Interessa potenciar esta visita como “surpresa” para os que estão perto e longe do Evangelho. Foi aberta uma nova ponte com o mundo laico
É natural que da visita do papa Bento XVI a Portugal fique mais o “acontecimento” no seu todo que o conjunto de 17 “discursos” que proferiu entre saudações, preces, entrevistas e homilias. Mas as suas palavras foram, de si, acontecimento. Se algumas foram circunstanciais e de protocolo outras, as principais, foram fruto de reflexão e proposta à Igreja e ao mundo em Portugal. Pena seria se, tanto a nossa sociedade civil, como a comunidade eclesial reduzissem tudo a um encontro de cortesia dum chefe de Estado ou duma apoteose simpática do “chefe” da Igreja.
O todo da mensagem do Papa foi repassado duma reflexão que terá acontecido dentro da nossa própria Igreja nas sugestões que de Portugal foram enviadas a Roma mas que, meditadas e assumidas pelo Sumo Pontífice, se transformaram em acto de magistério para o tempo que vivemos e o país que somos.
Será por isso de suma importância que as comunidades cristãs, no novo ano pastoral, cruzem os planos diocesanos, de paróquia, movimento, com a palavra mais actual do sucessor de Pedro sobre a nossa realidade humana e eclesial. Importa não desperdiçar em vagos considerandos este “testamento” riquíssimo que nos deixou Bento XVI que tem a ver com a nossa dignidade histórica, o diálogo com a cultura do nosso tempo, a importância do empenhamento social, a espiritualidade como fonte inspiradora das nossas vidas, a consagração vivida em fraternidade profunda, Fátima como uma mensagem inacabada, a evangelização como proposta e não imposição. E, à cabeça, a magistral entrevista concedida no avião, de improviso, com a fluência e a limpidez literária dum compêndio de sabedoria longamente meditado. Assim, iremos mais longe que a hospitalidade lusíada, o entusiasmo de multidões, as celebrações vivas de participação, a beleza e interioridade dos grandes momentos litúrgicos. Interessa potenciar esta visita como “surpresa” para os que estão perto e longe do Evangelho. Foi aberta uma nova ponte com o mundo laico. Não se pede que seja escrito um novo catecismo ou compêndio de pastoral, espiritualidade, evangelização ou moral. Mas podemos dizer que esta é a palavra da Igreja mais próxima no tempo e incarnada na realidade concreta do nosso país.
E que a esperança de que foi portador vá muito além duma alegria vaga e reverencial. E se alicerce nas razões profundas da nossa esperança que continuamente redescobrimos. A razão e a fé de Bento XVI vieram ajudar-nos a uma colocação harmoniosa do nosso crer e do amar o nosso mundo. Não podemos, seja a que pretexto for, desperdiçar este sinal que nos foi enviado.
António Rego, Editorial da Agência Ecclesia.
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