus a dizer que não vem para anular a Lei mosaica. Ele garante a plenitude da Lei. Como? É o que vemos neste episódio, e em muitas outras situações. A Lei suprema é a CARIDADE, preenchida pelo perdão e pelo bem.


       2 – Vale a pena ler/escutar o evangelho:
Jesus foi para o monte das Oliveiras. Mas de manhã cedo, apareceu outra vez no templo e todo o povo se aproximou d’Ele. Então sentou-Se e começou a ensinar. Os escribas e os fariseus apresentaram a Jesus uma mulher surpreendida em adultério, colocaram-na no meio dos presentes e disseram a Jesus: «Mestre, esta mulher foi surpreendida em flagrante adultério. Na Lei, Moisés mandou-nos apedrejar tais mulheres. Tu que dizes?». Falavam assim para Lhe armarem uma cilada e terem pretexto para O acusar. Mas Jesus inclinou-Se e começou a escrever com o dedo no chão. Como persistiam em interrogá-l’O, ergueu-Se e disse-lhes: «Quem de entre vós estiver sem pecado atire a primeira pedra». Inclinou-Se novamente e continuou a escrever no chão. Eles, porém, quando ouviram tais palavras, foram saindo um após outro, a começar pelos mais velhos, e ficou só Jesus e a mulher, que estava no meio. Jesus ergueu-Se e disse-lhe: «Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou?». Ela respondeu: «Ninguém, Senhor». Disse então Jesus: «Nem Eu te condeno. Vai e não tornes a pecar».
       3 – Jesus recolhe-se no monte das Oliveiras, para alguns momentos de oração e intimidade com o Pai. Regressa à cidade e ao templo. Para ensinar. Todas as horas são boas para ensinar. Nem só de pão vive o homem. A palavra, a abertura de espírito, as razões e o sentido para a vida. Poderemos ter tudo, mas o essencial é que a nossa vida faça sentido, para nós e para os outros, e que descubramos que a nossa luta, o nosso sofrimento, o nosso compromisso, não é em vão. Podemos ter o mundo inteiro, mas se nos faltam razões para viver, a presença dos amigos, a compreensão das nossas limitações, um ombro amigo, se nos falta um FIM pelo qual valha a pena viver, somos miseráveis. Jesus vem para ensinar. Para nos dar Deus. Para nos abrir o Coração do Pai. Para nos revelar um FIM, que não terá fim, será princípio da comunhão plena com Deus.
       A originalidade de alguns fariseus e escribas faz-nos lembrar aquelas pessoas que andam sempre em busca de motivos para denunciar, expor, conflituar, para arranjar confusão, a fim de exibirem a falibilidade dos outros, em contraponto com o heroísmo pessoal. Ou, como refere o célebre psiquiatra brasileiro, denunciando nos outros os próprios defeitos. Apontando para outros, desvia-se a atenção. Mais uma cilada a Jesus. Que fará, cumprirá a lei de Moisés ajudando a matar aquela mulher? E então o perdão e misericórdia que Ele defende?
       Diante d'Ele os acusadores e uma mulher pecadora. Por vezes os gestos são mais eloquentes que muitas explicações. Os acusadores evocam a Lei de Moisés, por que lhes convém. Jesus baixa-se e escreve no chão. Insistem com Ele, interrogam-no. Jesus responde taxativamente: “Quem de entre vós estiver sem pecado atire a primeira pedra”, baixa-se e continua a escrever no chão, a aguardar, provocando uma resposta nova, criativa, original (agora sim) nos seus ouvintes. Frente a Ele fica apenas aquela pobre mulher que já tinha o destino traçado.
       Também aqui é significativa a interação que Jesus provoca: «Mulher, onde estão eles? Ninguém te condenou?». Ela respondeu: «Ninguém, Senhor». Disse então Jesus: «Nem Eu te condeno. Vai e não tornes a pecar».
       Ao perdoar, e compreender, Jesus não sanciona ou aplaude o pecado daquela mulher, nem lhe diz que fez bem, nem a desculpa com os pecados dos outros. Não lhe diz para esquecer e ir à sua vida. Não. Envia-a para uma vida nova, diferente, de compreendida para convertida. VAI. Não VOLTES a pecar. Tens uma oportunidade para refletir, para começar uma vida nova. Não desperdices a tua vida com situações de pecado que te podem levar à morte. Vive positivamente. Encontrar-se com Jesus implica um caminho novo e não regressar à vida anterior. Foi assim com os Magos, é assim com esta mulher. VAI. NÃO VOLTES ao lugar do passado.
       4 – Desde logo a incoerência e a descriminação da lei. A mulher apanhada em adultério era condenada à morte – infelizmente ainda acontece em alguns países, marcados por fundamentalismos radicais –, e o homem que estava com ela nas mesmas circunstâncias? Por justiça, não teriam que ser os dois levados às autoridades e partilhado o mesmo destino? Em que é que se diferencia o pecado cometido por uma mulher ou por um homem?
       É uma descriminação que perdurou, mesmo em ambientes cristãos.
       Por outro lado, não seremos igualmente pecadores, quando provocamos situações para os outros pecarem? Poderemos, por algum momento, colocar-nos acima dos outros? Eles pecadores, nós santos? Os homens e as mulheres mais santas foram/são as pessoas mais compreensivas, tolerantes, acolhedoras, como no caso concreto de Jesus Cristo. Obviamente que em muitas situações a justiça tem de ser reposta, e o perdão não dispensa dessa justiça, sob pena de as vítimas continuarem a sê-lo.

       5 – O novo Papa, na primeira Eucaristia, na Capela Sistina, propôs-nos três verbos essenciais: CAMINHAR, EDIFICAR, PROFESSAR Jesus Cristo crucificado, caminhar sempre, na presença do Senhor, à luz do Senhor, procurando viver com irrepreensibilidade”, só com esta disponibilidade seremos verdadeiros discípulos do Senhor Jesus.
       Deste modo, a postura do cristão não poderá ser diversa da de Jesus Cristo. Neste ambiente se situam as palavras do apóstolo São Paulo: “Considero todas as coisas como prejuízo, comparando-as com o bem supremo, que é conhecer Jesus Cristo, meu Senhor. Por Ele renunciei a todas as para ganhar a Cristo e n’Ele me encontrar… Continuo a correr… Só penso numa coisa: esquecendo o que fica para trás, lançar-me para a frente, continuar a correr para a meta, em vista do prémio a que Deus, lá do alto, me chama em Cristo Jesus”.
       Em nenhuma circunstância o discípulo de Jesus está dispensado de prosseguir o seu caminho, transparecendo Cristo e Cristo crucificado. Diz o Papa Francisco: “Esta vida é um caminho e quando paramos as coisas não correm bem... Quando professamos um Cristo sem cruz não somos discípulos do Senhor”.

       6 – Em tempo de Quaresma, o nosso olhar só pode fixar-se na CRUZ de Jesus, como expressão do amor de Deus, como sinal do perdão e da caridade que Cristo visualiza para nós. Ele vai à frente. Nós seguimo-l'O e o encontro com Ele far-nos-á seguir por um caminho novo. VAI. Não VOLTES à tua vida anterior.
       Ponhamo-nos à escuta, com o olhar vigilante, para acolhermos e descobrirmos o NOVO CAMINHO com o qual Jesus nos presenteia, anunciado desta forma pelo profeta Isaías:
“O Senhor abriu outrora caminhos através do mar, veredas por entre as torrentes das águas... Eis o que diz o Senhor: «Olhai: vou realizar uma coisa nova, que já começa a aparecer; não a vedes? Vou abrir um caminho no deserto, fazer brotar rios na terra árida. Os animais selvagens – chacais e avestruzes – proclamarão a minha glória, porque farei brotar água no deserto, rios na terra árida, para matar a sede ao meu povo escolhido, o povo que formei para Mim e que proclamará os meus louvores».
       Já vislumbramos a Cruz e para lá da CRUZ e por causa da Cruz já nos incendeia a LUZ da ressurreição, a presença luminosa de DEUS.


Textos para a Eucaristia (ano C): Is 43, 16-21; Filip 3, 8-14; Jo 8, 1-11.

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