1 – A nossa vida é uma busca incessante.
Nas sábias palavras de Blaise Pascal, o homem ultrapassa infinitamente o homem. Ou seja, o nosso corpo, a nossa identidade corpórea-espiritual não nos confina à nossa dimensão biológica, mas portamos connosco um desejo permanente de ir mais longe, para lá de todas as nossas limitações. Diríamos, como crentes cristãos, que a nossa identidade divina nos faz ansiar pelo Infinito, por Deus, a nossa origem, e, como refere Santo Agostinho, o nosso coração anda inquieto enquanto não repousar no Senhor da vida. Numa outra perspectiva: a nossa vida funda-se na ESPERANÇA que mais à frente nos encontraremos numa situação mais favorável, mais compensadora e que nos fará verdadeiramente felizes.
No fundo, a nossa busca sem fim tem como fim (finalidade) a felicidade que se realizará em plenitude na eternidade mas que experimentamos, e ainda bem, já agora, na nossa vida terrena. Nunca se esgota o nosso desejo de sermos felizes. Por vezes devora-nos na ânsia do prazer imediato, do bem-estar, do comodismo. A felicidade é sempre caminho, compromisso, procura, nunca se esgota nas satisfações biológicas. Há algo maior, a nossa identidade que aponta e nos atrai para Deus.
2 – O encontro de Jesus com a mulher samaritana é, a este propósito, paradigmático. Para lá do contexto em que acontece – um judeu que fala com uma mulher e ainda para mais estrangeira, inimiga –, o ensinamento categórico de Jesus: a salvação é oferecida a todos os povos independentemente da cultura, da história ou da religião. Uma vez mais, o que importa verdadeiramente não é o ponto de partida, a situação actual em que nos encontramos, mas o caminho que podemos fazer. É uma primeira lição.
Depois, o diálogo sobre a verdadeira sede e a verdadeira água.
Jesus diz claramente à mulher samaritana que há uma sede que é bem maior que a sede biológica. Esta precisa de ser saciada e é-o no imediato com água, elemento da natureza. Mas há, em todos nós, uma sede maior, um desejo mais profundo, um sentido para a vida. Como nós, também ela é levada a compreender que muitos acontecimentos na sua vida pessoal, encontros e desencontros, não passaram de tentativas para responder a esta ânsia de felicidade, mas esgotaram-se na brevidade, como quem consome biologicamente os alimentos e precisa de repetidamente se alimentar.
"Se conhecesses o dom de Deus e quem é Aquele que te diz: ‘Dá Me de beber’, tu é que Lhe pedirias e Ele te daria água viva"... A água viva que Jesus nos dá sacia a nossa procura, é resposta aos nossos anseios mais profundos, é um sentido para a vida presente. Por aqui sabemos que as satisfações corporais são passageiras como passageiras são as adversidades actuais, o que permanece é o que fazemos por amor, o que nos liga ao outro, o que nos torna irmãos.
E, por conseguinte, é mais óbvia a resposta que Jesus dá aos seus discípulos quando estes regressam com alimentos: o meu alimento é fazer a vontade de Meu Pai. Vale mais que tudo. Vale sempre. Nem só de pão vive o homem, ainda que aquele seja necessário, mas da Palavra de Deus, que nos impele para a verdade e para a vida.
3 – O povo de Israel experimenta a tentação e o desânimo. Deixa-se vencer pela murmuração contra Deus e contra Moisés. No primeiro Domingo de Quaresma, víamos como Jesus superou as tentações em que o povo fracassou. A referência é e há-de ser sempre: fazer a vontade de Deus.
Hoje, na primeira leitura, ouvimos a ressonância dos murmúrios do povo. Rapidamente se esqueceu das maravilhas de Deus, la libertação do Egipto. Para que todos se lembrem do dia e do local em que se voltaram contra Deus e contra Moisés,... "chamou àquele lugar Massa e Meriba, por causa da altercação dos filhos de Israel e por terem tentado o Senhor, ao dizerem: «O Senhor está ou não no meio de nós?»" Não apenas para recordar, mas sobretudo para que não vença a tentação, mas a fé em Deus.
O salmista faz-nos rezar com as palavras de Deus, com o novo desafio: "Quem dera ouvísseis hoje a sua voz: «Não endureçais os vossos corações, como em Meriba, como no dia de Massa no deserto, onde vossos pais Me tentaram e provocaram, apesar de terem visto as minhas obras»".
4 – A nossa busca, o nosso caminho, não se faz de olhos fechados, mas sob a luz de Jesus Cristo. O encontro com Ele reorienta a nossa procura, dá sentido novo à nossa vida. A alegria da Samaritana é contagiante. Em Cristo, ela descobre o sentido da sua existência, e partilha-o com os habitantes da sua cidade. Eles mesmos fazem a experiência de encontro com Jesus, como Messias de Deus: "Já não é por causa das tuas palavras que acreditamos. Nós próprios ouvimos e sabemos que Ele é realmente o Salvador do mundo".
Não basta ouvir dizer. É fundamental que façamos a experiência de encontro com Jesus Cristo, deixando-O entrar na nossa vida e nas nossas escolhas de bem. Ele não engana.
"Ora, a esperança não engana, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado. Cristo morreu por nós, quando éramos ainda pecadores... Deus prova assim o seu amor para connosco: Cristo morreu por nós, quando éramos ainda pecadores".
É nesta esperança que radicamos a nossa vida crente, a nossa procura, o desejo de sermos felizes, experimentando a felicidade em cada gesto de perdão, de amor e de bem.
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Textos para a Eucaristia (ano A): Ex 17,3-7; Sl 94 (95); Rom 5,1-2.5-8; Jo 4,5-42.
Reflexão Dominical na página da Paróquia de Tabuaço.
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