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terça-feira, 16 de julho de 2019

HARUKI MURAKAMI - A morte do Comendador

HARUKI MURAKAMI (2018). A morte do Comendador. Volume 1. Alfragide: Casa das Letras. 408 páginas.
HARUKI MURAKAMI (2019). A morte do Comendador. Volume 2. Alfragide: Casa das Letras. 424 páginas.
Há ocasiões em que pegamos num copo cheio (de água, de cerveja, de vinho) e o bebemos de um trago. São assim os livros de Murakami, pelo menos para mim. Desde a obra "Em busca do Carneiro selvagem", a que aconselho para uma primeira leitura deste autor, que tenho seguido com atenção a publicação dos títulos deste autor japonês, radicado nos EUA.
Quem gosta de ler e segue de perto as publicações de alguns autores, procurando ler tudo ou quase tudo o que escrevem/publicam. Para mim, Paulo Coelho, durante um tempo, Virgílio Ferreira, José Saramago (com exceção dos diários), Augusto Cury, Gayle Forman. Um dos meus autores preferidos é Haruki Murakami. Sempre que surge uma nova publicação, qualquer outra leitura terá que esperar. Cada novo romance traz uma história encadeada, que nos prende do início ao final, com a inclusão de muitos ditados populares, criação de outros ditados, com personagens que surgem em diferentes livros, com recurso à cultura japonesa/oriental, à cultura mais ocidental, superstições e figuras mitológicas, crenças. Música, Jazz, carros, bares e rios, paisagens. Neste aparece o Toyota Corolla e um Jaguar, um Mini Cooper, e a música é clássica...
O narrador tem 36 anos (a idade de Murakami quando se tornou escritor) e enfrenta o divórcio, de um casamento que durou 6 anos, o sogro dava-lhes 5 anos de duração. Em vários livros, o autor apresenta personagens perfeitamente normais, sem se distinguirem do comum dos mortais. O narrador é um pintor, tendo-se especializado em retratos. O sucesso como retratista garante-lhe uma vida tranquila, sem sobressaltos. A opção por se tornar retratista foi o casamento e a família, agora tinha responsabilidades. Com o divórcio, a mulher decidiu que era o melhor, sente-se perdido pois continua a amar a mulher, mas "naturalmente" não faz fitas, sai de casa, anda a vaguear, até que se fixa na montanha, para Oddwara, na casa do filho do conhecido pintor Tomohiko Amada, Masahiko Amada, seu amigo, que lhe arranja emprego, a dar aulas, duas vezes por semana, duas turmas de adultos e uma de crianças.
Aí vai descobrir um quadro, escondido no sótão, onde vive uma coruja, intitulado "A Morte do Comendador". Um quadro desconhecido do grande público. Amada tinha ido para Viena estudar arte, para se dedicar a pintura ocidental, mas ao regressar ao Japão, adotou a pintura japonsesa, a nihonga, retalhos e colagens... Tornou-se famoso.
O narrador arruma o quadro no quarto de pintura. Vai-o admirando e estranhando porque é que o seu autor o manteve longe do público.
Entretanto um vizinho, Wataru Menshiki, mora numa vivenda em betão, branca, quer que o narrador lhe pinte o retrato e a soma avultada que lhe oferece fá-lo ponderar em voltar a pintar retratos. Menshiki trabalha na área das Novas Tecnologias, ou melhor, investe nesta aérea.
Uma das noites acorda, não com o barulho, mas com o silêncio, demasiado silêncio, nem os mosquitos se ouvem. Fica intrigado. Passado um momento começa a ouvir um barulho estranho, semelhante a um sino, olha para o exterior, mas está tudo às escuras, silencioso, a não ser aquele barulho. Sai para a floresta em busca do barulho, em direção a um santuário, e descobre um amontoado de pedras, quadradas, que parecem ter sido esculpidas. Volta para casa. O sino tocara entre a uma e meia e as duas horas e meia da manhã, mais coisa menos coisa. Volta a ouvir o barulho. Tem de contar a alguém e conta a Menshiki. Os dois vão novamente investigar o barulho vem do mesmo sítio. Através de pessoal contratado retiram as pedras. Pensam que podem encontrar um "monge" a tocar o sino, pois existem estórias várias de monges que se enterraram vivos e que tocam um gongo e pouco a pouco vão morrendo, ficando carne e osso. Depois anos mais tarde são desenterrados e muitas vezes são considerados como espécie de divindades. Um houve que se manteve anos a tocar o gongo e quando o encontraram, ressequido, ele continuava a tocar o sino. Alimentaram-no, ganhou carne, voltou à vida, casou, constituiu família, arranjou emprego, teve descendência... também o narrador e Menshik pensaram que poderiam encontrar um monge ressequido, mas encontram apenas um sino.
Levam-no para casa de Amada, onde vive o narrador, que o coloca no compartimento da pintura. O sino não deu sinal na primeira noite. Começam então a acontecer novos fenómenos. Um ocasião que está a tentar avançar no retrato, vai buscar qualquer coisa para comer e percebe que o banco em que se senta está noutra posição, mas não vê ninguém, daquela posição pode ver o que falta ao quadro. Mas há de ser uma voz que lhe diz que falta um pormenor importante (a cor branca do cabelo!). Mas não vê ninguém. Até que um dia encontra o Comendador, sentado tranquilamente no sofá da sala, do tamanho que está na pintura de Amada. Fala. Não está ferido. O narrador vai-lhe fazendo várias perguntas. Pode materializar-se pouco tempo e é mais fácil à noite, daí se materializar perto das duas manhã. Entrou na casa porque foi convidado no momento em que o sino também entrou. Depois pede ao narrador que convença Menshiki a convidá-lo. O narrador pergunta se pode levar o Comendador e Menshiki ri-se (da piada), mas convida-o e deixa-lhe um lugar à mesa. Só é visto e ouvido pelo narrador. O banquete é de agradecimento pelo retrato finalizado.
Menshiki pede outro favor, que pinte o retrato a uma menina, que é sua aluna, nas aulas de arte. A mãe da menina morreu, com picadas de vespas, e deixou-a com o marido, para todos os efeitos, o pai. Contudo, deixa uma carta a Menshiki e pela carta parece-lhe que ela poderá ser sua filha. Mas não quer recorrer ao ADN (se confirmasse, como é que iria retirar a filha do "pai"? E se não confirmasse, ficaria um vazio enorme), quer apenas estar próximo da filha e, por isso, comprou a casa naquele lugar, pois daí pode ver onde a filha mora. Se o narrador lhe pintar o quadro, Menshiki pode aparecer como que por acaso e vê de perto a filha, sem se revelar.

A história desenvolve, os quadros vão ficando prontos, os acontecimentos continuam a surgir. Eis que entretanto o retrato da menina está "inacabado", mas não há nada a acrescentar, fica a parte do mistério, a essência está lá.
Sem nada o prever, a menina desaparece. Parece ser um desaparecimento estranho. O narrador e Menshiki procuram-na no poço, mas apenas encontram um amoleto, que vai servir para o narrador atravessar um rio subterrâneo, será esse o pagamento ao barqueiro. Com o amigo, Masahiko Amada, o narrador vai visitar o grande pintor Tomohiko Amada. E volta a encontrar a figura do comendador, que lhe diz que terá que o matar (ainda que o Comendador seja uma Ideia). No quarto de Tomohiko Amada, na mesinha de cabeceira, a faca que anteriormente tinha desaparecido da casa de Mesahiko, onde mora o narrador. A morte do comendador será inevitável para que a menina possa reaparecer. Curiosamente, depois de aparecer, o narrador confronta a sua histórica com a da menina, a quem tinha aparecido o Comendador, quando ela se escondera na casa de Menshiki e como o Comendador a ajudou a manter-se escondida sem ser descoberta.

Mais de 800 páginas, nos 2 volumes, mas que se leem de um trago. As estórias de Murakami multiplicam-se, entrelaçando-se por entre a trama principal. O autor recorre a metáforas, imagens, comparações, analogias, ditados populares, numa linguagem sempre muito viva, escorreita, envolvendo-nos na história, com descrições pormenorizadas de pessoas, de lugares e dos acontecimentos, como quem conta uma história e nos faz ficar boquiaberto. Surpreende a forma como conjuga os elementos reais, históricos, com lugares, pessoas, culturas, a música, a pintura, a história do Japão com a China e com a Austrália, com elementos do imaginário oriental, com elementos do sobrenatural, espiritual, fantasmagórico. 

domingo, 25 de agosto de 2013

Haruki Murakami - o tempo como sonho ambíguo

       - Todos nós perdemos coisas a que damos valor. Oportunidades perdidas, possibilidades goradas, sentimentos que nunca mais voltaremos a viver. Faz parte da vida. Mas dentro da nossa cabeça, pelo menos é aí que eu imagino que tudo aconteça, existe um quartinho onde armezanamos todas as recordações. E a fim de compreendermos os mecanismos do nosso próprio coração temos que ir sempre dando entrada a novas fichas, como aqui [na Biblioteca] fazemos. Volta e meia precisamos de limpar o pó às coisas, deixar entrar ar, mudar a águia das plantas. Por outras palavras, cada um vive para sempre fechado dentro da sua própria biblioteca...
       Todas as pessoas precisam de um lugar onde possam pertencer...

       Sentes o peso do tempo como um velho sonho ambíguo. Continuas sempre em movimento, tentando arranjar maneira de te esquivares. Porém, mesmo que vás aos confins do mundo não lograrás escapar-lhe. Mesmo assim, não tens outro remédio senão seguir em frente, até esse fim do mundo. Há algo que não se consegue fazer sem lá chegar.

in HARUKI MURAKAMI. Kafka à Beira-mar. Casa das Letras. Alfragide 2012.

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Haruki Murakami: as pessoas estão sempre a morrer

       "...a vida do ser humano é breve, e muito mais frágil do que se imagina. As pessoas estão sempre e a morrer. Por isso, devemos tratar os outros de forma a não dar azo a grandes arrependimentos. De maneira justa e, se possível, com a máxima sinceridade. Eu, pessoalmente, não aprecio aqueles que não se esforçam quando têm oportunidade para isso e depois ficam a chorar baba e ranho e a torcer as mãos pelos cantos, cheios de remorsos, quando morre alguém".

Haruki Murakami, Dança, Dança, Dança. Casa das Letras, Cruz Quebrada: 2008.

domingo, 3 de outubro de 2010

Se me sentir frustrado...

       "Se estiver irritado, dirijo essa cólera contra mim próprio. Se me sentir frustrado, sirvo-me dessa experiência para me tornar melhor. Sempre vivi desta maneira. Absorvo calmamente as coisas o mais que posso, em silêncio, para mais tarde me libertar delas, e assim, procurando sempre mudar bastante as formas, elas tornam-se parte integrante da história..."

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Ninguém gosta de ser incompreendido

        "Existem valores para cada pessoa e formas de vida que correpondem a determinados valores. Essas diferenças dão, à partida, azo a discrepâncias, e a combinação desses pequenos desacordos pode estar na origem de mal-entendidos bastante ais graves. Em resultado disso, as pessoas são por vezes injustamente criticadas. Isso é mais do que evidente. Ninguém gosta de se sentir incompreendido ou de ser criticado; pelo contrário, a experiência pode revelar-se dolorosa e abrir feridas profundas...
        "É precisamente o facto de os homens serem diferentes uns dos outros que lhes permite construir a sua individualidade de maneira autónoma...
       "O facto de ser eu e não outra pessoa qualquer é, portanto, uma das minhas grandes perrogativas. As feridas emocionais represetam um preço a pagar ao mundo para obter essa independência como ser humano".

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

De cada falhanço, de cada alegria, uma lição!

       "Concentro-me em cada passo que dou, mas, ao mesmo tempo, procuro reflectir sem nunca perder de vista um cenário mais vasto, tentando abarcar as paisagens mais longínquas, ir mais o longe que me é possível. Sou, por definição, um corredor de fundo...
       "Para um corredor como eu, o que verdadeiramente importa é conseguir os objectivos que me proponho, ir até onde as minhas pernas me levam. Dou tudo o que tenho, aguento tudo o que tenho de aguentar, e obtenho, à minha maneira, o que para mim conta. De cada falhanço, de cada alegria, procuro tirar sempre uma lição concreta. (Não importa que seja minúscula, basta que seja concreta.) Com o tempo, à medida qe os anos forem passando, contando desde já com as corridas que hão-de vir, acabarei por alcançar o meu lugar de eleição. Ou talvez, quem sabe?, apenas um lugar que se aproxime vagamente disso. (Sim, esta é a melhor maneira de pôr as coisas, sem sombra de dúvida.)
       Um dia, se vier a ter uma campa e puder escolher o que ali será gravado, gostaria que dissesse o seguinte:
HARUKI MURAKAMI
1949 - 20**
ESCRITOR (E CORREDOR DE FUNDO)
PELO MENOS NUNCA CAMINHOU A PASSSO

       Haruki MURAKAMI, Auto-retrato do escritor enquanto corredor de fundo. Casa das Letras: 2009.