1 – É surpreendente como um bebé sossega ao ouvir a voz da Mãe. Desde cedo, o bebé aprende a voz, o cheiro, o toque da Mãe. Se durante a gravidez a Mãe falar com o/a filho/a, criando um ambiente tranquilo, quando nascer ele/a reconhecerá a mesma voz e o mesmo ambiente calmo, ou alguma música que escutou dentro do ventre materno. Virá depois o cheiro e o toque, facilmente identificáveis. O mesma ligação, ainda que mais ténue, do Pai. Se, durante a gravidez, o Pai tomou parte no mesmo ambiente, falando com o/a filho/a, este/a irá reconhecê-lo quando falar. Progressivamente, se for um Pai presente, irá reconhecer o seu cheiro, o seu toque, os seus passos.
É quase instintivo. Horários, barulhos, ambientes que progressivamente a criança irá interiorizando. E assim também, ainda ao colo da Mãe, começará a "negociar" (manipular) os pais, descobrindo, por exemplo, que o choro os traz imediatamente de volta.
Quem tem animais de estimação, sabe que sucede algo de semelhante. Um gato, ou um cão, identifica a voz de quem o alimenta e afaga, reconhece a voz, o barulho do motor do carro a chegar, a porta a abrir, bem como os cheiros, aproximando-se se forem familiares, escondendo-se ou revelando "irritação" se forem estranhos. O barulho do prato de comida! Um animal doméstico pode até detetar o humor dos seus donos, mantendo-se por perto ou afastando-se.
Outros animais domésticos, vacas, cabras, cavalos, coelhos (e até as galinhas), ovelhas, reconhecem os passos dos donos, de quem os trata, lhes traz o alimento ou os leva a pastar. Reconhecem a voz, o som dos carros que se aproximam, agitam-se, pois sabem que vão comer ou que vão sair. Ou, em sentido inverso, agitam-se porque apareceu algum estranho, pessoa ou animal, um cheiro e um barulho diferentes do habitual. O cavalo aprendeu a reconhecer a voz do seu tratador, terá dificuldade em sossegar diante de um estranho e dificilmente se deixará aparelhar ou cavalgar.
2 – Jesus viveu grande parte da sua vida em ambientes rurais. Nazaré é uma pequena cidade, mais aldeia que cidade, em que todos se conhecem e se entreajudam. É carpinteiro, como São José, trabalhando a madeira, a pedra e o ferro. É uma parte do trabalho. Semeiam os campos, próprios ou arrendados. Têm um ou outro animal doméstico. Alguns cabritos ou ovelhas. Recolhem a lã e o leite, para consumo próprio ou para trocar por outros alimentos essenciais. Pela Páscoa comem o Cordeiro pascal com os outros familiares. Em conformidade com a Lei mosaica, todas as famílias se reúnem para comer o Cordeiro pascal. Se houver alguma família que não possa, as outras devem prover para que não lhes falte, condividindo. Este cordeiro é para comer naquele dia. Mata-se o cordeiro do tamanho necessário para a refeição da família ou de forma a partilhar com uma família que não tenha meios para comprar e matar um cordeiro. Não haverá sobras para o dia seguinte!
Quando sobem ao Templo, por ocasião da Apresentação, José e Maria oferecem um par de rolas ou de pombas, por serem uma família modesta. Porém, é expectável e provável que tivessem uma ou outra ovelhinha, um ou outro cabrito. Por outro lado, o pastoreio fazia-se muitas vezes em comum. Os mais novos tomavam conta das ovelhas das famílias da aldeia, formando um só rebanho. Poderia ainda acontecer que um homem mais rico contratasse um dos jovens para guardar o seu rebanho. Em Nazaré, contudo, as famílias estariam niveladas, por baixo, no estatuto social e económico, ajudando-se reciprocamente nos campos, no cuidado dos animais de pequeno porte, nos trabalhos braçais e na lide doméstica, sobretudo aquando de festas religiosas, ou dos casamentos, e também por ocasião dos funerais. A aldeia forma uma só família.
As palavras de Jesus estão cheias de vida e de experiência: «As minhas ovelhas escutam a minha voz. Eu conheço as minhas ovelhas e elas seguem-Me. Eu dou-lhes a vida eterna e nunca hão de perecer e ninguém as arrebatará da minha mão. Meu Pai, que Mas deu, é maior do que todos e ninguém pode arrebatar nada da mão do Pai. Eu e o Pai somos um só».
Ele sabe do que fala e o seu auditório compreende perfeitamente o que lhes diz. Não é um discurso bonito, é a vida que emerge das suas palavras.
3 – Jesus é o Bom Pastor que conhece todas as ovelhas, que as chama pelo nome e que dá a vida por elas. O mercenário encara o pastoreio como um trabalho que realiza por um preço ajustado, sem colocar em risco a própria vida. Se há ameaça, mais importante é salvar-se a si mesmo. A tentação da Cruz – Salva-te a Ti e a nós também! Jesus ousa dar a vida. Não Se poupa nem Se resguarda.
Ele é o Bom Pastor que sai em busca das ovelhas. Se alguma se perde ou foge do redil, vai procurá-la. Se a encontra faz festa, como o Pai misericordioso faz festa pelo regresso do filho pródigo. Se a ovelha está ferida ou cansada, coloca-a aos ombros, e condu-la de volta ao rebanho. Mas não se pense que descura as que ficam no aprisco, condu-las às pastagens verdejantes e às águas refrescantes.
Quem Me vê, vê o Pai. Jesus vive sintonizado com o Pai, transparecendo-O no tempo e na história. É o Pai que Lhe confia as ovelhas. "Eu e o Pai somos Um só". Se as ovelhas são do Pai – e o Pai é maior do que todos –, Ele não deixará que as ovelhas se percam. Vem ao de cima a Misericórdia do Pai, que tudo fará para não perder nenhuma ovelha. Envia-nos como Bom Pastor o Seu Filho Jesus, a Quem confia toda a humanidade. De todos os cantos da terra, de todos os tempos, Jesus vem congregar-nos numa só família. Um só rebanho, um só Pastor.
4 – No Apocalipse, São João continua a revelar-nos as suas visões. Escuta um dos Anciãos: «Estes são os que vieram da grande tribulação, os que lavaram as túnicas e as branquearam no sangue do Cordeiro. Por isso estão diante do trono de Deus, servindo-O dia e noite no seu templo. Aquele que está sentado no trono abrigá-los-á na sua tenda. Nunca mais terão fome nem sede, nem o sol ou o vento ardente cairão sobre eles. O Cordeiro, que está no meio do trono, será o seu pastor e os conduzirá às fontes da água viva. E Deus enxugará todas as lágrimas dos seus olhos».
Jesus é o Cordeiro de Deus, é o Pastor que conduz a imensa multidão, pessoas vindas de todos os povos, línguas ou nações. A salvação é extensível a todos. Jesus oferece a Sua vida a favor da humanidade. Conduzirá todos às fontes de água viva e enxugará as lágrimas dos seus olhos.
5 – Celebramos hoje o Dia Mundial de Oração pelas Vocações. O Papa Francisco, na Sua mensagem, sob o tema "A Igreja, Mãe das Vocações", sublinha que "a Igreja é a casa da misericórdia e também a «terra» onde a vocação germina, cresce e dá fruto... A conversão e a vocação são como que duas faces da mesma medalha, interdependentes continuamente em toda a vida do discípulo missionário". O Papa Francisco aprofunda a mensagem em três notas que nos remetem para o único rebanho de Cristo: 1) A Vocação nasce na Igreja. 2) A Vocação cresce na Igreja. 3) A Vocação é sustentada na Igreja.
A segunda leitura incide sobre o ministério missionário de Paulo e Barnabé que lhes foi confiado pela Igreja. Visível a conversão, a inserção à comunidade e o compromisso missionário a partir da comunidade. O Papa diz-nos que "a missão de Paulo e Barnabé é um exemplo desta disponibilidade eclesial. Enviados em missão pelo Espírito Santo e pela comunidade de Antioquia (cf. Atos 13, 1-4), regressaram depois à mesma comunidade e narraram aquilo que o Senhor fizera por meio deles (cf. Atos 14, 27). Os missionários são acompanhados e sustentados pela comunidade cristã, que permanece uma referência vital, como a pátria visível onde encontram segurança aqueles que realizam a peregrinação para a vida eterna".
Entretanto a missão de Paulo e de Barnabé estende-se aos pagãos. A Boa Nova não está restringida aos judeus, mas destina-se a todas. As circunstâncias antecipam a Igreja em saída: «Era a vós que devia ser anunciada primeiro a palavra de Deus. Uma vez, porém, que a rejeitais e não vos julgais dignos da vida eterna, voltamo-nos para os gentios, pois assim nos mandou o Senhor: ‘Fiz de ti a luz das nações, para levares a salvação até aos confins da terra’». Os gentios rejubilam, mas os "principais da cidade" perseguem e expulsam, do seu território, Paulo e Barnabé. Eles continuam com alegria, e com o Espírito Santo, para outros lugares.
Pe. Manuel Gonçalves
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