sábado, 3 de novembro de 2012

XXXI Domingo do Tempo Comum - ano B - 4 de novembro

       1 – Jesus é um extraordinário ACONTECIMENTO na vida do mundo, um DOM na história da humanidade. Cada gesto, palavra, cada encontro, cada olhar, o sorriso, a delicadeza, o acolhimento, são expressão sublime do AMOR que Jesus nos vem trazer. Ele não anuncia um código de valores, regras para uma conduta regrada, um conjunto de obrigações, delimitando os direitos e os deveres e a linha divisória entre o bem e o mal, o aceitável e o condenável. A Sua vida é sobretudo acontecimento, sinal, presença, vida nova, proximidade, e não tanto discurso, texto, exigência.
       Para Jesus não há balizas para meninos bem comportados que serão compensados por andarem sempre na linha e para meninos mal comportados que por isso serão castigados e já agora ameaçados. Aliás, este maniqueísmo não é de todo possível. Há matizes diversas como o são as vidas de cada pessoa. Não há caminhos iguais. A identidade de cada pessoa acompanha-a pela vida fora. A aproximação ao CAMINHO de Jesus faz-se aceitando o colorido de experiências pessoais, familiares, comunitárias. Ninguém, de forma definitiva e absoluta, poderá considerar-se como ser acabado, perfeito, impecável, sem margem para o erro nem para o aperfeiçoamento. Estamos no Caminho, e a caminho. Estamos sujeitos às vicissitudes do tempo, da história, do nosso temperamento, das circunstâncias que nos envolvem. Sem pessimismos. Sem derrotas antecipadas. Sem vanglória. Somos todos discípulos de Jesus.
       Todos são chamados. Ele vem para todos. Vem com a força e o fogo do amor. Sem preconceitos. Como víamos, ainda no domingo passado, quando é necessário Ele deixa tudo, o caminho e a oração, o descanso e a pregação, para desafiar, para acolher, para perdoar, para curar, para que alguém à margem entre no Seu caminho e Lhe alcance o passo. Deus é Amor. E é Amigo. Jesus não nos mostra senão o amor de Deus e a Sua paixão pela humanidade inteira.
       Ao longo da Sua vida pública não se detém a discutir os pormenores da Lei, ou os preceitos mosaicos que autorizam e sancionam os que são dignos e puros perante a religião. Detém-se diante de pessoas, de carne e osso. Cada pessoa vale. Vale muito. Vale tudo. Ele deixa tudo por cada pessoa excluída, abandonada à sua sorte, a viver na escuridão e marginalizada na sociedade e no templo. Por mais inspirada que seja a Lei nada pode afastar as pessoas do bem, da vida, da alegria, de Deus. Como se vê, Ele não diaboliza a LEI, mas purifica-a pelo perdão e pelo AMOR. A caridade é o fundo, o fundamento, a seiva de todas as leis.

       2 – Quando um doutor da Lei se aproxima de Jesus e Lhe pergunta sobre o maior dos mandamentos, a resposta, que ambos conhecem, está explícita na Sagrada Escritura: «O primeiro é este: ‘Escuta, Israel: O Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todo o teu entendimento e com todas as tuas forças’. O segundo é este: ‘Amarás o teu próximo como a ti mesmo’. Não há nenhum mandamento maior que estes».
      Sabemos a formulação e o resumo dos mandamentos: amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Os seguidores de Jesus Cristo não precisam de mais leis. Têm o que é preciso: colocar Deus antes e acima de tudo e de todos. A adoração a Deus supõe e implica o amor ao semelhante. Jesus acrescenta o segundo mandamento de imediato para que não haja dúvidas. O amor ao próximo é decorrente do amor a Deus. Se, por mera hipótese, houvesse amor a Deus sem amor ao próximo, seria uma neurose intelectual/espiritual, uma mentira. O inverso deixaria margem para a instrumentalização das pessoas.
      Como nos mostra o evangelista Marcos, nestes últimos domingos, o serviço ao outro, o amor sem limites, a inclusão dos excluídos, é a melhor forma, a única, de amar a Deus. Quem quiser seguir Jesus faça como Ele: ame. Ame sempre. Ame mais. Ame sem parar. Ame cada pessoa. Servindo a todos. Vivendo para amar e para servir.
      Depois de perguntar, o escriba responde, sancionando com alegria as palavras de Jesus: «Muito bem, Mestre! Tens razão quando dizes: Deus é único e não há outro além d’Ele. Amá-l’O com todo o coração, com toda a inteligência e com todas as forças, e amar o próximo como a si mesmo, vale mais do que todos os holocaustos e sacrifícios».
      Jesus não fala do alto de uma tribuna, sentado, expondo. Ele caminha. Percorre a vida e os caminhos da Judeia, da Galileia, da Samaria, vai às margens de Israel, encontra estranhos e estrangeiros, mulheres e publicanos, doentes e leprosos, crianças e pecadores públicos. Não desvia o olhar de ninguém. Procura à volta, traz para a luz os que vivem nas trevas da solidão, da pobreza, da doença, do pecado. Para Jesus, cada pessoa vale. Vale muito. Vale tudo. Uma multidão que O acompanha não abafa a voz de um. Uma multidão não esconde um coração despedaçado. Ele ouve, Ele sente, Ele olha. Ele cura. Como Ele assim também há de ser a nossa envolvência com cada pessoa que Deus coloca à nossa beira.
      3 – Curiosa a pergunta do escriba, quando se aceita sem discussões ou nuances que o primeiro mandamento é o que coloca Deus em primeiro lugar, tendo-se tornado oração para todos os judeus. Ao logo do tempo, porém, a lei foi sendo adaptada, aumentada, complicada, dando-se uma inexplicável multiplicação de normas, preceitos, que complicam a compreensão da mesma e sobretudo a vivência séria para as pessoas mais simples e cumpridoras.
        As leis, ontem como hoje, têm de servir as pessoas, a sua dignidade, a aproximação entre uns e outros, a inclusão, a justiça, a verdade. Para as pessoas do povo, as leis têm de ser claras, diretas, sem subterfúgios. Para os entendidos, a complexidade das leis serve para iludir os demais e para justificar as exceções, o não cumprimento das mesmas.
       Jesus não é um fazedor de leis, mas um curador de corações, um vendedor de sonhos. Não dita ensinamentos, mas comunica a experiência de proximidade a Deus, ensina com a vida, a amar, a perdoar, a acolher, a dar, a reconhecer nos outros a presença de Deus.
       Para quem vive de Deus e para Deus, o amor ao seu próximo torna-se consequência lógica, inevitável, ainda que entre os entendidos haja discussões sobre quem é o próximo, o que é da minha religião, o que vive perto de mim, o que me ajuda, o da minha classe social e política, o que professa a minha maneira de ver e viver a vida? A resposta de Jesus é conclusiva, próximo é toda a pessoa de quem me aproximo, toda a pessoa que encontro pela frente, pois cada pessoa é presença do Deus altíssimo, a Quem amo em primeiro lugar. Amo a Deus, amando os que Ele me dá para amar. Amo a Deus fazendo a Sua vontade, como quando amo alguém e procuro tudo fazer para lhe ser agradável. E qual a vontade de Deus? Que todos sejam felizes, tenham vida e vida em abundância.

       4 – A epístola aos Hebreus, como em domingos anteriores, mostra-nos a originalidade do sacerdócio de Jesus Cristo, como paradigma e como desafio ao nosso compromisso sacerdotal. Em Jesus, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, o Céu desce à terra e da terra, Jesus eleva o homem até à eternidade. Jesus é mediador da Graça de Deus. Santifica-nos. Dá a Sua pela nossa vida.
       N'Ele o AMOR de Deus é-nos revelado em plenitude. Já não vivemos nas trevas, ou enublados pela dúvida, pela incerteza, Jesus é o ROSTO e a PRESENÇA de Deus no mundo, ontem como hoje e para sempre.
“Tal era, na verdade, o sumo-sacerdote que nos convinha: santo, inocente, sem mancha, separado dos pecadores e elevado acima dos céus, que não tem necessidade, como os sumos-sacerdotes, de oferecer cada dia sacrifícios, primeiro pelos seus próprios pecados, depois pelos pecados do povo, porque o fez de uma vez para sempre quando Se ofereceu a Si mesmo. A Lei constitui sumos-sacerdotes homens revestidos de fraqueza, mas a palavra do juramento, posterior à Lei, estabeleceu o Filho sumo-sacerdote perfeito para sempre”.
A plenitude da Lei de Moisés transforma-Se pela força do amor, pela entrega de Jesus a favor da humanidade inteira. Ele Encarna, assume a nossa humanidade, a nossa finitude. Ama-nos como somos. Ensina-nos a amarmo-nos como irmãos, porque primeiro Ele nos amou e Se entregou por nós.


Textos para a Eucaristia (ano B): Deut 6, 2-6; Hebr 7, 23-28; Mc 12, 28b-34.

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