Nunca como hoje os meios de comunicação social, mas também os meios de transporte, nos tornam tão vizinhos e no entanto continuamos distantes, talvez até mais que no passado.
As pessoas conheciam os vizinhos pelo nome, tinham as portas abertas para quem chegava, e para saírem ao encontro dos outros. Qualquer necessidade poderia ser satisfeita com a ajuda do vizinho. Hoje temos as portas e janelas fechadas, não apenas as de casa mas também as do coração.
No mesmo instante estamos em contacto com o fim do mundo, com alguém que não conhecemos de parte nenhuma mas que nos faz felizes por o vermos, por vermos o sucesso que tem ou nos entristecemos com os desaires daquele ator, daquela cantora, daquela pessoa que lançou uma campanha para ajudar um cão, ou daqueloutro que andou à batatada com a sogra.
E à nossa volta? Tão perto e tão distantes. Passamos e andamos. E o “tudo bem” não é uma pergunta, é uma mera formalidade. Cumprimentamos alguém mas não queremos saber da pessoa. Talvez, como já o referimos por aqui, queiramos saber alguma coisa sobre ela, mas não o que sente, o que precisa, o que se passa na sua vida.
Facilmente estamos em contacto com meio mundo. Trocamos mensagens, informações, o que gostamos, o que lemos, tantas centenas, milhares, de amigos virtuais, gastamos algum ou bastante tempo a postar belas frases, a sugerir pensamentos bem formulados, por vezes para os outros, não para nós, pois não precisamos. Porém, desconhecemos quem mora ao lado, o que faz, o que precisa. Desconhecemos o seu nome. Podemos até cruzar-nos com ele, ou embater contra ele, mas não nos toca. Podemos estar tão perto e tão longe uns dos outros. A aldeia é global, no conhecimento, na informação, na democratização cultural e religiosa, podemos até ser especialistas em bricolage e fabricar a nossa religião e a nossa ideologia. E diga-se que os meios de comunicação social, as redes que nos aproximam virtualmente, são uma oportunidade, um dom de Deus, ajudam a resolver problemas, a diagnosticá-los e formular soluções, a encontrar instrumentos para melhorar a vida uns dos outros, aproximam pessoas, ajudam a encontrar outras que desapareceram, facilitam campanhas de solidariedade, permitem a sensibilização para problemas atuais, de pessoas a animais e à natureza, e por vezes tribalizam-nos em alguns grupos de reflexão, de debate, de acusações, de críticas.
Também o ambiente digital precisa de conversão e é necessário que não desfoque o nosso coração e o nosso olhar das pessoas que nos rodeiam e das suas necessidades. Porque é que as pessoas gritam, pergunta um discípulo ao seu Mestre. Não é pela surdez de algum deles, mas por terem o coração fechado, distante, alheado. Não conseguem escutar-se. Mutatis mutandis, a globalização económica, política, cultural e até religiosa, não corresponde à melhoria na vida das pessoas e não resolve as suas inquietações existenciais. Por outro lado, tem-se dado também a globalização da indiferença. São tantas as situações discutidas até à exaustão que já não chocam, já não emocionam. Não mobilizam. Já fazem parte do quotidiano. Este é um risco elevado.
Temos os meios, há que colocar neles o nosso coração, o nosso compromisso. Não esperemos pelo ideal. Localizemo-nos, predispondo-nos a globalizar a caridade, a proximidade física e afetiva. Também isto é ser cristão, também por aqui a nossa conversão. A nossa visão tem diversas focalizações, pode ver bem ao longe e mal ao perto. Pode ver bem ao perto e esquecer o que vem lá. A árvore não nos impeça de ver a floresta, mas por causa desta não esqueçamos só existe porque há muitas árvores…
Publicado (abreviadamente) na VOZ DE LAMEGO, n.º 4257, de 25 de março de 2014
Sem comentários:
Enviar um comentário