sábado, 25 de janeiro de 2025

Domingo III do Tempo Comum - ano C - 26 de janeiro

       1 – São Lucas é o evangelista que mais de perto nos acompanhará nos Domingos e Solenidades deste Ano C. É considerado o Evangelho da Oração (do Senhor), do Envio, Evangelho Missionário, Evangelho da Misericórdia de Deus, e também o Evangelho dos Encontros. O Pai de Jesus Cristo, e nosso Pai, é um Deus misericordioso, clemente e compassivo. Algumas das parábolas que teremos oportunidade de escutar são uma marca luminosa da misericórdia de Deus: o Bom Samaritano; a Oração do Fariseu e do Publicano, a Parábola do Filho Pródigo e também da ovelha tresmalhada e da dracma perdida, do Juiz iníquo e da viúva insistente, do rico avarento e do pobre Lázaro ou mesmo do grande banquete. Da mesma forma os diversos encontros de Jesus: com Levi (Mateus), com Zaqueu, com a mulher apanhada em flagrante adultério, a refeição em casa do fariseu Simão e a pecadora arrependida, com a viúva de Naim, a quem ressuscita o filho único, com os 10 leprosos, com o bom ladrão.
       Logo no início do Evangelho, São Lucas apresenta o seu propósito: "Já que muitos empreenderam narrar os factos que se realizaram entre nós, como no-los transmitiram os que, desde o início, foram testemunhas oculares e ministros da palavra, também eu resolvi, depois de ter investigado cuidadosamente tudo desde as origens, escrevê-las para ti, ilustre Teófilo, para que tenhas conhecimento seguro do que te foi ensinado".
       O Evangelho é colocado por escrito para ser transmitido com mais segurança e rigor aos vindouros. É para nós que São Lucas escreve, para acolhermos as palavras e sobretudo a vida de Jesus. Teófilo – o amigo de Deus – somos nós, se nos dispomos acolher Deus com a Sua Palavra.
       2 – Durante a quadra de Natal, escutámos o Evangelho de Infância: anunciação, visitação, nascimento de Jesus, perda e encontro de Jesus no Templo. E claro as referências a São João Batista, anúncio a Zacarias que vai ser pai, nascimento de João Batista, e a pregação do Precursor. Entretanto, o texto lucano faz-nos avançar para a prisão de João Batista, seguindo-Se o batismo (inicial) de Jesus. Logo Jesus é impelido pelo Espírito Santo ao deserto (texto para escutar e refletir no primeiro domingo da Quaresma), onde é tentado pelo demónio. Volta para a Galileia e inicia-se (em definitivo) o ministério público, assumindo-Se como Enviado, Ungido do Senhor, o Filho bem-amado do Pai.
       Vai a Nazaré, onde se tinha criado. A sua fama já se espalhara por toda a região, pelo que também aqui se pressupõe que Jesus já pregava e realizava prodígios, ainda que para Lucas esta presença em Nazaré seja um dos primeiros "atos" públicos de Jesus.
       Era habitual Jesus ir à Sinagoga aos sábados, como todos os judeus crentes. Jesus integra-se no povo, na sua cultura e na sua religião. Estando na Sinagoga de Nazaré, chegado o momento, levanta-se para fazer a Leitura. Faz-nos lembrar a nossa liturgia, com as leituras e com a subsequente reflexão. Entregam-lhe o rolo (livro) de Isaías e encontra a seguinte passagem: «O Espírito do Senhor está sobre mim, porque Ele me ungiu para anunciar a boa nova aos pobres. Ele me enviou a proclamar a redenção aos cativos e a vista aos cegos, a restituir a liberdade aos oprimidos e a proclamar o ano da graça do Senhor».
       A liturgia desenrola-se, Jesus enrola o livro de Isaías e entrega-o ao ajudante. Senta-se. Como "mestre", senta-se para fazer a homilia e diz: «Cumpriu-se hoje mesmo esta passagem da Escritura que acabais de ouvir».
       Simples, direto, sucinto. HOJE cumpriu-se a Escritura. Vejamos: O Espírito do Senhor está em Jesus, ungiu-O para anunciar a boa nova aos pobres e a liberdade a todos os que vivem oprimidos pela doença, pela solidão, pelo medo. Veio trazer-nos a graça de Deus, cujo ano proclama. É um ANO de GRAÇA que HOJE nos é dado. Hoje, não ontem, não amanhã. Hoje.
       3 – Jesus surge no seguimento de outros Profetas, sendo Ele, não mais um, mas o último, o Profeta por excelência, o Ungido do Senhor. Os Patriarcas, os Juízes e os Profetas mantiveram Deus por perto, com as suas palavras inspiradas, a mensagem da Aliança, animando nos momentos históricos adversos, convocando para a fidelidade à Misericórdia de Deus para se manterem fiéis ao sonho, ao caminho, integrando outros e sendo bênção para todos os povos.
       Extraordinário e comovente relato nos é oferecido na primeira leitura. O Livro da Lei volta a estar disponível. Aqui o Livro sagrado visualiza a presença, o amor, a aliança de Deus com o Povo. O sacerdote Esdras traz o Livro da Lei, coloca-se diante da assembleia, de homens e de mulheres, isto é, todos os que eram capazes de compreender. E leu desde a aurora ao meio-dia.
       Relembremos também a nossa liturgia da Palavra. Esdras está de pé, num estrado de madeira, feito de propósito, elevado em relação à assembleia. Quando Esdras abriu o Livro todos se levantaram. Esdras bendisse a Deus, e o povo, erguendo as mãos, respondeu: «Ámen! Ámen!».
       Homens e mulheres prostram-se por terra para adorarem o Senhor. Os levitas leem, clara e distintamente, a Lei de Deus, explicando o seu sentido, para que todos possam compreender. Esdras e os Levitas ensinam todo o povo, que agradece, emocionado. É então que o governador Neemias, o sacerdote e escriba Esdras e os levitas dizem a todo o povo: «Hoje é um dia consagrado ao Senhor vosso Deus. Não vos entristeçais nem choreis». – Porque todo o povo chorava, ao escutar as palavras da Lei –. Depois Neemias acrescentou: «Ide para vossas casas, comei uma boa refeição, tomai bebidas doces e reparti com aqueles que não têm nada preparado. Hoje é um dia consagrado a nosso Senhor; portanto, não vos entristeçais, porque a alegria do Senhor é a vossa fortaleza».
       É o dia consagrado ao Senhor, dedicado à escuta e reflexão da Palavra de Deus, à adoração, mas também à festa em família.
       Podemos perguntar-nos como nos predispomos a escutar, a viver, a testemunhar a Palavra de Deus. Aquele povo emociona-se, comove-se, pois a Palavra de Deus que lhes é dirigida garante-lhes a presença e a bênção de Deus. A sinagoga de Nazaré coloca-se em posição, com os olhos voltados para Jesus, para O escutarem. E nós?
       4 – Hoje somos nós que estamos naquela Sinagoga! HOJE temos os olhos fitos em Jesus, os olhos e os ouvidos. Hoje: a Lei do Senhor, mas muito mais, a Sua graça. É um Ano feliz, santo, benfazejo, porque Deus está no meio de nós, já não apenas em palavras e promessas, mas na Palavra, em Jesus Cristo, que vive no meio de nós e se esconde (especialmente) nos mais pequeninos que colocou na nossa vida, para amarmos e servimos e para aprendermos a ser irmãos.
"A lei do Senhor é perfeita, ela reconforta a alma; as ordens do Senhor são firmes, dão sabedoria aos simples. / Os preceitos do Senhor são retos e alegram o coração; os mandamentos do Senhor são claros e iluminam os olhos. / O temor do Senhor é puro e permanece eternamente; os juízos do Senhor são verdadeiros, / todos eles são retos. / Aceitai as palavras da minha boca e os pensamentos do meu coração estejam na vossa presença: Vós, Senhor, sois o meu amparo".
       Há leis que matam, que aprisionam, que nos encolhem, que assustam, leis que dividem em maiores e menores, pessoas de primeira e de segunda, leis que nos subjugam. A Lei do Senhor reconforta-nos, desafia-nos, provoca-nos para o melhor de nós mesmos, liberta-nos para o bem, para a justiça e para a verdade. A LEI do Senhor agora tem um ROSTO: Jesus, Rosto da Misericórdia do Pai. Deus não nos governa de fora, distante e indiferente aos nossos sofrimentos. Deus ama-nos a partir de nós, do interior. Em Cristo vem habitar-nos, vem morar connosco.

       5 – Belíssima também a página de São Paulo que temos a dita de hoje escutar. A Igreja é o Corpo de Cristo, do qual Ele é a Cabeça e nós os membros. O Apóstolo sublinha o lugar e a importância de todos os membros, diferentes mas necessários.
       "O corpo é um só e tem muitos membros, e todos os membros do corpo, apesar de numerosos, constituem um só corpo". Também em Cristo acontece da mesma forma: todos nós - "judeus e gregos, escravos e homens livres – fomos batizados num só Espírito para constituirmos um só corpo e a todos nos foi dado a beber um só Espírito".
       No corpo todos os membros contam, todos são importantes. Muitas vezes os membros aparentemente mais frágeis são os que precisam de mais cuidados, pois a sua importância é crucial. E se um dos membros está em sofrimento, todos os membros padecem. Sabemos bem disso: se me doer um dente, é todo o corpo que fica em sofrimento, os ouvidos, a cabeça, o equilíbrio, a disposição, a vontade. É apenas um dente e afeta todo o meu dia.
       "Vós sois corpo de Cristo e seus membros, cada um por sua parte". O mesmo Deus, a mesma fé, o mesmo Batismo, Deus atua em todos. Os dons que Deus nos dá destinam-se ao bem de todos.

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (C): Ne 8, 2-4a. 5-6. 8-10; Sl 18 B (19); 1 Cor 12, 12-30; Lc 1, 1-4: 4, 14-21.

sábado, 18 de janeiro de 2025

Domingo II do Tempo Comum - ano C - 17 de janeiro

       1 – O Apóstolo São Pedro, no livro dos Atos dos Apóstolos (10, 34-38), lembra-nos que «Deus ungiu com a força do Espírito Santo a Jesus de Nazaré, que passou fazendo o bem e curando todos os que eram oprimidos pelo demónio, porque Deus estava com Ele».
       O Batismo de Jesus marca uma viragem na Sua vida. O nosso batismo há de marcar um tempo novo, de graça e de salvação. Seguindo entre o Povo, Jesus faz-Se batizar, connosco, para que nos batizemos com Ele. Pedro e os demais apóstolos são batizados na morte e na ressurreição de Jesus, Batismo consumado. A partir desta luz que irradia da Páscoa de Jesus, os discípulos seguem-n'O, anunciando-O, levando-O a todo o mundo, testemunhando-O com palavras e com a vida. Assim terá de ser connosco, batizados, novas criaturas, para vivermos de maneira nova, à maneira de Jesus, amando, servindo, dando a vida, transformando a água em vinho novo para a festa da partilha e da comunhão.
       Na vida de Jesus, e na Liturgia da Igreja, ao batismo segue-se a vida pública. Jesus irrompe pelas aldeias e pelas cidades, pelas montanhas e pelos vales, em terra ou em mar, a anunciar a salvação de Deus, a libertação das pessoas e dos povos, pela misericórdia e pela graça, pelo perdão e pelo amor sem medida, ou melhor, com a medida do amor de Deus.
       2 – No atual ciclo de leituras, ano C, aberto com o primeiro domingo do Advento, o evangelista que mais de perto nos acompanha é São Lucas. Porém, aqui e além, a oportunidade de escutar e mastigar outros evangelhos. Hoje a Liturgia da Palavra brinda-nos com o primeiro milagre de Jesus, segundo o evangelista São João, e que ocorre nas Bodas de Caná da Galileia.
       À primeira vista, Jesus, como Messias esperado e prometido, passa despercebido. Está na festa como convidado. Maria, a Mãe de Jesus foi convidada e em atenção à Mãe também Jesus e os seus discípulos são convidados.
       Jesus não é nenhum bicho de 7 cabeças, estranho, esquisito, extraterrestre. Ele assume-nos por inteiro. E assume-Se como verdadeiro Homem. Sendo Deus é Deus connosco, confunde-Se connosco, encarna, caminha connosco, vive como nós. Não cai do Céu aos trambolhões, nasce de uma Mulher, tem uma família, tem amigos, vai às festas dos familiares, participa nas dores e nas tristezas do seu povo. Não é romantismo, é a vida real de Jesus. Nas Bodas de Caná, Jesus está descontraidamente a festejar. Envolvido. Entre familiares e amigos.
       3 – A festa decorre normalmente. Os noivos estão felizes da vida, talvez um pouco ansiosos, falando com uns e com outros, preocupados em que tudo corra bem e todos se sintam felizes. Do mesmo jeito, os seus pais mal apreciam a comida e a bebida para se assegurarem que nada vai faltar aos convidados.
       Maria é apresentada como Mãe. As mães sempre desenvolvem uma grande perspicácia: atentas a tudo o que diz respeito aos seus filhos, ao que fazem, ao que dizem, ao que sentem, procurando adivinhar-lhes as preocupações. Muitas vezes alargam esta sensibilidade maternal às outras pessoas. Maria, Mãe de Jesus, tal como o Filho, está festejando. Mas mantém-se atenta. É amiga da família e preocupa-se com que tudo corra bem. Há pessoas assim. Maria é modelo e referência. Apercebe-se antes de todos os outros que o vinho está a faltar.
       Diante dos contratempos poderemos bloquear sem saber o que fazer, ou passemos à frente como se não nos dissesse respeito, deixando que outros resolvam. Maria toma a iniciativa e faz o que está ao Seu alcance. Vai ter com Jesus e diz-lhe: «Não têm vinho». Mais que um pedido parece ser um desabafo, isto é, se quiseres podes agir! A oração de Maria não força Deus, mas confia.
       A resposta de Jesus – «Mulher, que temos nós com isso?» – sintoniza, num primeiro tempo, com aquilo que pensamos, por que é que nos havemos de intrometer num problema que não criámos e que não nos diz respeito diretamente?
       «Ainda não chegou a minha hora». Jesus tem consciência do tempo em que Se manifestará a todos. Ainda não terá chegado a hora! Por vezes também nos acontece. Nós é que sabemos, quando, como, com quem, em que circunstâncias. E ficamos retinentes quando nos dizem que temos de fazer isto ou aquilo. Por casmurrice não fazemos. Também aqui Jesus nos dá uma lição importante, fazendo-nos olhar para Maria, Sua Mãe, que não desiste, dizendo aos serventes, que hoje somos nós: «Fazei tudo o que Ele vos disser». O que pedirmos com fé à Mãe, o Filho não deixará de atender. Ela intercede por nós, porque também nos assume como filhos.
       4 – Jesus não demora em justificações ou desculpas. Poderia passar culpas! Quem vai para o mar prepara-se em terra! Se os noivos e as suas famílias marcaram a festa de noivado-compromisso, então deveriam prever o número das pessoas e os dias da festa. Quem não quer ajudar sempre arranja desculpas. Quem se dispõe a ajudar, ajuda quando é preciso ajudar.
       Jesus manda os serventes – que hoje somos nós – encher as talhas de água. Seis talhas de pedra destinadas à purificação dos judeus. 600 litros de água transformada em 600 litros de vinho de qualidade.
       Os serventes seguem Jesus e fazem o que Ele lhes pede. Jesus conta com eles e connosco: «Tirai agora e levai ao chefe de mesa». Sem saber a origem deste vinho novo, o chefe de mesa prova e fica admirado, dizendo ao noivo: «Toda a gente serve primeiro o vinho bom e, depois de os convidados terem bebido bem, serve o inferior. Mas tu guardaste o vinho bom até agora».
       Jesus serve-nos o melhor vinho. Serve-nos a Sua vida por inteiro, cuja abundância já se visualiza neste primeiro milagre. Transforma a água em vinho. Transforma a Sua vida para Se nos dar, no pão e no vinho, com o Seu Corpo e o Seu sangue, em abundância, a abundância do amor.
       5 – As promessas de Deus ao Seu povo, anunciadas pelos profetas, começam a realizar-se. Não podemos não ouvir a voz sonante de Isaías. Também aqui se usa a imagem do noivado.
       "Por amor de Sião não me calarei, por amor de Jerusalém não terei repouso, enquanto a sua justiça não despontar como a aurora e a sua salvação não resplandecer como facho ardente. Os povos hão de ver a tua justiça e todos os reis a tua glória... Não mais te chamarão «Abandonada», nem à tua terra «Deserta», mas hão de chamar-te «Predileta» e à tua terra «Desposada», porque serás a predileta do Senhor e a tua terra terá um esposo. Tal como o jovem desposa uma virgem, o teu Construtor te desposará; e como a esposa é a alegria do marido, tu serás a alegria do teu Deus".
        Deus desposa o Seu povo, permanecendo por perto, não Se afastando mesmo quando é afastado. Os afastamentos trazem a diabolização, as divisões, a conflitualidade nas famílias e nas comunidades. Deus não Se impõe. O "contrato" de casamento é (quase) unilateral. Deus ama primeiro e ama sempre, além do nosso pecado e das nossas infidelidades, além do nosso esfriamento e das nossas hesitações. O olhar de Deus e a Sua mão não se afastam, para não nos perder, para não perder o Seu povo. Deus não desiste. Nunca desiste de nós.

        6 – Com Jesus realizam-se as promessas de Deus. A abundância da Sua vinda e da Sua vida leva-nos ao louvor e à ação de graças: "Cantai ao Senhor um cântico novo, cantai ao Senhor, terra inteira, cantai ao Senhor, bendizei o seu nome. Anunciai dia a dia a sua salvação, publicai entre as nações a sua glória, em todos os povos as suas maravilhas".

       7 – Na segunda leitura, São Paulo lembra-nos que todos somos batizados no mesmo Espírito para formarmos um só povo, vivendo ao serviço uns dos outros, como Jesus que veio para viver connosco, assumindo os nossos sonhos e os nossos pecados, o nosso sofrimento. Cabe-nos, imitando-O, dar a vida pelos nossos irmãos, pelas pessoas que Deus coloca na nossa vida.
       Há diversidade de dons espirituais, de ministérios, de operações, mas "é o mesmo Deus que realiza tudo em todos". Com efeito, os dons recebidos e os ministérios assumidos são em ordem ao bem de todos. "É um só e o mesmo Espírito que dá a um o dom da fé, a outro o poder de curar; a um dá o poder de fazer milagres, a outro o de falar em nome de Deus; a um dá o discernimento dos espíritos, a outro o de falar diversas línguas, a outro o dom de as interpretar. Mas é um só e o mesmo Espírito que faz tudo isto, distribuindo os dons a cada um" para o bem comum.
       Não nos ensoberbeçamos com os dons recebidos, que nos são "emprestados" para o utilizarmos a favor dos outros, como Jesus Cristo que sendo rico Se fez pobre para nos enriquecer com a Sua pobreza. "Infundi em nós, Senhor, o espírito da vossa caridade, para que vivam unidos num só coração e numa só alma aqueles que saciastes com o mesmo pão do Céu."

Pe. Manuel Gonçalves


Textos para a Eucaristia (ano C): Is 62, 1-5; Sl 95 (96); 1 Cor 12, 4-11; Jo 2, 1-11.

sábado, 4 de janeiro de 2025

Ermes Ronchi - a Dança dos Ventres

ERMES RONCHI (2024). A dança dos ventres. Meditações para o Advento. Prior Velho: Paulinas Editora. 70 páginas.

O Advento, deste ano litúrgico, (2024/2025) já lá vai, o tempo de Natal também, mas este livrinho lê-se bem em qualquer tempo litúrgico, pois nos coloca diante da alegria de Maria e de Isabel, e dos filhos que carregam no ventre… uma alegria tão grande que salta do ventre para os lábios! A Voz e a Palavra encontram-se antes de nascerem! Isabel e Maria juntam a Voz e a Palavra, João e Jesus, e dão voz às palavras para expressarem a alegria que carregam no peito, a graça que as preenche e aos respetivos ventres onde a vida germina até que a Luz se manifeste para o mundo inteiro.

Algumas expressões do autor:
“A vida está dentro do infinito, e o infinito está dentro da vida; o eterno brilha no instante, e o instante insinua-se no eterno”
 
“O mundo não acabará no caos, o mundo não acabará no nada, mas dentro de um abraço”;
 
"Em cada dia, morre um mundo à nossa volta; em cada dia, porém, também nasce outro mundo, e os nossos olhos não se devem fixar naquilo que morre, mas naquilo que nasce”;
 
“Quem não levanta a cabeça, nunca verá surgir o arco-íris. E mesmo quando as lágrimas correm, copiosas, dos nossos olhos, se irrompe, como sempre acontece, um raio de luz, então, do encontro da água com a luz, nascem arco-íris”;
 
“O grande milagre é caminhar de cabeça erguida na vida sem milagres, mas com a proximidade de Deus, que nos toma pela mão… Deus esconde-se nos detalhes”;
 
“O silêncio é um amor sem palavras, é como que o instante suspenso em que o regente da orquestra ergue a sua batuta, antes de começar, aquele instante imenso que precede a ‘ouverture’ da sinfonia. Depois do silêncio, o assombro e a perturbação”;
 
“O nosso Deus pode ser surpreendido nos caminhos, nas casas, nos berços, nas mãos de quem te quer bem”;
 
“Maria é a mulher do sim. Contudo, o seu primeiro sim foi dito a José, só num segundo momento pronunciou o seu sim a Deus”;
 
“Maria tem um amor e uma casa e dá-nos testemunho de que, na vida, podemos passar sem muitas coisas, mas não sem uma casa; podemos ser pobres de tudo, mas, para viver, precisamos de amor, ou melhor, precisamos de muito amor para viver bem”;
 
“Deus está em ação dentro das nossas relações, fala dentro das famílias, no diálogo, no drama, na crise, nas dúvidas, nos impulsos de um casal, onde se criam maravilhosos oásis de verdade e de amor que são as famílias, que nos salvam do risco de acabarmos no deserto dos sentimentos, nas glaciações dos afetos”
 
“Deus compraz-se em encerrar o grande no pequeno, o carvalho na bolota, o Verbo na carne, a eternidade no instante. Não temas os novos caminhos de deus, tão distantes da aparência, das luzes, da solenidade dos Templos; não temas a manjedoura, a aspereza da palha, em que Deus se tornará menino, vagido, fome de leite, sorriso, com grandes olhos muito abertos, mão pequeníssima que se estende para ti, tal como Deus Menino se inclina para ti, para mim. Não temas este Deus Menino. Ele viverá se tu o amares, deus viverá pelo teu amor: nós podemos ser o berço ou o túmulo de Deus. Este Menino será feliz, se tu o fizeres feliz, e é isso que o Anjo repete a cada mãe, a cada pai; o teu filho viverá, se tu o amares, todos nós viveremos pelo amor de uma mãe e de um pai. Hoje cabe-nos também nós ajudar Deus a estar vivo no mundo, a encarnar nesta história, nestes caminhos, nestas praças, dando-lhe tempo e coração; Deus viverá nestas nossas cidades distraídas, nestas casas encerradas, fechadas, só por nosso amor. Maria, tu conceberás e darás à luz: eis que Deus também transforma o corpo e a vida de Maria, também o corpo, porque sem o corpo de Maria, o Evangelho perde corpo e torna-se conceito. Maria é tão importante na história porque é o ponto de contacto do humano com o divino, é o lugar de encontro entre a materialidade da nossa vida e a divindade. É Deus que se enxerta no humano, o cromossoma divino dentro do ADN humano”;
 
“As duas primeiras profetisas do Novo Testamento são duas mães á espera e um filho e anunciam que a Palavra de Deus vem e gera vida em nós”;
 
“Quem quer bem não é preguiçoso, não é indolente, tem sempre pressa, sente-se atrasado em relação à necessidade dos outros, à sua fonte de encontros e de abraços. Escreve uma mística medieval: ‘os sábios caminham, os justos correm, mas os enamorados voam’ (Camila Battista da Varano, de Camerino)”.
 
Em contracapa:
“Um coração em registo de Advento é leve e atento, está expectante de vida. Testemunhas do encontro de Maria e Isabel, somos desafiados a viver um tempo favorável, onde, aprendendo a mover-nos por amor, permanecemos atentos ao pequeno no nosso quotidiano, que é cheio de potencial de infinito. Na sua simplicidade lírica, este livro convida-nos a viver continuamente ao jeito do Advento, a acolher Deus no íntimo da nossa vida, para que, no seu amor, também nós possamos ser sinal visível da sua ternura no mundo”.
 
O autor:
Ermes Maria Ronchi (Racchiuso di Attimis) nasceu a 16 de agosto de 1947, é um sacerdote e teólogo italiano da Ordem dos Servos de Maria. É professor de estética teológica e iconografia na Pontifícia Faculdade de Teologia "Marianum" em Roma. É autor de numerosos e populares livros de espiritualidade, alguns dos quais já publicados pelas Paulinas Editora, tais como “As Casas de Maria” ou “Os beijos não dados. Tu és a Beleza”, bem como meditações para os domingos dos três anos litúrgicos.
Doutorado em Antropologia Cultural pela Sorbona e em Ciências Religiosas pelo Instituto Católico de Paris, é uma presença assídua na impressa e televisão italianas, reside atualmente no pequeno Convento de Santa maria del Cengio, no Véneto.