sábado, 11 de julho de 2015

XV Domingo do Tempo Comum - ano B - 12 de julho

       1 – Deus chama-nos para nos enviar. A primeira e mais original vocação do cristão é a santidade, isto é, a disponibilidade para acolher Deus, deixando-se transformar pela Sua graça, identificando-se progressivamente com Jesus Cristo e com o seu jeito de viver, de amar, de perdoar, de Se assumir irmão, sobretudo dos mais frágeis.
       Jesus chama os apóstolos e envia-os. Se, por momentos, eles entendem que o seguimento é um privilégio, uma prerrogativa com benefícios materiais, sociais ou políticos, cedo vão perceber que seguir Jesus é uma missão da qual poderá advir a perseguição e a própria morte.
        Partem de mãos vazias. Como nos tem lembrado o nosso Bispo, D. António Couto, de mãos vazias como as de Deus, que tudo nos dá; a bênção faz-se com as mãos abertas e estendidas e hão de corresponder às nossas mãos abertas para receber os dons de Deus, mantendo-as abertas para repartir pelos irmãos. "Ordenou-lhes que nada levassem para o caminho, a não ser o bastão: nem pão, nem alforge, nem dinheiro; que fossem calçados com sandálias, e não levassem duas túnicas". O importante mesmo é a mensagem que levam. Quanto mais leves mais disponíveis e mais próximos das pessoas. O que levamos pesa-nos, atrasa-nos o andar, afasta-nos dos outros, cria medo de perder o que temos, faz-nos desconfiar dos outros e das suas intenções…
       Os apóstolos – hoje somos nós – não estão sós. Jesus envia-os dois a dois. Jesus vai com eles, vai connosco através do outro e da comunidade. Quando dois ou três vos reunirdes em Meu nome, Eu estarei no MEIO de vós (cf. Mt 18, 20). Sozinhos perder-nos-emos. Desanimaremos rapidamente, perderemos a direção, duvidaremos facilmente sobre o caminho que seguimos. O nosso GPS é Jesus, que segue connosco através da comunidade, a Igreja, que é o Seu Corpo.

        2 – O discípulo será sempre discípulo. Para os cristãos o Mestre é Jesus. Quem se assumir como mestre deixa de ser cristão para ser outra coisa qualquer. Fixando-nos nos dois termos "discípulo" e "apóstolo", diríamos que o cristão terá que ser sempre discípulo mesmo quando é apóstolo. Por sua vez, o apóstolo, para se manter fiel a Jesus Cristo, será sempre discípulo, aluno, aprendiz, servo. Por outras palavras, e assumindo a linguagem que se foi aprofundando nas Conferências Gerais do Episcopado da América Latina (CELAM), a junção da condição de discípulo com a de missionário. Daí que o cristão, todo o cristão, seja discípulo missionário. Não podemos ser seguidores de Jesus se não para O vivermos e O anunciarmos ao mundo inteiro.
       Jesus dá-lhes o poder sobre os espíritos impuros, com o seguinte mandato: «Quando entrardes em alguma casa, ficai nela até partirdes dali. E se não fordes recebidos em alguma localidade, se os habitantes não vos ouvirem, ao sair de lá, sacudi o pó dos vossos pés como testemunho contra eles».
       É Jesus quem os envia. O mandato é de Cristo. A mensagem que hão de anunciar – a proximidade do reino, o arrependimento e a fé no Evangelho (cf. Mc 1, 14-15) – é de Cristo. O risco dos discípulos é tornarem-se mestres desligando-se do verdadeiro Mestre, de Jesus Cristo, e em vez de anunciarem o Evangelho, anunciarem-se a si mesmos. E assim também o perigo da Igreja – constituída por todos os discípulos de Jesus –, de se debruçar sobre si mesma, protegendo-se, protegendo os privilégios que adquiriu. Desde o início do seu pontificado, Francisco tem-se referido à doença de uma Igreja ensimesmada, autorreferencial, voltada para o interior onde já só se encontra uma ovelha. Ao invés, a Igreja deve sair, à procura das 99 ovelhas que se tresmalharam, e anunciar Jesus. Como a Lua reflete a luz do Sol, assim a Igreja tem que refletir a Luz de Cristo.
       "Os Apóstolos partiram e pregaram o arrependimento, expulsaram muitos demónios, ungiram com óleo muitos doentes e curaram-nos" e regressam para junto de Jesus, como veremos no próximo Domingo. O ponto de partida é Jesus. O ponto de encontro dos cristãos, dos discípulos missionários, é Jesus. Ele é o ponto de convergência e de irradiação da salvação.

       3 – O Deus de Jesus Cristo é um Deus próximo, Pai, amigo. Se em Cristo Se revela em plenitude, nos Profetas e através deles, Deus dá-Se a conhecer como Alguém que se entranha na História, intervindo positivamente, pelos sinais e pelos mensageiros. Víamos, na semana passada, o envio de Ezequiel para o meio do povo. Podem não o escutar e à Palavra que traz de Deus, mas saberão que Deus não os abandona, que está no meio deles pelo Profeta.
       Amós está em missão. Não se anuncia. Vem em nome de Deus para comunicar a mensagem de Deus. E como bem sabemos a Palavra de Deus é como espada de dois gumes, corta o mal para introduzir o bem, denuncia as injustiças, a pobreza, a exclusão, para propor a Aliança, colocando Deus no centro para que as pessoas não sejam usadas caprichosa e arbitrariamente.
       Poderá a honestidade ofender? Poderá a verdade ferir? (Não se trata aqui da sensibilidade e do cuidado que deveremos ter quando lidamos com pessoas. Há sempre o perigo de utilizarmos a verdade, a honestidade ou a frontalidade como desculpa e justificação para destilarmos ódio e os nossos azeites sobre alguém de quem não gostamos muito).
       A honestidade, pela sua transparência, poderá ofender o desonesto, pois este sente-se exposto. Amasias, sacerdote de Betel, ressentido, ordena a Amós: «Vai-te daqui, vidente. Foge para a terra de Judá. Aí ganharás o pão com as tuas profecias. Mas não continues a profetizar aqui em Betel, que é o santuário real, o templo do reino». O sacerdote do templo está conivente com o poder instituído e não quer perder nem o posto nem o prestígio nem os proventos, pelo que tenta condicionar Amós.
       A resposta de Amós é corajosa: «Eu não era profeta, nem filho de profeta. Era pastor de gado e cultivava sicómoros. Foi o Senhor que me tirou da guarda do rebanho e me disse: ‘Vai profetizar ao meu povo de Israel’». O que está em causa não é Amós, mas Deus e o Seu mandato. Recusar servir a Deus para servir o poder e a realeza terrena não são opção para Amós.

       4 – A segunda leitura, como na maioria dos domingos, traz-nos o Apóstolo Paulo, Profeta cristão, que em nome de Jesus Cristo anuncia o Evangelho a todo o mundo onde humanamente é possível chegar. As missivas, enviadas às diversas comunidades por ele instituídas ou solidificadas, revelam esta preocupação de vincular os cristãos ao Evangelho recordando-lhes a Palavra de Deus, e apontando caminhos para viverem de acordo com Jesus Cristo.
       A Carta aos Efésios inicia com uma saudação que revela a misericórdia de Deus que nos abençoa com todas as espécies de bênçãos espirituais em Cristo para que vivamos como herdeiros, como filhos, conduzindo a nossa vida de forma a darmos glória a Deus, respondendo à Sua bênção: “N’Ele nos escolheu, antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis, em caridade, na sua presença. Ele nos predestinou, conforme a benevolência da sua vontade, a fim de sermos seus filhos adotivos, por Jesus Cristo, para louvor da sua glória e da graça… N’Ele, pelo seu sangue, temos a redenção e a remissão dos pecados. Em Cristo fomos constituídos herdeiros, para sermos um hino de louvor da sua glória...”
       A chuva que cai na terra não volta para o céu sem ter produzido fruto, assim a Palavra de Deus, assim a Sua bênção, é um chamamento constante, um desafio, para que em nós produza em abundância e transpareça para todas as pessoas que Deus estão à nossa volta.

       5 – A oração de coleta deste domingo recolhe e sublinha a palavra proclamada: "Senhor nosso Deus, que mostrais aos errantes a luz da vossa verdade para poderem voltar ao bom caminho, concedei a quantos se declaram cristãos que, rejeitando tudo o que é indigno deste nome, sigam fielmente as exigências da sua fé".
       A oração torna-nos mais íntimos de Deus, que nos envia aos nossos semelhantes. A fé salva-nos, mas aferimos da sua autenticidade quando nos tornamos irmãos e cuidamos uns dos outros.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (B): Amós 7, 12-15; Sal 84 (85); Ef 1, 3-14; Mc 6, 7-13.

Sem comentários:

Enviar um comentário