"É assim que a Igreja cresce: juntamente com Pedro,
confessando Cristo, seguindo Cristo. E façamo-lo sempre. Eu estou muito
agradecido pela vossa oração, que pude sentir – como disse quarta-feira – quase
fisicamente. Embora agora me retire, na oração continuo sempre unido a todos vós
e tenho a certeza de que também vós estareis unidos a mim, apesar de permanecer
oculto para o mundo.
Devido às condições da minha idade, não pude preparar, para hoje, um grande e
verdadeiro discurso, como alguém poderia esperar; eu pensava mais numa breve
conversa sobre o Concílio Vaticano II, tal como eu o vi..."
Vaticano II, sobre a Liturgia:
"Eu diria que havia diversas: sobretudo o Mistério Pascal como centro do ser
cristão e, consequentemente, da vida cristã, do ano, do tempo cristão, expresso
no tempo pascal e no domingo que é sempre o dia da Ressurreição. Sempre de novo
começamos o nosso tempo com a Ressurreição, o encontro com o Ressuscitado, e, do
encontro com o Ressuscitado, saímos para o mundo. Neste sentido, é uma pena que
hoje o domingo se tenha transformado em fim de semana, quando na verdade é o
primeiro dia, é o início. Interiormente devemos ter isto presente: é o início, o
início da Criação, é o início da recriação na Igreja, encontro com o Criador e
com Cristo Ressuscitado. Também este duplo conteúdo do domingo é importante: é o
primeiro dia, isto é, a festa da criação, o nosso fundamento continua a ser a
Criação, acreditamos em Deus Criador; e encontro com o Ressuscitado, que renova
a Criação; o seu verdadeiro objectivo é criar um mundo que seja resposta ao amor
de Deus"
Vaticano II, sobre a Igreja:
"Nós somos a Igreja, a Igreja não é uma
estrutura; nós, os próprios cristãos juntos, todos nós somos o Corpo vivo da
Igreja. Naturalmente isto é válido no sentido que o nós, o verdadeiro «nós» dos
crentes, juntamente com o «Eu» de Cristo é a Igreja; cada um de nós, não «um
nós», um grupo que se declara Igreja. Isso não! Este «nós somos Igreja» exige
precisamente a minha inserção no grande «nós» dos crentes de todos os tempos e
lugares. Assim temos a primeira ideia: completar a eclesiologia de modo
teológico, mas continuando também de modo estrutural, ou seja, ao lado da
sucessão de Pedro, da sua função única, definir melhor também a função dos
Bispos, do Corpo Episcopal. E, para fazer isso, encontrou-se a palavra
«colegialidade», muito discutida, com discussões acesas, diria mesmo, um pouco
exageradas. Mas era a palavra – talvez houvesse ainda outra, mas esta servia –
para exprimir que os Bispos, juntos, são a continuação dos Doze, do Corpo dos
Apóstolos. Dissemos: só um Bispo, o de Roma, é sucessor de um determinado
apóstolo, de Pedro. Todos os outros tornam-se sucessores dos Apóstolos, entrando
no Corpo que continua o Corpo dos Apóstolos. Precisamente assim o Corpo dos
Bispos, o colégio, é a continuação do Corpo dos Doze, e deste modo se vê a sua
necessidade, a sua função, os seus direitos e deveres. A muitos aparecia como
uma luta pelo poder, e talvez algum tenha pensado também ao seu poder, mas
substancialmente não se tratava de poder, mas da complementaridade dos factores
e do completamento do Corpo da Igreja com os Bispos, sucessores dos Apóstolos,
como pedra angular; e cada um deles, unido a este grande Corpo, é pedra angular
da Igreja".
Vaticano II, sobre a Revelação:
"Ainda mais conflituoso era o problema da Revelação. Tratava-se da relação entre
Escritura e Tradição, e aqui apareciam sobretudo os exegetas interessados numa
maior liberdade; sentiam-se um pouco – digamos – em situação de inferioridade
relativamente aos protestantes, que faziam as grandes descobertas, enquanto os
católicos se viam um pouco como «deficientes» pela necessidade de se submeter ao
Magistério. Por conseguinte, aqui estava em jogo uma luta também muito concreta:
Que liberdade têm os exegetas? Como se pode ler bem a Escritura? Que quer dizer
Tradição? Era uma batalha pluridimensional que não posso mostrar agora; o
importante é que a Escritura é de certeza a Palavra de Deus, e a Igreja está sob
a Escritura, obedece à Palavra de Deus, não está acima da Escritura. E, no
entanto, a Escritura só é Escritura porque existe a Igreja viva, o seu sujeito
vivo; sem o sujeito vivo da Igreja, a Bíblia é apenas um livro que abre, se abre
para diferentes interpretações sem dar uma derradeira clareza...
Vaticano II, sobre o ecumenismo e a liberdade religiosa:
O horizonte da segunda parte do Concílio é muito mais vasto. Apresentava-se, com
grande urgência, o tema: O mundo de hoje, a época moderna, e a Igreja; e,
relacionado com o mesmo, os temas da responsabilidade pela construção deste
mundo, da sociedade, a responsabilidade pelo futuro deste mundo e esperança
escatológica, a responsabilidade ética do cristão, onde poderá encontrar os seus
guias; e, depois, a liberdade religiosa, o progresso e a relação com as outras
religiões. Nesta altura, participam realmente na discussão todas as latitudes
presentes no Concílio; não só a América, os Estados Unidos…, com um grande
interesse pela liberdade religiosa. No terceiro período, estes disseram ao Papa:
Não podemos voltar para casa sem levar, na nossa bagagem, uma declaração sobre a
liberdade religiosa votada pelo Concílio. Todavia o Papa, com firmeza e decisão,
teve a paciência de levar o texto para o quarto período, a fim de encontrar uma
maturação e um consenso suficientemente completos entre os Padres do Concílio.
Como dizia, jogaram um papel forte no Concílio não só os norte-americanos, mas
também a América Latina, bem conhecedora da miséria do povo, de um continente
católico, e da responsabilidade da fé pela situação daquela gente. E de igual
modo a África, a Ásia, que viram a necessidade do diálogo inter-religioso;
despontaram problemas que nós, alemães, – é justo que o diga – no início não
tínhamos visto. Não posso agora descrever tudo isto. O grande documento «Gaudium
et spes» analisou muito bem os problemas da escatologia cristã e progresso
do mundo, da responsabilidade pela sociedade de amanhã e responsabilidade do
cristão face à eternidade, tendo assim também renovado a ética cristã, os
fundamentos. Mas inesperadamente – digamos – cresceu, ao lado deste grande
documento, outro documento que dava resposta, de forma mais sintética e
concreta, aos desafios do tempo: a «Nostra aetate». Desde o início,
estavam presentes os nossos amigos judeus, que nos disseram a nós, alemães,
sobretudo, mas não só a nós, que depois dos tristes acontecimentos deste século
nazista, da década nazista, a Igreja Católica deve dizer uma palavra sobre o
Antigo Testamento, sobre o povo judeu. Diziam: embora seja claro que a Igreja
não é responsável pelo Shoah, todavia uma grande parte daqueles que
cometeram tais crimes eram cristãos; devemos aprofundar e renovar a consciência
cristã, mesmo sabendo bem que os verdadeiros crentes sempre resistiram contra
essas coisas. Tornava-se assim claro que a relação com o mundo do antigo Povo de
Deus devia ser objecto de reflexão. É compreensível também que os países árabes
– os Bispos dos países árabes – não tivessem ficado felizes com esta
possibilidade: temiam em certa medida uma glorificação do Estado de Israel, que
naturalmente não queriam. E disseram: Uma indicação verdadeiramente teológica
sobre o povo judeu é boa, é necessária, mas, se falardes disso, falai também do
Islão; só assim se restabelecerá o equilíbrio; também o Islão é um grande
desafio, e a Igreja deve esclarecer igualmente a sua relação com o Islão. Eis
uma realidade que então nós quase não compreendemos: um pouco, sim, mas não
muito. Hoje sabemos como era necessário!"
O verdadeiro Concílio:
"Agora quero acrescentar ainda um terceiro ponto: havia o Concílio dos Padres – o
verdadeiro Concílio – mas havia também o Concílio dos meios de comunicação, que
era quase um Concílio aparte. E o mundo captou o Concílio através deles, através
dos mass-media. Portanto o Concílio, que chegou de forma imediata e
eficiente ao povo, foi o dos meios de comunicação, não o dos Padres. E enquanto
o Concílio dos Padres se realizava no âmbito da fé, era um Concílio da fé que
faz apelo ao intellectus, que procura compreender-se e procura entender
os sinais de Deus naquele momento, que procura responder ao desafio de Deus
naquele momento e encontrar, na Palavra de Deus, a palavra para o presente e o
futuro, enquanto todo o Concílio – como disse – se movia no âmbito da fé, como
fides quaerens intellectum, o Concílio dos jornalistas, naturalmente, não
se realizou no âmbito da fé, mas dentro das categorias dos meios de comunicação
actuais, isto é, fora da fé, com uma hermenêutica diferente. Era uma
hermenêuticos política: para os mass-media, o Concílio era uma luta
política, uma luta de poder entre diversas correntes da Igreja".
no Encontro de Bento XVI com o clero de Roma, 14 de fevereiro de 2013: AQUI
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