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terça-feira, 16 de outubro de 2018

Santa Margarida Maria Alacoque, Virgem

Nota biográfica:
       Nasceu em 1647 na diocese de Autun (França). Acolhida entre as Irmãs da Visitação de Paray le Monial, progrediu de modo admirável no caminho da perfeição. Teve revelações místicas, particularmente sobre a devoção ao Coração de Jesus, e contribuiu muito para introduzir o seu culto na Igreja. Morreu a 17 de Outubro de 1690.
ORAÇÃO COLETA
       Infundi em nós, Senhor, o espírito com que enriquecestes Santa Margarida Maria, para chegarmos ao conhecimento do mistério incomparável do amor de Cristo e alcançarmos a plenitude da vida divina. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho, que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
Das Cartas de Santa Margarida Maria Alacoque, virgem
Devemos conhecer o amor supereminente da ciência de Cristo
Parece me que a intenção de Nosso Senhor ao manifestar tão grande desejo de que o seu Sagrado Coração seja especialmente venerado, é renovar nas almas os efeitos da sua redenção. Na verdade, o Sagrado Coração é uma fonte inesgotável que não pretende senão comunicar se aos corações humildes, para que, mais livres e disponíveis, orientem a sua vida na entrega total à sua vontade.
Deste divino Coração brotam sem cessar três canais de graça. O primeiro é o da misericórdia para com os pecadores, sobre os quais infunde o espírito de contrição e de penitência. O segundo é o da caridade, para auxílio de quantos padecem tribulações e em especial dos que aspiram à perfeição, a fim de que superem todas as dificuldades. O terceiro é de amor e luz para os seus amigos perfeitos que deseja unir a Si para os tornar participantes da sua ciência e dos seus desígnios, a fim de que eles se consagrem inteiramente a promover a sua glória, cada um à sua maneira.
Este divino Coração é um abismo que encerra todos os bens e é preciso que os pobres Lhe confiem todas as suas necessidades. É abismo de alegria em que devem ficar submersas todas as nossas tristezas; é abismo de humildade contra o nosso orgulho; é abismo de misericórdia para os infelizes; é abismo de amor para saciar toda a nossa pobreza.
Uni vos intimamente, em tudo o que fizerdes, ao Coração de Nosso Senhor Jesus Cristo, para fazerdes vossas as suas disposições e a sua satisfação. Por exemplo: não adiantais nada na oração? Contentai-vos com oferecer a Deus as preces que o divino Salvador eleva por nós no Sacramento do altar, oferecendo o seu fervor em reparação da vossa tibieza; e dizei em cada uma das vossas acções: «Meu Deus, faço isto ou sofro aquilo em união com o Sagrado Coração de vosso Filho e segundo as suas intenções; eu Vo-lo ofereço em reparação de todo o mal ou imperfeição das minhas obras». E de modo semelhante em todas as circunstâncias da vida. E sempre que vos sobrevém qualquer sofrimento, angústia ou mortificação, dizei no vosso interior: «Recebe o que o Sagrado Coração de Jesus te envia para te unir a Ele».
Acima de tudo, porém, conservai a paz de coração, que supera todos os tesouros. E o melhor meio de a conservar é renunciar à própria vontade e colocar a vontade do divino Coração em vez da nossa, para a deixar escolher por nós aquilo que mais pode contribuir para a sua glória.

quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Amai os vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam

       «Digo-vos a vós que Me escutais: Amai os vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam. Abençoai os que vos amaldiçoam, orai por aqueles que vos injuriam. A quem te bater numa face, apresenta-lhe também a outra; e a quem te levar a capa, deixa-lhe também a túnica. Dá a todo aquele que te pedir e ao que levar o que é teu, não o reclames. Como quereis que os outros vos façam, fazei-lho vós também... amai os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai, sem nada esperar em troca. Então será grande a vossa recompensa e sereis filhos do Altíssimo, que é bom até para os ingratos e os maus. Sede misericordiosos, como o vosso Pai é misericordioso. Não julgueis e não sereis julgados. Não condeneis e não sereis condenados. Perdoai e sereis perdoados. Dai e dar-se-vos-á: deitar-vos-ão no regaço uma boa medida, calcada, sacudida, a transbordar. A medida que usardes com os outros será usada também convosco» (Lc 6, 27-38).
       O Evangelho deste dia está repleto de recomendações essenciais de Jesus.
       Para lá regra de ouro - faz aos outros o que queres que te façam a ti - Jesus acentua a misericórdia, a generosidade, o amor até aos inimigos, a compreensão com o próximo. A lei de talião - olho por olho, dente por dente - não cabe nas contas de Jesus: "a quem te bater numa face, apresenta-lhe também a outra".
       A caridade, ao jeito de Jesus, deve presidir a todos os nossos atos... quando estivermos irritados com alguém, como tem recomendado o Papa Francisco, rezemos por ele. Abençoemos em vez de condenarmos. Não julguemos. Não percamos tempo em juízos de valor acerca dos outros. Rezemos por todos.

sábado, 25 de agosto de 2018

Não imiteis as suas obras, eles dizem e não fazem

       No Evangelho para hoje, Jesus remete-nos para a necessidade das boas obras confirmarem o que professamos pelas palavras, procurando a correspondência entre o que nos exigimos e o que exigimos ao nosso irmão, optando por um caminho de humildade, e não de sobranceria. É no reconhecimento da nossa limitação, que podemos abrir-nos aos outros e a Deus.
       «Na cadeira de Moisés sentaram-se os escribas e os fariseus. Fazei e observai tudo quanto vos disserem, mas não imiteis as suas obras, porque eles dizem e não fazem. Atam fardos pesados e põem-nos aos ombros dos homens, mas eles nem com o dedo os querem mover. Tudo o que fazem é para serem vistos pelos homens: alargam as filactérias e ampliam as borlas; gostam do primeiro lugar nos banquetes e dos primeiros assentos nas sinagogas, das saudações nas praças públicas e que os tratem por ‘Mestres’. Vós, porém, não vos deixeis tratar por ‘Mestres’, porque um só é o vosso Mestre e vós sois todos irmãos. Na terra não chameis a ninguém vosso ‘Pai’, porque um só é o vosso pai, o Pai celeste. Nem vos deixeis tratar por ‘Doutores’, porque um só é o vosso doutor, o Messias. Aquele que for o maior entre vós será o vosso servo. Quem se exalta será humilhado e quem se humilha será exaltado» (Mt 23, 1-12).
       As nossas palavras devem levar-nos ao compromisso, a fazer o bem, a viver honesta e solidariamente. De que adianta ter uma fé imensa, se vejo alguém a quem deitar a mão e não o faço por preguiça, ou deixando que outros façam?
       Jesus diz claramente que devemos agir pela justiça, pelo amor, pelo bem, não para que outros vejam e nos elogiem, mas por ser bem e justo. E, por outro lado, e necessidade das nossas palavras não serem ocas, mas corresponderem à nossa prática

terça-feira, 6 de março de 2018

Assim procederá convosco o Vosso Pai

       "...E agora Vos seguimos de todo o coração, Vos tememos e buscamos o vosso rosto. Não nos deixeis ficar envergonhados, mas tratai-nos segundo a vossa bondade e segundo a abundância da vossa misericórdia. Livrai-nos pelo vosso admirável poder e dai glória, Senhor, ao vosso nome" (Dan 3, 25.34-43).

       Pedro aproximou-se de Jesus e perguntou-Lhe: «Se meu irmão me ofender, quantas vezes deverei perdoar-lhe? Até sete vezes?» Jesus respondeu: «Não te digo até sete vezes, mas até setenta vezes sete. Na verdade, o reino de Deus pode comparar-se a um rei que quis ajustar contas com os seus servos. Logo de começo, apresentaram-lhe um homem que devia dez mil talentos. Não tendo com que pagar, o senhor mandou que fosse vendido, com a mulher, os filhos e tudo quanto possuía, para assim pagar a dívida. Então o servo prostrou-se a seus pés, dizendo: ‘Senhor, concede-me um prazo e tudo te pagarei’. Cheio de compaixão, o senhor daquele servo deu-lhe a liberdade e perdoou-lhe a dívida. Ao sair, o servo encontrou um dos seus companheiros que lhe devia cem denários. Segurando-o, começou a apertar-lhe o pescoço, dizendo: ‘Paga o que me deves’. Então o companheiro caiu a seus pés e suplicou-lhe, dizendo: ‘Concede-me um prazo e pagar-te-ei’. Ele, porém, não consentiu e mandou-o prender, até que pagasse tudo quanto devia. Testemunhas desta cena, os seus companheiros ficaram muito tristes e foram contar ao senhor tudo o que havia sucedido. Então, o senhor mandou-o chamar e disse: ‘Servo mau, perdoei-te tudo o que me devias, porque me pediste. Não devias, também tu, compadecer-te do teu companheiro, como eu tive compaixão de ti?’ E o senhor, indignado, entregou-o aos verdugos, até que pagasse tudo o que lhe devia. Assim procederá convosco meu Pai celeste, se cada um de vós não perdoar a seu irmão de todo o coração» (Mt 18, 21-35).
       A liturgia da Palavra deste dia apresenta-nos uma aspecto fundamental na vida do crente: o arrependimento dos pecados, reconhecendo a própria culpa, a conversão so Senhor de todo o coração e a vida nova daí resultante.
       Na primeira leitura, Azarias faz uma súplica de arrependimento, em seu nome e de todo o povo, para que Deus não leve em conta os seus pecados, mas na Sua misericórdia infinita olhe para o Seu pequeno povo e não esqueça a Sua aliança. O compromisso de Azarias e do povo é caminhar na presença do Senhor, segundo os Seus mandamentos.
       No Evangelho, encontramos Pedro a perguntar a Jesus quantas vezes devemos perdoar. A resposta de Jesus é inequívoca: sempre! Em todas as circunstâncias, em qualquer situação, todos os que nos ofenderem ou se a mesma pessoa nos ofender muitas vezes. Não é uma tarefa fácil. É um desafio salutar. Aceitar o outro com as suas limitações é pedir que os outros nos aceitem nas nossas insuficiência.
       Não esquecer, que o perdão nos é dado, antes de mais, pelo próprio Deus. Só Ele nos purifica e nos livra da culpa do pecado. É essa precisamente a lição a tirar da parábola de Jesus, do administrador infiel, que vê perdoada a sua grande dívida mas não é capaz de perdoar uma ninharia ao seu semelhante...

sábado, 3 de março de 2018

Pai, dá-me a parte da herança que me toca...

       É-nos proposto, para este sábado, o Evangelho em que Jesus apresenta Deus como um Pai infinitamente misericordioso, pronto a perdoar, que se lança aos braços dos filhos desavindos, que faz festa pelo regresso dos que se transviaram. É a conhecida parábola do filho pródigo, muito mais parábola do Pai Misericordioso.
       Por outro lado, agudiza-se o debate com os fariseus e doutores da lei. São como o filho mais velho, zelosos, e que julgam que por estarem há mais tempo na religião têm todos os direitos e podem decidir quem entra e quem sai, quem tem ou não direito à salvação.
       Por outro lado ainda, o convite à alegria e à festa, que por vezes se esquece na religião que assenta sobretudo na tradição e não na conversão pessoal, e na intimidade com Deus e com os outrso.
       Vale a pena ler toda a parábola:
Jesus disse-lhes então a seguinte parábola: «Certo homem tinha dois filhos. O mais novo disse ao pai: ‘Pai, dá-me a parte da herança que me toca’. O pai repartiu os bens pelos filhos. Alguns dias depois, o filho mais novo, juntando todos os seus haveres, partiu para um país distante e por lá esbanjou quanto possuía, numa vida dissoluta. Tendo gasto tudo, houve uma grande fome naquela região e ele começou a passar privações. Entrou então ao serviço de um dos habitantes daquela terra, que o mandou para os seus campos guardar porcos. Bem desejava ele matar a fome com as alfarrobas que os porcos comiam, mas ninguém lhas dava. Então, caindo em si, disse: ‘Quantos trabalhadores de meu pai têm pão em abundância, e eu aqui a morrer de fome! Vou-me embora, vou ter com meu pai e dizer-lhe: Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho, mas trata-me como um dos teus trabalhadores’. Pôs-se a caminho e foi ter com o pai. Ainda ele estava longe, quando o pai o viu: encheu-se de compaixão e correu a lançar- se-lhe ao pescoço, cobrindo-o de beijos. Disse-lhe o filho: ‘Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho’. Mas o pai disse aos servos: ‘Trazei depressa a túnica mais bela e vesti-lha. Ponde-lhe um anel no dedo e sandálias nos pés. Trazei o vitelo gordo e matai-o. Comamos e festejemos, porque este meu filho estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado’. E começou a festa. Ora o filho mais velho estava no campo. Quando regressou, ao aproximar-se da casa, ouviu a música e as danças. Chamou um dos servos e perguntou-lhe o que era aquilo. O servo respondeu-lhe: ‘O teu irmão voltou e teu pai mandou matar o vitelo gordo, porque chegou são e salvo’. Ele ficou ressentido e não queria entrar. Então o pai veio cá fora instar com ele. Mas ele respondeu ao pai: ‘Há tantos anos que te sirvo, sem nunca transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito para fazer uma festa com os meus amigos. E agora, quando chegou esse teu filho, que consumiu os teus bens com mulheres de má vida, mataste-lhe o vitelo gordo’. Disse-lhe o pai: ‘Filho, tu estás sempre comigo e tudo o que é meu é teu. Mas tínhamos de fazer uma festa e alegrar-nos, porque o teu irmão estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado’» (Lc 15, 1-3.11-32).

terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Respeitai o direito, protegei, fazei justiça, defendei

       A palavra de Deus proposta para esta terça feira acentua a misericórdia de Deus. Jesus colocava a misericórdia de Deus como ideal comparativo para nos centrarmos na vivência da misericórdia. Hoje, na primeira leitura, a bondade de Deus, e o Seu perdão, estão ao alcance de todos, importa, antes de mais, iniciar um caminho positivo, de honestidade, de atenção ao semelhante, de prática da justiça e da caridade. Uma vez mais, as boas obras testam e aprofunda a fé.

Mas atentemos ao texto:
       Escutai a palavra do Senhor, chefes de Sodoma; dai ouvidos à lei do nosso Deus, povo de Gomorra: «Lavai-vos, purificai-vos, afastai dos meus olhos a malícia das vossas acções, deixai de praticar o mal e aprendei a fazer o bem. Respeitai o direito, protegei o oprimido, fazei justiça ao órfão, defendei a causa da viúva. Vinde então para discutirmos as nossas razões, – diz o Senhor. Ainda que os vossos pecados sejam como o escarlate, ficarão brancos como a neve; ainda que sejam vermelhos como a púrpura, ficarão brancos como a lã. Se fordes dóceis e obedientes, comereis os bens da terra. Mas se recusardes e fordes rebeldes, sereis devorados pela espada» (Is 1, 10.16-20).
       No Evangelho, Jesus remete-nos para a necessidade das boas obras confirmarem o que professamos pelas palavras, procurando a correspondência entre o que nos exigimos e o que exigimos ao nosso irmão, optando por um caminho de humildade, e não de sobranceria. É no reconhecimento da nossa limitação, que podemos abrir-nos aos outros e a Deus.

Vejamos as palavras de Jesus aos discípulos e à multidão:
       «Na cadeira de Moisés sentaram-se os escribas e os fariseus. Fazei e observai tudo quanto vos disserem, mas não imiteis as suas obras, porque eles dizem e não fazem. Atam fardos pesados e põem-nos aos ombros dos homens, mas eles nem com o dedo os querem mover. Tudo o que fazem é para serem vistos pelos homens: alargam as filactérias e ampliam as borlas; gostam do primeiro lugar nos banquetes e dos primeiros assentos nas sinagogas, das saudações nas praças públicas e que os tratem por ‘Mestres’. Vós, porém, não vos deixeis tratar por ‘Mestres’, porque um só é o vosso Mestre e vós sois todos irmãos. Na terra não chameis a ninguém vosso ‘Pai’, porque um só é o vosso pai, o Pai celeste. Nem vos deixeis tratar por ‘Doutores’, porque um só é o vosso doutor, o Messias. Aquele que for o maior entre vós será o vosso servo. Quem se exalta será humilhado e quem se humilha será exaltado» (Mt 23, 1-12).

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Não condeneis e não sereis condenados...

       Disse Jesus aos seus discípulos: «Sede misericordiosos, como o vosso Pai é misericordioso. Não julgueis e não sereis julgados. Não condeneis e não sereis condenados. Perdoai e sereis perdoados. Dai e dar-se-vos-á: deitar-vos-ão no regaço uma boa medida, calcada, sacudida, a transbordar. A medida que usardes com os outros será usada também convosco» (Lc 6, 36-38).
        A medida da nossa vivência cristã é Jesus Cristo.
       Não é uma medida por baixo, com os mínimos garantidos, é uma medida sempre a crescer até à estatura de Jesus Cristo. Ele dá a vida por nós, resgatando-nos ao pecado e à morte, é a Sua medida. Não dá pouco nem muito, dá-Se totalmente, entrega-Se em cada gesto, em cada palavra, em cada olhar, em cada encontro, em cada sorriso, em cada afago. Por conseguinte, é seguido pelos esquecidos e odiados da sociedade do Seu tempo, come com eles, chama-os, aproxima-Se deles, vai nas suas direcções para os fazer regressar à vida.
       Hoje deixa-nos uma referência fundamental: ser misericordiosos como o Pai do Céu é misericordioso. Se Ele é a nossa medida e se a Sua medida é Deus Pai, então a medida do nosso amor é o Deus de Jesus Cristo, próximo, misericordioso, pronto para perdoar, para Se fazer próximo e em Jesus nosso irmão.
       Que melhor atitude quaresmal que o perdão, a misericórdia, a bondade, a generosidade para com os outros! Um dia disseram-nos que só gostando de nós poderíamos gostar dos outros. Mas Jesus vai mais longe, quanto mais nos dermos aos outros tanto mais nos sentiremos bem connosco e com o mundo que nos rodeia.

segunda-feira, 24 de abril de 2017

VL – O Jejum que Eu quero é a Misericórdia

É mais importante não comer carne à sexta-feira ou ir à Missa ao Domingo?
       Há tradições que são expressão da religiosidade mais popular. Mas, por vezes, parecem não passar de uma superstição entre outras como ver um gato preto, passar debaixo de uma escada, sentar-se a uma mesa com treze pessoas. É crucial não comer carne nas sextas-feiras da Quaresma porque é pecado e, pelo sim pelo não, mais vale prevenir e cumprir, não vá Deus chatear-Se. Temor sim, medo não. Deus ama-nos. É Pai de Misericórdia. Um Pai por certo não está à espera que o filho erre para o castigar, quando muito educa-o, dá-lhe ferramentas, aponta direções, caminhos…
       Perguntam-me se comer carne às sextas-feiras da Quaresma é pecado! Apetecia-me responder: é mais importante ir à Missa ao Domingo. Uma pessoa não vai à Missa há dois ou três anos, só entra na Igreja num funeral, e depois pergunta se é pecado comer carne à sexta-feira? Claro que há muitas outras coisas essenciais, cuidar da família, comprometer-se com a justiça e com a verdade, ser honesto, ajudar os mais frágeis… Mas se falamos numa proposta feita pela Igreja, de abster-se de alguma coisa que se gosta muito, e que pode muito bem ser a carne, e que esse gesto (sacrifício) possa beneficiar uma causa, pessoas mais carenciadas, então talvez faça sentido interrogar-se sobre o que é essencial na vivência e expressão da fé!
       Dois belíssimos textos no início da Quaresma. «Rasgai os vossos corações e não as vossas vestes, convertei-vos ao Senhor, vosso Deus, porque Ele é clemente e compassivo, paciente e rico em misericórdia» (Joel 2, 12-13). «O jejum que me agrada é este: libertar os que foram presos injus­tamente, livrá-los do jugo que levam às cos­tas, pôr em liberdade os oprimidos, quebrar toda a espécie de opres­são, repartir o teu pão com os esfo­meados, dar abrigo aos infelizes sem casa, atender e vestir os nus e não des­prezar o teu irmão» (Is 58, 6-7).
       Pergunta o Papa Francisco: como se pode pagar um jantar de duzentos euros e depois fazer de conta que não se vê um homem faminto à saída do restaurante? «Sou justo, pinto o coração mas depois discuto, exploro as pessoas… Eu sou generoso, darei uma boa oferta à Igreja… diz-me: tu pagas o justo às tuas colaboradoras domésticas? Aos teus empregados pagas o salário não declarado? Ou como a lei estabelece, para que possam dar de comer aos filhos?».
       Desafia Jesus: «Ide aprender o que significa: prefiro a misericórdia ao sacrifício» (Mt 9, 13).

Publicado na Voz de Lamego, n.º 4405, de 28 de março de 2017

quinta-feira, 2 de março de 2017

Leituras: JOSÉ ANTONIO PAGOLA - IDE E CURAI

JOSÉ ANTONIO PAGOLA (2015). Ide e Curai. Evangelizar o mundo da saúde e da doença. Lisboa: Paulus Editora. 312 páginas.
       A doença e o sofrimento que acarreta nos próprios e na família e nos amigos é um tema de sempre. Poder-se-á dizer que é no sofrimento que se conhece o ser humano na sua profundidade. Os amigos e a resiliência da família e dos amigos testa-se no sofrimento, na doença crónica, nas doenças oncológicas, na SIDA, na toxicodependência, no alcoolismo, nas depressões profundas. Por vezes a persistência e a duração da doença são um autêntico desafio à coragem, à compaixão e ao amor. Mas não é fácil explicar, muito menos passar por algumas das situações dolorosas, para os próprios e para aqueles e aquelas que estão à sua volta.
       A referência e o fundamento de qualquer compromisso cristão é Jesus Cristo, a força da Sua graça, a Sua postura e docilidade. O ministério de Jesus é um ministério de cura e de evangelização. Ide e evangelizai. Ide e batizai. Ide e curai. Tudo integra a missão de Jesus Cristo. Anuncia o Evangelho, a Boa Nova aos pobres, cura os doentes e todas as enfermidades, liberta os que são oprimidos pelos espíritos impuros. O desafio é igual para os seus discípulos e para a Igreja: Ide e anunciai o Evangelho, curai os enfermos, expulsai os demónios. Recebeste de graça, dai de graça.
       A dimensão curativa foi sendo esquecida. A missão de Jesus inclui sempre a dimensão sanadora, curando e restaurando a dignidade dos esquecidos da sociedade e da própria religião. Neste livro, que agrega textos do autor escrito ao longo dos anos, indicações, sugestões, fundamentação bíblico-teológico. A caridade, nomeadamente na Cáritas, tem-se desenvolvido, mas muitas vezes falta maior organização, incluindo a pessoa como um todo, e não apenas a assistência às necessidades pontuais. A visita aos doentes e os visitadores é um dos aspetos que o autor sublinha, como início, mas não esquecendo que a pastoral da saúde e da doença deve incluir e comprometer toda a comunidade, interagindo com outras instituições, com Hospitais e Lares, dialogando com médicos e enfermeiros e outros agentes hospitalares, empenhando-se sobretudo em ir ao encontro dos doentes mais frágeis, excluídos, esquecidos, os que sugerem maior afastamento, com determinadas doenças, como, por exemplo, os doentes mentais. A preocupação com os doentes há estender-se também às famílias.
       O autor propõe o conhecimento da realidade e dos doentes que existem no espaço territorial da paróquia, atendendo a todos, sabendo em que condições se encontram, se é ou não necessário pôr-se em contacto com a Cáritas, vendo quais as necessidades, mas também a atenção e o cuidado à família. A visita aos doentes deve resultar do compromisso de toda a comunidade e quem está comprometido com a pastoral da saúde deve estar envolvido na comunidade.
       Tão importante como visitar um doente, é telefonar-lhe, escrever-lhe, fazer com que vizinhos e familiares se aproximem. A celebração dos sacramentos, da Unção dos Enfermos e do Viático, deve acontecer naturalmente, para quem tem fé, para quem não tem pode ajudá-la a rezar, franquear-lhe a possibilidade mas não forçar. A presença, a escuta, a atenção é mais importante.
       Por um lado, deve promover-se a celebração comunitária a Unção dos Enfermos. Por outro, os doentes também devem participar, quanto possível, na vida da comunidade. Por conseguinte, além de celebrações específicas, como Unção dos Doentes, o Dia Mundial do Doente, preparadas também com os doentes, eliminar, por exemplo, as barreiras arquitetónicas...

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

VL – O amor afasta o temor (Santa Faustina)

       Imaginemos um pai severo, com muitas regras e castigos. Tão distante dos filhos que se faz respeitar pelo medo. Basta um olhar! E se for preciso desapertar a fivela do cinto...
       Imaginemos um pai compreensivo, dialogante, carinhoso com os filhos, estabelece regras explica-as, negoceia fronteiras e limites...
       Passados 30 anos, quais os filhos estarão mais próximos dos pais?
       Há pessoas que se atêm à religião mais pelo medo, pela presença demoníaca, pela escrupulosidade do pecado, que pelo convite acolhedor de Jesus e do Seu Evangelho de Paixão e de Misericórdia.
       O Ano Jubilar acentuou a dinâmica do amor de Deus para com a humanidade, assumido e plenizado na vida de Jesus, na Sua morte e ressurreição, e o desafio à Igreja para ser Casa da Misericórdia, assomando a beleza e a alegria da Boa Nova da redenção. 
       Há um caminho importante a fazer. O caminho de cada um – lembrando as palavras do então cardeal Ratzinger: há tantos caminhos quantas as pessoas – há de aproximar-nos de Jesus, Caminho, Verdade e Vida. Com Ele experimentamos libertação, docilidade, prontidão, serviço. Não ameaça, atemorização. Jesus não olha para o inferno mas para o Céu, para o Pai.
       Ao longo dos séculos, muitos círculos eclesiais acentuaram o medo e à ameaça. As descrições do inferno pareciam ser testemunhos de quem lá tinha estado. O inferno era garantia da nossa vida. Era preciso fazer tudo para ganhar o céu, pelo sacrifício, pela mortificação, anulando-se como pessoas e colocando-se em atitude de subserviência, à espera que à custa de tantos sofrimentos Deus pudesse compadecer-se. É o contrário, o Céu é garantia e a vida eterna está aí como dom que nos responsabiliza com os outros.
       A vida, a pregação e a oração dos cristãos há de estar preenchida com ternura e o amor de Deus. Nãos se trata de negar a doutrina da Igreja, assente nas palavras e nos gestos de Jesus. Porém, seguindo-O, veremos a bondade e a filiação amistosa com o Pai. O inferno é uma possibilidade real. Deus leva-nos a sério, respeita a nossa liberdade e o nosso não. Mas como cristãos e como Igreja vivemos do amor de Deus. Jesus procura libertar, elevar, envolver. A Cruz é a assunção do amor levado até à última gota de sangue. Com a Sua ressurreição, Jesus coloca a nossa natureza humana na glória do Pai, de onde nos atrai e desafia.

Publicado na Voz de Lamego, n.º 4380, de 27 de setembro de 2016

terça-feira, 25 de outubro de 2016

VL – Um Deus bom destrói a religião?!

       A religião tem-se imposto pelo medo, pela ameaça, pela certeza de forças ocultas, poderosas, capazes de aniquilar o ser humano para sempre. Parece que quando maior o medo e o desconhecimento, maior o número dos que engrossam as fileiras da religião.
       Esta servirá para aplacar a ira dos deuses, para compensar, pelo sacrifício, as ofensas para com um deus-supremo, Juiz, Vigilante, Patrão, Todo-poderoso. 
       Será sempre mais fácil dizer que os padres destroem a religião.
       Quando se dispensam ou alteram certas tradições populares, logo as pessoas sublinham que os padres hão de destruir a religião. Bem entendido, nem seria assim tão mal, se estivermos a falar da religião assente mais nos méritos humanos do que na gratuidade da salvação de Deus oferecida a todos os homens.
       Neste ano jubilar tem-se acentuado o atributo maior de Deus, a Misericórdia, cujo Rosto é Jesus Cristo, nas palavras e nas obras, na vida e na morte, entendida como entrega até ao fim. Na Ressurreição de Jesus, a certeza do amor de Deus e da Sua misericórdia, que está acima de qualquer limitação.
       Para alguns, sublinhar demasiado a misericórdia de Deus pode levar à desconstrução da religião composta por uma série de exigências, sacrifícios, sujeita a ameaças, anúncios de cataclismos sempre e quando o ser humano não cumprir com a vontade de Deus.
       Por um lado, na Igreja como em outros movimentos religiosos, sempre que nos aproximamos do fim dos séculos ou do milénio, o medo que o mundo acabe gera mais pessoas à procura da proteção da religião. Se a ameaça termina, parece que as pessoas voltam às suas vidas e se esquecem de Deus e sobretudo se esquecem das suas obrigações com a comunidade. Poder-se-á agrafar aqui a máxima, só nos lembramos de santa Bárbara quando troveja.
       Por outro lado, Jesus Cristo destruiu efetivamente a religião passada e do passado. Aproximou-nos de Deus e fez com que Deus chegasse tão perto de nós que pudesse ser perseguido, maltratado, injuriado, e morto. Em Jesus, Deus assume as chagas da nossa fragilidade e as limitações do tempo e do espaço. Ao mesmo tempo, ultrapassa as fronteiras das religiões e do templo. Com Jesus, Deus está ao alcance da mão. É um Deus bom, misericordioso, compassivo. Mas quem disse que ternura não pode exigir e pressupor a justiça? A misericórdia de Deus acaricia-nos além do perdão dos pecados. Com efeito, o amor afasta o temor, como diz Santa Faustina no seu diário.
       No final, prender-nos-á mais o amor que o temor!

Publicado na Voz de Lamego, n.º 4379, de 20 de setembro de 2016

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Santa Faustina Kowalska - DIÁRIO

Santa FAUSTINA KOWALSKA (2016). Diário. A Misericórdia Divina na minha alma. Fátima: Marianos da Imaculada Conceição. 632 páginas.
       Santa Faustina adquiriu uma maior notoriedade neste Jubileu Extraordinário da Misericórdia, convocado pelo Papa Francisco, a decorrer entre 8 de dezembro de 2015, solenidade da Imaculada Conceição, e o dia 20 de novembro de 2016, solenidade de Cristo Rei. Outros santos estiveram em evidência, mas Faustina é tida como a Secretária/Santa da Misericórdia. Ela própria se define como Secretária da Misericórdia, segundo as revelações de Jesus, que lhe pede para escrever sobre a Misericórdia divina, como Secretária fiel em colocar por escrito tudo quanto Jesus lhe disser.
Faustina "nasceu em Glogowiec, na Polónia central, no dia 25 de agosto de 1905, de uma família camponesa de sólida formação cristã. Desde a infância sentiu a aspiração à vida consagrada, mas teve de esperar diversos anos antes de poder seguir a sua vocação...
Com a idade de 16 anos deixou a casa paterna e começou a trabalhar como doméstica. Na oração tomou depois a decisão de ingressar num convento. Assim, em 1925, entrou na Congregação das Irmãs da Bem-aventurada Virgem Maria da Misericórdia, que se dedica à educação das jovens e à assistência das mulheres necessitadas de renovação espiritual. Ao concluir o noviciado, emitiu os votos religiosos que foram observados durante toda a sua vida, com prontidão e lealdade. Em diversas casas do Instituto, desempenhou de modo exemplar as funções de cozinheira, jardineira e porteira. Teve uma vida espiritual extraordinariamente rica de generosidade, de amor e de carismas que escondeu na humildade dos empenhos quotidianos.
O Senhor escolheu esta Religiosa para se tornar apóstola da Sua misericórdia, a fim de aproximar mais de Deus os homens, segundo o expresso mandato de Jesus: "Os homens têm necessidade da minha misericórdia".
Em 1934, Irmã Maria Faustina ofereceu-se a Deus pelos pecadores, sobretudo por aqueles que tinham perdido a esperança na misericórdia divina. Nutriu uma fervorosa devoção à Eucaristia e à Mãe do Redentor, e amou intensamente a Igreja participando, no escondimento, na sua missão de salvação. Enriqueceu a sua vida consagrada e o seu apostolado, com o sofrimento do espírito e do coração. Consumada pela tuberculose, morreu santamente em Cracóvia no dia 5 de Outubro de 1938, com a idade de 33 anos.
João Paulo II proclamou-a Beata no dia 18 de abril de 1993; sucessivamente, a Congregação para as Causas dos Santos examinou com êxito positivo uma cura milagrosa atribuída à intercessão da Beata Maria Faustina, e no dia 20 de dezembro de 1999 foi promulgado o Decreto sobre esse milagre" (Nota biográfica na página oficial do Vaticano: AQUI).
       O DIÁRIO é uma ferramenta essencial para compreender a vida, o pensamento de Santa Faustina e para nos deixarmos interpelar pela Mensagem da Misericórdia Divina. Como outros santos, vem ao de cima a luta constante pela humildade, pelo serviço, pela descrição, procurando o silêncio e a oração, com o desejo de permanecer junto de Deus, junto ao Coração de Jesus Vive para anunciar a Misericórdia divina, a confiança na bondade de Deus que a todos quer salvar. O desejo por salvar os pecadores compromete-a cada dia, ainda que a morte não seja desprezível, já que dessa forma se unirá em definitivo a Jesus Cristo.
       Por exemplo sobre a Hóstia consagrada. Nesta sugestão, a tradução/adaptação das Servas da Divina Misericórdia:
Ó Jesus Hóstia Santa, na qual está encerrado o testamento da Misericórdia de Deus para nós, e especialmente para Sacerdotes e os pobres pecadores.
Ó Jesus Hóstia Santa, na qual está encerrado o Corpo e o Sangue de Nosso Senhor, como testemunho de infinita Misericórdia para connosco, especialmente para com os Sacerdotes, e os pobres pecadores.
Ó Jesus Hóstia Santana qual está encerrada a Vida eterna e a infinita Misericórdia concedida copiosamente a nós, especialmente aos Sacerdotes e aos pobres pecadores.
Ó Jesus Hóstia Santa, na qual está encerrada a Misericórdia do Pai, do Filho, e do Espírito Santo para connosco, especialmente para com os Sacerdotes e os pobres pecadores.
Ó Jesus Hóstia Santa, na qual está encerrado o infinito preço da misericórdia, que pagará todas as nossas dividas, especialmente as dos Sacerdotes e dos pobres pecadores.
Ó Jesus Hóstia Santa, na qual está encerrada a Fonte da água viva que brota da infinita misericórdia para connosco, especialmente para com os Sacerdotes e os pobres pecadores.
Ó Jesus Hóstia Santa, na qual está encerrado o fogo do amor mais puro, que arde no seio do Pai Eterno, como num abismo de infinita misericórdia para connosco, especialmente para com os Sacerdotes e os pobres pecadores.
Ó Jesus Hóstia Santa, na qual está encerrado o remédio para todas as nossas doenças, que flui da infinita misericórdia como de uma fonte para nós especialmente para os Sacerdotes e os pobres pecadores.
Ó Jesus Hóstia Santa, na qual está encerrada a união entre Deus e nós pela infinita misericórdia para connosco, especialmente para com os Sacerdotes e os pobres pecadores.
Ó Jesus Hóstia Santa, na qual estão encerrado todos os sentimentos do Dulcíssimo Coração de Jesus para connosco, especialmente para com os Sacerdotes e os pobres pecadores.
Ó Jesus Hóstia Santa, nossa única esperança, em todos os sofrimentos e contrariedades da vida.
Ó Jesus Hóstia Santa, nossa única esperança em meio ás trevas e ás tempestades interiores e exteriores.
Ó Jesus Hóstia Santa, nossa única esperança, na vida e na hora da morte.
Ó Jesus Hóstia Santa, nossa única esperança, em meio aos insucessos e ás profundas incertezas.
Ó Jesus Hóstia Santa, nossa única esperança em meio ás falsidades e ás traições.
Ó Jesus Hóstia Santa, nossa única esperança nas trevas e na perversidade que cobrem a Terra.
Ó Jesus Hóstia Santa, nossa única esperança em meio da saudade e da dor, em que ninguém nos compreende.
Ó Jesus Hóstia Santa, nossa única esperança em meio dos afazeres e a monotonia da vida quotidiana.
Ó Jesus Hóstia Santa, nossa única esperança, em meio à destruição das ruínas dos anseios e dos nossos esforços.
Ó Jesus Hóstia Santa, nossa única esperança em meio dos ataques do inimigo e das investidas do inferno.
Ó Jesus Hóstia Santa, confio em Vós, quando as dificuldades superarem as minhas forças, quando eu ver ineficazes os meus esforços.
Ó Jesus Hóstia Santa, confio em Vós, quando as tempestades agitarem o meu coração e o espírito atemorizado inclinar-se ao desespero.
Ó Jesus Hóstia Santa, confio em Vós, quando o meu coração tremer e, quando o suor mortal cobrir a minha fronte.
Ó Jesus Hóstia Santa, confio em Vós, quando tudo conspirar contra mim e o negro desespero penetrar em minha alma.
Ó Jesus Hóstia Santa, confio em Vós, quando a minha vista se apagar para tudo que é terrestre, e o meu espírito ver pela primeira vez os mundos desconhecidos.
Ó Jesus Hóstia Santa, confio em Vós, quando os meus trabalhos superarem as minhas forças e o insucesso me acompanhar continuamente.
Ó Jesus Hóstia Santa, confio em Vós, quando o cumprimento da virtude me parecer difícil e a natureza se revoltar.
Ó Jesus Hóstia Santa, confio em Vós, quando os golpes do inimigo forem desferidos contra mim.
Ó Jesus Hóstia Santa, confio em Vós quando os trabalhos e esforços forem condenados pelos homens.
Ó Jesus Hóstia Santa, confio em Vós, quando soar sobre mim Vosso Juízo, então, confiarei no oceano da Vossa Misericórdia.
Sobre o Terço da Misericórdia (n.º 476 do Diário)
“Primeiro dirás o Pai-nosso, a Avé-Maria e o Credo. Depois, nas contas do Pai Nosso, dirás as seguintes palavras: Eterno Pai, eu Vos ofereço o Corpo e o Sangue, a Alma e a Divindade de Vosso diletíssimo Filho, Nosso Senhor Jesus Cristo, em expiação dos nossos pecados e dos do mundo inteiro. Nas contas da Ave-Maria rezarás as seguintes palavras: Pela Sua dolorosa Paixão, tende misericórdia de nós e do mundo inteiro. No fim, rezarás três vezes estas palavras: Deus Santo, Deus Forte, Deus Imortal, tende piedade de nós e do mundo inteiro” (Diário, 476).

sábado, 10 de setembro de 2016

XXIV Domingo do Tempo Comum - ano C - 11.09.2016

       1 – O Jubileu da Misericórdia está agrafado ao Evangelho de São Lucas, conhecido também como Evangelho da Misericórdia. O Evangelho transparece a ternura, a docilidade, a proximidade de Jesus com os pecadores, os pobres, os doentes, os enjeitados deste mundo, leprosos, mulheres, crianças, servos, publicanos, estrangeiros. Nas palavras e nos gestos, na postura e nos prodígios, Jesus orienta a Sua vida e missão para reabilitar, curar, envolver, incluir, salvar. O mistério da Encarnação garante-nos a presença de Deus no meio de nós. Da eternidade para o tempo, do Céu para o mundo, para redimir a humanidade, reconciliando-a pelo perdão e pelo amor.
       Estamos no centro do Evangelho, com este grupo de três parábolas. Outras parábolas nos falam da misericórdia: dois devedores perdoados das suas dívidas (Lc 7, 41-43); o Bom Samaritano, que socorre o homem caído à beira do caminho (Lc 10, 25-37); o pobre Lázaro, que nos desafia a agir com compaixão, aqui e agora, onde se inicia o caminho para o Céu... amanhã é sempre tarde (Lc 16, 19-31); Misericórdia no prisma da oração perseverante, na súplica da viúva pobre diante do iníquo Juiz (Lc 18, 1-8); o fariseu soberbo e o publicano justificado pela humildade (Lc 18, 9-14). Mais que pelo mérito, a justificação vem-nos da misericórdia divina que nos reabilita além da nossa miséria.
       Primeira condição para sermos redimidos: abertura à graça de Deus. As parábolas explicitam o agir de Jesus; veja-se, por exemplo, a compaixão para com a viúva de Naím que levava o filho único a sepultar (Lc 7, 11-17) ou para com a multidão fatigada e faminta, multiplicando os pães (Lc 9, 11b-17). Só para dar dois exemplos do cuidado e da resposta concreta que Jesus que dá.

        2 – "Diz-me com quem andas e dir-te-ei quem és". Junta-te aos bons e serás como eles, junta-te aos maus e serás pior que eles! Qualquer um de nós está certo destes princípios. Facilmente nos colocaríamos do lado dos escribas e fariseus, contestando a promiscuidade de Jesus, que convive e come com publicanos e pecadores! Jesus anda em "más" companhias. Vai correr mal!
       Aqueles que prevenimos, contestam-nos dizendo que conhecem bem os amigos e se sentem capazes de os mudar. Jesus também se justifica, mas remetendo-nos para o proceder de Deus, que usa de misericórdia para com todos e faz festa pelo reencontro dos que se perderam.
       Conta-lhes, e a nós também, uma parábola, desdobrável em três. «Quem de vós, que possua cem ovelhas e tenha perdido uma delas, não deixa as outras noventa e nove no deserto, para ir à procura da que anda perdida, até a encontrar? Quando a encontra, põe-na alegremente aos ombros e, ao chegar a casa, chama os amigos e vizinhos e diz-lhes: ‘Alegrai-vos comigo, porque encontrei a minha ovelha perdida’. Eu vos digo: Assim haverá mais alegria no Céu por um só pecador que se arrependa, do que por noventa e nove justos, que não precisam de arrependimento. Ou então, qual é a mulher que, possuindo dez dracmas e tendo perdido uma, não acende uma lâmpada, varre a casa e procura cuidadosamente a moeda até a encontrar? Quando a encontra, chama as amigas e vizinhas e diz-lhes: ‘Alegrai-vos comigo, porque encontrei a dracma perdida’. Eu vos digo: Assim haverá alegria entre os Anjos de Deus por um só pecador que se arrependa».
       O Pastor deixa tudo e vai procurar a ovelha perdida. Ao encontrá-la, coloca-a aos ombros e alegra-se, fazendo festa com os amigos. É fundamental cuidar para que nenhuma ovelha se perca. O ambiente é adverso, o deserto. As complicações da vida, exterior e interior, podem conduzir ao desnorte e à perdição. Mas também podemos perder-nos dentro de casa, dentro da Igreja, no caminho da fé. A mulher perde a dracma em casa. Quando encontra a moeda perdida, faz festa com as amigas. Deus sempre faz festa, no nosso regresso! Antes, precisamos de arrumar a casa, acender a lâmpada da fé, de varrer tudo o que é poeira e estorvo, desviar os empecilhos, para então encontrarmos a moeda perdida.
       3 – Na terceira parábola, a mais refletida, Jesus fala num Pai que ama até ao limite e dois filhos que não se reconhecem como irmãos e lidam com o Pai como Patrão. O Pai procura salvá-los pelo amor. Os filhos relacionam-se em dinâmica de poder, disputando para ver quem é o melhor. Um acomoda-se em casa do Pai-patrão, vai herdar um imenso património. Outro pede-lhe em vida o que lhe pertenceria pela morte, quer ser patrão de si mesmo, autodeterminando-se e assumindo-se "sem pai", já que o considera morto pelo pedido da herança que lhe toca.
       O pai reparte os bens pelos seus filhos. Poderia não o fazer, pois só a morte o exigiria. Mas abaixa-se à vontade dos filhos. Por amor. A sua tristeza é evidente. Não se revolta. Não contesta os filhos. Continua a amá-los com amor materno. Parte-se-lhe o coração. Mas não desiste. Deus nunca desiste de nós. Espera, espreita o horizonte contando que o filho regresse. Quando isso acontece, não se faz rogado, "ainda ele estava longe, quando o pai o viu: enchendo-se de compaixão, correu a lançar-se-lhe ao pescoço, cobrindo-o de beijos".
       O filho continua a fixar-se em si mesmo e não no Pai. Quer ser acolhido como empregado. O que o faz regressar é a miséria em que caiu. Para o pai é suficiente um esboço de arrependimento: "Pai, pequei contra o Céu e contra ti. Já não mereço ser chamado teu filho". Está tão feliz que nem espera pelas justificações do filho: "Trazei depressa a melhor túnica e vesti-lha. Ponde-lhe um anel no dedo e sandálias nos pés. Trazei o vitelo gordo e matai-o. Comamos e festejemos, porque este meu filho estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado". A misericórdia de Deus cancela as nossas dívidas, o nosso pecado; só não atua se não lhe abrirmos qualquer brecha.
       4 – A festa começa e, quando tudo parece bem, eis que vem o filho mais velho e faz a sua birra. Ciumento e invejoso, não vê o irmão que regressa vivo, mas um concorrente – esse teu filho – a disputar as graças do patrão! "Há tantos anos que eu te sirvo, sem nunca transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito para fazer uma festa com os meus amigos. E agora, quando chegou esse teu filho, que consumiu os teus bens com mulheres de má vida, mataste-lhe o vitelo gordo".
       O filho mais velho reclama direitos. Sempre certinho, cumpridor, mas sem experimentar a alegria da proximidade com o pai. Não partilha alegrias, só trabalho. Não saboreia a vida, só obrigações. A relação com o Pai não assenta na familiaridade e na alegria, mas em deveres.
       Para o Pai, em todas as situações, prevalece o amor, a compaixão, a proximidade. Não há nada mais importante que os filhos. Podem maltratá-lo, esbanjar os bens, acusarem-no. O importante é que os filhos se sintam em casa e que estejam bem e sejam felizes. «Filho, tu estás sempre comigo e tudo o que é meu é teu. Mas tínhamos de fazer uma festa e alegrar-nos, porque este teu irmão estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado».
       Todos os filhos contam. E contam tudo. O Pai "obriga-nos" a olhar para o outro como irmão. Se é Pai de todos, somos todos irmãos. Devemos tratar-nos como tal.

       5 – A Misericórdia de Deus não tem limites. Melhor, o único limite é a nossa liberdade. Podemos escolher viver à margem de Deus, longe de casa e de costas voltadas para os irmãos.
       O povo de Deus experimenta a misericórdia de Deus, mas rapidamente se esquece do Seu cuidado e do Seu amor. Faz lembrar alguns animais domésticos, mal enchem a pança logo se afastam de casa. Aquele povo, liberto do Egipto, ensoberbece-se, fazem um deus à sua imagem!
       Diz Deus a Moisés: «Tenho observado este povo: é um povo de dura cerviz. Agora deixa que a minha indignação se inflame contra eles e os destrua. De ti farei uma grande nação».
       A oração ajuda-nos a perceber a vontade de Deus. De modo nenhum Deus quer a morte do pecador, mas antes que se converta e viva. A oração de Moisés revela a sensibilidade e o cuidado para com os seus irmãos, invocando a benevolência de Deus: «Por que razão, Senhor, se há de inflamar a vossa indignação contra o vosso povo, que libertastes da terra do Egipto com tão grande força e mão tão poderosa? Lembrai-Vos dos vossos servos Abraão, Isaac e Israel, a quem jurastes pelo vosso nome, dizendo: ‘Farei a vossa descendência tão numerosa como as estrelas do céu e dar-lhe-ei para sempre em herança toda a terra que vos prometi’». Deus não desiste de nós. Nunca. Mais facilmente desistimos uns dos outros.

       6 – Deus não cessa de nos amar. Só amando é possível tornar completa a vida e projetá-la até à eternidade. O amor pleniza-nos e eterniza os nossos sonhos e as nossas escolhas.
       Deus envia-nos Jesus. A eternidade entra no tempo, o divino humaniza-se, o Céu toca a terra, Deus faz-Se um de nós. Para nos salvar a partir de dentro. Sem imposições. Por amor. O apóstolo é testemunha desta graça de Deus. Perseguidor, blasfemo, pecador, alcançou a misericórdia de Deus. "A graça de Nosso Senhor superabundou em mim". Com efeito, continua o apóstolo, "Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores e eu sou o primeiro deles. Mas alcancei misericórdia, para que, em mim primeiramente, Jesus Cristo manifestasse toda a sua magnanimidade…".
       Humildemente, seguindo a interpelação do apóstolo, confiemo-nos ao olhar compassivo de Deus nosso Pai: "Criador e Senhor de todas as coisas, lançai sobre nós o vosso olhar; e para sentirmos em nós os efeitos do vosso amor, dai-nos a graça de Vos servirmos com todo o coração".
       Na proximidade de Deus, acolhidos na casa paterna, na alegria do Seu banquete, prontifiquemo-nos a contagiar outros para este reino de alegria e de paz, de justiça e de amor.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (C): Ex 32, 7-11. 13-14; Sl 50 (51); 1 Tim 1, 12-17; Lc 15, 1-32.

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

D. ANTÓNIO COUTO - A Misericórdia. Lugar e Modo

D. ANTÓNIO COUTO (2016). A Misericórdia. Lugar e Modo. Lavra: Autores e Letras e Coisas. 84 páginas.
       Vivemos o Jubileu Extraordinário da Misericórdia, iniciado a 8 de dezembro de 2015, solenidade da Imaculada Virgem Maria, e a encerrar no dia 20 de novembro de 2016, solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo. O propósito do Papa Francisco foi que se vincasse em definitivo e com clarividência a misericórdia de Deus. Num tempo e mundo complexos, a misericórdia de Deus há de resplandecer como proposta de salvação, como desafio, como esperança, como compromisso. Jesus é o Rosto da Misericórdia. Os cristãos devem alimentar-se da misericórdia de Deus e irradia misericórdia para com os outros, para com toda a criação.
       Com a convocação deste Ano Santo da Misericórdia, a reflexão à volta deste atributo de Deus e a sua fundamentação na bíblia, na história do povo judeu, na vida da Igreja.
       D. António Couto anteriormente publicou o Livro dos Salmos, já dentro deste Jubileu e com a referência que os salmos estudados têm com a Misericórdia de Deus. Porém, este novo estudo é especificamente sobre a Misericórdia.
       Em conferências, jornadas bíblicas, formação do clero e de leigos, D. António Couto tem intervindo sobre esta temática, com o enquadramento do jubileu, com as obras de misericórdia, com a contextualização litúrgica. Aqui coloca nas nossas mãos um estudo mais detalhado sobre a misericórdia, a linguagem da bíblia, a origem das palavras utilizadas, a misericórdia no Antigo Testamento, a misericórdia revelada em plenitude da Pessoa e na Mensagem de Jesus Cristo, com o Seu proceder, compassivo, com as parábolas da misericórdia que mostram o modo de ser de Deus.
       Este pequeno livro subdivide-se em três capítulos: 1 - Deus também reza em clave de misericórdia; 2 - A magna charta do amor de Deus (Ex 34, 6-7), e 3 - Jesus misericordioso, transparência da misericórdia do Pai.
"Deus fiel, fiável, Sim irrevogável, matriz fidedigna, maternal amor preveniente, condescendente, permanente, paciente, palavra primeira e confidente, providente, eficiente, a dizer-se sempre e para sempre dita, rochedo firme, abrigo seguro, alcofa para o nascituro, luz no escuro, amor forte sem medo da morte e do futuro. Deus fiel e confidente, fala, que o teu servo escuta atentamente. Nada do que dizes cairá por terra. A tua palavra à minha mesa, minha habitação, minha alegria, minha exultação, energia do meu coração, luz que me guia e que me alumia. A minha luz é reflexa, a minha palavra é lalação, de ti decorre, para ti corre a minha vida, dita, dada, recebida e oferecida. O teu rosto, Senhor, eu procuro, não escondas de mim o teu rosto, o teu gosto, a tua música. Dispõe de mim sempre, Senhor"

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

VL - A misericórdia de Deus reabilita-nos

       O Jubileu da Misericórdia alimenta-se da liturgia, permitindo acolher a Palavra de Deus ao longo do ano, refletindo-A e renovando propósitos que nos levam a ser misericordiosos como o Pai.
       Nos últimos três domingos (IX, X, XI, do Tempo Comum, ano C) fomos surpreendidos pela ternura, compaixão e proximidade de Jesus, que nos reabilita do pecado e da morte, “contaminando-Se” com a nossa fragilidade, deixando-nos contaminar com a Sua santidade.
       No primeiro episódio (Lc 7, 1-10), um centurião intercede por um dos seus servos, revelando uma grande humildade e uma grande fé, que o próprio Jesus testemunha. A compaixão do centurião leva-O a Jesus, cuja compaixão devolve a saúde ao servo. Atente-se à disponibilidade para partir. Nós temos que ver a agenda. Jesus parte e vai ao encontro de quem precisa da Sua ajuda! Sem hesitar.
       Num segundo momento (Lc 7, 11-17), Jesus, ao entrar na cidade de Naim, depara com um funeral. Uma pobre Mãe, viúva, leva o seu filho único a sepultar. Uma desgraça. A perda de um filho, arrasa qualquer pai. Acrescente-se o facto de ser filho único e a mãe ser viúva! O Evangelho mostra a comoção de Jesus. “Ao vê-la, o Senhor, compadeceu-Se dela”. Jesus não se fica pela contemplação da dor. Diz àquela mãe: “Não chores”. Aproxima-Se. Toca no caixão. E ordena: «Jovem, Eu te ordeno, levanta-te». Jesus levanta-nos, ressuscita-nos dos caixões que nos aprisionam, dos medos, do sofrimento e da perda e diz-nos que a última palavra não é da morte mas da vida.
       Neste último domingo (Lc 7, 36-50), uma mulher, pecadora, aproxima-se de Jesus, banha-lhe os pés com as lágrimas, derrama um vaso de alabastro, perfume de alto preço, enxuga-lhe os pés com os cabelos. Gestos que ressalvam a sua humildade e a predisposição para mudar de vida. Sente-se impelida por Jesus. Não tem muito a perder. Comprada às escondidas, rejeitada às claras. Vive e alimenta-se da escuridão. Não tem vida pessoal. Os afetos comprados não são afetos, são comércio que não tocam a alma, a não ser para a destruir. Quem a vê (de dia) desvia-se, com medo de ser contaminado e/ou que os outros levantem alguma suspeição. Se é pecadora pública, reconhecida como tal, outros contribuem para o seu pecado, comprando-a, expondo-a, promovendo a maledicência.
        Jesus deixa-Se tocar por esta mulher. Não Se desvia. Atrai-a para a Sua Luz. O amor tudo alcança. «A tua fé te salvou. Vai em paz». Os seus muitos pecados são-lhe perdoados porque muito amou.

Publicado na Voz de Lamego, de 14 de junho de 2016

sábado, 23 de julho de 2016

XVII Domingo do Tempo Comum - ano C - 24 de julho

       1 – A vocação primeira do cristão é apaixonar-se por Cristo e segui-l'O pelos caminhos por Ele propostos. Ele segue à frente e será curial que sigamos os Seus passos. Outras vezes, segue lado a lado connosco. Adianta-Se para que nos esforcemos por alcancá-l'O. Aponta-nos a meta, a direção e o quanto temos ainda que percorrer, para não afrouxarmos! Quando os nossos passos se tornam vacilantes, inseguros, Jesus volta-Se, espera por nós, vem até nós dar-nos ânimo para retomarmos o caminho. Importa não O perder de vista. Ele nunca nos deixa à deriva, mesmo quando parece que vai a dormir na nossa barca…
       A oração é o combustível que nos dá a vitalidade para enfrentarmos as adversidades, a humildade para nos reconhecermos pecadores, a sabedoria para aceitarmos que é a Sua mão que nos leva à felicidade, a pobreza para nos enriquecermos com a Sua graça e nos deixarmos preencher pelo Seu amor.
       O Evangelho de Lucas mostra-nos Jesus, recolhido, a orar. Orar é deixar que Deus fale em nós, rezar é falarmos a Deus da nossa vida, das nossas dificuldades e anseios. Se usarmos este sentido restrito, então, mais importante que rezar importa orar, deixar que Deus nos reze, que Deus diga em nós. A ligação de Jesus ao Pai é constante. A Sua vida é oração ao Pai, oferta, procurando perscrutar a vontade paterna, traduzindo-a nas palavras, nos gestos, no encontro com as pessoas. Porém, Jesus reserva momentos específicos para orar/rezar. Sem mais. Sem outro afazeres.
       Os discípulos percebem a importância da oração na vida de Jesus e deixam-se contagiar por esta postura, pedindo-Lhe que lhes ensine a rezar. O estilo de oração de Jesus leva à imitação. Jesus deixa claro que não são precisas muitas palavras, é imprescindível sintonizar o coração – pensamentos, intenções, propósitos – e a vida – serviço aos outros, luta pela justiça e pela paz, compromisso com os mais frágeis, caridade – com o coração e a vida de Deus.
       2 – A oração torna-nos íntimos de Deus e cúmplices uns dos outros. Rezai assim: «Pai, santificado seja o vosso nome; venha o vosso reino; dai-nos em cada dia o pão da nossa subsistência; perdoai-nos os nossos pecados, porque também nós perdoamos a todo aquele que nos ofende; e não nos deixeis cair em tentação».
       Percebe-se na oração do Pai-nosso, a prioridade de "orar" e não apenas "rezar". Explico: o fundamental é que a vontade do Pai se realize em nós e em todo o mundo, em todo o tempo. Começamos por reconhecer que Deus é Pai, Pai de todos, nosso Pai. E se todos o temos por Pai, todos procuramos ser-Lhe fiéis, fazendo por concretizar, aqui e agora, a Sua vontade: que todos se salvem!
       Se reconhecemos Deus como Pai e queremos que a Sua vontade se realize em mim, em ti, em nós, tornar-nos-emos mensageiros da alegria e da paz, fazedores de pontes, partidários do diálogo e da reconciliação, da partilha solidária e do perdão, do amor e da humildade, assumindo as próprias fragilidades para aceitar as dos outros. Se rezamos ao Pai, assumimo-nos como filhos, comprometidos uns com os outros, com todos os irmãos. Encaixa aqui o pedido do Pão nosso de cada dia. Se o pedimos ao nosso Pai, não o pedimos só para nós, teremos que o pedir para todos os Seus filhos, para os nossos irmãos.
       Jesus faz-Se Pão e Vida para nós. Por todos. Para todos. Jesus é partilhável. Melhor, se tento açambarcá-l'O, perco-O e traio a Sua mensagem de amor. Como Seus discípulos, como seguidores Seus, também nós teremos de nos fazermos pão e vida uns para os outros e cuidar que a ninguém falte o necessário para viver com dignidade e em segurança.
       3 – Deus não nos deixará sem resposta. A oração ajuda-nos a descobrir o que pedimos a Deus, isto é, que a Sua vontade Se realize no mundo (também) através de nós. A oração dilata o nosso coração e sintoniza-nos com Deus. Coloca-nos em atitude de escuta. A oração é um diálogo com Deus. Falamos a Deus e Deus fala-nos. Deus conhece-nos intimamente. Melhor que nós mesmos. Sabe do que precisamos. Não precisamos de dizer muito. Precisamos de nos dizer. Precisamos de perceber a vontade de Deus, escutando-O, estando atentos ao que nos quer dizer.
       Haverá ocasiões em que sobrevirá a dúvida e a incerteza sobre qual a vontade de Deus para nós e como realizarmos o que nos pede. Desde logo, a certeza que Deus é Pai. A Sua vontade e desejos descem aos nossos desejos e à nossa vontade em sermos felizes. Deus não atenta contra nós. Não nos exige sacrifícios que nos anulem e nos desumanizem, exige-nos, isso sim, dedicação, esforço, e, como Pai, que nos tratemos como irmãos cuidando sobretudo dos mais pequeninos. Nessa ocasião estaremos a cuidar de Jesus Cristo. “Sempre que fizeste isto a um dos meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizeste” (Mt 25, 40).
       O exemplo usado por Jesus convida-nos a resistir na oração, confiando em Deus. Se um amigo nos atende pela amizade ou pelo incómodo, quanto mais Deus que é nosso Pai. «Pedi e dar-se-vos-á; procurai e encontrareis; batei à porta e abrir-se-vos-á. Porque quem pede recebe; quem procura encontra e a quem bate à porta, abrir-se-á».
       Deus responder-nos-á como Pai. Podemos não gostar da resposta. Como por vezes não compreendemos as negas e os reparos dos nossos pais. Mas como Pai também Deus tudo fará para nos abençoar, nos proteger e nos guiar à verdadeira felicidade que a todos integra numa só família.
       4 – É expressiva a oração de intercessão de Abraão a favor do povo de Sodoma e Gomorra. Em primeiro lugar, vê-se com clareza como Abraão confia em Deus e na Sua misericórdia. Pede. Sugere. Negoceia. Não para si, mas para os outros. Em segundo lugar, a oração irmana-nos e leva-nos a querer o bem de todos.
       Abraão não cessa de interceder, apelando à compreensão e à benevolência de Deus. E se houver 50 justos na cidade? E se houver 40? «Se o meu Senhor não levar a mal, falarei mais uma vez: talvez haja lá trinta justos... vinte justos... talvez lá não se encontrem senão dez». A resposta de Deus é elucidativa: «Em atenção a esses dez, não destruirei a cidade». No final nem 5 justos! Uma cidade onde impere a injustiça, o egoísmo, a corrupção e a prepotência desembocará inevitavelmente em desgraça e destruição!
       A justiça de Deus é a Sua misericórdia. Deus adia o "castigo" até ao limite, melhor, prorroga todos os prazos para que sejamos salvos pelo Seu amor. A misericórdia de Deus "falha" quando o nosso pecado não Lhe abre qualquer brecha. Só nós podemos, com a liberdade com que Ele nos criou, impedir que a Sua misericórdia nos redima do pecado e da morte.

       5 – A Cruz de Cristo, reafirma São Paulo, cancela a dívida contraída pelo nosso pecado. No batismo configuramo-nos com a morte de Jesus. Com Ele sepultados, no pecado e na morte, para n'Ele e com Ele nos tornarmos novas criaturas, ressuscitando.
       Esta é uma página belíssima do Apóstolo: o documento da nossa dívida foi anulado ao ser cravado na cruz. Em Cristo, Deus perdoa-nos todas as faltas e faz-nos regressar à vida.

       6 – Peçamos a Deus o dom da sabedoria, para que em nós se multiplique a Sua misericórdia e, conduzidos por Ele, “usemos de tal modo os bens temporais que possamos aderir desde já aos bens eternos”. Complete Deus, na Sua bondade, a obra que em nós iniciou.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (C): Gen 18, 20-32; Sl 137 (138); Col 2, 12-14; Lc 11, 1-13.