1 – «Assim como o Pai Me amou, também Eu vos amei. Permanecei no meu amor. Se guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor, assim como Eu tenho guardado os mandamentos de meu Pai e permaneço no seu amor».
Crescemos e amadurecemos imitando os outros no nosso comportamento, na nossa aprendizagem, nos nossos gestos, de tal forma que o convívio que se prolonga no tempo acentua as parecenças até mesmo no timbre de voz. Com facilidade confundimos, ao telefone, a voz de dois irmãos, ou da mãe e da filha, ou do pai e do filho. Há filhos que caminham como os pais, têm os mesmos tiques ou trejeitos e imitam-nos no vestir. Pouco disponíveis para escutar os conselhos, repreensões ou sermões, mas prontos para repetir a postura dos pais. Se em casa se fala muito alto, na escola os filhos reproduzirão a mesma sonoridade. Se há palavrões em família, não será muito diferente na escola. Nem tudo é linear. Há crianças de famílias desestruturadas que têm comportamentos exemplares e crianças de famílias bem estruturadas com comportamentos perturbadores quando longe dos pais. Refira-se, a propósito, que hoje em dia a postura mimética é mais abrangente, imitam-se os colegas da sala de aula, os atores de determinada série de televisão, os amigos lá da rua. A televisão e a Internet, meios privilegiados de difusão, facilmente globalizam gestos, formas de vestir e de pensar.
E como cristãos, quem é que imitamos? A maioria? O que está na moda?
Os valores que defendemos, na medida em que estamos inseridos numa cultura globalizada, nem sempre são concordes com a fé professada. Recordo os milhares de jovens que aplaudiam o Papa João Paulo II, nos EUA, na sua última viagem apostólica àquele país. Quando lhes perguntavam sobre valores, da vida, da dignidade da pessoa humana desde a conceção à morte natural, as respostas eram curiosas: gostavam do Papa – figura mundial – mas não das ideias que defendia.
Temos um modelo a seguir e a imitar: Jesus Cristo. Como o Pai me ama, também Eu vos amo. Dou a vida por vós. Amai-vos uns aos outros como EU vos amo.
2 – As palavras movem, os testemunhos arrastam. Como sublinhava o Papa Paulo VI, o nosso tempo mais que mestres quer testemunhas, ou mestres que sejam testemunhas. Jesus dá-nos o exemplo. É a referência da nossa vida, dos nossos gestos. Não temos que imitar mais ninguém, em absoluto. Devemos ser referência uns para os outros, mas na medida em que transparecemos Jesus Cristo e o Seu evangelho de verdade e de caridade. Como nos dirá São Paulo: sede meus imitadores como eu sou imitador de Cristo.
O plano original de Deus aponta para uma imitação libertadora, como família, revendo-nos uns nos outros. Fomos criados à imagem e semelhança de Deus. Da mesma carne, do mesmo sangue, com a mesma origem. Saímos das mãos de Deus e do Seu coração. Auxiliares uns dos outros. O pecado surge não por sermos diferentes, mas por queremos excluir os outros da nossa vida e colocar-nos diante deles como senhores absolutos do mundo.
A Encarnação de Deus, em Jesus Cristo, e o Seu mistério pascal, paixão, morte e ressurreição, invertem o caminho para nos colocarem novamente na senda de Deus, orientando-nos uns para os outros, assumindo-nos como irmãos, como família. Ele entrega a Sua vida por nós. «Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida pelos amigos». Para termos vida em abundância. «Disse-vos estas coisas, para que a minha alegria esteja em vós e a vossa alegria seja completa. É este o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros, como Eu vos amei». Jesus trata-nos como irmãos, como amigos. «Vós sois meus amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi a meu Pai».
A amizade leva-nos à proximidade (e vice-versa) e à identificação. Identificamo-nos com os nossos amigos, de quem aceitamos conselhos, recomendações, a quem pedimos opinião. «Fui Eu que vos escolhi e destinei, para que vades e deis fruto e o vosso fruto permaneça. O que vos mando é que vos ameis uns aos outros». Como ramos unidos à videira, também nós daremos muitos frutos se unidos a Cristo, se d'Ele nos alimentarmos.
3 – É mentiroso todo aquele que diz amar a Deus e odiar o seu semelhante. É uma afirmação que decorre da Palavra de Deus e da vivência da fé. Se Deus é Pai de todos, todos somos irmãos. Não podemos rezar o Pai-nosso em comum e depois cada um ir à sua vida, com as suas preocupações, mesmo que honestas e defensáveis. Não. O Pai-nosso não é apenas uma oração que Jesus nos ensina, é um desafio e um compromisso. Reconhecemo-nos diante de Deus como irmãos, dispondo-nos a acolher o Seu reino e a Sua vontade em todo o mundo.
Com efeito, diz-nos o apóstolo são João, na segunda leitura, «amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem de Deus e todo aquele que ama nasceu de Deus e conhece a Deus. Quem não ama não conhece a Deus, porque Deus é amor. Assim se manifestou o amor de Deus para connosco: Deus enviou ao mundo o seu Filho Unigénito, para que vivamos por Ele. Nisto consiste o amor: não fomos nós que amámos a Deus, mas foi Ele que nos amou e enviou o seu Filho como vítima de expiação pelos nossos pecados».
O amor ao próximo não é uma opção. Se seguimos Cristo é para O imitarmos, acolhendo a Sua palavra. Somos discípulos missionários. Embrenhamo-nos no Evangelho e transparecemo-lo através da nossa vida, até que possamos dizer o mesmo que o apóstolo Paulo: «Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim» (Gl 2, 20), «Para mim, viver é Cristo» (Fil 1, 21).
Jesus dá a Sua vida por nós. Nesta entrega é visível que Deus nos ama primeiro para que também nós possamos amar-nos uns aos outros. É no amor que conheceremos a Deus e n'Ele permaneceremos.
4 – O sol quando nasce é para todos. Como lembra a Sagrada Escritura, Deus faz chover sobre bons e maus (cf. Mt 5, 45). A salvação que nos é dada em Jesus Cristo, no mistério pascal que celebramos em cada Eucaristia, não é prerrogativa de um ou outro grupo, de um ou outro iluminado. É para todos, independentemente da origem, do caminho percorrido, da raça, da cor, ou da nacionalidade. A única condição é amar, deixar-se plasmar pelo Espírito de Deus.
Ao longo da história da Igreja, este Corpo de Cristo a que pertencemos pelo Batismo, como membros de que Ele é a Cabeça e o garante, viveu os dramas das diferentes épocas, culturas e sensibilidades, procurando, através dos mais humildes e dos mais santos, aproximar-Se de Jesus, identificar-se com Ele, manter-se fiel ao Evangelho. Logo no início surgem dissensões. As pessoas têm opiniões próprias que precisam de moldar ao proceder de Jesus, libertando-se das arestas de cada um, para sermos MAIS em Cristo.
Os apóstolos, nomeadamente Pedro, compreendem que a Páscoa não é benefício dos judeus, mas terá que chegar a todos. A conversão de Cornélio, oficial romano, é um desafio para o qual, aparentemente, a primeira comunidade não estava preparada, ainda que o envio de Jesus seja a todo o mundo, a todas as nações. «Na verdade, diz Pedro, eu reconheço que Deus não faz aceção de pessoas, mas, em qualquer nação, aquele que O teme e pratica a justiça é-Lhe agradável».
O Senhor opera maravilhas a favor de todos os povos. «Todos os fiéis convertidos do judaísmo, que tinham vindo com Pedro, ficaram maravilhados ao verem que o Espírito Santo se difundia também sobre os gentios, pois ouviam-nos falar em diversas línguas e glorificar a Deus».
5 – O salmista ajuda-nos a rezar e a agradecer: «O Senhor deu a conhecer a salvação, revelou aos olhos das nações a sua justiça. Recordou-Se da sua bondade e fidelidade em favor da casa de Israel. Os confins da terra puderam ver a salvação do nosso Deus. Aclamai o Senhor, terra inteira, exultai de alegria e cantai».
Pe. Manuel Gonçalves
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