sábado, 13 de junho de 2015

XI Domingo do tempo Comum - ano B - 14 de junho

       1 – A vida sempre nos escapa no seu admirável mistério, na compreensão e na vivência. Por mais que reflitamos, por mais experiências que tenhamos, por mais evoluída que esteja a ciência, há sempre um emaranhado de condicionalismos que nos surpreendem. A vida é simultaneamente simples e complexa. Como surge, como evolui no ventre materno, como cresce e se desenvolve o corpo, o cérebro, os sentimentos, a vontade? Como é que somos tão diferentes e tão iguais?
        Há quem queira controlar todos os pormenores da vida, para em nada ser surpreendido e há quem constantemente se deixe surpreender mesmo diante de situações que se repetem. Não é possível controlar todos os movimentos da vida. Podemos levar uma vida certinha, alimentar-nos de forma saudável, praticarmos desporto, tentarmos que os sentimentos não nos traiam nem nos levem por caminhos que previamente não escolhemos e, de repente, uma situação inesperada altera a nossa vida, uma doença, a morte de um familiar, a alteração no trabalho, uma palavra ou um gesto que nos magoou! No lado oposto, deixarmo-nos levar como as folhas de outono pelo vento, nas diferentes direções e modas e tendências e qualquer brisa nos despedaçará.
       O equilíbrio é um caminho possível para absorver a beleza e a alegria da vida.
       Cada um de nós reage de maneira própria a situações semelhantes, mas também, em dois momentos distintos, podemos reagir diversamente perante um quadro similar. A vida, em definitivo, não se escreve a preto e branco. Saber para onde caminhamos, saber o chão que pisamos e o que nos faz viver, poderá ser importante para acolhermos as surpresas da vida! Pode não ser o meio-termo, mas importa que sejamos suficientemente maleáveis para lidar com situações adversas, convictos que nunca estamos preparados para tudo o que possa acontecer.
       Não nos deixemos paralisar com o medo do futuro, com aquilo que virá, de bom ou de mau. Vivamos hoje com toda a garra que nos é possível. Se esperamos pelas possibilidades de amanhã poderemos nunca viver as realidades de hoje e apreciar tudo o que de bom e maravilhoso acontece na nossa vida.
       Para os cristãos há uma segurança definitiva: Deus.
       A confiança pressupõe uma dose de abandono, exigindo, por vezes, fazer como a criança quando se lança para os braços do pai ou da mãe, confiando que vai ficar seguro…


       2 – As parábolas que Jesus utiliza no Evangelho para nos explicar e envolver no Reino de Deus mostram uma profunda certeza: Deus cria e recria o mundo constantemente, mesmo quando tudo parece silencioso, inócuo, sem movimento.
«O reino de Deus é como um homem que lançou a semente à terra. Dorme e levanta-se, noite e dia, enquanto a semente germina e cresce, sem ele saber como. A terra produz por si, primeiro a planta, depois a espiga, por fim o trigo maduro na espiga. E quando o trigo o permite, logo se mete a foice, porque já chegou o tempo da colheita... É como um grão de mostarda, que, ao ser semeado na terra, é a menor de todas as sementes que há sobre a terra; mas, depois de semeado, começa a crescer e torna-se a maior de todas as plantas da horta, estendendo de tal forma os seus ramos que as aves do céu podem abrigar-se à sua sombra».
       Nuances diferentes, a mesma constatação: o reino de Deus não é fruto do ocaso como o não é o mundo em que vivemos. Se observarmos com atenção, na primeira parábola, a semente lançada à terra, noite e dia vai produzindo o seu efeito sem nenhuma intervenção humana, desponta, desabrocha da terra, cresce, produz a espiga e depois o trigo maduro. Assim o mundo se mantém apesar de tudo, da noite e do dia, das violências e das guerras. Deus tudo sustenta. Ele dá-nos a semente (a Palavra de Deus), o campo (o mundo, as pessoas) e o fruto (todo o bem que se possa realizar)! Mas conta connosco. Para preparar a terra, lançar a semente, vigiar para que os pássaros ou outros animais não destruam a sementeira, arrancar algumas ervas daninhas quando ainda é possível sem arrancar também o trigo (cf. Mt 13, 24-30) sobretudo o trabalho da ceifa e da colheita. Deus conta comigo e contigo, conta connosco, para construir com mais amor a família de Deus.
       A segunda parábola explicita a esperança. O que é pequeno ao nosso olhar, em Deus tornar-se-á abundante, imenso, maior. Também aqui poderíamos falar de bem-aventuranças, falar da humildade que nos permite abrir o coração e a vontade para juntos, como irmãos, construirmos um mundo justo e fraterno, criando as melhores condições para que transpareça o reino de Deus.


       3 – A vida sem Deus é nada, o nada com Deus é muito, é tudo. Em alternativa, o vazio, o acaso, as coincidências e os destinos, o mundo que nos controla, nos sujeita e nos absorve, aniquilando a nossa memória, a nossa vida por inteiro. Caímos à terra e nada mais. Tornamo-nos pó. Pó somente. E por mais romântico que possa parecer, apelando para a nossa humildade ou indigência, ninguém quer ser apenas pó, desaparecendo para sempre, até da memória dos entes queridos, pois também os que perdurarem hão perecer e com eles desaparecerá qualquer vestígio da nossa existência... fiquem árvores ou filhos ou livros, mas nós não ficaremos. Nada de nós sobrevirá à nossa vida ou à nossa morte!
       Só Deus garante que não seremos apenas pó, ainda que do pó nos tenha chamado à vida, com o Seu Espírito. Voltaremos à terra, mas em Deus não ficaremos enterrados, esquecidos, abandonados aos bichinhos. Como a Jesus, Deus ressuscitar-nos-á, fará surgir um rebento novo, nova vida.
       Belíssimas palavras do profeta Ezequiel: «...Eu próprio arrancarei um ramo novo e vou plantá-lo num monte muito alto. Na excelsa montanha de Israel o plantarei e ele lançará ramos e dará frutos e tornar-se-á um cedro majestoso... E todas as árvores do campo hão de saber que Eu sou o Senhor; humilho a árvore elevada e elevo a árvore modesta, faço secar a árvore verde e reverdeço a árvore seca. Eu, o Senhor, digo e faço».
       E se é assim com a árvore, muito mais será connosco. "O justo florescerá como a palmeira, / crescerá como o cedro do Líbano; / plantado na casa do Senhor, / florescerá nos átrios do nosso Deus". Ou melhor, a árvore é a imagem do reino de Deus e de cada um de nós que se deixa plasmar pelo Espírito do Senhor. É este o pedido da oração de coleta: "Deus misericordioso, fortaleza dos que esperam em Vós, atendei propício as nossas súplicas; e, como sem Vós nada pode a fraqueza humana, concedei-nos sempre o auxílio da vossa graça, para que as nossas vontades e ações Vos sejam agradáveis no cumprimento fiel dos vossos mandamentos".


       4 – São Paulo, na sua segunda missiva aos Coríntios, faz melodia com as demais leituras e orações, fazendo-nos ver que a vida presente é atraída pela vida futura e há de ser já vivida com os olhos postos na eternidade, para que tudo o que façamos não seja em vão, a prazo, ou como passatempo, mas seja para louvor e glória de Deus. Não somos perfeitos. Longe disso. Mas estamos a caminho. Deus segue connosco. Dá-nos Jesus. Dá-nos o Seu Espírito de Amor, que torna presente, sempre, Jesus Cristo, na palavra, nos Sacramentos e na caridade.
       “Nós estamos sempre cheios de confiança, sabendo que, enquanto habitarmos neste corpo, vivemos como exilados, longe do Senhor, pois caminhamos à luz da fé e não da visão clara. E com esta confiança, preferíamos exilar-nos do corpo, para irmos habitar junto do Senhor. Por isso nos empenhamos em ser-Lhe agradáveis, quer continuemos a habitar no corpo, quer tenhamos de sair dele”. A fé ilumina o nosso compromisso presente com a transformação do mundo.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (B): Ez 17, 22-24; Sl 91 (92); 2 Cor 5, 6-10; Mc 4, 26-34.

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