São dramáticas as imagens que nos chegam do Haiti, não apenas as das primeiras horas mas também as actuais. O sismo devastador deu lugar a uma situação de descalabro e mesmo na procura de comida e de água há conflitos, violência, disputas várias pela sobrevivência e num ou noutro caso o ensejo de tirar algum proveito da desgraça alheia.
Primeira nota: por mais violências e comovedoras que sejam as imagens, nada se compara ao caos instalado, ao sofrimento, ao luto e ao desespero das pessoas que perderam tudo e sobretudo perderam os seus familiares e amigos. Entenderão como uma bênção o terem sobrevivido, mas sobre-vem também a angústia pelo que perderam e por quem perderam. Mesmo depois do país estar recuperado haverá milhares de rostos desfigurados pela tragédia, pelo medo, pela perda de algum familiar. Por mais que tentemos nunca chegaremos a compreender totalmente a dimensão desta tragédia na vida concreta das pessoas.
Segunda nota: a solidariedade internacional para com as vítimas e para com o Haiti é louvável. Um drama que suscita a comoção e a compaixão de pessoas, instituições e estados do mundo inteiro, mobilizados para minorar a dor e a confusão que se instalou. O ser humano, capaz de muitos atropelos, revela em momentos como este, o seu lado melhor e a capacidade de tentar fazer a diferença. Todos querem participar na ajuda ao Haiti.
Terceira nota: o sismo pôs a descoberto uma situação que se vivia há muito: a pobreza. Quando ouvíamos falar do Haiti, do Havai, da República Dominicana, era numa linguagem romântica, de paisagens paradisíacas, lugar de férias, de turismo e de encantamento. O sismo desfez a imagem romântica que pudéssemos ter do Haiti. Afinal era um país extremamente pobre, dos mais pobres do planeta, onde as pessoas viviam na miséria. Talvez agora os olhos do mundo se voltem para o Haiti, e sobretudo para as pessoas concretas, como um desafio solidário de partilha e de ajuda na vida quotidiana, permitindo que ao recuperar o país, as pessoas recuperem também e possam encontrar condições humanas para enfrentar novos tempos...
Quarta nota: só nos lembramos de Santa Bárbara quando troveja, nesta como em muitas situações da vida. O investimento para minorar os resultados do sismo e reconstruir o país, já deveria ter tido lugar no combate à pobreza e a degradação humana.. Por exemplo, os EUA disponibilizaram à partida 100 milhões de dólares. Naturalmente que países industrializados como os EUA, que muitas vezes apregoam a solidariedade, mas que chega apenas quando os holofotes estão ligados. As pessoas já viviam há muito na miséria, em condições sub-humanas...
Quinta nota: decorrente do aspecto anterior, o investimento feito em armamento, ou até mesmo os gastos de reuniões internacionais, que não dão fruto, que se tornam muitas das vezes reuniões sociais e turísticas para os chefes de Estado, poderia em parte ser canalizado para a irradiação da pobreza. Esta é de bradar aos céus em países já reconhecidos como extremamente pobres, mas mesmo em países desenvolvidos.
Há dias passava uma reportagem numa das nossas televisões que mostram como havia muitas pessoas que sobreviviam a partir de uma lixeira... e tanto desperdício... Diga-se, a este propósito ainda, que a atenção que o combate ao terrorismo merece, não invalida o investimento prioritário no combate pela irradiação da pobreza, que por sua vez, gera violência: quem nada tem, tudo pode fazer, porque nada tem a perder... por vezes nem a dignidade... que nunca lhe reconheceram...
Há dias passava uma reportagem numa das nossas televisões que mostram como havia muitas pessoas que sobreviviam a partir de uma lixeira... e tanto desperdício... Diga-se, a este propósito ainda, que a atenção que o combate ao terrorismo merece, não invalida o investimento prioritário no combate pela irradiação da pobreza, que por sua vez, gera violência: quem nada tem, tudo pode fazer, porque nada tem a perder... por vezes nem a dignidade... que nunca lhe reconheceram...
Sexta nota: no Haiti, quando os holofotes se apagarem ou se desviarem para outro acontecimento, o pior está para vir, a comoção poderá dar lugar à indiferença e ao esquecimento e quem sofrerá serão os mesmos que agora beneficiam do auxílio e das promessas, mas cujas dificuldades não serão facilmente sanadas. Importa que instituições locais continuem a obra de reconstrução do país e da "reconstrução" das pessoas e das famílias. A este propósito e como referência, o papel da Caritas Internacional e da Caritas Portuguesa, apoiam mas através da Caritas do Haiti, ou seja, de pessoas que já estão há muito no terreno da solidariedade e que lá continuarão. Obviamente, com isto não queremos significar a ajuda que for de fora não é meritória, mas que esta suscite também aquela, para que no final não fiquem desamparados aqueles que agora queremos ajudar...
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