1 – «Se mandais o vosso espírito, retomam a vida e renovais a face da terra».
Na resposta salmódica à palavra de Deus reconhecemos que só Ele é o Senhor da Vida, que a dá e a retoma, que no-la devolve. «Como são grandes, Senhor, as vossas obras! A terra está cheia das vossas criaturas. Se lhes tirais o alento, morrem e voltam ao pó donde vieram. Se mandais o vosso espírito, retomam a vida». É o Espírito do Senhor que nos dá a vida. É n'Ele que somos ressuscitados em Cristo Jesus. Surge, neste contexto, a oração de súplica: enviai/mandai o Vosso Espírito, renovai a face da Terra. Parafraseando o nosso Bispo, D. António Couto, na homilia do Crisma, em Tabuaço, é o Espírito de Deus que nos capacita, não para tornar o mundo melhor, mas para criar um mundo novo. Melhor do que o que está poderá ser ainda mau. É urgente criar um mundo novo, com o olhar cheio de Jesus, com o coração cheio do amor de Deus. A salvação já se deu, com a morte e ressurreição de Jesus. Cabe-nos transparecê-la, através das palavras e das obras, através do nosso compromisso sério uns com os outros, sob a dinâmica (ou, nas palavras de D. António, dinamite) do Espírito Santo.
É esse o dinamismo com que Jesus, no primeiro dia da semana, primeiro dia da Nova Criação, Se apresenta vivo no meio dos discípulos e Lhes comunica a paz, dando-lhes o Espírito Santo: «Recebei o Espírito Santo: àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados; e àqueles a quem os retiverdes ser-lhes-ão retidos».
O Espírito que recebemos é dinamismo que nos envia. A mensagem de Jesus é clara. A paz que Ele nos traz, a paz que nos dá, não é para nos adormecer, mas para nos comprometer. Recebei o Espírito e ide, perdoai. Como o Pai Me enviou também Eu vos envio a vós. Recebeste de graça, dai de graça.
2 – «Se mandais o vosso espírito, retomam a vida e renovais a face da terra».
O Espírito que nos renova, tornando-nos criaturas novas, envia-nos de imediato. Não é para amanhã. Não é para quando estivermos bem-dispostos. Não é para quando nos convém. Não é para quando as circunstâncias forem mais favoráveis. Não é para quando tivermos tempo e/ou disponibilidade. É para ontem. Hoje já é tarde. O Espírito Santo é fogo que arde em nós e nos preenche e nos provoca. A paz que Eu vos dou não é a paz do mundo, a paz que Eu vos dou há de inquietar-vos até que a todos chega a vida, chegue a paz, chegue a Boa Nova da salvação.
No relato do Pentecostes, no livro dos Atos dos Apóstolos, o Espírito Santo inunda todo o espaço e sobretudo encharca de luz os Apóstolos. É um vento forte. São como que línguas de fogo que repousam em cada um deles. Todos ficam cheios do Espírito Santo. Não há portas nem janelas que impeçam a chegada de Jesus ao meio dos Seus discípulos; não há obstáculos que impeçam a inundação do Espírito Santo. Só nós, cada um de nós, pode impedir que Jesus continue vivo; só nós, cada um de nós, pode impedir que o Espírito Santo seja chama, fogo, luz, vida nova!
Naquele dia, os apóstolos perderam o medo e a vergonha. O que é decisivo já não sou eu, já não és somente tu. O decisivo é a ação do Espírito Santo em mim que me faz portador da Boa Nova de Jesus. O decisivo passa a ser a responsabilidade e o compromisso que tenho para com os outros. De graça recebi para dar gratuitamente. Já. Aqui e agora. Como Jesus. Falando uma linguagem percetível a todos. Jesus faz-Se entender pela docilidade, pela compaixão, pela ternura; faz-Se compreender pela proximidade, pela delicadeza, pelo amor. É também essa a linguagem que nos aproxima uns dos outros, nos aproxima de Deus e nos leva ao encontro de todos.
3 – «Se mandais o vosso espírito, retomam a vida e renovais a face da terra».
O Espírito Santo irmana-nos, mas não nos anula. Aproxima-nos, mas não nos massifica. Identifica-nos como discípulos de Jesus, mas não nos uniformiza. Por um lado, é o Espírito Santo que verdadeiramente nos torna cristãos. Somos batizados na água e no Espírito. É Ele que nos garante a fé e a profissão da mesma. Sem Espírito Santo como perderíamos dizer que Jesus é o Messias, o Filho de Deus?
Por outro, dá-nos a sabedoria e a fortaleza para nos colocarmos em atitude de saída e de serviço. Saindo de nós, para nos encontrarmos com os outros, fazendo comunidade e servindo-os de todo o coração. O primeiro serviço é precisamente o anúncio do Reino de Deus. Um anúncio que há de frutificar na caridade, reconhecendo que esta será sempre a referência para as palavras e para as obras. Não há pregação que não nos comprometa com a saúde, a alimentação, a habitação, a dignidade da pessoa humana concreta. Mas a caridade só será autêntica se não se fixar em nós mas apontar para Deus, para o Alto, apontar para Jesus, mesmo que essa orientação se fique num primeiro momento por esses gestos preenchidos de alegria, de confiança e de carinho.
A fraternidade constrói-se com o contributo de cada um. Não nos diluímos, desaparecendo, uns nos outros, mas somos diante e com os outros. Temos por fundamento e modelo a Santíssima Trindade: Um só Deus em Três Pessoas, comunhão perfeita de vida e de amor. Com efeito, somos um só Corpo, pois recebemos um só Espírito, todos fomos batizados na morte e na ressurreição de Jesus Cristo.
«Há diversidade de dons espirituais, mas o Espírito é o mesmo. Há diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo». É Deus que opera em nós e cada um recebe d'Ele os dons, não para seu benefício, para em prol do bem comum. O corpo é um todo constituído por diversos membros. Também nós em Cristo, judeus e gregos, portugueses e chineses, somos um só Corpo.
4 – «Se mandais o vosso espírito, retomam a vida e renovais a face da terra».
A oração é o ambiente natural do cristão. Assim é para Jesus. No meio da azáfama arranja tempo para estar com Deus a sós. A sua vida, pode dizer-se com segurança, é oração constante. Isso, porém, não O dispensa de Se retirar para orar, por vezes passando a noite em oração. Os Seus discípulos, para que a sintonia e a sincronização com a vontade de Deus seja permanente, terão de O imitar, dando prioridade à oração. Esta, em nenhuma situação tira tempo para o serviço e o cuidado aos outros.
«Deus do universo, que no mistério do Pentecostes santificais a Igreja dispersa entre todos os povos e nações, derramai sobre a terra os dons do Espírito Santo, de modo que também hoje se renovem nos corações dos fiéis os prodígios realizados nos primórdios da pregação do Evangelho».
A oração da Eucaristia (hoje) faz-nos louvar a Deus pela santificação da Igreja presente nos povos de toda a terra, suplicando pelos Seus dons, para que em nós e através de nós as Suas maravilhas continuem a iluminar o mundo.
Pe. Manuel Gonçalves
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