segunda-feira, 20 de abril de 2015

Será a ressurreição um final feliz?


       Tomáš Halík, comentando o encontro de Jesus Ressuscitado com Tomé, lança o repto: “A ressurreição não é, pois, nenhum «happy-end», mas um convite e um desafio: não devemos e não podemos capitular perante o fogo do sofrimento, mesmo se agora não conseguimos extingui-lo… Onde tu tocares no sofrimento humano, ficas a saber que Eu estou vivo, que «Eu sou». Encontras-me por toda a parte onde os homens sofrem. Não fujas de mim em nenhum destes encontros. Não tenhas medo. Não sejas incrédulo, mas crê!”
       Há uns anos em Salamanca, ouvi, com dois amigos sacerdotes, a voz castelhana de uma mulher a despertar os que, indiferentes, passavam ou se afastavam de uma zaragata entre dois homens: “matam um homem na praça maior e ninguém faz nada”. Assim era: cada pessoa seguia como se nada se estivesse a passar. Rapidamente as pessoas se voltaram e puseram fim àquela bulha.
       Esta tolerância pode matar. Passamos ao lado para não sermos incomodados no futuro. Não queremos "intrometer-nos" na vida dos outros, "entre marido e mulher ninguém meta colher", entre pais e filhos... eles que se entendam! É preferível não ver, não ouvir, não fazer nada... Passamos ao lado, porque não podemos corrigir todo o mal, todos os conflitos. Estes são cada vez mais e mais violentos. Abertura de telejornais, primeiras páginas de jornais e revistas: conflitos, guerras, guetos, violência doméstica, corrupção...
       Esta tolerância não respeita o outro, é indiferença que mata ou deixa morrer!
       Na sua primeira Mensagem para o Dia Mundial da Paz (2014), o Papa Francisco relembra-nos a fraternidade a construir, desejo inscrito no nosso coração. Contudo, lamenta a crescente globalização da indiferença perante o sofrimento alheio. Mais recentemente, na Mensagem para a Quaresma (2015), o Papa volta a insistir na globalização da indiferença que se acentua, remetendo-nos para o mistério da encarnação, morte e ressurreição de Jesus: «A Deus não Lhe é indiferente o mundo, mas ama-o até ao ponto de entregar o seu Filho pela salvação de todo o homem. Na encarnação, na vida terrena, na morte e ressurreição do Filho de Deus, abre-se definitivamente a porta entre Deus e o homem, entre o Céu e a terra».
       A ressurreição sanciona o compromisso preferente de Jesus com os mais frágeis. Como Seus discípulos, não a poderemos transformar num tónico analgésico, mas, num esforço renovado, teremos que levar a ressurreição a todos os recantos onde predominam as trevas, a morte, o sofrimento.

Texto publicado na Voz de Lamego, edição de 14 de abril de 2015

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