Todas as pessoas já viveram situações que desejariam não ter vivido.
Por vezes ouvimos alguns a dizerem que se voltassem atrás fariam tudo de novo, repetiriam a vida. Tal não seria possível! A vida não volta para trás. E, claro, todos alterariam alguma coisa. Só não mudam os burros e os sábios, como diz um provérbio chinês. Olhando para trás, se não houvesse nada a mudar, era sinal que nada se tinha aprendido com as diversas experiências, nada se teria aprendido com a própria história. Repetindo tudo, também os erros seriam repetidos.
Obviamente, todos mudaríamos alguma coisa.
Mesmo que saibamos que as circunstâncias em que agimos não nos tivessem antes permitido agir doutra forma. Como nos lembra Ortega y Gasset, nós, somos nós e as nossas circunstâncias. Um comportamento determinado está condicionado por muitos fatores interiores: medo ou confiança, experiência ou inexperiência, coragem ou hesitação, pessimismo ou experiência, e por muitas fatores exteriores: os outros, o tempo, as condições sociais, políticas, económicas, familiares.
Por outro lado deparamos com aqueles que torcem as orelhas: quem me dera voltar atrás, como tudo seria diferente! Ah, como eu mudaria muita coisa!
Mas também não podemos voltar atrás. A nossa vida decide-se e resolve-se no presente e avança impreterivelmente para o futuro, e este só Deus no-lo pode garantir. Cabe-nos viver o presente, o aqui e agora (hic et nunc) da nossa vida, o passado não é recuperável, o futuro a Deus pertence. Carpe diem – colha o dia, viva o momento! Num sentido cristão, positivo, significa que não desculpamos a vida com o passado ou com o futuro mas comprometemo-nos com o nosso semelhante no dia de hoje, nas circunstâncias que nos é dado viver.
Quem me dera voltar atrás!
Em tempo de Quaresma, este poderá ser um bom propósito, não para olhar (simplesmente) para trás, mas para nos "situarmos" (nos imaginarmos) no futuro, quando chegar o dia, se deixarmos, em que, ao voltar-nos para trás, para o passado, tenhamos que fazer tal afirmação, como lamento, como desilusão, como impossibilidade, com a resignação de quem sabe que poderia ter aproveitado a vida, poderia ter vivido bem, com verdade, com alegria, com honestidade, com garra, com história, e agora já não pode fazer nada com o tempo desperdiçado, com as oportunidades que não agarrou... Não vale a pena chorar sobre o leite derramado!
É sintomático o conselho de Santo Inácio de Loyola: “Orai como se tudo dependesse de Deus, trabalhai como se tudo dependesse de vós”.
publicado na Voz de Lamego, n.º 4350, de 16 de fevereiro de 2016
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