sexta-feira, 9 de outubro de 2015

XXVIII Domingo do Tempo Comum - B - 11 de outubro

       1 – «Falta-te uma coisa: vai vender o que tens, dá o dinheiro aos pobres e terás um tesouro no Céu. Depois, vem e segue-Me».
       Jesus responde, exigindo o máximo, desafiando o melhor de cada um. Aceita a nossa limitação, mas também a capacidade de progredirmos. Alguém se aproxima de Jesus, a correr, e ajoelha perguntando: «Bom Mestre, que hei-de fazer para alcançar a vida eterna?».
       É um momento importante que os evangelistas sublinham e que volta a colocar-nos diante da pobreza e do compromisso com os mais pequenos. Aquele homem tem pressa em chegar perto de Jesus e esperança de encontrar respostas para a inquietação que lhe vai na alma. Deixou o que estava a fazer! É uma hipótese. Ou não queria perder tempo porque tinha muitas ocupações! Gera simpatia em Jesus e nos seus discípulos. Jesus responde-lhe com a Sagrada Escritura: «Porque Me chamas bom? Ninguém é bom senão Deus. Tu sabes os mandamentos: Não mates; não cometas adultério; não roubes; não levantes falso testemunho; não cometas fraudes; honra pai e mãe’».
       Só Deus é Deus, só Deus é bom. Como seres humanos estamos a caminho, a amadurecer, a crescer, a aprender. E logo Jesus lhe recorda os mandamentos, sancionando a mensagem mosaica. Porém, cumprir a lei só por cumprir, como obrigação imposta, ou como tradição convencionada, não traz alegria à vida. Há pessoas muito certinhas ao longo de uma vida inteira e que nunca experimentaram o entusiasmo de viver e de servir amando. A vida enfaixada na lei, nos preceitos, nos medos, sem convicção, cumpre-se o que é socialmente recomendável. Falta a chama do amor, da paixão, da vida nova.
       Cumprir regras, em obediência cega, não implica viver. Jesus lança-lhe e lança-nos o repto: «Falta-te uma coisa: vai vender o que tens, dá o dinheiro aos pobres e terás um tesouro no Céu. Depois, vem e segue-Me». Nada se pode interpor entre nós e o seguimento. Se temos muitos afazeres, o seguimento de Jesus não é (ainda) para nós.
       2 – «Como será difícil para os que têm riquezas entrar no reino de Deus!»
       Jesus sendo rico fez-Se pobre para nos enriquecer com a Sua pobreza (cf. 2 Cor 8, 9). O chão do Evangelho: serviço aos outros e sobretudo aos mais pobres. Quem quiser ser o maior será o menor de todos e o servo de todos (cf. Mc 9, 30-37).
       Aquele homem, quando Jesus lhe falou na necessidade de vender os bens, não para comprar tesouros, mas para lhe ser dado um tesouro no reino dos Céus, entristeceu-se pois o seu mundo e a sua segurança eram os bens materiais que possuía. Tinha muitos bens para “comprar” a vida eterna! Mas o que há de mais importante na vida não tem preço. Jesus oferece-lhe a vida eterna!
       Apesar de ser "materialmente" um homem muito rico, é espiritualmente um homem muito pobre, que não consegue ser feliz. O que tem dá para ele e sobeja para fazer outros felizes. Há mais alegria em dar do que em receber (cf. Atos 5, 35). A felicidade mede-se mais pelo número de amigos do que pela quantidade de bens. Aprendeu a comprar, não aprendeu a receber e a dar!
       Num primeiro momento Jesus exigiu o mais básico: cumprir os mandamentos. Com o avançar do diálogo compreendeu que aquele homem esperava mais da vida. Faz-lhe um desafio maior, de entrega e de seguimento. Quem preferir a casa, os pais, os filhos, mais que a Mim não é digno de Me seguir (cf. Mt 10, 37-38). Não se trata de excluir, mas de amar. Colocando Deus como prioridade, multiplicar-se-á o amor para amar de verdade o pai, a mãe, os irmãos, o filho e/ou a filha, nunca os reduzindo instrumentalmente aos próprios gostos, apetites ou necessidades, mas tratando-os como filhos de Deus e portanto como irmãos, sem ascendência nem subserviência.
       3 – A opção preferencial pelos mais pobres, o compromisso social, a erradicação da pobreza, estão bem vincadas neste texto. Àquele homem é proposto o despojamento e a partilha; a pobreza como opção de vida, como dinamismo que irmana e enlaça nos outros. Uma pobreza para enriquecer os demais e para se enriquecer com o maior dos tesouros: a vida eterna. "De nenhum fruto queiras só metade" (Miguel Torga). Vive a vida por inteiro, e não à espera; como ator e não como espectador; age, atua, transforma o mundo que habitas. Não guardes somente para ti. Quando partires, segue contigo o que foste e viveste, nunca o que adquiriste. Verdadeiramente teu é o que partilhares com os outros. As coisas que guardas não as possuis, são elas que te possuem.
       «Como será difícil para os que têm riquezas entrar no reino de Deus!».
       Definitivamente, o que está em causa não são os bens ou a riqueza material, mas a avareza, a ganância desmedida. Naquele homem não há espaço para a vida, para a alegria, para a festa, para a partilha. Oportunidade para nos interrogarmos sobre o tempo que dedicamos à família e a apreciar o que nos rodeia. Também por esta razão o DOMINGO faz sentido, pois nos interliga à vida como um TODO, aos outros, ao mundo, às pessoas que passam e habitam a nossa vida.
       Aquele homem tinha os meios e os bens para ajudar outros a viver melhor. E seria muito mais feliz! «Meus filhos, como é difícil entrar no reino de Deus! É mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no reino de Deus».
       Todos precisamos de bens que configurem certa comodidade e sobretudo permitam viver com dignidade. O trabalho honesto e retribuído com justiça dignifica o trabalhador e o proprietário. Importa não esquecer, parafraseando Jesus Cristo, que o trabalho é para engrandecer a pessoa e nunca para a escravizar. Os escravos do trabalho perderão a vida, depois de perderem a alma.
       4 – «Quem pode então salvar-se?». A pergunta dos discípulos implica-nos também a nós que nos vamos agarrando às coisas, para nos sentirmos "seguros", presos a um lugar, a uma situação, a um aconchego.
       A resposta de Jesus é clarificadora: «Aos homens é impossível, mas não a Deus, porque a Deus tudo é possível». Não somos nós que nos salvamos, é Deus que nos salva para além do tempo e da história. É Deus, somente Deus, que nos resgata na nossa mortalidade e nos abre as portas da eternidade. A promessa de Jesus envolve também as perseguições, as dificuldades. Seguir Jesus exige tomar a sua cruz dia após dia e segui-l'O em todas as situações, favoráveis ou contrárias.
       A nós cabe-nos fazer o que está ao nosso alcance, cada vez com mais exigência, dando sempre o melhor de nós. A negociação dos discípulos – «Vê como nós deixámos tudo para Te seguir» – volta a mostrar como são falíveis e imaturos. Ainda se prendem a disputas, a lugares, a benesses. Ainda não se aperceberam do tempo da salvação, da gratuidade, da partilha, em que se vive o serviço e o amor ao próximo.
       No evangelho é possível encontrar Mateus (cf. Mt 9, 9-13), que deixa a banca dos impostos para seguir Jesus; é possível irmos a casa de Zaqueu, que deixa o seu posto de cobrança para vender o que tem, compensar os que prejudicou e partilhar com os pobres (cf. Lc 19, 1-10).
       Os bens materiais não impedem o seguimento. A atitude face aos mesmos é que pode impedir. Algumas mulheres seguem Jesus, juntamente com os Apóstolos, entre elas, Maria Madalena, Joana, mulher de Cuza, administrador de Herodes, Susana e muitas outras, que servem Jesus com os seus bens (cf. Lc 8, 1-13).

        5 – No meio da nossa fragilidade e do nosso pecado, socorramo-nos da palavra de Deus, que é "viva e eficaz, mais cortante que uma espada de dois gumes… capaz de discernir os pensamentos e intenções do coração… É a ela que devemos prestar contas".
       A oração sintoniza-nos com Deus, com a Sua Palavra, com a Sabedoria que d'Ele nos vem: «Orei e foi-me dada a prudência; implorei e veio a mim o espírito de sabedoria. Preferi-a aos cetros e aos tronos e, em sua comparação, considerei a riqueza como nada… Amei-a mais do que a saúde e a beleza e decidi tê-la como luz, porque o seu brilho jamais se extingue. Com ela me vieram todos os bens e, pelas suas mãos, riquezas inumeráveis».
       Rezemos com a oração (de coleta) proposta hoje na Eucaristia: "Nós Vos pedimos, Senhor, que a vossa graça preceda e acompanhe sempre as nossas ações e nos torne cada vez mais atentos à prática das boas obras".

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (B): Sab 7, 7-11; Sl 89 (90); Hebr 4, 12-13; Mc 10, 17-30.

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